A CEO foi empurrada contra a parede, ficando cara a cara com a outra mulher. – É impressão minha ou vejo um pouco de medo e desejo reticente nesse seu olhar? – Carmen ameaçou beijá-la, mas não o fez – Nunca imaginei que alguém como você ficasse acanhada na intimidade! – provocou

 

--Você enlouqueceu? – desvencilhou-se da outra e ajeitou a própria roupa – Eu não vim aqui pra... – sentia-se nervosa – Ora, Carmen, somos duas mulheres maduras e civilizadas, não é assim que a coisa funciona! – aproximou-se da janela do quarto – Eu vim porque... – olhou para o exterior – precisava desabafar com alguém... – olhou novamente para a estilista – É muita pressão em cima de mim! – suspirou – É foda ter que ser irrepreensível o tempo inteiro! – passou a mão nos cabelos – Quando se é mulher a frente de uma empresa as exigências são muito maiores! – pausou brevemente – E eu sei que você me entende!

 

--Own, meu bem... – caminhou até o frigobar – Sou uma mexicana comandando negócios nos Estados Unidos. É claro que eu entendo perfeitamente. -- retirou uma garrafa de vinho – E como sou prevenida, comprei essa delícia pensando nesse encontro. – separou duas taças – Vinho orgânico bordô. – abriu a garrafa com facilidade e serviu as taças – Ideal para mulheres como nós. – aproximou-se da engenheira com as duas taças na mão – Secas na hora certa, – estendeu uma taça para a outra, que a recebeu – suaves na hora exata. – sorriu – Tintim! -- bebeu um gole

 

Bebeu um gole também. – Hum... – apreciou o sabor – Muito bom! – elogiou – Nunca havia provado um vinho orgânico.

 

--Há vários outros sabores que você ainda não provou, meu bem. – foi até a imensa cama de casal e recostou-se nos travesseiros – Mas deseja provar com a mesma curiosidade que esse vinho te despertou. – reparava na outra – Por que não começa tirando parte dessa roupa formal e se juntando a mim nessa cama? – propôs insinuante – Se me quer como confidente, o mínimo que poderia fazer é ficar mais à vontade, não? – bebeu mais um gole

 

“Ora, Yesmin, que mal haveria nisso?” – pensou – “Ela não vai te estuprar se você relaxar um pouco.” -- deu um suspiro profundo – Tudo bem. – colocou a taça sobre uma mesinha – Vamos ficar mais à vontade. – tirou o blazer, os sapatos e as joias

 

Carmen devorava a mulher com os olhos em cada movimento que ela fazia. – Por que não tira também a saia? Roupas íntimas e essa blusa aí devidamente desabotoada seria quase como uma... como dizer isso em português? – pensou brevemente – Festa do pijama. – sorriu

 

Olhou desconfiada para a estilista. – Pode ser... – concordou reticente – Mas não fique pensando besteiras por causa disso. – fez conforme sugerido

 

--Nada que eu pense envolvendo você é besteira, cariño. – bebeu mais um gole – Agora vem aqui e me conta o que te maltrata. – pediu gentilmente – Estou sabendo da história daquelas moças e dos outros escândalos que vieram na esteira. – continuava reparando na CEO – Agora conte-me o que eu não sei.

 

Yesmin pegou a taça de novo e uniu-se à estilista na cama. Acomodou-se confortavelmente, bebeu mais um gole de vinho e começou a falar. – O que se disser aqui, morre aqui, entendeu? – olhava para a mulher

 

--Deal! – concordou – E digo mais: o que acontecer aqui, morre aqui. – piscou insinuante

 

***

 

--De tudo que você me falou, eu diria que em relação à BoFe você tem sido simplesmente perfeita! – elogiou – O caminho é esse mesmo e no mais é a cruz que toda mulher empoderada carrega por conta do machismo. – bebeu um gole de vinho – Continuemos deixando esses idiotas morrendo de inveja do nosso sucesso! – gesticulou – Mas quanto a sua vida privada, eu queria explorar um pouco mais. – bebeu o último gole e colocou a taça numa mesinha próxima – É nítido que sua ligação com sua mãe e filha não tem sido forte o suficiente. Talvez nunca tenha sido... – pausou por instantes – A cuidadora Zaida teve tanta facilidade em entrar na vida delas e conquistá-las justamente porque havia lacunas importantes. – concluiu – E isso te deixa enciumada, revoltada, irada... – estudava o rosto da outra – Sem contar que essa mulher, tão simples e diferente de todos ao seu redor, te encara de igual para igual e com tudo isso... – passou o indicador direito gentilmente pelo rosto de Yesmin – te deixa intrigada e... excitada!

