Capítulo 15
Capítulo 15
- É gente, preconceito sempre tem algo a ver com o que a pessoa tinha vontade de ser ou fazer e não tem coragem. - Disse Jéssica. - Eu fiquei muito feliz quando a Vi se assumiu, ela se tornou uma pessoa mais feliz e amiga. Lembro ainda de quando nós éramos adolescentes, ela era um pouco agressiva e fechada. Não gostava de falar de namoros, era toda preconceituosa com um casal gay que morava no nosso prédio. Eu sentia que ela sofria por não poder contar pra mim e nossa mãe o que ela realmente desejava, acho que ela tinha medo de se assumir por causa do nosso pai, que era muito preconceituoso. Mas no fundo, todos de casa sabíamos.
Virgínia que sempre fazia brincadeiras, dessa vez ficou calada e com olhar triste, mas isso não passou despercebido para Leandro, que como seu amigo de mais de dez anos, teve que aproveitar a oportunidade, que era rara, para tirar um sarro da amiga.
- Ih gente, olha só a Vi! Agora não tem gracinha nenhuma para falar, né? Ficou muda amiga? Quando é com você a coisa é mais embaixo né? - Ele disse todo feliz pela oportunidade.
- Não Leandro, seu mala! Mas é que a Jéssica está certa. Eu tinha medo de me assumir. Quem aqui não teve medo de se assumir? Aliás, vamos a mais essa pergunta agora. Como foi que vocês se assumiram? - Disse Virgínia.
- Eu me assumi aos vinte e dois anos, e após um mês minha irmã descobriu que estava grávida. Ela nem me deixava tocar na barriga dela durante a gestação. Depois de quatro meses, minha mãe morreu, eles diziam que era por desgosto que eu causei, mas ela tinha câncer. Minha irmã e meu outro irmão venderam a casa e não queriam dar a minha parte. Tive que brigar durante dois anos na justiça pra conseguir a minha parte dos bens dos meus pais. E mesmo assim nem consegui o valor certo, porque eles torraram quase tudo. Nós nunca mais tivemos contato, nem por telefone. Nunca vi meu sobrinho. Só sei que ela teve mais um filho. Meu irmão também sai com homens, só que escondido, porque tem medo de ser discriminado. Só sei disso porque minha prima me conta. A única que me aceita e com quem tenho contato na família. - Disse Bianca, um pouco triste.
- Oh amor! Agora você tem uma nova família que te ama muito. Todos nós somos sua nova família! - Disse Simone acariciando o rosto da namorada.
- Bia, você já faz parte da nossa família. - Disse Marta.
- Isso mesmo, você pode ser meu irmão! - Disse Virgínia. E depois se escondeu atrás de Marta para não receber a almofada que Bianca arremessou contra ela.
- Bom, eu sou filha única e minha mãe foi mãe solteira, então quando eu era adolescente eu comecei a namorar com caras, porque achava que desejar meninas era errado, mas depois de um tempo vi que era infeliz e resolvi começar a sair com mulheres, só que não sabia onde encontrá-las. Então um primo meu se assumiu homossexual, aproveitei e pedi pra ele me apresentar algumas amigas. Ele ficou com medo, achando que minha mãe brigaria com ele, mas eu já tinha dezenove anos e ele acabou aceitando. Então comecei a sair com mulheres e depois de seis meses falei para a minha mãe que aceitou bem todas as namoradas que tive esses anos e hoje, trata a Jake melhor que eu até! - Gláucia fez carinha de enciumada.
- Ah amor, tem ciúmes de mim com a sua mãe? Eu adoro a minha sogra, mas eu divido ela com você! - Brincou Jaqueline.
- Como assim divide? Ela é minha primeiro, pow! - Gláucia fez mais cara de bravinha ainda.
- Ah para de ser bocó, viadinho! Você deveria adorar o fato da sua mãe tratar sua mulher bem assim! Eu me assumi um ano depois que meu pai morreu. Tive algumas namoradas, mas minha mãe só conheceu a Marta, afinal ela é a minha esposa. A minha mãe trata a Marta bem, mas age como se nós fossemos só amigas. Nem vai em casa, quando quero vê-la, tenho que ir no apartamento dela. E quando estamos com ela, não posso ficar abraçada e nem beijar a Marta. - Falou Virgínia.
- Amor, não pode me beijar e me abraçar, por que você a respeita, mesmo ela não respeitando o que sentimos, mas sinceramente, não tenho nada contra a minha sogra. Ela é educada comigo, mas não é minha amiga. Adoro mesmo a minha cunhadinha! - Marta mandou um beijo para Jéssica que retribuiu com outro.
- Ei, para de ser puxa saco da minha irmã! - Falou Virgínia com cara de ciúmes.
- Ei Vi, para de brigar com a minha cunhadinha preferida. A adoro também! - Jéssica disse rindo e mandando mais beijos para Marta. - E você anda na linha viu? Porque eu te puxo as orelhas se fizer algo para a minha cunhada.
