A proposta
― Do que a senhora está falando?
― Ah, Teodora – ela deu um sorriso sarcástico – não tente mentir pra mim. Está escancarado que vocês duas tem alguma coisa.
Pressionava minhas mãos com força, tentando a todo custo esconder meu nervosismo e o suor frio que vinha nas palmas delas.
― Mas... – e deu com os ombros, revirando os olhos, como se falasse qualquer aleatoriedade – Nada que eu já não tivesse percebido, pra ser sincera.
― Como a senhora... – procurava as palavras que me faltavam – desconfiou?
― Minha filha – ela voltava a rir, apontando pra mim – você é muito óbvia. É só olhar pra você que dá pra saber que no mínimo tu beija boca de mulher, né?
Minhas bochechas coraram quase que de imediato, desviando o olhar para baixo.
― E outra, é só juntar uma coisa com a outra. Toda essa sua proximidade com ela – ela esfregava os indicadores um no outro – o fato de você não querer ir pra casa do seu pai, ela ter ido lá pra sua casa...
Não é como se quiséssemos esconder isso, de um jeito ou de outro.
― E outra, querida, vocês não se olham como amigas – minha tia negava com a cabeça – vocês se olham de um jeito que a gente olha pra uma pessoa que a gente quer...
Falar daquilo era constrangedor demais para mim, mas, uma coisa tinha que ser dita.
― Isso seria um problema?
― Para o seu pai? Não – ela negou de antemão – Para mim? Menos ainda. Pra sua avó e Simone? Com certeza! Ainda mais sendo quem é.
Respirei fundo, deixando o ar fugir da minha boca.
― Relaxa, tá bom? – ela apoiou a mão em meu ombro – E só que seria legal que você ao menos comentasse com seu pai sobre isso, porque, sinceramente, Teodora... Eu acho que ele desconfia, mas tem vergonha de perguntar.
― Não sei como fazer isso...
― Não quero que pareça que estou te forçando a isso – ela cerrou os olhos, voltando a me encarar – só estou comentando que, quando você quiser falar sobre ele vai te entender, e provavelmente vai ficar feliz em saber que a filha se sente bem em compartilhar esse tipo de coisa...
Olhei-a timidamente por um segundo, e desviei o olhar de novo.
― É como se você desse um voto de confiança.
O carro dele chegou, descendo logo os vidros. Ela desconversou, gesticulando para que entrasse logo.
― E aí, meninas? – ele perguntou assim que entramos – Gastaram muito?
― Investimos em nós mesmos – Patrícia ponderou – é diferente.
Não que eu nunca pensasse que um dia esse assunto viria à tona, mas, não era algo que vinha em minha cabeça naquele momento. Primeiro porque tinha outras preocupações, e outra pelo fato de que isso nunca tinha sido um problema pra mim. Nunca cheguei e falei pra minha mãe sobre mim. Ela só sabia, e tratou com muita naturalidade. Não só ela como minha tia, então ter que expressar sobre as pessoas que me interesso não deixava de ser estranho.
A única coisa que ela sempre me alertava era sobre os outros, já que não sabíamos como eles podiam reagir e, provavelmente, não eram todos que pensavam igual a elas, por exemplo.
Mas, se minha tia falava aquilo, não era por nada. Conclui que ele deve ter citado isso a ela em alguma de suas conversas e não teve coragem de falar nada, então se viu no papel de dar um empurrão para que isso acontecesse.
― Acho incrível o fato de que você seja tão lerdo que não percebeu o que fizemos no nosso cabelo, Tadeu!
― Ah... – ele olhou rapidamente para nós duas – É, ficou ótimo. Gostei como ficou, ficaram bonitas.
Ele não deveria saber dizer o que tinha mudado ali, mas só concordou para não parecer insensível sobre nossa aparência.
Chegamos, e ela logo foi para o quarto comigo. Arrumamos as roupas, e ela saiu para atender uma ligação. Me vi sozinha ali, então desci as escadas, e a vi conversando com meu pai em seu escritório.
Enquanto ia para o lado de fora e encarava o terreno que sumia de vista em minha frente, eu me perguntava o que faria dali em diante.
Fiquei por um tempo absorta em pensamentos que iam desde meu lugar no mundo a como entraria no assunto com o meu pai. O que eu poderia fazer para que ele percebesse que meu relacionamento com Catarina fosse além da amizade?
Até que cheguei em uma conclusão que poderia ser arriscada demais, mas que valia a pena tentar. Era uma possibilidade que passava em minha mente desde que havia sido comentado, mas parecia irreal demais. Agora, achava que não poderia ser tão ruim quanto parecia.
E, provavelmente, era a opção perfeita para o que queria.
De noite, enquanto estávamos reunidos na mesa, olhava para eles de relance, mas a coragem de falar sobre me travava completamente. Encarava meu pai, que jantava em silêncio, e de relance voltava os olhos para minha tia.
― Você quer falar alguma coisa, Téo?
