Capitulo 48 – Foi por pouco
Camila
Nos últimos dias o nome de Helen foi foco de vários noticiários. A repercussão do caso foi nacional, devido a operação que se iniciou com a acusação do governador, vários outros nomes apareceram durante as investigações. Alguns nomes políticos, outros do meio empresarial. O esquema foi descoberto antes que o governador pudesse fazer um acordo para delatar seus comparsas e conseguir privilégios para o seu caso. Essa sem dúvida foi mais uma vitória para Helen.
Helen passou uma semana em Nova Esperança. Dessa vez não pude acompanhá-la. Para mim é estranho chegar em casa e encontrar tudo em total silêncio. Foram poucas as vezes que nos falamos durante o dia. Na maior parte estamos em ligação apenas na hora de dormir. Paro o carro na garagem depois de um dia longo de trabalho.
Hoje é sexta à noite. Até pensei em ir de surpresa encontrar com Helen, mas ela me garantiu que volta cedo na manhã seguinte. Antes de entrar em casa, meu celular toca. Na tela aparece o nome do meu irmão. Encaro a tela disposta a ignorar a chamada. Coloco o aparelho no bolso.
- Que safada, me ignorando.
- Aí! Samuka, que susto. – Digo sentindo meu coração saltando no peito.
- Deveria morrer de susto. Quem já se viu recusar uma ligação minha? Eu sou seu irmão. Poderia estar morrendo, sabia? – Diz indignado.
- Mas você não está. Dramático. – Ele sorri.
- Não estou, mas poderia. Só precisava conversar com você. Podemos ir beber algo, o que me diz?
- Eu estou cansada, Samuka.
- Só um drink. Sei que está sozinha. Eu estou precisando de conselhos da minha irmã mais velha.
- Tudo bem. Um drink. Entra, vou tomar um banho e depois saímos. – Abro a porta dando passagem para que ele entre. – Fique à vontade. Já volto.
Quando entro no quarto já tiro minhas roupas indo para o banho. Tomo uma rápida chuveirada, enquanto escolho algo para vestir ligo para Helen avisando que vou sair, ela não atende então mando uma mensagem de texto. Escolho uma camiseta preta e um short curto, a noite está quente.
- Prontinho.
- Ótimo. Podemos ir? Eu preciso mesmo de uma cerveja gelada ou duas. – Passa os braços em volta dos meus ombros.
Logo que alcançamos a garagem jogo a chave em sua direção deixando que ele dirija. Enquanto seguimos o percurso Samuel me conta sobre como andam as coisas no escritório. Estou fitando a tela do celular, na esperança de que Helen me respondesse.
- Está tudo bem?
- Sim! Sim, claro. Eu só...
- Estava encarando o celular como uma obsessora. – Ele ri de canto.
- Desculpa. É que avisei a Helen que ia sair, mas até agora ela não leu a mensagem.
- Vai ver que ela ainda está trabalhando. Sabemos bem o quanto esse caso tem sugado dela.
- Eu sei. Não consigo deixar de temer pela vida dela.
- Mana, relaxa. Se algo tivesse acontecido a essa altura já saberíamos.
- Você tem razão. – Afirmo.
Paramos o carro em frente ao bar que costumávamos frequentar. Sentamos na mesma mesa e logo fomos atendidos. Samuel brinca com o dedo na borda do copo.
- Sei que tem algo fazendo seus neurônios queimarem. Posso sentir o cheiro daqui. – Brinco tomando um longo gole enquanto escondo um sorriso.
- Muito engraçada. – Debocha. – Mas sim. Tem algo me fazendo gastar as últimas quilometragens de neurônios que me restam.
- Certo. Então me diga o que está acontecendo. – Inclino-me em sua direção.
- Beto e eu, nós trans*mos. – Diz nervoso.
- Uau! Nossa!
- Camila, diz algo que não seja apenas expressões de surpresa. – Pede.
- Foi bom? - Questiono rindo.
- Isso é o que você quer saber? – Faço que sim com a cabeça. Ele sorri, balança a cabeça desacreditado. – Sim. Foi bom. – Confessa.
- Então qual a preocupação?
- Nós trabalhamos juntos.
- E?
- Qual é. Você mais do que ninguém deveria saber que não dá certo se envolver no trabalho. – Ele me fita sério.
