Bianca

Acordei assustada, alguma coisa tinha caído no andar de baixo e pelo barulho fora algo grande. Sentei na cama e olhei para o rádio relógio na mesinha de cabeceira, eram quatro horas da manhã. O que que estava acontecendo? Será que alguém havia entrado na casa? Onde estariam os seguranças? Levantei, coloquei o robe e desci as escadas na ponta do pé. Ouvi uma pessoa falando baixinho e continuei até alcançar a sala. As luzes estavam acesas e Marcella estava sentada no chão catando os cacos de um vaso que havia se espatifado ao cair no solo.

- Caceta! Que merd*! – Ela xingava.

Me aproximei e agachei a seu lado, mas ela nem notou a minha presença até que eu falei:

- Dona Marcella quer que eu te ajude?

Ela se espantou e acabou cortando a mão em um dos cacos.

- Porr*! Que susto! De onde você surgiu? – Sua voz estava pastosa

Imediatamente percebi que ela estava embriagada, e por este motivo devia ter derrubado o enfeite. Delicadamente peguei sua mão e olhei o corte, não fora muito profundo.

- Fique quietinha ai. Eu já venho. Deixe que eu cato os pedaços do vaso depois. Me espera sentada aí. – Falei enquanto me levantava.

Subi até o meu quarto e peguei a caixa de primeiros socorros que estava no banheiro. O que será que fizera Cella beber tanto a ponto de ficar naquele estado. Ela era uma pessoa tão centrada. Jamais imaginaria vê-la daquele jeito. Seja o que for não devia ser nada bom. Desci novamente e a encontrei sentada no mesmo lugar olhando o sague escorrer do corte. Coloquei a caixa na mesinha de canto e voltei para junto dela.

- Dona Marcella me dê as mãos vou ajudá-la a se levantar. – Disse estendendo os braços.

Ela levantou o rosto e ficou me olhando por um tempo, seus olhos semicerrados, como se não estivesse me reconhecendo, mas depois estendeu as mãos que peguei e puxei em minha direção. Ela se apoiou em mim assim que ficou de pé. Mansamente eu a levei até o sofá onde a sentei com cuidado. Peguei algodão e água oxigenada e comecei a limpar sua mão. De vez em quando olhava pra ela que estava me encarando. Terminei colocando um band-aid no ferimento.

- Pronto agora está tudo certo. – Disse sorrindo.

- Você é um anjo não é mesmo? Veio do céu para me ajudar depois de tanto que pedi a Deus. Você não é de verdade, não deve ser. Ninguém pode ser tão incrivelmente perfeita. – Falou olhando fixamente pra mim.

- Que isso dona Marcella, sou uma simples mortal, nada além disso. E não sou perfeita, tenho muitos defeitos.

- Não minta pra mim. Eu sei que você é um anjo. E que está aqui por minha causa. Eu te pedi e Ele mandou.

E sem eu esperar ela começou a cariciar meus cabelos, depois meu rosto para em seguida passar os dedos sobre meus lábios.

- Tão linda! Onde estão os seus defeitos Bianca? Nunca os vi, só consigo enxergar esses cabelos loiros, a pele branquinha e macia e seus lábios rosados. Tão delicada, parece uma boneca de porcelana. – Seus olhos estavam brilhantes.

Mesmo sabendo que ela estava alterada pela bebida seu toque mexeu comigo. Imediatamente os bicos dos meus seios ficaram endurecidos e aquele tremor já meu conhecido tomou conta do meu corpo.

- A senhora precisa ir deitar. Já é tarde. – Sussurrei.

- Posso te fazer uma pergunta? – Ela continuou como se não tivesse me escutado.

- Claro que sim. - Respondi

- Por que você nunca beijou? Sua boca é tão linda. Eu fico olhando pra ela e imaginando tanta coisa...

Meu Deus, ela ficava imaginando o que? Será que tinha notado o quanto minha boca ficava seca quando estava ao seu lado? Sem pensar passei a língua sobre os meus lábios para umedecê-los. Eu mal conseguia respirar.

- Não faz isso. É tão convidativo. Minha vontade é de molhá-los pra você. Beijá-los com vontade de nunca parar.  – Disse e foi se aproximando.

Levantei de um pulo. Meu coração estava saltando no peito. Não podia permitir aquilo, ela estava bêbada.

- Venha vou ajudá-la a ir para a cama. – Disse e ofereci a mão que ela pegou, mas não fez força pra levantar.

- Sua mão é tão macia. Tão bonita. – Ela começou a passar o dedão no centro da palma suavemente.                                                                                                        

- Dona Marcella por favor, colabora. Levanta. Vem comigo. – Já estava desesperada com o que aquele toque estava me provocando.

