- Pois não?. – Júlia respondeu sorrindo deixando à mostra as covinhas do lado direito do rosto ao ver a bela ruiva ladeada com o filho.

- Prazer sou Nicolle, sua vizinha, vim trazer esse bolo de chocolate, Alvinho insistiu, ele gostou muito das gêmeas, passou a semana inteira pedindo para vir, mas, estava tão ocupada com as coisas da casa.

- Ah, que bom que veio, entre, vamos aproveitar essa delícia e conversar um pouco. Tudo bem Alvinho?.

- Tudo, as meninas estão ai?.

- Estão, vou chama-las, elas vão adorar a sua visita, ainda mais com um bolo lindo desses, tão novinho e já sabe ser cativante.

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         O menino piscou os olhos azuis sem entender a frase, mas, sentiu que era um elogio verdadeiro, sorrindo aberto quando Amélia e Alice desceram ajeitando a jardineira jeans, colocando a blusa listrada com as cores do arco íris para dentro. Júlia riu baixinho ao perceber que tinham trocado de roupa e prendido os cabelos em um gracioso rabo de cavalo.

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- Oi Amélia, oi Alice, tudo bem?.

- Tudo. – Responderam juntas e ao mesmo tempo.

- Eu pedi para a mamãe fazer esse bolo de chocolate para nós, eu sei que vocês gostam muito.

- Tá, obrigada. – Dessa vez apenas Amélia respondeu.

- Está tudo bem?.

- Sim. – Responderam novamente juntas.

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         Júlia estranhou o comportamento arredio e até meio frio das filhas, que em nenhum momento esboçaram um sorriso sequer, então suspirou ajeitando a toalha xadrez com as cores da bandeira italiana, convidando a todos a sentarem em volta da grande mesa da sala. Enquanto distribuía os pratos e os garfinhos percebeu que Alvinho sorria desajeitado balançando os pés olhando para as gêmeas desolado. Por não saber exatamente o que dizer, dirigiu-se a sua mãe quando começaram a comer.

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- O bolo está uma delícia Nicolle, desculpe perguntar, mas, como vieram para Ilha Verde?.

- O pai de Alvinho foi transferido para cá, então fechei meu consultório para acompanhar – Falou com visível incômodo na voz.

- Não sei se seu filho comentou, mas, na verdade, estou apenas passando uns dias com minhas filhas enquanto a mãe delas está em lua de mel nas Ilhas Seychelles.

- A mãe delas está em lua de mel?, como?, não entendi, desculpa.

- Fui casada por algum tempo com Anna, a mãe que gerou as meninas, por inseminação ela engravidou desses pacotinhos, infelizmente eu fugi, não sabia como lidar com essa genética tão peculiar, hoje não entendo como passei tanto tempo vivendo longe elas.

- É compreensível, desculpe dizer meninas, vocês são lindas, mas, tem essa particularidade, o que para mim não faz a menor diferença, sabemos no entanto, que nem todos pensam assim como nós, não é verdade?.

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         Ao ouvir a frase Amélia deixou que um vinco se formasse no meio de sua testa para falar junto com os perdigotos que saiam de sua boca.

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- Não somos lindas, seríamos se cada cabeça tivesse um corpo, mas, assim, a maioria das pessoas acham que somos um monstro, acredita que tem gente que acha que somos uma só?.

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         Júlia olhou assustada, as abraçou, mas, não conseguia falar nada, diante do seu silêncio Nicolle resolveu tomar a frente da situação, caminhando até a cadeira das meninas para se ajoelhar, encarando os olhos das gêmeas rasos de lágrimas.

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- Amélia, Alice aqui estão com sua mãe e entre amigos, não estou vendo monstro algum, apenas duas meninas lindas com uma rara condição, por isso mesmo meu filho escolheu um livro que sei que vão adorar.

- Qual livro que é?. – Falaram enxugando as lágrimas na manga da blusa querendo sorrir.

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         Nicolle ajeitou os fios de seus cabelos lisos da cor de bronze, exatamente da mesma textura e cor do filho, depois tirou da bolsa o presente bem embrulhado em um papel lilás entregando a Alvinho.

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-Filho, entregue o livro que escolheu para as meninas. – Alvinho, balançou os cabelos com as mãos e seguiu até lá.

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- Achei que iam gostar desse livro, espero que esteja certo.

- Obrigada e me desculpe, as vezes eu fico com muita raiva de ter nascido desse jeito, é algo só meu, Alice parece não se importar muito.

-Não fique assim, minha mãe sempre diz que tudo tem um porquê.

- Se existe um Deus porque nasci assim?.

- Ah, minha mãe me disse que a gente tem tanta célula no nosso corpo que dar tudo certo é um verdadeiro milagre, só que as vezes dá um errinho e bom, acontece isso ai.

