Já se passava das 20 horas quando Sófia estacionou o seu carro em frente ao prédio que Raquel morava.

Sentia-se ansiosa. Havia passado o percurso todo de sua casa até ali pensando no que dizer para sua amada. Sabia que não seria fácil convencer Raquel de que ela não havia lhe enganado e que tudo que dissera sentir era verdade, mas tentaria. Tentaria quantas vezes fosse possível, pois ela não iria desistir da mulher que amava.

Ainda no carro, Sófia olhou para o banco de trás e viu Nino. Parecia contente e Sófia sabia o porquê para isso. Nino e Nina se gostavam demais. Sempre que ficavam separados, eles se deprimiam.

— Eu vou resolver essa situação, garotão— Sófia desceu e tirou Nino do cinto.

Ao se ver na calçada, ela olhou para cima e respirou fundo. Estava desejando mentalmente que tudo desse certo. Ela só precisava que Raquel lhe escutasse, apenas isso.

Sabia que tinha muitas pessoas envolvidas naquela história, mas o amor que elas sentiam pela outra tinha que ser maior do que tudo isso, era o que Sófia pensava.

Na portaria a sua subida foi autorizada por Norma. E nesse instante, se lembrou do que o pai havia dito.

— Raquel não está se sentindo bem – isso fez o seu coração doer. Se entristeceu. Doía demais saber que sua amada não estava bem.

Respirou fundo e olhou para Nino que lhe encarava. Parecia que ele queria lhe incentivar a prosseguir.

Uma coisa Sófia já sabia, Nino apoiava o relacionamento das duas. Agora ela só não sabia se ele fazia isso somente por interesse.

— Sófia? – Norma abriu a porta do apartamento.

— Onde ela está? – Os olhos de Sófia correram pela sala ao entrar com Nino, mas não encontrou mais ninguém ali.

— Está no quarto– Fechou a porta – Eu não sei mais o que fazer com essa cabeça dura – Parecia muito cansada.

— O que houve com ela?

— Não estava se alimentando – respirou fundo. Não aguentava mais ver a sua amiga naquele estado – Vocês precisam conversar.

— Eu sei! Por isso que vim até aqui. A ideia do meu pai foi muito boa –  olhou para Nino e percebeu que ele havia gostado de ir para a sua casa, pois pode ficar mais tempo com Nina – Será que ela conversaria comigo agora? – perguntou temerosa.

— Ela está dormindo já algum tempo. Acho que estava muito cansada. Ela não estava se cuidando, Sófia.

Neste momento, Sófia abaixou o seu campo de visão, pois sabia que a culpada por tudo isso ter acontecido era ela.

— Me dói saber que foi a causadora disso tudo.

— Sim, mas agora você precisa mudar tudo isso  — Norma foi até Sófia e pousou a sua mão no ombro da loira – Ela está com medo da rejeição da família.

— Eu não sei o que fazer quanto a isso – Seus olhos passaram a marejar.

Norma pareceu pensar por um tempo.

— É uma situação complicada. A Raquel nunca foi a preferida e sempre foi deixada mais de lado. Não sei se por conta de sua sexualidade. Contudo, ela sente a necessidade de ser aceita por eles. Ela está voltando para a construtora por causa disso. Só que se envolver com você quer dizer que isso vai ficar ainda mais longe de ser alcançado.

— Você acha que ela pode não querer mais ficar comigo? – pensar nessa possibilidade fez o seu coração doer.

— Eu não sei, Sófia, a Raquel é muito cabeça dura – Deu uma pausa e olhou para onde ficava a porta do quarto de Raquel— Vá vê—-a. Está dormindo, mas você pode matar a saudade um pouquinho.

Os olhos de Sófia passaram a brilhar – Muito obrigada, Norma!

— Não precisa agradecer!

Após esse momento, Sófia deixou Norma na sala com Nino e foi para o quarto de sua amada.