- Eu vou. Me leva para onde você quiser Bi.

Eu a puxei e a ajudei a se segurar em meus ombros. E caminhamos juntas para a escada. Foi bem complicado subir os degraus, mas enfim chegamos ao seu quarto. A sentei na beirada da cama. Ela abaixou a cabeça por um instante e depois gem*u.

- Bianca não estou me sentindo bem, me leve para o banheiro rápido.

Corri com ela bem a tempo, ela se curvou diante do vaso sanitário e começou a vomitar. Fiquei ao seu lado segurando seus cabelos. Depois que tinha colocado tudo pra fora ela sentou-se no chão. Eu sabia o que tinha que fazer, mas estava com muito medo do que sentiria, porém, meu lado caridoso falou mais alto. Fui até o chuveiro e o liguei no maximo, depois fui até onde ela estava.

- Dona Marcella a senhora precisa de um banho. Vou tirar... vou tirar suas... roupas tudo bem? – Gaguejei.

Ela fez um leve movimento de consentimento com a cabeça. Abaixei a tampa do vaso e a ajudei a se sentar sobre ela. Então comecei a desabotoar a sua camisa. Meus dedos estavam tão trêmulos que demorei uma eternidade nessa tarefa. Seu sutiã era de renda branca e fiquei olhando para eles como se estivesse hipnotizada o bico dos seios rosados estavam perfeitamente visíveis e intumescidos. Quando levantei os olhos mergulhei nos dela que me olhavam de um jeito que me bagunçou ainda mais. Parecia saber o que eu estava sentindo.

- É melhor a senhora ficar de pé para que eu possa desabotoar as suas calças. – Falei sem jeito.

Ela segurou-se em mim e levantou. O contato de seu corpo piorou a situação. Se minhas mãos antes estavam tremulas, agora parecia que eu tinha mal de Parkinson, a intimidade daquele ato estava acabando com meus nervos. Depois do que me pareceu uma eternidade consegui tirar a peça. Mas não tive coragem de retirar a lingerie e a coloquei embaixo do chuveiro com as roupas de baixo mesmo. A água estava fria e ela estremeceu assim que o liquido tocou seu corpo.

- Ei isso está gelado! Meu Deus! Quer me matar? – Ela exclamou!

- Eu sei, me desculpe, mas li em algum lugar que isso ajuda a curar uma bebedeira. Fique embaixo da água um tempo. Vou fazer um café forte. – Falei dando as costas o mais rápido que pude, já que a lingerie molhada estava totalmente transparente.

Desci para fazer a bebida quente com o corpo todo tremendo. Vê-la praticamente nua tinha com certeza me deixado atordoada. Senti uma vontade quase incontrolável de tocá-la e sentir sua pele de encontro a minha. Seria insuportável ficar olhando pra ela. Coloquei a água e o pó na cafeteira, enquanto esperava me lembrei do que tinha lido. Alguns cientistas diziam que o homossexualismo tinha uma explicação genética, outros refutavam isso, ainda outros diziam que na verdade os seres humanos são todos bissexuais, enfim teorias e mais teorias. Mas em uma coisa todos concordavam as pessoas têm o direito de amar a quem quiserem e o desejo acontece e pronto. E nisso eles tinham razão, porque fora isso que acontecera comigo. No exato momento em que vi seu rosto algo dentro de mim despertou. Uma força que eu não tinha como controlar, como se algo estivesse desabrochando, a minha libido, coisa que eu nem sabia que tinha, ganhou vida. E agora teria que aprender a conviver com aquele sentimento e também com os desejos que ele me provocava. Enchi uma xicara de café e dirigi-me ao quarto de Marcella, quando cheguei ela já estava de roupão, com uma toalha enrolada nos cabelos.

- A senhora está melhor? – Perguntei estendo a xicara em sua direção.

- Sim um pouco melhor, mas ainda tonta. Obrigada Bianca. – Disse com a voz já mais normal.

Ela pegou o café e sentou-se na cama. Fez um gesto para que eu me sentasse ao seu lado. E obedeci como sempre.

- Desculpe pelo trabalho que lhe dei. Não tinha a intenção de incomodar ninguém. Se não tivesse quebrado aquele vaso...

- Tudo bem. Não foi incomodo nenhum. – Respondi.

- Claro que foi menina. Pessoas bêbadas só causam problemas, e sabe o que é o pior? A bebida não resolve nada. A gente pensa que esquece, mas é besteira. Está tudo aqui ainda. – Disse apontando a cabeça. – Nada some. Ilusão. Idiotice. É como lutar contra um demônio invencível. – Seus olhos escureceram.