 

--Ah! – sentou-se de um pulo – Ora, veja só! – levantou-se da cama – Excitada?! – indignou-se – Não seja ridícula, Carmen! – protestou – Eu nunca me interessei por mulheres na vida e se você tivesse ideia dos homens com quem já estive iria ficar impressionada!

 

--E daí? – respondeu sem se abalar – Não são as mulheres, meu bem; é Zaida. – sorriu – Assim como sou eu. – passou a mão nos cabelos – Você não estaria aqui se eu não abalasse sua hetero convicção de alguma forma. – provocou – Tanto quanto Zaida também abala. – novamente ajeitou-se na cama – No entanto, fique tranquila porque não sou ciumenta.

 

Riu por achar absurdo. – Você é louca! – começou a andar em círculos pelo quarto – Além de ter uma autoestima um bocado inchada! – falava de cara feia

 

--Ao contrário de você, que talvez tenha uma autoestima baixa e por isso viva de provar pros outros o tempo inteiro que é a melhor, simplesmente porque você precisa se convencer disso. – analisava – Talvez uma das razões por que Zaida te irrite, é que ela parece desnudar a sua... “incompetência”, – fez aspas com os dedos -- uma vez que consegue com sua família o que você não chega nem perto de conseguir. – dizia o que pensava – Sem contar que ela parece não se abalar diante da sua pose de... como se diz? – gastou uns segundos calada – Fodona! – riu brevemente – Ela não se abala; eu me excito. – afirmou insinuante

 

“Parte do que ela fala parece até Rogério falando!” – recordava do que já ouvira do marido – Não é isso! – negou com insegurança – Você não sabe do que tá dizendo! – caminhou até a janela e ficou olhando para fora

 

--Não é vergonha, meu bem. – levantou-se e foi até a outra – Todos temos fraquezas e traumas. – virou-a de frente para si – Posso te contar os meus sem problema algum. – acariciava-lhe o rosto – Sabia que meus irmãos e eu fomos obrigados a assistir mama sendo surrada por nosso papa por 10 anos, de segunda à sexta? É que no final de semana ele saía de casa para beber e aí nós tínhamos paz. – confessou – Depois ele foi morto numa briga e eu tive que ir reconhecer o corpo... havia um guarda-chuva enfiado na boca dele. – lembrava -- E eu nunca mais usei um guarda-chuva depois daquilo.  – deu um sorriso triste – Você ficaria surpresa se soubesse como minha infância e adolescência no México foram duras... – pausou brevemente --Saia dessa casca de Wonder Woman e me deixe ver quem se esconde aí dentro? – deslizou o indicador direito até a altura do coração dela – Você é realmente foda, como dizem os brasileiros, mas... eu não sei. – reparava na CEO – Algo me diz que uma menina carente ainda vive dentro de você. – novamente deslizou o dedo até o rosto dela – Por que não volta pra cama comigo e me conta como Yesmin Zahia Torricelli foi forjada? – pediu – Algo que eu não vá encontrar se procurar no Fuçapédia. – piscou e sorriu

 

Deu um suspiro profundo. – Eu não sou do tipo que fica remoendo passado e... – afastou-se da outra – Pra que tirar os esqueletos do armário? – gesticulou brevemente – Pra que discutir se a coisa que maama se arrepende acima de tudo foi de ter me deixado nascer?

