Dezembro chegou carregado com muitas tensões: maama e suas crises de ansiedade noturnas que me deixavam louca, Bianca, seus problemas familiares e a pressão sobre mim. As coisas no trabalho também andavam a mil, com a correria do fechamento do ano letivo e de todos os relatórios de projeto que deveriam ser entregues. Como Deus sempre dá um refresco, tivemos o prazer de sediar na Universidade uma feirinha de robótica com a participação das crianças e jovens das redes de ensino fundamental e médio. Suellen me surpreendeu por ter sido a principal responsável pela organização. Mas, como nada é perfeito, maama teve que ir de cadeira de rodas para aguentar permanecer na feira durante toda a tarde. Fingi naturalidade, mas foi algo que me machucou profundamente; ainda mais do que quando vi tia Jandira como cadeirante pela primeira vez há anos atrás.

 

--Espia quanta coisa interessante que esses menino fizeram, dona Suhaila! – Rute observava com atenção – Fico besta de ver tanta inteligência! – estava admirada – Benza-te Deus! – empurrava a cadeira da paciente

 

--E não é? – concordou animada – Ói essa ruma de robozinho por todo canto! – apontou

 

--Pelo que vejo o único robô que a senhora não é gosta é o que lhe toma conta, né, maama? – provocou brincalhona – Mas eu fico feliz que estejam gostando da feirinha! – Camilla exclamou sorridente – Maama, -- abaixou-se perto da mulher mais velha – não tô empurrando sua cadeira porque tenho que dar atenção a muitas pessoas aqui, mas fiquei feliz em ver que a senhora se animou! – beijou a testa dela – “Especialmente depois de ter chorado tanto por ter que usar essa cadeira.” – pensou disfarçando a tristeza

 

--Eu não gostei de vir sentada nesse troço, -- referia-se a cadeira – mas não fosse isso não ia poder ver o que tem aqui, né? – comentou mais conformada

 

--Isso é passageiro, tenha certeza e fé! – beijou-lhe a testa novamente e esticou o tronco – Dona Rute, leva maama pro lado de lá pra ver a parte das crianças mais novas, por favor. – olhou para a cuidadora

 

--Vamo! – concordou de pronto – Simbora, dona Suhaila! – seguiu animada

 

A professora cruzou os braços e ficou apenas observando. “Agora é contigo, Suellen!” – pensou ao sorrir

 

***

 

--E aqui deste lado temos as crianças das Escolas Estaduais e Municipais. – Suellen dizia – Começo apresentando a representante da Escola Estadual de Casa Amarela e o destaque do robô garrafa, que tem quatro canetinhas como pernas e consegue desenhar enquanto se move. – sorriu – Quer explicar como ele funciona, Astraia? – perguntou à menina

 

--Minha Nossa Senhora! – Rute levou as duas mãos ao peito – Essa menina é... – o coração disparou

 

--Eu vou explicar! – Astraia respondeu animada – A gente bem pegou uma garrafa PET vazia, cortou no meio, botou olho, -- apontou para os olhos de papel colados no corpo da garrafa – colou quatro canetinhas ao redor dela e botou dentro o motorzinho que a tia Suellen deu. – explicava olhando para os adultos – Aí, quando bota a pilha no motor, o motor funciona e faz o robô tremer. – gesticulava – E nisso de tremer, ele se mexe e no que se mexe bem pinta no papel! – sorriu orgulhosa ao concluir

 

--Que menina inteligente! – Suhaila sorriu para a criança – Parabéns, filha! Eu gostei muito! – cumprimentou animada – Gostasse, Rute? – olhou para trás para ver a mulher – Visse, como é que essa menina pode fazer robô até com garrafa velha? – perguntou. Estava ciente de quem era a menina

 

--Eu, eu... – a cuidadora não sabia o que dizer. Os olhos estavam marejados

 

--Ela se dedicou muito pra chegar até aqui. – Suellen fez um breve carinho na cabeça da menina – E com o pouco tempo que tivemos, é de se orgulhar! – piscou para Astraia

 

Rute se aproximou da menina e se ajoelhou. – É de se orgulhar... – derramou algumas lágrimas de emoção – Orgulho da vovó... – olhava embevecida para a criança – Orgulho da voínha... – tocou-lhe o rosto suavemente – Orgulho... – não resistiu e a tomou nos braços

 

--Vixe! – Astraia se surpreendeu sem entender aquele abraço

 

--Ela é sua avó, meu bem. É que você não lembra mais... – uma mulher falou humildemente ao se aproximar – Era muito novinha quando... nos afastamos. – parou a uma curta distância  – Dela a senhora pode se orgulhar.

