Capítulo 20 - Lemniscata
Passava das onze horas de uma noite com temperatura agradável num território quase vazio entre Colômbia e Equador. Numa casa abandonada com grandes janelas quebradas imperava agora o silêncio. E poeira ainda em suspensão no ar, mas isso Theo não podia ver.
– O que foi isso?? Sam? – Theo levantou-se rapidamente, e seguiu aos tropeços até a origem do estrondo que escutara segundos atrás.
Percebeu pedaços de madeira e gesso num aglomerado, andava ao redor, bradando pelo nome de sua amiga, sem resposta.
– Sam, se você estiver me pregando uma peça, saiba que não tem a menor graça, ok?
– Eu estou bem. – Sam murmurou, começou-se a ouvir barulho de entulho sendo remexido.
– Onde você está? – Theo seguiu a voz e tropeçou numa viga, caindo de joelhos. – Merda.
– O que foi?
– Sam, o que aconteceu? Caiu algo em você? Foi o teto?
– Você tropeçou?
– Porr*, cadê você??
Theo sentiu uma mão segurando firmemente seu braço, auxiliando a levantar do chão.
– Aqui.
– Alguma coisa despencou em você? Parecia que o teto estava caindo!
– Caiu.
– E você fala com essa calma?
– Estou bem, dei sorte, foi só um susto. E um corte.
– Onde?
– No braço. – Sam tirava a poeira de seus ombros e camisa, depois deu uma boa olhada no ferimento no braço direito, uma grande laceração em diagonal.
– Foi sério?
– Não.
– Deixe eu ver. – Theo tomou seu braço e deslizou delicadamente os dedos pelo corte.
– É grande, precisa de pontos.
– Não consigo dar pontos com a mão esquerda, vai ter que fechar sozinho.
– Eu darei os pontos.
– E eu sou a rainha da Inglaterra.
– Estou falando sério, vamos pegar a caixa médica no carro, arranje algum recipiente para colocarmos água limpa. – Theo já saia andando na direção do carro, foi impedida por Sam.
– Vá dormir, Theo.
– Venha comigo até o carro. – Theo a puxou pela camisa.
– Não, vá se deitar, eu vou limpar e também vou para a cama, não foi nada.
– Nada? O teto desabou em você! Estou ainda sentindo meu coração batendo na garganta.
– Foi vacilo meu.
– Vacilo?
– Eu chutei a viga.
Silêncio.
– Você chutou a viga?
– Chutei.
Silêncio.
– Sam, você está tentando suicídio? Se for, me avise, não quero morrer também.
– Ok, venha comigo até o carro, me ajude a limpar isso. – Sam colocou a mão às suas costas, a levando até o carro.
Sam preparou um recipiente com água e pôs ao lado da caixa médica, já aberta sobre a parte de trás do carro. Ligou o refletor e sentou-se na traseira da caminhonete. Orientou Theo para sentar-se ao seu lado e lavou as mãos, passou uma gaze molhada pelo corte, que não mais sangrava.
Theo observou o barulho da água e lavou suas mãos também, ficou de pé, de frente para Sam.
– Prepare a agulha e a linha.
– Não, não consigo me costurar com a mão esquerda. Se eu tivesse uma daquelas máquinas… Mas nesse continente decadente ainda não usam as máquinas de sutura, isso é um absurdo… – Sam reclamava.
– Eu vou suturar, eu já fiz isso, fique tranquila.
– Não duvido de suas palavras, mas é meu dever te alertar de um detalhe: você não enxerga.
– Você vai me orientar, e tenho tato.
– Não vou deixar uma cega me costurar, esqueça. – Sam preparava um curativo para seu braço, ainda sentada no fundo do carro.
– Você me ouviu? Eu já fiz isso, deixe de teimosia.
– Não.
– Vou te chamar de Samantha de novo.
– Você já fez isso? Já deu pontos?
– Já, juro. – Theo movia-se impacientemente à sua frente.
Sam a mediu por alguns segundos, procurou o necessário para a sutura na caixa, preparou a agulha e colocou em cima da tampa.