Suas palavras me cortam como se uma faca penetrasse minha carne. Ajeito-me na cadeira, passo a ponta dos dedos na borda do copo. Sei bem que ele está falando sobre Mariana, mas não quero falar dela, ou nela.
- Minha história foi diferente. Você sabe disso. Não foi complicado namorar com Mariana, não foi isso que nos separou. Foi traição. – Digo por fim.
- Eu sei. Mas depois que terminaram você mudou toda sua vida por conta de um coração partido.
- O que você esquece é que às vezes podemos tirar uma coisa boa de algo ruim. Tudo bem que meu coração foi partido, e concordo que eu não merecia ter sido tratada daquela forma, porém, tudo que houve me trouxe para os braços de Helen. Esse é o meu algo bom. Aliás é o meu algo maravilhoso. Nunca estive tão feliz. – Afirmo.
- E quem garante que se eu também quebrar a cara e o coração vou encontrar o amor da minha vida como você? Nem todo mundo tem essa sorte.
- Eu prefiro acreditar que coisas boas acontecem. Independente de ser sorte ou não.
- O que eu faço?
- Sexo. Quantas vezes vocês quiserem. Mas antes conversem para as coisas não se misturarem. Deixem claro que o relacionamento pessoal não pode interferir no trabalho. Pelo amor de Deus, Samuka! Vocês dois são adultos não tem por que evitar o assunto.
- Falou a pessoa que fugiu sem conversar. – Debocha. Novamente sinto um nó se formar em minha garganta.
Sei que agi de forma errada. Mudar minha vida da forma que mudei apenas por Mariana ter me traído, não ter dado a chance de ela falar, fez com que parecesse que eu só quis sair de perto. E essa foi toda a verdade. Tive medo de ouvir sua explicação e simplesmente me deixar levar por sua conversa. Afinal eu a amava, não estava imune ao que sentia por ela.
- Eu sei que agi errado. Talvez por medo.
- Medo?
- Sim. De escutá-la, e acreditar em sua versão dos fatos. E depois sofrer mais.
- Você deveria tê-la ouvido. – Afirma. – Ela se sentiu culpada por muitos anos, sabia? Quase todas as noites ia para o apartamento e chorava conversando com Diana. Ela te amava. – Dou uma risada de canto.
- Quem ama não trai. – rebato. – Ela não se importou com o amor que eu sentia.
- Pelo contrário. Você não consegue ver? Ela esperou que você voltasse.
- Ela está namorando a Charlotte. – Conto.
- O que você queria que ela fizesse? Esperasse que o seu conto de fadas acabasse? Mariana precisava seguir a vida dela. Você nunca se importou com o que ela tinha a dizer. Mas não ache que ela não te amou. Isso seria injusto da sua parte.
- No dia que fomos para o jantar de Diana. Charlotte fez questão de contar que estamos tentando engravidar. Vi nos olhos de Mariana a decepção. Ela queria ter filhos comigo. Aquele era um sonho dela.
- Espera! – Ordena. – Você e Helen vão ter filhos? Eu escutei direito?
Só então percebi que ainda não havia contado a ninguém. Samuel me fita com os olhos arregalados, esperando que eu diga algo.
- Sim. Estamos. Mas ainda é segredo. Não falamos para ninguém, você é o primeiro a saber. – Conto sorrindo.
- Que maravilha!!! Eu vou ser tio. – Abraça-me.
- Sim vai. Me jure que não vai dizer nada a mamãe.
- Juro. Vamos tomar mais uma para comemorar. – Diz sorrindo e pedindo mais cerveja.
Samuel aproveitou a desculpa de ser tio para encher a cara. Levei-o para casa passava da meia noite. Com dificuldade consegui colocá-lo na cama. Tranquei a porta da frente com a minha chave e fui para o carro. Ao chegar na rua em que moramos percebi algo estranho. As luzes estavam acesas, o portão da garagem estava no chão. Desliguei o carro, procurei meu revólver no porta luvas. Sim, temos porte de arma, foi uma das minhas exigências juntamente com aula de autodefesa. Sai do carro, ficando atrás dele. Disquei o número da polícia, me identifiquei e pedi ajuda.
A polícia levou cerca de 10 minutos para chegar. Expliquei o que havia acontecido, eles pediram para eu ficar do lado de fora enquanto eles averiguavam se havia alguém lá dentro ainda. Levou cerca de quinze minutos até que eles voltassem.