 

Estranhou o que ouviu. – Por que pensa assim? – encostou-se na janela e cruzou os braços

 

--Porque ela disse isso de várias formas por anos a fio... – mirou um ponto no infinito

 

“--Eu nunca deveria ter deixado meu carreira de lado por um raagil (homem) como você! – Adma afirmava com raiva – Uma irresponsável, amante de mahdia (vadia)! GAATAK NIILA, VICENZO! (VÁ PARA O INFERNO, VICENZO)! – gritou descontrolada

 

--Eu não entendo metade do que você fala! – o homem respondeu debochado – Aprende a falar português primeiro e depois a gente discute! – preparava-se para sair

 

--Axra min kida mafiiš! (Não há merd* pior do que essa!) – xingava revoltada – Eu te odeia, Vicenzo! – arremessou um enfeite de mesa contra o homem

 

--Tá louca?! – perguntou de cara feia ao se desvencilhar – Eu não aguento mais esses teus chiliques, Adma! – foi até ela e a segurou pelo braço com força – Se arrependeu de ter casado comigo? Se arrependeu de ter vindo pro Brasil? – chacoalhava a mulher – Então junta seus trapinhos e vá embora! – empurrou-a – Volta pro Líbano e some daqui! – falava com raiva

 

--Se eu pudesse, Vicenzo, se eu pudesse... – lutava para não chorar – Ladayna ibna! (Nós temos uma filha!) – gesticulou – Eu não pode voltar pra Líbano sozinha com uma awlaad (criança) e não pode deixar Yesmin com você! – derramou algumas lágrimas -- Inta abun sayyi’! (Você é um péssimo pai!) – acusou --Wa zog aswa'! (E marido pior ainda)!

 

--Você engravidou porque quis! Não era nenhuma virgem inexperiente! – seguiu até a porta da sala e a abriu – Não me espere. Volto quando cismar. – saiu batendo a porta atrás de si

 

Adma começou a chorar copiosamente, gritando palavras em árabe e quebrando coisas. A pequena Yesmin assistia escondida e se sentia como um estorvo na vida de sua mãe.”

 

--Perdi as contas de quantas vezes ouvi maama dizer que se arrependia de ter casado com o baba, de ter deixado a carreira pra trás, que não podia ir embora por minha causa... – rememorava com mágoa – Ele era viciado em jogo, apostador de cavalos, foi dilapidando nosso patrimônio ano após ano... – andava pelo quarto – Nenhum dos dois nunca se importou comigo, com o que eu sentia, com o que eu fazia... não interessava ser a melhor na escola, me destacar em tudo, não dar trabalho pra eles... Era como se eu não existisse! – sentia dor ao lembrar – Quando ele nos deixou, eu tinha 22 anos e tava prestes a me formar! Estávamos praticamente na merd*! – os olhos marejaram – E quer saber? – emocionou-se – Eles não foram na minha formatura! Eu não... – calou-se e chorou

 

--Own, cariño... – aproximou-se e a abraçou com força – Vem aqui, meu bem. – acariciava-lhe a cabeça – Pode chorar... – derramou uma lágrima -- estou aqui para você.

***

 

--NAZIRA!! – Malika gritava da cozinha – NAZIRAAA!!! – e nada de ouvir resposta – Por que eu não trouxe minha corneta da Copa pra cá, hein? – reclamou consigo mesma – Vamos ver o que essa bicha tanto faz que não me escuta! – decidiu ir atrás

 

Enquanto isso, Nazira treinava poses, caras e bocas em seu quarto. “Isso, mulher, isso mesmo!” – admirava-se no espelho – “Capricha, vai!” – dizia mentalmente para si

 

--Nazira, afinal de contas... – a idosa chegava na porta do quarto da outra – Mas Minha Nossa Senhora! – assustou-se – Posso saber o que diabo é isso aí? – não entendia

 

--Ui, dona Malika, que susto! – pôs as mãos sobre o peito e olhou para a outra – Chegando sem avisar, cruzes! – passou a mão nos cabelos

 

--Susto levei eu! – reparava na outra – Tô te chamando toda vida, você não responde e quando venho ver o que houve, dou de cara com essa cena? – apontou para a mulher mais jovem – Eu hein! Tava dançando capoeira, recebendo santo, o que diabo é isso??

 

Nazira usava uma túnica preta esvoaçante e uma espécie de capa com capuz da mesma cor. – A senhora é tão implicante! O que tem de errado com meu look? – reclamou cruzando os braços – Eu simplesmente tava aqui treinando pra caprichar na minha aura de mistério! – justificou-se – O Pitaco me orientou desse jeito pra chamar a atenção do nerd do prédio!