– Lavou bem as mãos? – Sam perguntou.
– Sim. Limpou bem o ferimento?
– Sim. Tome a agulha, já está com a linha. Dê apenas um ou dois pontos, para que a pele se aproxime. Lembre-se que odeio agulhas, não perfure profundamente, você vai apenas traspassar alguns milímetros da pele de forma curvada e…
– E eu vou costurar sua boca. Estique o braço, coloque a caixa no seu colo e o braço por cima.
Sam prontamente a obedeceu, Theo aproximou-se, passava devagar seus dedos por cima do ferimento, compenetrada, os olhos fixos no chão.
– Cinco pontos.
– Não, de jeito nenhum.
– Cinco pontos, é um corte extenso e vou começar daqui. Está com sangue novamente, limpe com uma gaze seca.
Após Sam limpar, Theo iniciou o primeiro ponto, com delicadeza. Com uma mão “enxergava” e com a outra movia a agulha.
– Você parece já ter feito isso.
– Eu disse. – Theo respondeu sem mudar seu semblante sério.
– Já suturou então.
– Já. Mas você é a primeira coisa viva que suturo.
Sam arregalou os olhos.
– Sério?
Theo apenas deu um sorrisinho. Iniciava agora o segundo ponto, de volta à sua compenetração dedicada.
– Você está fazendo um bom trabalho. – Sam olhava agora de perto.
Theo permaneceu em silêncio.
– Você tem mãos ágeis. – Sam voltou a falar.
– Eu sei, todos dizem isso.
– Eu vou me casar em agosto.
Theo parou a agulha no ar, congelando o movimento que fazia. Por fim sorriu.
– O mês do seu aniversário.
Sam também sorriu, timidamente.
– Sim.
– Mike te deu a notícia agora?
– É, me ligou dizendo que está marcando a data com Padre Clive, nossa casa está quase pronta, deve ser entregue mês que vem.
– Que ótima notícia! Será que tenho chances de pegar o buquê? – Theo voltou a costurar o braço de Sam.
– Ai!
– Desculpe, não tateei o suficiente. Corte aqui. – Theo ergueu a agulha. – Vamos para o quarto.
– O que?
– O quarto ponto.
– Ah.
Sam ora observava seu braço, ora relanceava os olhos para Theo, seguiram em silêncio por algum tempo, Theo iniciava o último ponto.
– Então… – Theo voltava ao assunto. – Ficou tão feliz com a notícia que não se conteve e saiu chutando as pilastras?
– Não. – Sam a fitou. – Eu estava me preparando para ir conversar com você, para dizer que não deveríamos mais ter nenhum contato físico.
Theo balançou a cabeça, assimilando.
– Compreendo. – Theo respondeu, com a voz moderada.
– Eu vou casar em alguns meses, meu noivo está se mobilizando para que tenhamos o futuro que sonhamos juntos, e eu? Estou cometendo um sem número de pecados pelas costas dele, não está certo, não posso continuar o traindo, mesmo que isso tenha data para terminar, não achei certo que tenhamos mais contato.
– Tudo bem. Corte. – Ergueu a agulha. – Vai arranjar um cão guia para mim? Ou tudo bem continuar me conduzindo? Acho que se você apenas me conduzir, parando com esse afago que você faz com o polegar na minha mão, não conta como contato íntimo.
– Você percebeu? – Sam disse, franzindo a testa.
– Sempre percebo. Me passe o curativo.
Sam ergueu o braço, olhando de perto os pontos.
– Bom trabalho, recruta. Eu consigo colocar o curativo, vá lavar as mãos, a toalha está do lado direito.
Enquanto Sam lavava suas mãos e o rosto, Theo guardava todos os itens na caixa médica, caminhou tateando a lateral do carro e guardou atrás do banco.
– Mas eu mudei de ideia. – Sam voltou a falar, enxugando o pescoço lentamente.
– Mudou de ideia? Ou mudou a mudança de ideia?
– É… – Sam analisou a frase. – Mudei a mudança de ideia.
– Então me explique, porque estou completamente perdida nessas suas mudanças de ideia, parei de entender lá pela décima vez.