- É seguro entrar, mas não sei se a senhora vai gostar de ver sua casa no estado que está.
Ignorando completamente o que ele falou corri para o outro lado da rua em direção aos portões caídos na calçada. O cenário era um verdadeiro campo de guerra. Tudo estava fora do lugar, poltronas soltavam penas devido aos tiros que receberam, as paredes cheias de buracos. Meu estômago revirou, se eu tivesse ficado em casa eles teriam me matado. Imediatamente peguei o celular para ligar para Helen.
- O que aconteceu aqui? - Sua voz surgiu atrás de mim, virei-me em sua direção aliviada por ela estar bem.
- Amor! - Abracei-a. - Eu não sei, quando voltei percebi que algo estava errado. Se eu não tivesse saído com Samuel eles teriam me matado. - Tal constatação me fez gelar.
- Não quero nem pensar nisso. - Apertou-me em seus braços. - Já conseguiram acesso às câmeras?
- Sim. Estamos fazendo isso agora. - Uma policial respondeu.
- Ótimo. Muito obrigada pessoal. Vamos, meu bem. Precisamos sair daqui.
Eu não conseguia assimilar nada ao meu redor. Tudo parecia meio fora de órbita, sinto um tremor nas mãos, uma náusea subindo até minha garganta, e por mais que eu tente não consigo pronunciar mais nenhuma palavra. Senti minhas costas tocarem o banco do carro que logo entrou em movimento. Helen fala algo para mim, mas eu não consegui compreendê-la. Ela fez algumas ligações e em seguida beijou meus lábios.
Já no quarto de hotel meu celular tocou e era a minha mãe. Helen quem atendeu.
- Sim, estamos bem. Ela não estava em casa, graças a Deus. - Colocou no viva-voz.
- Vocês precisam de proteção.
- Eu estou cuidando disso. Estamos em um hotel, há seguranças lá fora. Não precisa ficar preocupada. Pedi que mais dois ficassem ai com vocês e outro na casa do Samuel.
- Você acha que quem fez isso pode fazer algo contra nós?
- Sim, vocês são a única família que eu tenho. E para me calar irão tentar tudo.
- Certo. Vão me dando notícias.
- Pode deixar. - Encerrou a ligação. Ficou a minha frente, deixando seus olhos na altura dos meus. - Amor, vem. Vamos para o banho.
Pisquei os olhos devagar tentando assimilar o que ela me dizia. Me deixei ser conduzida para o banheiro.
- Você se sente melhor? - Perguntou enquanto lavava meus cabelos.
- S-sim. Um pouco. Acho que foi apenas o choque.
- Sinto muito que isso tenha acontecido por culpa minha.
- Ei! Não diga isso. Não foi sua culpa. Vamos apenas redobrar o cuidado. Até hoje não tivemos problemas. E sempre deixamos claro que se um dia isso acontecesse faríamos tudo para nos manter em segurança. - Beijei seus lábios, vi seus olhos marejados. - Vai ficar tudo bem.
- Eles poderiam ter te matado. - Lamentou chorosa.
- Shiii. Isso não aconteceu, estamos bem. Eu estou aqui. Vamos resolver tudo. Acho que posso trabalhar de casa uns dias.
- Que casa? Não vamos voltar para lá.
- Podemos ficar no hotel que você estava, ou ir para outro. Vamos resolver isso.
- Como vamos colocar uma criança no meio disso tudo? - Seus olhos estavam aflitos.
- Quer adiar?
- Não! Esperava que você dissesse que tudo iria ficar bem. Você quer adiar?
- Eu quero o que você quiser. Se precisarmos esperar que ele seja condenado, faremos isso. Mas acredito que não devemos parar nossa vida por conta dos criminosos que invadiram nossa casa.
- Então a gente vai iniciar com as injeções?
- Sim. Claro. Podemos fazer isso amanhã mesmo. Vai ficar tudo bem, eu te prometo.
Nos beijamos e eu não consegui dormir. Passei a noite em claro velando o sono de Helen e pensando em como as nossas vidas iriam mudar dali para frente, também me questionei se seria uma boa ideia tentarmos engravidar em meio ao caos. A única certeza é que passaremos por tudo juntas.
Fim do capítulo
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