Surpreendi-me ao ver que essa pergunta tinha sido feita pelo meu pai, que se servia mais enquanto eu sequer tinha mexido no prato tamanha tensão.
― Posso convidar a Catarina?
― Para vir pra cá agora?
Minha tia engolia em seco diante a pergunta dele, tentando esconder o sorrisinho de canto.
― Não, para... – cerrei os olhos, me servindo de água – O jantar do final de semana.
Ele emudeceu. Ficou alguns segundos estático, até que levantou uma das sobrancelhas, curioso.
― Eu não sei se é uma boa ideia, Teodora.
― Por que não seria? – minha tia rebateu.
― Você sabe muito bem qual é o posicionamento delas com qualquer um dos Martins – seu rosto foi tomado pela expressão franzida – principalmente com ela.
― Mas, elas são amigas – Patrícia voltou a dizer – e Teodora não tem nada a ver com isso, até onde eu saiba.
― É melhor evitar confusão...
― Seria importante pra mim se ela fosse.
Sequer sabia dizer de onde tirei coragem para falar aquilo. Ambos me olharam antes de se entreolhar. Minha tia se prestou a dar de ombros, como se confirmasse o que tivesse acabado de falar.
― Mas, Téo, elas não se gostam... – seu olhar era sério – Acha que Catarina ia gostar de estar lá?
― Acho que ela estaria por mim... – engoli em seco – E não pelos outros.
Sem contar que ela foi enfática quando disse que gostaria de estar lá quando finalmente as coisas fossem jogadas na mesa.
― E não é como se dona Maria tivesse alguma moral pra falar qualquer coisa, não é, Tadeu? – minha tia o olhava sério – Não depois de tudo que ela fez contra ti e tua família que está bem do teu lado.
Ele coçou a nuca, expirando como se ouvir aquilo o tivesse atingido. Não falou mais nada, mas, estava visivelmente inquieto. Minha tia também não insistiu, e assim se seguiu até o resto do jantar.
Quando fui lavar a louça, o vi se apoiar na bancada ao meu lado, de frente para a sala. Olhava para longe quando começou a falar.
― Escute, minha filha... – e me olhou de relance enquanto colocava o prato no escorredor – Sei que Catarina não faria nada demais, mas, o que me preocupa é a reação da sua avó, ainda mais com tudo que anda acontecendo e...
― É que não vai ser fácil pra mim ter que olhar pra sua mãe, sabe, pai? – cerrava as sobrancelhas, tentando não pensar em toda aquela situação – Então, pensei que ter alguém próximo fosse me deixar melhor...
― Você não tem outra pessoa que queira levar? – ele dizia entre os dentes – Não sei, até mesmo Cristiano seria melhor... Ele não é seu amigo?
― Não tanto quanto ela.
Não conseguia dizer aquelas coisas olhando para ele. Tentava me concentrar na tarefa para poder fugir do real teor daquela conversa.
― Levar Catarina Martins pra mesa da nossa família seria a mesma coisa de dar um tapa na cara de sua avó, Teodora...
― Não, pai – engoli em seco, terminando de lavar o último prato – um tapa na cara foi saber que a sua mãe me escondeu do senhor de propósito e fez minha mãe se sentir horrível e sozinha.
Enxuguei minhas mãos e me voltei pra ele, que parecia estar assustado com o que tinha acabado de ouvir.
― Eu realmente não ligo pro que ela vai achar de mim ou os absurdos que ela acha de Catarina – dei com os ombros, colocando o guardanapo de lado.
Tadeu cravou os dedos contra a bancada, respirando fundo mais uma vez. Pressionou os lábios e negou enfático com a cabeça.
― Você realmente quer comprar essa briga, Téo?
Deixei o ar escapar devagar pelos meus pulmões, e mordi os lábios com notável firmeza.
― E o senhor, não?
Ele nada disse, indo apenas embora. Eu já esperava essa resposta.
Segui para meu quarto, e tentei me distrair conversando com ela e com minha mãe. Não citei para nenhuma delas a sugestão que tinha feito.
Em um determinado momento, alguém bateu na minha porta. Falei para entrar. Era meu pai, que ficou parado lá mesmo, com as mãos para trás, olhando para o outro lado.
― Se isso é importante para ti, então também é importante para mim.
E se voltou para minha direção, já com o olhar mais sério, deixando longe o ar temeroso que estava antes.
― Pode chamá-la. Amanhã dou um jeito de colocar um lugar para ela, tá bom?
Assenti que sim, e antes que ele fosse, chamei sua atenção.
― Pai?
Ele se virou no mesmo instante.
― Obrigada.
Sua resposta foi um sorriso contido seguido de um breve aceno, antes de desejar boa noite e fechar a porta.
Peguei o telefone e tentei esconder a euforia em mandar uma mensagem fazendo o convite. Quase que de imediato, ela respondeu.
“Com certeza eu irei contigo, Téo. Não perderia isso por nada.”
Fim do capítulo
Eu também não perderia isso por nada rs
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Marta Andrade dos Santos
Em: 08/05/2024
Eu também não vou perder kkkkk.
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