Sam largou a toalha na caminhonete e pegou a mão direita de Theo, a trazendo para próximo.
– Quero manter o acordo.
Theo moveu a cabeça com um semblante de desaprovação.
– Ah vá…
– Não, eu não estou ligando ou desligando você ao meu bel prazer. – Sam justificou. – Eu não desliguei, eu fui honesta, disse que estava pensando em falar com você, mas não falei.
– Porque o teto caiu na sua cabeça. Conveniente.
– Que seja, mas eu não te desliguei, eu poderia ter omitido tudo isso.
Theo acabou abrindo um pequeno sorriso.
– Um dia entenderei porque é tão difícil dizer não para você…
Sam tomou a outra mão dela, e colocou ambas para trás de suas costas, as soltou e envolveu seu pescoço.
– E então? – Sam perguntou.
– Ok, acordo mantido. Sem julgamentos, sem culpa, sem pretensões, mas se vacilar não tem volta. – Theo a abraçou pela cintura.
– Só mais um pouquinho. – Sam falou baixo, com uma voz carinhosa.
Sam sorriu e beijou seu pescoço.
– Você tem dedos leves… – Sam murmurou perto de seu ouvido.
– Eu sei.
– Obrigada, você salvou meu braço.
Sam a beijou, deu alguns beijos soltos.
– Disponha. – Theo sussurrou, e voltou a beijá-la.
***
Três dias depois, tiveram o que talvez fora um dos dias mais longos na estrada, Sam dirigiu por quase doze horas, apenas com uma rápida parada num posto. Andavam por rodovias mal conservadas e quase desertas, lugares que pareciam esquecidos no tempo e pelos governantes, assim como grande parte dos países já atravessados.
– No Brasil é diferente, você vai logo perceber. – Theo comentava enquanto Sam dirigia em baixa velocidade pelo centro de uma pequena cidade, procurando algum lugar para comer e dormir.
– Diferente como? É mais populoso?
– Muito mais populoso, não se parece com estes lugares que ficaram no século passado.
– O governo da Nova Capital centralizou-se no Brasil e esqueceu o resto da América Latina, não foi?
– É uma boa definição.
Sam parou o carro numa rua comercial, cheia de vitrines e com algumas placas digitais. As lojas ainda estavam abertas e haviam alguns locais transitando por ali.
– Deve ter algum lugar para comer nesta rua, vamos. – Sam disse já saindo do carro.
– O Brasil é um bom país, tem um povo legal, só está sendo mal aproveitado. – Theo explicava. – E a boa tecnologia é quase toda utilizada e controlada pelo governo, um desperdício de esforços.
– Deve ter mais vigilância e policiamento também.
– Muito mais, há pequenos drones, do tamanho de um pássaro, monitorando silenciosamente as pessoas e conversas. Até mesmo dentro do seu apartamento no centésimo andar você pode estar sendo observado e ouvido pelo governo, os drones não tem limites.
Encontraram uma lanchonete engordurada no final da rua, distante do carro. Resolveram jantar por ali mesmo, era quase nove da noite. Após o lanche igualmente engordurado, saíram caminhando pela calçada, voltavam sem pressa para o carro, lado a lado.
– Espera. – Sam freou seu passo, a puxando pela mão.
– O que foi?
Sam olhava para dentro de uma vitrine cheia de caveiras e rosas decorando o vidro, e o nome “Banha Tattoo”.
– Acho que hoje é um bom dia para se tatuar.
Theo abriu um sorriso.
– Você está falando sério?
– Coisa pequena.
– Tem certeza?
– Vamos entrar antes que eu mude de ideia. – Sam a conduziu para o interior da loja, onde um grande homem gorducho, com tatuagens cobrindo os braços e pescoço, e de aproximadamente quarenta anos, as atendeu.
– Uou, me amarrei nas suas tatuagens, gata! Qual vai ser hoje? – Ele olhava sorridente de perto as tatuagens nos braços de Theo, que usava uma camiseta branca de mangas curtas.
– Para mim nada, vamos iniciar nossa amiga aqui no mundo da tatuagem. Você é o Banha?