 

--Rebeca?! – Rute rompeu o abraço e se levantou surpreendida olhando na direção da voz

 

--Quis Deus que sua neta viesse a participar dessa feira, dona Rute. – Camilla estava parada ao lado de Rebeca – E quis Deus que vocês se encontrassem pra nunca mais se separar. – falava com carinho – Maama me ensinou que com Deus e Jesus não se discute, então não se atreva! – sorriu

 

--Aproveite agora pra não se arrepender depois, mulher! – Suhaila aconselhou – Já perdesse tempo demais com peitica! -- gesticulou -- Depois que morre, baubau! Aí vai chorar no colo do Capeta!

 

--Maama... – a professora balançou a cabeça achando graça

 

Rute não verbalizou palavra e puxou a filha para um abraço que as fez chorar como em um reencontro inesperado, porém muito desejado. Suellen estimulou Astraia a se unir a ambas e ela assim o fez.

 

--Parabéns pra você também, minha cara aluna orientanda! – Camilla cumprimentou Suellen falando em voz baixa – A tia tá orgulhosa! – brincou

 

Achou graça e levou as mãos aos olhos para rapidamente secar as lágrimas que ameaçavam rolar. – Acho que descobri o que realmente quero. – olhou para a morena – Ser professora! – pausou brevemente – Como você! – sorriu

 

--Bem-vinda ao time! – Camilla saudou sorridente

 

***

 

--Olha, eu tô besta com essa festa de casamento! – Camilla comentou com as outras mulheres – Salão imenso, decoração refinada, um monte de convidados e várias novidades high-tech! – gesticulou brevemente – Não aguentei aquele espaço Tik Tok! – apontou discretamente – O povo tá se esbaldando, criando vídeos e a hashtag casamentorai&tuyeufui tá simplesmente bombando! – bebeu um gole de soda

 

--Eu também tô besta, não sabe? – Elzira concordou reparando no ambiente – Parece que em toda parte tem drone só filmando a gente e o DJ já fez cada efeito especial que nunca vi!

 

--Pois foi só disso que não gostei, dessas peste voando na minha cabeça! – Suhaila fez cara feia – Tô a ponto de dar um tiro em um! – deu uma colherada

 

--Dar tiro como, maama? – achou graça – Cadê o revólver? – brincou e todas riram

 

--Pois eu pego um troço qualquer e jogo nele, não sabe? Inda tenho boa mira! – garantiu -- Comadre, ói, -- olhou para a outra -- essa festa aqui deve de tá custando os olhos da cara, visse? – Suhaila reparou – E que comida boa! – deu outra colherada

 

--É por isso que a lista de presente de Raimundinho foi como foi! – Leyna concluiu – Com o tanto de dinheiro que deve de ter sido gasto nessa festa, acabou faltando pra todo resto! – reparava em tudo – Se bem que quem pagou essa conta aqui foi meu filho e o sogro. – considerou – Sei não! – fez um gesto de desprezo

 

--E cá pra nós, com todo respeito dona Leyna, que casal estranho! – Bianca reparava nos noivos – Raimundinho e Tuany quase nem se falam, ficam no celular teclando ou fazendo selfie o tempo todo! – achava graça – Parece que só conversam nas redes sociais! – bebeu um gole de vinho

 

--Eu não disse que eles se conheceram ontem? – Leyna lembrou – Estranho mais nada dessas doidiça! – deu uma colherada

 