- É isso aí cunhadinha linda! - Marta disse e riu.
- Fudeu! Agora tenho mais uma me vigiando! - Virgínia bateu na própria perna em sinal de indignação e balançou a cabeça negativamente.
E todos riram da cara de triste que ela fez.
- Bom, eu ainda não me assumi. Eu comecei a namorar a Bia há sete meses, mas meus pais são religiosos e sei que vai ser tenso o dia que eu me revelar, mas tenho convicção que é isso que eu quero para mim! Eu prefiro sair de casa primeiro pra depois me assumir. Não quero chantagens emocionais ou financeiras. - Simone falou e recebeu um abraço apertado da namorada.
- Eu quando me assumi fui expulso de casa. A Vi foi a minha salvadora porque fiquei sem lugar para ir. Meus "amigos" - Leandro falou a palavra amigos e fez um gesto de aspas, com os dedos no ar. - Que de amigos não tinham nada, só estavam ao meu lado quando eu tinha o carro do meu pai e dinheiro para ir nas baladas e ferver com eles, nenhum deles me ajudou; e meus parentes, mesmo aqueles que tinham quartos vazios em suas casas, nem olhavam na minha cara, me trataram como um cachorro de rua sarnento. - Os olhos de Leandro começaram a ficar marejados e a voz embargada. - Eu fiquei três dias dormindo na rua, meu pai me expulsou só com a roupa do corpo. Bati na casa de uma tia e um amigo e eles nem me deixaram entrar. Se não fosse a Vi ter aberto as portas de seu apartamento para mim e me acolhido, nem sei o que seria de mim. Eu tranquei a faculdade, fiquei dois meses à custa dela, até conseguir um trabalho e mais nove meses morando com ela até ter dinheiro suficiente para poder alugar um lugarzinho para mim. E ela nem queria me deixar sair. Eu só fui mesmo, porque senti que precisava dar esse passo para crescer, como um adulto de verdade! - Leandro deixou uma lágrima descer e escondeu o rosto no ombro do namorado que enxugou sua lágrima e beijou sua cabeça.
- Não fica assim gatinho! Nós te amamos e você nunca mais vai ficar sozinho! - Rômulo continuou acariciando o rosto de Leandro e o abraçando.
- Ei Lê, sempre que precisar, estamos aí! Mas olha, sinto falta das nossas faxinas juntos, viu! Quando comprávamos salames e cervejas, ligávamos o som e ficávamos cantando, dançando e limpando a casa. Acabávamos a faxina tarde pra caralh* e bêbados, mas felizes! - Virgínia ria ao se recordar.
E todos riram imaginando os dois amigos felizes. Foi o suficiente para descontrair o momento e Leandro voltar a sorrir. Afinal, família são aquelas pessoas que nos amam, não só aqueles que a vida nos obrigou a conviver.
- Eu só me assumi depois que terminei a faculdade. Sabia que se falasse para eles, teria o mesmo tratamento que o Lê teve. Terminei a faculdade, consegui um trabalho, guardei dinheiro por um ano e meio e quando tive o suficiente, caí fora. Aí, depois de seis meses, em uma reunião de família em um domingo, contei para meus pais e irmãos. Minha mãe e um dos meus irmãos são os únicos que falam comigo. Meu pai e os outros se afastaram completamente. Quando vou na casa dos meus pais, para reuniões de família, fica um clima super chato, por que hoje meus irmãos nem me dirigem a palavra e param de falar quando estou perto. Mas sinto falta deles, de como éramos antigamente! - Rômulo disse e suspirou triste.
- De boa, eu acho uma merd* isso! Não matamos, não roubamos, não abusamos de crianças, não somos fraudadores, nem nada dessas coisas. E só por que somos homossexuais, eles acham que somos anormais, mundanos, e se sentem melhores que nós. Sinceramente eu prefiro não ter essas pessoas por perto do que ter que implorar o respeito e o carinho deles. - Jaqueline falou indignada. - Eu praticamente sustentava minha mãe e minha avó sozinha. Era a única que trabalhava e ajudava, meus irmãos mais velhos eram casados e nem se importavam se tínhamos comida ou não em casa. Então, no dia que resolvi me assumir, minha mãe não teve muita opção a não ser aceitar. Afinal, dependia de mim. Mas sempre que pode, ela me dizia que a vida das minhas irmãs são as certas. Mesmo elas tendo maridos bêbados, que batem nelas, um monte de filhos e sem condições nenhuma de criar eles bem, além de viverem vidas de privações e sofrimento. Sou muito feliz com a minha mulher, nós duas trabalhamos, conquistamos juntas nossos sonhos de consumo, temos nossos diplomas de nível superior e logo, logo, teremos um bebê! - Jaqueline disse e riu ao ver a cara de espanto de Gláucia.