– Em carne e tecido adiposo. Então mocinha. – Ele foi até Sam, que usava uma camiseta regata verde musgo. – Uma caveira mexicana ficaria perfeita no seu braço.
– Não, não, algo discreto. – Sam respondeu, um pouco assustada.
– Tem algo em mente? Quer uma removível?
– Uma frase nas costelas. Definitiva. – Falou de bate pronto.
– Hum, garota decidida. – Theo deu um tapinha em seu ombro.
Os três seguiram para dentro do estúdio, onde haviam duas macas articuladas e uma garota com uma dúzia de piercings no rosto e orelhas, sentada com as pernas para cima assistindo a tela suspensa.
Sam anotou a frase num papel e deitou-se na maca, puxou a camisa para cima e ergueu o braço. Assim que o barulho da máquina foi ouvido, Theo animou-se.
– Mudei de ideia, quero fazer uma também.
– Agora? – Sam perguntou, a fitando surpresa.
– Agora. Moça, você tatua?
A garota dos piercings respondeu de forma afirmativa e foi logo preparando-se para tatuar Theo na outra maca.
– O que você vai fazer?
– Vou desenhar alguma coisa.
– Você tá falando sério? Você vai desenhar sem enxergar? Me diga o que é, posso desenhar para você.
– Não precisa, não é nada elaborado. – Theo disse, já desenhando. – Entendeu o que é? – Perguntou à moça.
– Ahan, vai ser onde?
– Pulso esquerdo.
Theo estava sentada na maca, com o braço esquerdo estendido, a garota iniciava a tatuagem em seu pulso.
– Qual é a frase? – Theo perguntou.
– Alegrai-vos na esperança, sede pacientes na tribulação, perseverai na oração. Romanos 12:12.
– Um trecho da bíblia. Escolha interessante.
– Ouvi na missa dia desses. E o seu desenho? Não consigo enxergar daqui. – Sam tentou erguer a cabeça, sendo repreendida por Banha.
– Gata, melhor não se mexer, senão você terá um versículo do Apocalipse nas costelas.
Theo riu, gargalhando.
– Isso não foi engraçado. – Sam disse.
Theo continuava rindo alto.
– Tá, só um pouquinho. – Sam acabou rindo também.
A tatuagem de Theo logo foi finalizada, seu pulso recebeu uma fina cama de pomada protetora, formando uma película instantaneamente. Aguardava a finalização de Sam de pé, recostada na maca, de braços cruzados.
– Prontinho. – Banha disse. – Pode se olhar no espelho.
Sam virava-se de um lado para outro, olhando atentamente sua primeira tatuagem, ainda com vermelhidão ao redor.
– Ficou muito melhor do que eu imaginei, adorei sua letra! – Sam dizia com animação.
– Depois eu vejo com os dedos. – Theo falou.
– É só a primeira, sei que outras virão. – Banha comentou.
– Ok, agora me deixe ver a sua. – Sam foi até Theo, ficando a sua frente.
Theo hesitou, por fim estendeu seu braço, mostrando o pulso.
– O símbolo do infinito. – Um sorriso largo iluminou-se no rosto de Sam.
Theo apenas balançou a cabeça confirmando, com um sorrisinho contido.
– Não, espera. Uma lemniscata, acertei a palavra? – Sam perguntou.
– Acertou.
– Eu adorei. – Sam tomou seu pulso, olhando a tatuagem de perto.
– Que bom. – Theo sussurrou, procurou seu rosto com os dedos e lhe roubou um beijo rápido. Sam ficou sem jeito, com um sorriso torto, mas sentiu algo agradável e suave subindo dentro do seu peito.
***
– Dormiremos aqui. – Sam disse, abrindo a porta do carro.
– Aqui onde? No carro?
– Não, na calçada. Pegue suas coisas. – Sam seguiu para o outro lado, e tirava o necessário para a pernoite.
– Na calçada? Algum beco? – Theo perguntou com insegurança, com as mãos no alto da porta do carro.