--Esse bobó de camarão de vocês parece bom! – Camilla reparou no que a mãe e madrinha comiam – Quando passar aqui de novo, não vou deixar escapar! – sorriu

 

--Como sempre, comilona! – Bianca provocou brincando

 

--Eu tô de olho é na mesa de doces! – Elzira exclamou como criança

 

--Oi, família, tudo bem? – Lutfi se aproximou saudando – O casamento tá bonito, né? – sorria com um copo de cerveja na mão – Orgulho ver um filho casando! – olhava para as mulheres

 

--Tá tudo muito bonito, meu filho! – Leyna respondeu, no que as demais concordaram – E a comida e bebida tão da melhor qualidade. Nessa mesa ninguém pode dizer que tá sendo mal servido.

 

--Parabéns, Lutfi! – Suhaila cumprimentou – E a festa, Ave Maria! Danada de boa! – ajeitou-se na cadeira – Camilla, me levanta aqui que tá doendo! – pediu

 

--Já vou, maama! – levantou-se rapidamente para ajudar – É isso aí, Lutfi, tá tudo muito bonito! Parabéns! – cumprimentou

 

--Um luxo! – Bianca comentou olhando para o homem. Elzira balançou a cabeça concordando – Também tô adorando esse forró techno que tá tocando agora! -- sorriu

 

--E não é? – sorriu -- Deu trabalho, mas valeu a pena! – o homem bebeu um gole de cerveja – E que eles sejam felizes para sempre! – desejou

 

--Amém! – todas responderam

 

No momento em que um garçom se aproximava da mesa para servi-las, um estranho tumulto surpreendeu a todos.

 

--PUTA QUE PARIU, QUE PORRA É ESSA??? – Tuany gritou inesperadamente – CASASSE COMIGO HOJE E JÁ TÁ ME CHIFRANDO, SEU FUDIDO? – jogou sua bebida no rosto do noivo – DJ PARA DE TOCAR ESSA MERDA! – arremessou o copo vazio contra o homem que interrompeu a música bruscamente – HASHTAG TÔ PUTA E MUITO PUTA! – gritava histérica

 

--FICOU MALUCA, MERDA? – Raimundinho retrucou ao arremessar um pratinho de salgados contra a noiva – HASHTAG VOU TE PORRAR E LEI MARIA DA PENHA QUE SE FODA!

 

--VIXE??!! – Leyna e Suhaila exclamaram ao mesmo tempo

 

--Gentem, que babado forte! – Bianca prestava atenção

 

Camilla e Elzira ficaram boquiabertas. Lutfi se engasgou com a cerveja.

 

--EM MENOS DE UMA HORA DESSE CINCO CURTIDAS NO INSTA DE KEYLIANE! – Tuany acusou – ISSO É TRAIÇÃO E UMA FULEIRAGEM DA PORRA!! – continuava gritando – HASHTAG TRAIRÃO!

 

--TÁ PENSANDO QUE EU TAMBÉM NÃO TE VI STALKEANDO O FACE DE KLEBÃO? PENSASSE QUE EU NÃO TE VI CURTINDO O INSTA DE FABÃO E DE BRUNÃO? – Raimundinho respondeu no mesmo tom – POIS QUEM PROCURA ACHA, VISSE? HASHTAG RAPARIGA!

 

--Pense numa vergonha, que vergonha, aff... – Adalgiza ensaia um desmaio e cai abestalhada perto da mesa que o pai ocupava

 

--Minha mulher! – Lutfi saiu correndo para socorrer – Querida, calma! – pedia aflito – Meu sogro! – viu quando o outro homem desmaiou também

 

--Mas que fuleiragem é essa aí? – Suhaila estranhava o que se passava – Entendo nada!

 

--POIS EU VOU POSTAR NO MEU FACE MOSTRANDO O CABRA SAFADO QUE VOCÊ É! – Tuany digitava furiosa – TRAIDOR E AGRESSOR DE MULHER! – acusava – HASHTAG SOBREVIVI A UM FEMINICÍDIO!