- A senhora tem que descansar agora. Tome o seu café e deite-se. Amanhã estrará melhor.

- Estarei com uma puta de uma ressaca isso sim. Minha cabeça já está doendo. Mas bem feito pra mim, já devia ter aprendido. Sou uma idiota

- Não fala isso. Imagino que esteja com dor. Quer um remédio para a cabeça.

Me respondeu que sim e eu fui até o armário do banheiro peguei duas aspirinas e um copo de água. Entreguei a ela que engoliu franzindo a testa. Devia estar doendo mesmo.

- Precisa de mais alguma coisa dona Marcella?

- Sim. Que pare de me chamar assim. Depois do que viu hoje, não precisa mais ficar com essa estória de senhora nem dona. Me chame apenas de Marcella ou Cella se preferir. Acho que já temos intimidade o suficiente para isso. – Falou

- Eu não acho correto. A senhora é minha patroa. – Estava sem jeito com o pedido dela.

- É uma ordem. Por favor. – Sorriu, e meu mundo parou. Faria tudo o que ela quisesse.

- Sendo assim, uma ordem, só me resta obedecer. – Disse encabulada.

- E mais uma coisa Bianca. Eu estou embriagada, mas sei muito bem tudo o que te disse. E reafirmo, você é o anjo que veio para mudar minha vida. Obrigada.

Enquanto dizia aquilo colocou sua mão em meu braço, respirei fundo, só aquele toque já me desestabilizava. Que situação triste a minha. Estava a seu lado e não conseguia esquecer que provavelmente ela estava nua sob o roupão. Pra quem nem sabia o que era desejo eu estava aprendendo muito rápido.

- Não precisa me agradecer. Qualquer um faria o que eu fiz. – Baixei meus olhos e encarei minhas mãos que estavam cruzadas em meu colo.

- Tem mais uma coisa. Você se lembra de tudo o mais que falei na sala?

Fiquei estática. Sim é claro que lembrava, ela sugeriu, não na verdade ela deixara claro que gostaria de me beijar. Mais do que isso, ela provavelmente teria beijado se eu não tivesse me levantado.

- Era tudo verdade. Sei que você não entende a minha sexualidade, e nem vou tentar te explicar. Mas me sinto atraída por você como não me sentia há muito tempo. Dizem que as pessoas bêbadas têm a tendência de contar tudo o que pensam, bem isso é correto. Só quero que saiba que eu te respeito e nunca vou fazer nada que possa te magoar. Não se preocupe. E me desculpe por ter falado, não era para eu ter exposto essa atração.

- Não estou preocupada Marcella. Faz pouco tempo que convivo com você, mas já sei que é uma pessoa de caráter. Jamais me desrespeitaria. Sei que não faria mal algum a ninguém.

- Ah doce e ingênua Bianca, você se espantaria se soubesse o quanto isso é inverdade. Não sou tão boa como pensa. Existem pessoas que se eu pudesse faria desaparecer da face da Terra sem dó ou piedade. – A ira apareceu em seu tom.

- Você pensa que é má. Mas não é. Eu sei. Agora é melhor eu ir me deitar. Daqui a pouco a Dudinha acorda. Se precisar de mais alguma coisa é só me chamar tá bom?

- Vai sim. Mais uma vez obrigada por sua gentileza e paciência. E me desculpe por qualquer coisa.

Levantei e fui em direção à porta, porém não sei qual força que me impeliu e parei, olhei novamente para ela e disse:

- Marcella, já que você foi tão verdadeira comigo quero que saiba que a mesma vontade que você sente...eu...sinto também.

Me virei e segui em frente sem esperar para ver sua reação. Meu coração estava batendo na garganta, e nem mesma eu sei de onde tinha tirado a coragem pra dizer aquilo. Estava ficando louca mesmo, só podia.

Entrei no meu quarto, fechei a porta e me joguei na cama. Com certeza não conseguiria mais dormir. Muitas coisas estavam em minha mente. O que eu tinha feito? E agora? Como faria para encará-la quando acordasse? Ela bebeu e eu que tinha ficado bêbada, não tinha outra explicação. “Bianca, Bianca você não era assim”, pensei com meus botões. Esse tal de amor estava sendo uma má influência para a minha sensatez. Fechei os olhos, mas como havia imaginado o sono não veio e quando o sol nasceu eu me levantei para enfrentar um novo dia, sem saber o que me esperava depois daquela declaração idiota.

Fim do capítulo