– Não, na calçada mesmo, hoje está uma noite agradável, você não sentirá frio. E ainda por cima teremos companhia, tem dois sem teto já adormecidos atrás de você.
Theo continuava estática, com as mãos no carro.
– Vai ficar aí me olhando? – Sam reclamou, com uma bolsa em cada mão. – Pegue sua bolsa.
– Mas… – Theo obedeceu, arqueou-se por cima do banco e pegou sua bolsa marrom.
Sam aproximou-se, encostou seu braço nela.
– Vamos, segure no meu braço, vamos atravessar a rua.
– Mas… Sam, não é perigoso dormir ao relento? Vamos procurar algo abandonado. – Theo seguia preocupada.
Subiram dois lances de escadas, passaram por uma pequena porta de vidro. No interior de uma pequena recepção a atendente cochilava com a cabeça para trás.
– Um quarto, por gentileza. – Sam disse, soltando as bolsas no chão.
– Quarto com banheiro e duas camas, trinta pratas, pagamento antecipado.
Sam colocou as notas sobre a mesa, recebendo o cartão de acesso ao quarto, no final de um corredor externo.
Ao entrarem no quarto, Theo soltou o braço de Sam e atirou sua bolsa nela.
– Hey! Minha tatuagem, cuidado. – Sam disse em direção ao banheiro, rindo.
O quarto era minúsculo, antigo, duas camas escuras e uma pequena mesa quadrada o preenchiam quase por completo. A roupa de cama era floral, semelhante às cortinas também coloridas.
– Calçada… Sei. – Theo balançava a cabeça.
– Está tão vermelho.
– Onde você está?
– No banheiro. – Sam olhava sua tatuagem no espelho, com a camisa erguida.
– Onde fica o banheiro?
– À sua esquerda, siga minha voz.
– Ai! Porcaria de mesa!
– O que foi?
– Uma mesa me atropelou.
– Desculpe, esqueci de avisar. Perfurou algum órgão interno?
– Não.
– Então você vai sobreviver.
Theo tateava curvada pela parede, até chegar à porta do banheiro, com uma mão esfregando o quadril.
– E além de vermelho está inchado? – Theo perguntou.
– Um pouco inchado, já não era para ter voltado à cor normal? – Sam indagou, ainda se olhando no espelho.
– Não, fica vermelho pelo menos até amanhã. A minha também deve estar vermelha.
Sam virou-se, tomou sua mão e olhou a tatuagem em seu braço.
– Nossa senhora misericordiosa. – Sam olhava de perto.
– O que foi?
– Está bem vermelha, muito mais que a minha.
– É normal.
– É?
– É sim.
– Quer ver a minha? – Sam oferecia.
– Sim. – Theo ergueu a mão, sendo conduzida até suas costelas.
Theo deslizava levemente seus dedos pela região, sentindo a pele em alto relevo. Percebeu Sam contraindo-se com um dos seus movimentos.
– Se arrepiou? – Theo perguntou, rindo.
– Fala sério, Theo. Você deve ser uma alienígena. – Sam baixou sua camisa.
– Por que?
– Basta você colocar sua mão em mim por cinco segundos e eu tenho uma vontade incontrolável de voar para cima de você, isso não é normal.
– É normal sim, é uma reação espontânea do nosso corpo. Uns reagem mais, outros menos.
Sam ergueu a camiseta de Theo, a assustando e fazendo com que desse um passo para trás.
– Também se sente dessa forma, quando faço isso? – Sam pousou a mão na região das costelas dela.
– Não sei, tente mais um pouco, mais para cima, e para o lado.
Sam riu e a puxou pela cintura.
– Você me transformou numa devassa. – Sam murmurou.
– Agradeça depois. – Theo a beijou, e o beijo tomou ares incendiários.
– Esse acordo é a melhor coisa que poderíamos ter feito. – Sam disse interrompendo o beijo minutos depois.
– Shhhh. – Theo a empurrou, a derrubando na cama.
Depois de algum tempo de ação, Theo percebeu que Sam a pedia.
– Quero que você conheça outras cláusulas. – Sussurrou em seu ouvido, estava por cima dela.