- Vamos?! - Gláucia disse espantada.
- Vamos sim! E a Jéssica que vai nos ajudar com a inseminação artificial! - Jaqueline sorriu e piscou para Jéssica e recebeu o abraço e muitos beijinhos de felicidade de Gláucia.
- Ah! Nesse caso a Carol que vai te ajudar, ela que é a especialista em reprodução humana e fertilização aqui! - Jéssica esclareceu.
- Então Carol, vamos marcar uma consulta e você me explica tudinho!
- Claro Jake, pode marcar, vou adorar ajudar vocês! - Carol disse feliz.
- Bom gente, eu só descobri que gostava de mulher, depois que essa safadinha aqui começou a dar em cima de mim. Meu pai tinha um restaurante na mesma rua que ela morava, eu estava terminando a faculdade e ajudava ele no restaurante e ela picava cartão todo dia lá, sempre linda e atenciosa. Eu era noiva na época, namorava há quatro anos. Fiquei super em dúvida, a Vi teve uma paciência enorme, foram quase nove meses tentando e eu nada. Até que um dia não resisti aos seus encantos e acabamos nos beijando. Eu ainda fiquei mais dois meses tentando entender esse sentimento, até que criei coragem e terminei o noivado, faltando cinco meses para o casamento. Meu ex noivo, era sócio do meu pai e trabalhávamos todos juntos e ficou um clima horrível. Aí, comecei a namorar a Vi escondido. Depois de seis meses terminei a faculdade e resolvi sair de casa e fomos morar juntas. Quando minha mãe foi na minha casa nova e viu só uma cama de casal e ela sabia que eu "dividia" - Marta fez sinal no ar - o apartamento com a Virgínia, ela percebeu na hora o que acontecia entre nós, porque já desconfiava pelo jeito da Vi e armou um barraco. Meu pai ameaçou a Virgínia e meu ex noivo se juntou a ele, mas não desistimos. O primeiro ano foi terrível, com várias brigas, chegamos a romper por duas vezes; eu saí de casa e ficamos quase quinze dias longe, cada uma na sua, mas depois nos acertamos novamente. Mudamos para longe dos meus pais e consegui um trabalho na minha área e me afastei do restaurante. Aos poucos, meu ex noivo percebeu que não teria chances e parou de nos perseguir e ameaçar. Meu pai hoje é indiferente comigo e minha mãe me trata um pouco seca. Os únicos que são super atenciosos conosco são meus irmãos e minhas cunhadas. - Marta disse e abraçou a Virgínia.
- É, foi complicado conquistar essa mulher linda aqui, eu ralei, viu gente! - Virgínia disse rindo e abraçando a esposa.
Todos riram.
- Bom, acho que só falta eu e a Gio, né? Eu sou órfã, portanto não tenho ninguém a quem precise dar satisfações. Mas na verdade comecei a gostar de mulher apenas depois que vi a Gio. Eu a via na praia há vários meses, mas nunca tive coragem de falar com ela. Eu nunca tinha saído com mulheres e tinha me divorciado a pouco mais de um ano. Aí, a Virgínia e a Marta foram as pessoas que me ajudaram a compreender esse sentimento. Depois de oito meses a Gio passou mal e eu tentei socorrê-la, foi então que finalmente a gente começou a conversar e hoje estamos aqui. Faz só três dias que estamos saindo e namorando, mas eu adoro muito essa mulher. E tenho certeza que não quero outra pessoa na minha vida! - Carol disse e olhou com carinho para o rosto de Giovanna, que a beijou levemente e acariciou seu rosto.
- Só três dias Carol? - Gláucia falou espantada.
- Só três dias. Mas foram os meus melhores três dias, até hoje! - Carol riu.
- E você Giovanna? - Perguntou Bianca.
- Bom, eu também sou órfã e fui criada por um amigo do meu pai. Um senhor muito sábio e ele sempre soube que eu não era como as outras meninas. Nunca precisei falar nada para ninguém, por que nós não conversávamos coisas pessoais e ele era muito discreto e nunca me disse se era a favor ou contra. Ele era uma pessoa querida, me ensinou e me apoiou, mas não tínhamos laços afetivos fortes. Depois ele morreu e então nunca soube sua opinião! - Giovanna disse séria.
- Puxa que triste amor, não sabia que você também era órfã! - Carol deu um beijo no rosto de Giovanna.
- Sou sim, meus pais morreram em um acidente, quando eu tinha catorze anos! - Giovanna retribuiu o beijo da namorada.
Fim do capítulo
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Andreia
Em: 16/09/2024
Porque acho que Gio tá mentindo sobr os pais e os temas que os amigos estão discutindo é pura realidade de muitos gays que decide se assumir p uma sociedade machista e se acha superior e acha direito de julga mais são mais sujo que td. Estou amando a linda história abraços.
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