 

--E EU VOU MOSTRAR PRA TODO MUNDO NO MEU INSTA A PIRANHA QUE TU É! – Raimundinho digitava nervosamente – O CASAMENTO SE ACABA AQUI, VISSE? – decidiu – HASHTAG NÃO SOU CORNO MANSO PRA CASAR COM RAPARIGA!

 

--Então o casamento acabou-se?? – o garçom perguntou estupefato – Vixe e agora?

 

--Pois acabou-se! – Suhaila respondeu de pronto – Então deixe essa bandeja toda de bobó aqui pra nós e vá simbora antes que sobre pra você. – aconselhou e o homem obedeceu – Camilla, enche o bucho! – pegou mais um pratinho

 

--Ah! – a professora prestava atenção no tumulto que havia tomado conta do lugar

 

--Eu vou lá na recepção pegar nossos presentes de volta! – Elzira decidiu ao se levantar – Se o casamento acabou-se não dá pra desperdiçar! – saiu da mesa quase correndo

 

--Aproveita e passa perto da mesa de doces! – Bianca aconselhou Elzira – Ela tava querendo tanto, né? – justificou-se para as demais

 

--Eu não acredito nisso! – Leyna estava chocada – Minha nora e o pai esparracado no chão, meu filho que nem barata tonta, meu neto e a ex futura esposa fazendo vexame na frente desse povo todo... – suspirou – É, comadre, só nos resta comer! – pegou um pratinho – E vamo de bobó!

 

--Será que ainda vão servir mais desse vinho? – Bianca perguntou ao beber o último gole – Acho que vou dar uma passada na cozinha pra ver se tem uma xepa! – cochichou para a namorada

 

A professora achou graça. – Esse deve ter sido um dos casamentos mais relâmpagos da história desse país! – pegou um pratinho – E vamos de bobó! Fazer o que, né?

 

Vários convidados faziam selfies e vídeos curtos no espaço TikTok repercutindo o fuzuê, enquanto os noivos continuavam batendo boca ao vivo e nas redes sociais.

 

***

 

--Ai, amore, só você pra me fazer dirigir por 11 horas a fio por causa de um casamento que acabou em menos de 24 horas! – beijou-a – Valeu pela comida e por aquele vinho maravilhoso que eu não conhecia! – beijou-a novamente – Sem contar do fuxico daquele pessoal gravando pro TikTok! Era um querendo aparecer mais que o outro! -- acharam graça

 

--Ah, minha linda, teve uma parte que foi massa, como a viagem, a empolgação pra festa... – a professora beijou a namorada – Até a parte do fuzuê foi engraçada, especialmente quando prima Elzira me aparece com nossos presentes devidamente recuperados e uma sacola cheia de docinho! – riram juntas – Nem sei de onde me tirou aquela sacola e como pode pegar tanto doce em pouco tempo!

 

--Esse ex casamento vai ficar pros anais! – Bianca acariciava o rosto da amada – Deu pena dos pais de Raimundinho que morreram de vergonha, mas fiquei passada com a grosseria dele, da garota... – beijou-a – Eu hein, é cada coisa!

 

--Também choquei! E o modo surreal como discutiam, a causa banal que gerou tudo aquilo... – suspirou – Fazer o que, né? Dinda também morreu de vergonha, mas tirou de letra comendo e bebendo enquanto o couro comia! – riram brevemente – Maama também não deixou passar, lavou a égua! – pausou brevemente – Pena que nos dois dias logo depois da viagem ela quase morreu de dor e teve crises de ansiedade absurdas... – lamentou – Aliás, nunca mais houve noite em que tais crises não acontecessem...

 

--É por isso que você não quer dormir aqui comigo? – perguntou melosa – Queria tanto passar a noite com você... – beijou-a sensualmente

 

Camilla e Bianca estavam na casa da advogada. Haviam acabado de fazer amor e estavam na cama e deitadas de lado, nuas, uma de frente para a outra.