– Que? – Sam respondeu, confusa, já sem camisa.
– Eu vou descer… – Theo disse após um beijo.
– Onde você vai? Fique aqui.
– Eu estarei aqui. – Theo descia os beijos pelo pescoço.
– Theo?
– Já volto, aproveite a viagem.
Lentamente e prestando atenção às respostas do corpo dela, Theo descia correndo seus lábios, beijando seu abdome, ventre. Abriu seu jeans, o tirando sem pressa, Sam assistia ainda sem entender as pretensões dela.
Subiu beijando sua perna artificial, subia sorrateiramente sua mão pela parte interna de suas coxas, suas mãos chegaram ao destino primeiro, dando lugar posteriormente aos seus lábios e língua.
Sam segurava firmemente nas grades da cabeceira da cama, que imitava madeira antiga. Precisou de apenas alguns míseros minutos tendo a visão daqueles ombros coloridos para fechar os olhos com força, o gemido interrompido que Theo já conhecia, quase arrancando as hastes que segurava.
Finalmente abriu os olhos, tentando acreditar que seu corpo ainda estava lá. E estava: sem lençóis, sem roupas, sem constrangimento.
Ao olhar para o lado enxergou a razão daquilo tudo, deitada com um sorrisinho arteiro, satisfeito, ainda trajava sua calça. Sam deitou-se com a cabeça em seu abdome, recebendo prontamente afago de Theo.
– Isso é ainda melhor. – Sam disse, extasiada, a fitando.
Theo riu.
– Eu acho mais intenso, mas depende do momento. E fico feliz que você tenha aprovado essa cláusula.
– É, eu curti a viagem, como você mandou.
Sam subiu e a beijou, voltando para seu colo. Por alguns minutos confortáveis, permaneceram em silêncio.
– Sam, posso te fazer uma pergunta pessoal? – Theo interrompeu o silêncio, continuava correndo sua mão pelas costas nuas de Sam.
– Pode. – Respondeu sem segurança.
– Você já havia tido um orgasmo antes?
Sam ruborizou, mas respondeu sem hesitar.
– Claro.
– Eu digo, antes de mim?
– Sim, tive.
– Que bom.
– Acho que algumas vezes.
– Acha? – Theo sorriu ao ouvir a resposta.
– Acho que sim.
– Não tem como achar que teve. Você tem certeza quando tem, é reação química e elétrica.
Sam apenas silenciou-se pensativa.
– O que você acabou de sentir, você acha ou tem certeza? – Theo voltou a perguntar.
– Tenho certeza.
– As outras vezes comigo?
– Tenho certeza.
– É disso que estou falando.
Novamente Sam refletia em silêncio.
– Acho que não. – Sam disse.
– Acha que não o que?
– Que nunca tive, antes de você.
Theo não conteve um sorriso satisfeito.
– Nem quando se masturbava?
– Eu não faço estas coisas. – Sam respondeu, sem jeito.
– Nunca é tarde para começar, é saudável, faz um bem danado e você acaba se conhecendo.
– Não é certo.
– E isso que você acabou de fazer comigo é certo?
– Também não.
– Não me pareceu errado. Nenhuma das vezes. – Theo provocava.
– É bom, mas não está certo, não é para isso que nossos corpos servem, eu sei que estou cometendo o pecado da carne.
– Nossos corpos nos dão prazer, aproveite essa dádiva. Como é o sex* com seu noivo?
– Normal.
– Normal? E onde entra o seu prazer?
– Eu sinto prazer.
– Mas nunca chega lá, do que adianta? Tenho certeza que Mike chega aos finalmentes sempre.
– Tem sido satisfatório para ambos, isso que importa.
– Sam. – Theo ergueu um pouco a cabeça de Sam na sua direção. – Você tem direito aos orgasmos tanto quanto ele, não abra mão disto por conta de convenções retrógradas criadas por pessoas que nem praticam sex*.
– Esse é um assunto íntimo, só nos diz respeito, as coisas sempre funcionaram assim.
– Você nunca se questionou se não havia algo mais? Nunca sentiu falta de algo na cama?