- Tem razão, Deus não tem nada a ver com isso.

- Não mesmo.

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         Júlia tentou buscar um assunto que cortasse o que estavam conversando, teve um clique quando percebeu que estavam comendo o bolo sem nada para beber.

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- Nossa, que falta de educação a minha, estão comendo no seco, aceita um guaraná querido?. E você Júlia quer um café?, um capuccino talvez?.

- Um capuccino está ótimo.

- Nós três vamos de guaraná – Falou Amélia mais tranquila desatando a falar.

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- Nicolle, sabe que a namorada da mamãe Anna, a mamãe Kayra é ruiva que nem você...ops, mamãe Júlia disse que não se fala “que nem”, mas, “igual a você”.

- Que bacana, somos apenas 1% da população, sabia?.

- Só que a mamãe Ka é loira, ela pinta dos cabelos.

- Então, ela foge a curva dos ruivos. – Riu enquanto a observava com os expressivos olhos violeta.

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         Quando Nicolle e Alvinho se foram, Amélia nem lembrava mais do incômodo que lhe havia acometido por uns instantes.

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Ilhas Seychelles, 03 de julho de 2020

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- Ai amor, eu fico imaginando a cena da Júlia com as visitas, ela está se esforçando para ser uma boa mãe, mas, é tão desajeitada que dá até dó.

- Precisamos ligar mais tarde para saber como as coisas andam, e minha bebê Amélia com um crush, quem diria?.

- São crianças, quem nunca teve um namoradinho na infância?.

- Eu, meu primeiro crush foi uma menina.

-Ah, para de graça Anna.

- Sou sapatão raiz meu amor.

- Hahahahah, você não existe. – Falei piscando meus olhos apaixonados e entregues.

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- Com licença, você é Kayra Montenegro, não é?.

- Sim – Falei com um sorriso tímido.

- Amo seus livros, trouxe um comigo para a viagem, “O silêncio do lago negro”, se importa em autografar?.

- Claro que não, é pra você mesmo?.

- Sim, me chamo Mayara, vim para o casamento de uma amiga aqui na ilha, se quiserem aparecer vai ser um prazer – Ela falou enquanto me entregava o livro de capa dura e duas pulseiras de cor neon para a festa de logo mais. Agradeci, guardei as credenciais, lendo rapidamente o nome de uma das noivas “Joana”, em seguida dediquei com carinho o livro e o  entreguei de volta.

- Espero que o final te surpreenda, essa é uma das histórias que mais amei escrever.

- O livro é muito misterioso, sempre gostei de filmes e livros de suspense, literatura lésbica não é apenas hot.

- Concordo, olha, não sei explicar, quando escrevo parece que as palavras tem vida própria, assim como os personagens, meu processo de escrita é tudo muito estranho.

- Adoro ler, e o seu próximo livro?, soube que está escrevendo.

- Está na metade, ainda não sei no que vai dar.

- Faço questão de tê-lo em minha estante. Bom, espero vocês no casamento das meninas mais tarde.

- Obrigada, com certeza iremos... – Depois da conversa ela se foi e vi que os olhos de Anna brilhavam de felicidade e orgulho.

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- Eu fico tão feliz quando seu trabalho é reconhecido.

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O assunto terminou com a chegada do almoço, fomos surpreendidas pela deliciosa cozinha do Fish Trap Restaurant & Bar, em La Digue, uma ilha bem pequena, mas, muito aconchegante, optamos por experimentar uma salada de peixe defumado típica das ilhas e um delicioso kebab de camarão com molho de manteiga que estava divino, de sobremesa optamos pelo “Sheychelles Cream”, sobremesa feita com claras em neve que lembram nuvens com um delicioso creme de baunilha, polvilhados com canela.

Após o almoço voltamos para o hotel, depois de fazer amor, adormeci para sonhar.

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Miraflor, 20 de outubro de 1849

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- Então é isso Seu Afonso, estão todos bem, a freira, suas amantes, os órfãos e bastardos.

- Certo Isidoro, pode ir.

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         Após a saída do empregado, Afonso bateu com força na pesada mesa de madeira.

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- Maldição, pensei que aquele pardieiro jamais funcionaria sem mim!.

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Afonso estava irado, sentiu a raiva tomar conta de seu corpo e com a mão jogou tudo que estava em cima da mesa no chão.

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- Com o ódio que estou só uma pessoa pode me ajudar, preciso de uma pequena dose de felicidade ou vou enlouquecer. – Depois arrumou rapidamente a mala, chamando o motorista.

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- Arrume minha carruagem com alguns mantimentos, vou viajar e não tenho data pra voltar.

- Não sabia dessa viagem, o senhor espere um pouco que vou arrumar minhas coisas.