 

--Ah! – achou um absurdo – Era mais fácil você complementar o visual com uma foice, já que tá vestida de Morte! – reparava – Ou então comprar uma máscara branca da boca aberta pra ficar igual àquele outro capeta dos filmes de terror! -- fez um bico – Aura de mistério, pois sim! – balançou a cabeça indignada – Para com tanta palhaçada e vem pra cozinha comigo porque a pia tá entupida e tem que resolver isso! – ordenou

 

--A senhora nunca entende... – choramingou feito criança – Tá, eu vou trocar de roupa e vou ver a pia pra senhora. – abriu a porta do armário

 

--E não demore! – advertiu antes de voltar para a cozinha

 

--Ela sempre criticando! – reclamava sozinha – Agora vê! Me comparar com a Morte e com aquele filme do Pânico... – tirou um vestido de uma gaveta – Mas... e o se nerd pensar igual a ela? – perguntou-se preocupada – Hum, é melhor eu aproveitar das nossas origens libanesas e de repente trabalhar um visual tipo burca... – considerou – É! Vamos investir nisso aí! -- decidiu

(NOTA DA AUTORA: Talvez o FalaGPiTaco tenha aprendido sobre “aura de mistério” treinando com dados sobre uma certa Abigail, num conto de uma certa autora! rs)

 

***

 

Zaida estava em casa lavando roupa e ouvindo música pelo celular. De repente, o som melodioso foi interrompido por uma propaganda no TeuTubo.

 

Olá, minha amiga! Olá, meu amigo! Olá, todas as tribos! – uma mulher saudava sorridente – Cansados de tantos problemas de saúde, amorosos, financeiros ou profissionais? – olhava para a tela – Venha falar com madame Vivi: a cigana caipira das vidências verdadeiras! – anunciou

 

--O que?? – interrompeu o que fazia e olhou para a tela do celular

 

--Eu sou madame Vivi! – Vivinácia falava de modo hipnótico – Nascida em Muçambinho d’Oeste, o logradouro mais místico da história desse país, tenho solução para todos os seus problemas! – gesticulava de forma estudada –Venha buscar a Luz que te faltava em seus caminhos! – fez um truque de mágica, gerando um breve clarão

 

--Não acredito nisso! – Zaida estava pasma

 

Não perca tempo! – a outra mulher voltava a falar – De segunda à sábado, das 9 às 20h, madame Vivi espera por você em Copacabana, na rua Constante Ramos número 24, esquina com a Domingos Ferreira! – sorria – A gente se encontra lá! -- piscou

 

--Essa mulher foi criada por IA?! – Zaida reparou – Gente, mas ela tá se empenhando até nisso? – falava sozinha – Nunca gostou de estudar, só que se é pra enrolar o povo... – suspirou – Enfim, eu não tenho mais nada com isso, né? – voltou a lavar roupa – Que um dia sua consciência desperte, Vivi. – desejou – Antes que seja tarde...

 

***

 

--Aqui, cadê Yes me? – Stefany entrava no quarto dos pais de cara feia – Daqui a pouco o período acaba e eu vou me dar bem nas matéria, tá ligado? – parou diante de Rogério – Quero saber qual é a da porr* desse castigo que ninguém fala de terminar! – reclamava – Tô fazendo a minha parte, valeu? – cruzou os braços indignada – Partiu vida normal!

 

O homem interrompeu a leitura, tirou os óculos e olhou para a filha. – Boa noite, Stefany. Tudo bem? – cumprimentou irônico – Esse castigo foi uma determinação da sua mãe, no que concordei completamente. Daí cabe a ela encerrar com a reprimenda quando considerar oportuno. – pausou brevemente – E além do mais o período ainda não terminou e você ainda não passou em todas as matérias. – preparou-se para voltar a ler

 

--Ah, pai... – pirraçou que nem criança – E cadê ela, hein? – insistiu – Eu tô numas de negociar, sabe qual é?

 

Achou graça. – Negociar... – balançou a cabeça contrariado – Sua mãe tem ido todas as noites na tal da Rio Fashion Season e volta de lá praticamente de madrugada. – informou – Acho melhor você esperar esse evento acabar. – aconselhou – Creio que será lá pra sexta. – voltou a se concentrar na leitura

 

--Puta merd*! – resmungou – Se eu não tivesse de castigo, bem podia tá indo nesse evento aí! – dirigiu-se para o próprio quarto – Ia bombar nas minhas redes tirando onda... – continuava se lamentando – É foda, cara!