Enquanto dava passos quase que apressados, pois tinha que fazer pouco barulho e ao mesmo tempo não conseguia controlar a sua ansiedade, Sófia via um nervosismo tomando conta de seu ser.

Fazia alguns dias que não havia vistos a sua amada. Então, estava com muita saudade.

Abriu a porta do quarto de Raquel. Com a cena que viu, ela começou a se emocionar. Isso fez ela deixar algumas lágrimas escorrerem pelo seu rosto.

Raquel dormia tranquilamente. Parecia um anjo.

— O meu anjo – Disse baixinho ao se aproximar da cama e ajoelhar-se diante dela.

Sófia não estava conseguindo conter a emoção por estar tão perto da mulher que amava. Ainda mais, porque reparou que Raquel demonstrava estar muito frágil.

Os seus olhos pareciam um pouco fundos. Nisso se lembrou de que Raquel não estava se alimentando e talvez nem dormindo direito.

Tocou a face de Raquel com a ponta de seus dedos.

A engenheira não acordou com seu toque. Estava cansada demais, para despertar com uma simples caricia.

Como os cabelos estavam um pouco bagunçados, Sófia tentou arruma-los.

— Estou com tanta saudade de você. Anseio tanto pelo dia que você irá me escutar – Neste momento os seus olhos se direcionaram para os lábios de Raquel.

Eram rosados e tão convidativos.

Levada por um impulso, Sófia aproximou mais o seu rosto e deu um selinho um pouco demorado em Raquel.

Com aquele ato, sentiu algo se aquecer dentro de seu coração, pois de alguma forma amenizou a dor que sentia em seu coração.

Após se afastar, Sófia segurou uma das mãos de Raquel e ficou a observando dormir.

Seu coração naquele momento estava calmo. Sentia-se feliz ao lado daquela mulher.

— Sófia? – Norma chamou baixinho ao chegar a porta do quarto de sua amiga.

Ao ver aquela de Sófia ajoelhada diante de Raquel, ele percebeu que a loira realmente havia sido verdadeira com relação aos seus sentimentos.

— Oi! – Sófia se levantou.

— Você precisa ir agora – Falou isso com pesar, pois sabia que Sófia não queria se afastar de Raquel— Ela logo vai acordar e é melhor vocês não conversarem agora. Raquel está um pouco fraca. Desculpa!

— Não precisa se desculpar. Eu entendo – Respirou fundo. Era difícil ter que voltar para casa sem a certeza de que aquele momento iria se repetir.

— Quando ela estiver bem, procure uma forma de falar com ela sobre os seus sentimentos— Nino colocou a sua cabeça para dentro do quarto – Pode usar os cachorros como desculpa – Olhou para Nino e percebeu que ele gostou muito da ideia, pois começou a abanar o seu rabo.

— Antes de ir, eu posso me despedir dela?

— Claro! – Norma entendeu e puxou o cachorro para a sala.

Ao ficar sozinha novamente com Raquel, Sófia deu um beijo em sua testa.

— Lutarei por nosso amor! – Disse ao deixar o quarto.

 

 

Durante o caminho até sua casa, Sófia chorou muito. Doeu demais deixar Raquel com sem a certeza de quando voltariam a dividir o mesmo ambiente.

Quando chegou em casa, a primeira coisa que fez foi se jogar no colo de seu pai.

— Meu amor, o que aconteceu? – Geraldo começou a acariciar os cabelos de sua filha – Ela não te escutou?

— Não foi isso, pai! – As suas lágrimas já molhavam o colo de Geraldo.

— Então, o que houve?

— É muito difícil lidar com a possibilidade de não podermos ficar juntas.

— Filha, tenha calma— Disse de uma forma amável— Tudo vai se resolver, mas ao seu tempo.

— E se ela não me perdoar? – levantou a sua cabeça para encarar o seu pai.

— E se ela te perdoar? – ignorou a pergunta de sua filha.

Sófia sorriu ao pensar na possibilidade— Eu serei a mulher mais feliz desse mundo.

