Capitulo 11
Por Bia:
“Caos” resumiria minha semana. Um vendaval de vídeos, campanhas publicitárias e mensagens intermináveis do Pietro, que, se pudesse, teria me implantado um chip rastreador para garantir que eu não perdesse nenhum compromisso e andasse na linha. Entre reuniões, gravações e chamadas histéricas dele dizendo "Bia, pelo amor de Deus, foco!", eu alimentava a ilusão de que teria um final de semana relaxante. Mas a vida de influenciadora não permite descanso, apenas novos cenários para mais trabalho. Como o gran finale desse espetáculo de desgraças, teria o ensaio da linha Maresia e eu ainda teria que lidar com o humor azedo de Luísa, que aparentemente me odiava pelo simples fato de eu respirar perto dela.
Eu já estava pronta e esperando na calçada quando o Uber parou na frente do meu prédio. Pietro desceu do carro quase antes mesmo do motorista frear completamente, com a animação de um golden retriever indo para a praia.
— Bom dia, Bia! Já separou tudo? — Ele perguntou, debruçando-se sobre a minha mala com uma empolgação que me fez questionar se ele tinha tomado café ou um energético direto na veia.
— Já sim. Tá tudo aqui. — Respondi, jogando a mala no porta-malas com uma energia proporcionalmente oposta à dele e ajustando os óculos de sol.
— Então vamos! Não podemos atrasar. Já são quase 7 horas. — Ele disparou, checando o relógio.
— Eu sei. — Revirei os olhos, porque eu tinha plena consciência de que a pontualidade dele era uma questão de vida ou morte e que, se eu me atrasasse, Luísa provavelmente faria questão de assumir o controle do barco e me deixar para trás, na melhor das hipóteses.
— Eles já devem estar nos esperando — Pietro comentou quando finalmente estávamos a poucos minutos do porto.
— Quanto tempo até lá? — perguntei, sem nenhuma empolgação real de saber.
— Mais uns 10 minutos, chegamos ao porto e 40 minutos de barco até a Ilha do Farol. Estou tão animado! Nunca fui lá antes!
— Eu também não. — E honestamente? Não tinha certeza de que queria ir. Pelo menos não nessas circunstâncias.
Quando chegamos ao porto, meu olhar passeou preguiçosamente pelo trapiche. E foi aí que a vi: Luísa, ao lado de Roger. Mesmo à distância, tenho certeza absoluta de que ela fez uma careta ao me ver. Ou talvez tenha sido só o sol forte na cara dela, mas prefiro acreditar que foi minha simples presença que a incomodou. Porque, sejamos sinceros, um pouco de veneno matinal num sábado ensolarado só deixa tudo mais interessante.
Pietro e eu tiramos a bagagem do carro, e enquanto ele conferia pela terceira vez se não tínhamos esquecido nada, eu apenas conferi se meus documentos estavam na bolsa e me preparei mentalmente.
Ao nos aproximarmos, cumprimentamos Róger e outras pessoas da equipe que estavam por perto. Percebi que Luísa estava mais afastada, quase na ponta do píer, e cabisbaixa, mexendo no celular, completamente alheia à minha chegada e a de Pietro. Ótimo, como sempre, eu brilhando na lista de prioridades dela, bem abaixo de qualquer notificação aleatória.
Ela vestia um short branco de linho de cintura alta e uma regata cropped marrom. Simples. Elegante. Linda. Irritantemente linda.
Me posicionei ao lado dela e, sem cerimônia, a abracei, ignorando a certeza de que minha aproximação seria tão bem-vinda quanto um e-mail de trabalho no sábado à noite.
— Oi, amor — sussurrei no ouvido dela, arrastando propositalmente as palavras, deixando meu hálito quente tocar sua pele.
Vi os pelos de seu braço se arrepiarem. Interessante. Pelo menos fisicamente, eu ainda causava algum efeito nela.
— Oi, Bia — ela respondeu, virando-se para me olhar, mas mantendo a postura defensiva. Depois, deu um passo discreto para trás, como se minha presença fosse um campo magnético e ela precisasse urgentemente sair do alcance.
Nosso olhar se cruzou por um segundo longo o suficiente para que eu percebesse os detalhes que não havia notado antes. Olheiras sutis, um leve inchaço ao redor dos olhos. Algo me dizia que Luísa tinha chorado. E, contra todas as minhas expectativas e inclinações naturais de provocar um pouquinho mais, senti um desconforto estranho se instalar no meu peito.
Respirei fundo, ajustando os óculos de sol no rosto, e decidi não cutucar a fera. Por enquanto.
Embarcamos em um catamarã branco e vermelho por meio de uma passarela de madeira estreita que balançava suavemente com o movimento da maré. O barco era espaçoso, com dois cascos largos que garantiam estabilidade mesmo quando o vento soprava mais forte. O convés principal tinha um amplo espaço aberto, protegido por uma cobertura de lona branca que filtrava o sol escaldante da manhã sem bloquear a brisa refrescante. Espreguiçadeiras estavam estrategicamente posicionadas, prontas para quem quisesse fingir que aquilo era um passeio relaxante.
O motor rugiu e o catamarã começou a deslizar para longe do porto, deixando para trás as construções que pareciam mais distantes a cada minuto. O mar, antes refletindo o dourado do sol, aos poucos se transformava em um azul mais intenso e profundo.
— Você sumiu para encontrar sua namoradinha e eu tive que guardar sua mala sozinho — Pietro se aproximou, claramente ofendido, mas sem abandonar o tom teatral que ele adorava usar sempre que queria atenção.
— Cavalheirismo de vez em quando faz bem, amigo — respondi, jogando um olhar de tédio para ele, como quem diz supere isso.