 

***

 

Zaida tomava banho enquanto Adma e Patrícia conversavam na sala.

 

--Dona Adma, me ensina como criar uma pessoa de sucesso? – queria saber – Eu quero que meu filho seja a versão masculina da dona Yesmin quando ele crescer! – sonhava – Como foi que a senhora fez pra sua filha ser essa mulher tão demais?

 

A idosa gastou uns segundos calada até que respondeu pensativa: -- Eu... eu não fiz de Yesmin um mulher de sucesso... – admitiu – Esse foi conquista dela. -- pausou brevemente – Se ela não fosse tão obcecada por aquilo que quer, não teria chegado nem no metade do caminho. – mirou um ponto no infinito – Fazendo todo justiça, nem eu e nem meu ex-marido construímos um caminho pra ela... – suspirou  – Yesmin fez tudo sozinho!

 

***

--Eu criei Stefany do jeito que eu queria ter sido criada. – Yesmin dizia enquanto girava lentamente o vinho na taça – Tudo do bom e do melhor. Tudo que ela quisesse, a tempo e a hora. Rogério também não fazia diferente. – desabafava – Mas nossa vida sempre foi muito atribulada por causa do trabalho, das viagens pra atender reuniões, congressos... – olhava para Carmen – Aí eu tinha que contar com babás pra cuidar dela e nunca deixava que nenhuma ficasse por muito tempo com a gente pra não criar vínculos e não fazê-la sofrer. – justificava-se – Um dia as babás invariavelmente vão embora e também as crianças crescem... – gesticulou – Eu mesma tive babás e olha que maama nem trabalhava... – passou a mão nos cabelos – E o tempo passa rápido, sabe? Um dia eu acordei e Stefany já havia crescido e se tornado uma problemática e quase incontrolável jovem mulher...

 

--Eu não tive filhos, mas praticamente criei meus irmãos. – bebeu um gole de vinho -- Mama trabalhava muito duro, já que o papa gastava tudo que ganhava com bebida e mulheres. – olhava para a outra – E se foi uma coisa que a vida me ensinou é que a pior coisa que se pode fazer quando se cria alguém é dar a essa pessoa tudo que ela quer.

 

As duas mulheres estavam sentadas na cama, uma de frente para a outra. Yesmin estava recostada na cabeceira e Carmen se acomodava em vários travesseiros. Usavam apenas roupas íntimas.

 

Suspirou. – Tem razão... – concordou pensativa – Mas aos poucos pretendo ir mudando isso. – pausou brevemente – Não faço de uma vez porque... – não teve coragem de falar

 

--Porque tem medo que sua filha absolutamente deixe de te amar. – completou o raciocínio da outra – Aliás, você parece até alimentar dúvidas se ela te ama ou não. – bebeu mais um gole – De tudo posso lhe garantir: amor não se compra, meu bem! Não é evitando dizer não que você será mais amada.

 

Yesmin gastou uns segundos calada antes de voltar a falar. – Você deve ter razão... – concordou – Sabe que você tem sido uma psiquiatra melhor que Rogério? – brincou – E olha que ele ganha uma fábula por consulta! – revirou os olhos – Mas sinceramente o método dele me irrita! – bebeu um gole

 

Riu brevemente. – Eu cheguei a cursar uns períodos na Faculdade de Psicologia... – reparava na outra – Mas, falando nele, no seu marido... – passou a mão nos cabelos – Conte-me como foi que ele aconteceu na sua vida. – pediu interessada

 

--Foi na minha formatura. – respondeu de pronto – Ele era o melhor amigo de um rapaz riquinho da nossa turma. – lembrava – Eu fui a oradora e ele veio me abordar se dizendo impressionado com meu discurso. Eu tava super pra baixo e o interesse dele me levantou o astral. – sorriu – Achei ele um charme, a gente ficou na festa e depois disso ele continuou me procurando; de repente a gente tava namorando... – viajava no tempo – Em dois anos de namoro ele me pediu em casamento e eu pensei: gosto dele, é um cara de bons hábitos, o sex* entre nós é legal, amo a família dele e além de tudo são um clã rico e tradicional, o que mais eu poderia querer por agora? – gesticulava – Os pais dele me adoravam, sabe? Tinha que ver! – visualizava o rosto do casal na mente – Eles só tiveram filho homem e viam em mim a filha que desejavam ter. – pausou brevemente – Fiquei arrasada quando eles morreram. Stefany só tinha um aninho... – olhava para a mulher – Mas, enfim, esse é o resumo da ópera! – bebeu o último gole