— Então, pense nisso, filha. Não pense no que pode dar errado. Agindo assim, você só vai sofrer – Acariciou a face de Sófia e sentiu uma de suas mãos sendo beijadas.

— Eu te amo, pai!

— Também te amo. O que mais desejo é que tudo dê certo. Estou me sentindo em dívida com você. Foi por conta do que me aconteceu que você ficou nessa situação.

— Pai – se sentou no sofá— Não pense dessa forma. Me envolvi com o Ricardo porque achei que seria bom para mim no momento.

— Falando nele, como está a situação de vocês?

Neste momento, Sófia respirou fundo. Desde que havia terminado com Ricardo que estava sendo insustentável a sua vida na empresa.

Ricardo sempre a procurava para fazer algo.

— Ele está tentando me controlar.

— Como assim?

— Desde que terminamos, eu estou tendo que ajuda-lo com tudo e ficar quase o tempo todo em sua sala – Sófia parecia muito cansada disso.

— Eu não achei que ele pudesse ter essa reação— Conhecia Ricardo há um bom tempo. Achava ele um homem muito bom e compreensivo.

— Nem eu!

***

No dia seguinte, às 6:30, Raquel acordou e se sentou na cama por um tempo. Passou a observar o ambiente a sua volta. Parecia que tinha algo diferente.  Um cheiro... Sófia.

Tocou os seus lábios levemente. Sentia um gosto conhecido em seus lábios. Será que havia enlouquecido?

— Será que tudo isso é saudade? – Ao se perguntar, notou o seu celular vibrando sobre a cômoda.

Pegou o aparelho um pouco receosa. Temia ser uma mensagem de Sófia, mas para a morena foi algo ainda pior.

Era uma mensagem de sua mãe a convidando para tomar café em casa com seu irmão Ricardo.

Respirou fundo. Não estrava preparada para encarar o seu irmão depois do que havia acontecido. O dia do almoço já havia sido demais para ela.

Pensou em recusar, mas era sua mãe que estava convidando. Isso queria dizer que a queria por perto.

Após se arrumar, Raquel chegou a sala. Encontrou Norma dormindo tranquilamente no sofá.

Nino, até então, não havia dado sinais de vida. A passos cautelosos, ela tentou andar em direção a cozinha, mas algo a impediu. Nino surgiu do nada pulando em seu corpo, fazendo ela se esbarrar em uns objetos.

— Nino! – olhou para o sofá temendo ter acordado Norma, mas a ruiva já estava sentada olhando ao seu redor tentando de alguma forma entender o que havia acontecido.

— Para onde você vai hoje? – Norma estranhou a sua amiga estar toda arrumada.

— Vou a casa de meus pais.

— Fazer o quê lá? – Pensava que sua amiga esperaria mais um tempo para voltar a se aproximar de sua família novamente.

— Preciso voltar a seguir com minha vida – Deu uma pausa para olhar para Nino que estava com cara de pidão – Depois vou para a construtora.

Norma ficou em silêncio por um tempo. Será o que havia acontecido com sua amiga durante a noite?

— Tome suas vitaminas direito – Raquel pensava que Norma iria brigar para não ir.

— Pensava que você teria uma outra reação.

— E adianta dizer alguma coisa? Você é muito cabeça dura – Se levantou do sofá e começou a se alongar – Preciso ir para casa. Hoje, eu terei uma audiência.

— Toma um café comigo antes – Raquel sugeriu.

— Pensava que iria comer na casa de seus pais.

— Ahhh... – Pareceu ficar sem jeito – Eu acho que não vou conseguir comer nada lá. O Ricardo vai estar.

— Eu disse que não vou dizer nada e eu não vou dizer – Disse mais para si do que para Raquel.

— Você sabe que quero ser aceita – lembrou-se de tudo que andava evitando para conseguir atingir o seu objetivo.

— hurum – Norma antes achava aquela vontade algo natural, no entanto, estava percebendo que isso só iria fazer mal a sua amiga, pois iria a impedir de ser feliz.

Fim do capítulo