— Estou vendo que hoje ela não está para conversa, né? — Ele indicou discretamente Luísa com um aceno de cabeça.
Lá estava ela, jogada em uma das espreguiçadeiras. Pernas esticadas, corpo inclinado de um jeito que definitivamente não parecia confortável. O rosto parcialmente coberto pelos óculos escuros, mas ela nem precisava tirá-los para saber que sua expressão era a de alguém que não queria ser incomodada.
— E quando é que ela está para conversa? — retruquei, cruzando os braços.
Pietro soltou um riso curto.
— Credo! Vamos ali com o Ró e com o Renan? Ele está chateado porque não conseguiram exclusividade. Queria que reservassem toda a ilha toda só para a gente, mas parece que a magnânima cortou o gasto. — Disse com um tom ácido ao se referir a Valéria.
— Ixi… — Fiz uma careta. — Acho que não vou. Vou ficar por aqui mesmo, aproveitando a paisagem.
Pietro apenas me lançou um olhar indiferente antes de sair em direção ao Roger. Nem precisava dizer nada, estava na cara que os dois tinham algum tipo de envolvimento. Para eles, essa viagem provavelmente não passava de uma pseudo lua de mel disfarçada de trabalho.
Aproveitei o raro momento de paz, sem ninguém por perto para me interromper, e resolvi gravar um story no barco. Falei sobre a viagem, dei um gostinho do que estava por vir e mencionei brevemente a gravação da campanha da linha Maresia. Tudo no tom certo: descontraído, mas profissional. Afinal, a magia do marketing é fazer parecer que sempre estamos nos divertindo.
Assim que finalizei o story e bloqueei a tela do celular, meus olhos, como se tivessem vontade própria, voltaram a procurar Luísa. Lá estava ela, na mesma posição, praticamente uma estátua. Se não fosse pelo movimento sutil da respiração, eu juraria que ela tinha virado parte da mobília do barco.
Franzi a testa, intrigada e suspirei. Alguma coisa tinha acontecido. Estava na cara dela. Mas qual seria o motivo? Algum drama corporativo? Alguma tragédia envolvendo uma planilha de custos? Ou será que o problema era eu? Hmm... improvável. Se tem algo que Luísa domina, é fingir que minha presença não a afeta. E ela é quase boa nisso.
Depois de um tempo navegando, a imagem da ilha finalmente começou a ficar mais nítida no horizonte. No começo, apenas um borrão indistinto entre o azul do mar e do céu. Mas, pouco a pouco, foi ganhando forma: uma faixa de terra cercada por águas cristalinas, com montes cobertos de verde brotando no centro, recortados pelo brilho branco da areia fina.
Assim que o barco parou, tive uma epifania: eu estava dentro de um episódio de The White Lotus. Não tinha outra explicação para a cena cinematográfica que se desenrolava diante dos meus olhos. A equipe do Aurora Island Resort surgiu na praia em uma formação quase coreografada, vestindo uniformes impecáveis e exibindo sorrisos treinados que gritavam "Bem-vindos ao paraíso, hóspedes endinheirados!" Só faltava a trilha sonora de abertura.
— Realmente, luxuoso. — Comentei para Pietro enquanto descíamos.
— Te disse! Agora vai lá atrás com a tua namorada, amiga. Momento de fazer close. — Ele respondeu em baixa intensidade, lançando um olhar sugestivo e apontando discretamente para trás.
Segui o olhar dele e encontrei Luísa. Continuava na mesma vibe, perdida em algum pensamento. Suspirei e comecei a me desviar da equipe do resort, nadando contra a corrente de empolgados, só para voltar e chegar até ela.
Quando finalmente parei ao seu lado, ela me olhou confusa. Sem dizer nada, peguei sua mão. Estava fria, um contraste direto com a minha, que parecia absorver todo o calor tropical. Ela percebeu o motivo da minha aproximação antes mesmo de eu abrir a boca.
— Que comece o teatro. — Murmurou com um sorriso breve, forçado, mas ainda assim um sorriso.
— Vai dar tudo certo. — Respondi, embora nem eu mesma soubesse direito se estava tentando tranquilizá-la ou me convencer disso.
O saguão do Aurora Island Resort era um exagero luxuoso digno de capa de revista. Pé-direito alto, colunas de pedra polida, uma fonte escandalosamente iluminada bem no centro e aquele cheirinho de hotel caro com incenso de mirra francesa. Do teto, pendia um lustre que provavelmente custou um valor exorbitante. Funcionários andavam de um lado para o outro em uma eficiência quase robótica, enquanto alguns hóspedes desfilavam com roupões e óculos de sol.
A equipe de Roger fez uma fila para o check-in e quando chegou nossa vez veio a bomba:
— Vocês duas ficarão na Suíte Master Vista Mar. — A recepcionista informou com um sorriso profissional.
Pisquei. Olhei para Luísa. Olhei de volta para a recepcionista.
— Ah, que maravilha. — Respondi, tentando não soar tão cínica.
Era óbvio que tínhamos que dividir o quarto. Parte do nosso maravilhoso papel de casal perfeito para vender a campanha. Olhei de soslaio para Luísa, esperando alguma resistência. Nada. Nenhuma careta, nenhum suspiro irritado, nenhuma tentativa de contestação. Apenas uma aceitação cansada.
Bom... uma noite. Passaria rápido. Era assim que eu tentava me convencer.
Fim do capítulo
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HelOliveira
Em: 07/11/2025
Já ansiosa pelo próximo acho que essa ilha promete e algo bem interessante.... expectativas foram criadas rs
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MalluBlues Em: 07/11/2025 Autora da história
O próximo capítulo acabou de sair. Espero que goste!