 

--Interessante que você disse amar a família dele, mas não ele. – observou – Confessa pra mim, cariño: você não o ama, não é verdade? – provocou – Até porque, se amasse não aprontava tanto nas viagens de serviço, como pude constatar em Nova York! -- lembrava

 

Gastou uns segundos calada antes de responder. – Rogério foi uma paixonite, como outras que eu tive na vida. – confessou – Amor vem com o tempo e eu não posso dizer que não o ame... mas não é AQUELE amor, sabe? – desabafava – É que com o tempo eu me decepcionei também... – ajeitou-se na cama – Ele é muito acomodado, espera que eu resolva tudo... principalmente no que diz respeito a Stefany! Às vezes parece que sou mãe deles dois! – queixou-se – Tenho certeza de que se meu sogro, que foi um grande psiquiatra, não tivesse pavimentado o caminho pra ele, certamente Rogério não teria o sucesso profissional que tem! – pausou brevemente – Mas ainda assim eu não pulava a cerca. Fui fiel por muito tempo... – mirou um ponto no infinito – Foi depois de um escândalo que houve envolvendo uma ex paciente dele que eu deixei a fidelidade de lado. – apontou rapidamente para a outra – E nem adianta me perguntar sobre isso que não vou responder! – advertiu

 

--Sem problemas, meu bem. – achou graça – Mas e o tal AQUELE amor? – prestava total atenção na engenheira – Algum dia aconteceu?

 

Abaixou a cabeça e sorriu saudosa. – Sim... – brincava com o lençol – Fui completamente apaixonada por um namorado que era parente de um dos ex sócios do baba... – lembrava do rapaz – Depois de um ano de namoro a família dele forçou pelo término porque diziam que a filha de um empresário fanfarrão e de uma artista libanesa de má fama não podia ser bom partido pra ele... – levantou a cabeça novamente – Acho que inventaram essa história de má fama pra maama porque descobriram algum tabloide antigo fazendo enxame da vida dela, sei lá! – fez um gesto – Eles eram bem ricos, ao contrário de nós que estávamos caindo ano após ano por causa das putarias do baba! – afirmou com mágoa – Por fim, a lição foi: as classes não devem se misturar! -- deixou a taça sobre a mesinha mais próxima

 

--E você concorda com isso? – bebeu o último gole também – Pode ser complicado juntar os extremos, mas eu não tenho problemas com essas coisas. – deixou a taça em outra mesinha – Na cama nada disso faz sentido!

 

Riu brevemente. – Um relacionamento não é só a cama, Carmen! – salientou – E na cama, com certeza, nenhum problema! Fora dela... – suspirou – É complicado... – gastou uns segundos calada antes de voltar a falar – Você... algum dia esteve com um homem? – perguntou curiosa

 

--Nunca! – respondeu de imediato – E segue confissão: -- fingiu que cochichava – perdi a virgindade com um falo que eu mesma fiz usando papelão, papel higiênico e plástico! – riram juntas – Só tive mulher na minha vida! – pausou brevemente – E a primeira aconteceu aos meus 17, quase 18 anos.

 

--Perdi a virgindade com essa idade também, mas não foi com um falo de mentirinha! – riram novamente – E como foi essa história? – queria saber – Com essa idade você ainda morava com a família, não?

 

--Por supuesto! (Certamente!) – sorria – Mas quando uma professora conhecida e respeitável da cidade convida sua filha para um almoço festivo porque ela acabou de ganhar uma bolsa de estudos nos Estados Unidos, não há mama que veja mal nisso! – lembrava – Aceitei o convite com a barriga cheia de mariposas e nem esperava que a sobremesa seria eu! – brincou – Aquela professora era meu sonho de consumo e eu simplesmente amei a comemoração!

 

Não sabia o que dizer. – É, né? – passou a mão nos cabelos – Que bom que você gostou.