Sam sempre soube que sim, mas não admitiria para Theo.
– Relacionamentos heterossexuais são diferentes, você não entende desse assunto. – Sam dizia com impaciência.
– Converse com Mike, é óbvio que está faltando algo, ele está te devendo centenas de orgasmos. – Theo riu. – Eu não entendo qual o lance dele, você não tem nenhum problema, em três minutos fazendo a coisa certa você chega lá, eu sei do que estou falando. E puta que o pariu, desculpe o palavreado, mas você é tão gostosa, Sam, ele deveria te dedicar mais tempo, prestar mais atenção em você.
Sam acabou rindo também.
– Essa é a conversa mais surreal que já tive.
– Você vai casar com ele em breve, você quer ter uma vida inteira sem o prazer que você tem direito? Então pelo menos aprenda a se divertir sozinha.
– Ok, vou considerar essa possibilidade.
– Autoconhecimento, pratique o autoconhecimento. Vai facilitar inclusive para dar orientações à Mike.
– Obrigada pelos conselhos, a terapia está encerrada por hoje.
– De nada, só estou cumprindo meu dever como amiga.
Ouvir Theo se referindo como amiga tirou o sorriso do seu rosto.
– Obrigada, amiga…
Theo captava o que se passava com Sam naquele momento, processava as informações.
– Amiguinha? – Theo a chamou. – Venha aqui.
Sam não se moveu.
– Vamos, suba aqui.
Sam ergueu-se e subiu sem pressa, ficando acima do rosto de Theo, que pousou suas mãos ao redor de sua cabeça.
– Nunca aceite menos. Você tem ideia do poder que tem?
Sam apenas moveu a cabeça de forma negativa.
– Você se acostumou com menos, mas não precisa ser assim para sempre. Nossa sociedade, principalmente a europeia, cria mulheres para servirem aos homens. Não culpo Mike, ele foi criado assim, mas você pode mudar isso pelo menos com um homem, com seu noivo. Se imponha, exija, não abra mão do que você tem direito. Não aceite menos do que merece, e você merece muito, oficial.
– Ok. – Sam respondeu timidamente.
– Sam, eu gosto de ficar com você, se não tenho pretensões é porque sei que não tenho esse direito, seria loucura alimentar qualquer tipo de pretensão, então você é e sempre será minha amiga.
Sam colocou um dedo sobre os lábios de Theo.
– Você quebrou o acordo. – Sam falou com uma voz moderada.
– Quebrei.
Sam a fitou por alguns segundos.
– Acho que também quebrei. – Sam disse.
***
Estavam no meio de um banho lascivo, entrando no segundo round. Sam estava contra a parede e desligara todos os filtros e pudores. Desceu sua mão discretamente, e a pousou entre as pernas de Theo, que parou o beijo, segurando sua mão.
– Não, por favor… – Theo sussurrou num tom piedoso.
– Tudo bem. – Sam disse em seu ouvido.
Theo soltou sua mão, permanecendo sem ação, Sam afastou-se um pouco a fitando, percebeu um semblante abatido, quase amedrontado, e a abraçou.
– Está tudo bem… Tudo bem… – Sam repetiu, a abraçando firme.
Enquanto recebia a água morna em suas costas, Theo mergulhava o rosto em seu pescoço, fazendo de Sam seu refúgio momentâneo.
– Vamos terminar nosso banho? – Theo disse, soltando-se do abraço.
O comunicador pode ser ouvido do lado de fora.
– Preciso atender, não costumam me ligar nesse horário. – Sam disse.
– Ok, vou terminar meu banho. – Theo a soltou, Sam enrolou-se na toalha e foi atender a ligação.
Alguns minutos depois Theo saiu do banheiro, terminando de vestir a camiseta.
– Algo com seu pai? Ou era sua irmã falando mal de mim? – Perguntou, esbarrando na cama.
Sam a encarou, ainda assimilando a notícia recebida.
– Não. – Respondeu com a voz trêmula. – Mike chega amanhã.
Fim do capítulo
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viiihellen
Em: 12/11/2015
Não acredito que Mike já vai chegar.... O.O
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