- Quem disse eu você vai energúmeno, vou sozinho dessa vez, quero só que ajeite o meu transporte.

- Sim senhor.

- Vá logo homem, não tenho tempo a perder.

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         Afonso reuniu a família e empregados, dizendo que deixaria tudo por conta deles, em seguida partiu sem se despedir direito, oito horas depois chegava ao seu destino no imponente sobrado de portas amarelas emolduradas com alizares verdes.

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- Afonso, meu amor, pensei que tinhas me esquecido.

- Jamais meu colibri, sabes que minha vida é complicada.

- Se não tivesse tantas amantes teria mais tempo para o nosso amor.

- Eu sei meu bem, esquece isso, eu te amo, você é o único e verdadeiro amor da minha vida, agora, que tal agora brincarmos um pouquinho em teu quarto, o que acha?.

- Não devia querer você, mas, falando assim já me atiço todo.

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         Afonso encarou os olhos castanhos que lhe olhavam cheios de desejo, em seguida encostou-se na parede empinando a bunda, sentindo o p*nis entumecido do rapaz passar suavemente nas nádegas planas.

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- Vem Jair, me faz teu, me mostra o que sou.

- Você é minha cadelinha, é?.

- Au au, sou, todo seu meu garanhão, me devora inteiro, vai.

- Afonso, você me deixa louco. – Falou puxando-o pela mão para depois dizer. – Veste esse camisola amor.

- Visto meu bem, quero ser tua mulherzinha hoje.

- Como sempre quer.

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         Acordei rindo alto, gravei o sonho com o celular para não esquecer essa parte importante da história, quer dizer que o poderoso Afonso era mais hipócrita do que imaginava?, e ainda tinha como amante um tal Jair?, duplamente divertido. Levantei para ir ao banheiro pensando em como as coisas deveriam estar em Ilha Verde.

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Ilha Verde, 05 de julho de 2020

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         Júlia acordou assustada com o barulho da mensagem do celular,  colocou os óculos de grau que estava na mesinha de cabeceira para ler, em seguida tirou devagar os braços de Moara em torno do seu corpo nu, dirigindo-se ao banheiro, voltou já arrumada e resoluta, passando os dedos nas costas nuas da indígena que piscou para dizer com a voz rouca.

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- Bom dia, como está linda, devia ter me chamado, sabe que adoro um banho compartilhado.

- Desculpa, eu gosto de ter privacidade quando preciso pensar, se arruma, vamos tomar café, Beatrice está vindo ai, quer conversar conosco.

- Será que ela se chateou por não ter sido convidada para ver série ontem à noite com a gente?.

- Não sei, mas, vamos já descobrir.

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        Não demorou e escutaram Amélia e Alice tagarelando com a loira, pelos barulhos que ouviram perceberam que as três arrumavam a mesa para o café da manhã. Moara entrou no chuveiro e Júlia desceu para ajudar a arrumar as coisas.

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- Oi?.

- Bom dia – Beatrice falou se aproximando da grossa janela de vidro da casa para continuar seu pensamento – acho incrível a vista privilegiada dessa casa, desde pequena sempre fui encantada com esse farol, ele parece mágico.

- Sim, mas, o que queria falar de tão importante?, mas, com certeza não veio para admirar o farol.

- Claro que não, precisamos conversar, mas, prefiro que seja na presença de Moara.

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    O café da manha seguiu silencioso, as meninas ajudaram a deixar a louça no balcão e logo seguiram para escovar os dentes e assistir “Coraline e o túnel secreto”.

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- Então, Júlia, Moara, precisamos conversar.

- O que foi? – Perguntaram as duas praticamente ao mesmo tempo.

- Recebi uma proposta de emprego, impossível de recusar, no entanto, é distante de Ilha Verde.

- Quão distante? – Júlia perguntou sentindo os olhos marejarem.

- Tão distante que nossa relação se torna impossível.

- Pelo visto até já aceitou, onde vai Beatrice?. – Perguntou Moara enxugando as lágrimas que caiam uma após a outra.

- Irlanda...

- Põe distante nisso, espero que seja bem feliz, é de coração, obrigada por me ajudar a formar o trisal mais fofo e que jamais imaginei em formar.

- Eu também agradeço Júlia. – As três se abraçaram demorado, haviam constituído um laço verdadeiro de afeto, paixão e querer.

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- Quando vai?.

- Daqui a quinze dias, desculpa meninas, eu não soube como falar antes.

- Tudo bem, vê se dá notícias...

- Sempre, agora preciso ir, antes vamos dançar juntas pela última vez.

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      Enquanto “Do you wanna dance” rolava na sala, se abraçavam em uma mistura delicada de desejo e carinho.

Fim do capítulo