 

--Você gosta do jogo de sedução, Yesmin! – sentou-se na cama – De reparar no ambiente, escolher um homem e decidir: é aquele ali que eu quero! – jogava um charme – Mas posso lhe dizer que entre mulheres tudo isso é muito melhor e mais rico! – garantiu

 

--Não duvido. – desviou o olhar

 

--Quando a professora Marina me tocou pela primeira vez... – pousou a mão direita sobre a canela da outra – com aquele toque suave e firme ao mesmo tempo, -- ficou de quatro na cama – minha pele pareceu incendiar...

 

--Carmen... – olhou surpreendida para a outra – Eu acho que essa conversa tá tomando um rumo meio...

 

--Caliente? – interrompeu a fala da CEO – Não quer saber como foi quando ela... – aproximava-se engatinhando – veio percorrendo meu corpo inteiro com a ponta da língua? – seguiu lambendo o abdômen da outra desde o cós da calcinha até o bojo do sutiã mantendo a língua rija – E quando removeu meu sutiã com os dentes? – fazia tudo lentamente conforme narrava

 

Yesmin sentiu o corpo todo arrepiar. – Carmen, eu... – não sabia o que fazer

 

--Estamos na golden age, meu bem! – mordiscou-lhe o bico do seio direito – E deliciosamente preparadas... – falava com voz hipnótica – Bem ou mal, -- lambia a pele diante de si, exalando ar quente sobre ela – somos duas sobreviventes... – mordeu-lhe o queixo – Você não é o tipo da boa menina... – olhava nos olhos – Então vem comigo? – lambeu-lhe os lábios – Te quiero! – afirmou possessiva

 

Por instantes pareceu à engenheira que aquela mulher sedutora e sofisticada diante de si assumia a imagem de Zaida, em toda sua simplicidade. Sentia-se confusa.

 

Sentou-se no colo de Yesmin, removendo lenta e sensualmente o sutiã e a calcinha, que era presa por lacinhos na lateral. – Já devassamos o nosso passado... – continuava falando com voz hipnótica – então vamos explorar o presente! – uma Carmen/Zaida dizia com um sorriso sedutor – Vem!

 

“Memories consume (Memórias consomem),

Like opening the wound (Como se abrissem a ferida),

I'm picking me apart again (Eu estou me criticando de novo)...”

 

Guiada pelo mais puro desejo, Yesmin segurou a outra pelos cabelos da nuca e a beijou com paixão, deitando-se sobre ela.

 

“You all assume (Vocês supõem),

I'm safe here in this room (Que estou segura aqui neste quarto),

Unless I try to start again (A menos que eu tente começar de novo)...”

 

Carmen inverteu as posições e seguiu beijando, lambendo e mordendo o corpo da engenheira em direção ao sex* dela. Removeu-lhe a calcinha e sorriu para si mesma antes de mergulhar boca, lábios e língua onde mais desejava.

 

--AH!!!! – a CEO gem*u alto

 

“I don't want to be the one (Eu não quero ser aquela),

Who the battles always choose (Que as batalhas sempre escolhem),

'Cause inside I realize (Porque, por dentro, percebo),

That I'm the one confused (Que eu sou a única confusa)...”

 

“Zaida...” – Yesmin chamava dentro da mente

 

“I don't know what's worth fighting for (Eu não sei pelo que vale a pena lutar),

Or why I have to scream (Ou por que tenho que gritar),

I don't know why I instigate (Eu não sei por que provoco),

And say what I don't mean (E digo o que não quero dizer)...”

 

Totalmente tomada pelo desejo, a engenheira novamente mudou as posições e seguiu uma trilha de beijos e mordidas diretamente até o sex* da parceira, que gem*u satisfeita.

 

“I don't know how I got this way (Eu não sei como fiquei desse jeito),

I know it's not alright (Eu sei que isso não está certo),

So I'm breaking the habit (Então, estou quebrando o hábito)...”

 

Yesmin não queria pensar em mais nada, acreditando que tudo aquilo seria só por uma noite e nunca mais.

 

“I'm breaking the habit (Estou quebrando o hábito),

Tonight (Esta noite).”

Breaking the Habit. Intérprete: Linkin Park. Compositor: Mike Shinoda. In: Meteora. Warner Bross, 2004. 1 CD (3min16)

(Nota da autora: alterações da autora em itálico na tradução)

 

 

Fim do capítulo