 

--Já me dou por satisfeita de Elzira estar com maama agora, mas pra dormir tem que ser comigo, não tem jeito! – beijou a advogada– Ou melhor, pra deitar, porque dormir é praticamente tudo que não se faz naquela casa... – pausou brevemente – Tá tudo tão difícil, minha linda... Eu tive que fazer das tripas coração pra não chorar ao ver maama precisar de cadeira de rodas pra visitar a feirinha na universidade. – beijou-a mais uma vez e lentamente se desvencilhou para se sentar – Maama nunca mais evoluiu! A gente vai em médico, em centro, faz tantos tratamentos... acho que ela tá perdendo a esperança de melhorar e eu mesma luto muito pra não perder a minha! – confessou

 

--É claro que esse desânimo é normal. – sentou-se também – Mas não se entreguem a ele. – aconselhou com carinho – Vide o exemplo de minha mãe: outrora uma mulher chique e estilosa e hoje uma senhora caquética, que vive fazendo papel de besta nas mãos de tudo que é pilantra pra ver se amarra meu pai! – fez cara feia – E enquanto isso, ele tá lá, pensando que tem 20 anos e desfilando com garotona! – censurou

 

Camilla não comentou e se levantou. – Você vai passar as festas com sua família, né? – olhou para a outra – Maama quer ir pra Triunfo pra voltar só no dia 06 de janeiro. – informou

 

--Sim, eu vou passar as festas com a família. – Bianca confirmou – Até porque, né, amore? Tenho que me despedir... – referia-se à partida para a Suíça – Pelo menos no primeiro ano fora não pretendo voltar pra cá. – olhava para Camilla – Talvez só a partir do segundo.

 

--Tá bom... – balançou a cabeça pensativa – Quando eu voltar de Triunfo, a gente conversa e define nossa situação de uma vez por todas.

 

A advogada lançou-lhe um olhar que misturava esperança e medo.

 

***

 

--Ói, eu desejo uma boa viagem pra vocês tudo! – Rute dizia para as mulheres – Tem sido uma honra trabalhar nessa casa! – olhou para Camilla – E o que fizesse por mim, por minha neta... – calou-se brevemente para conter a emoção – Nunca vou ter como pagar, não sabe?

 

--Não tem o que pagar, dona Rute. – Camilla respondeu de pronto – Tente ser mais tolerante, mantenha a aproximação com sua filha, com sua neta e permita-se a chance de conhecer a companheira de Rebeca. – aconselhou – Sei que é um relacionamento estranho aos seus olhos, mas ela pode ser uma pessoa boa! E se faz sua filha feliz, se é boa pra sua neta...

 

--E pense numa outra coisa, mulher: sua filha podia ter se pegado com um cabra beberrão, safado e que ainda incestasse ela quando chegasse em casa! – Suhaila foi logo dizendo – Não é melhor ter uma genra do que um traste desse? – considerou

 

Camilla e Elzira acharam graça.

 

--Isso é... – Rute ponderou – Eu me confessei com padre Emílio nesse domingo, contei dessas coisa toda e ele me disse que Jesus não julgou. Então quem sou eu, né? – sorriu encabulada

 

--Às vezes a gente perde muito tempo insistindo com o que não presta, dona Rute, com ideias que não deixam a vida da gente andar! – Elzira falava mais para si do que para a cuidadora – Agora é hora de recomeçar, visse? – sorriu

 

--Eu escolhi recomeçar! – balançou a cabeça concordando – Chega de perder tempo com peitica, não sabe? – riu brevemente -- E vou ser eternamente grata a essa família! – os olhos marejaram – O que vocês precisar, vou tá sempre às ordens! – prometeu

 

--Calma, dona Rute, dia 06 de janeiro a gente já tá de volta! – a professora respondeu brincalhona – Deixe de falar assim que parece até uma despedida!

 

--Né isso não... – discordou gentilmente – É só uma promessa! – aproximou-se de Suhaila e a abraçou com força – Feliz natal e feliz ano bom pra senhora! Que 2024 venha com muita saúde e a senhora se livre desse sofrimento pra sempre! – desejou -- Se Deus quiser e Deus quer!

 

--Amém! – todas responderam de imediato

 

***

 

--Então, prima, como você sabe o recesso do Judiciário só termina no dia 20 de janeiro... por isso o escritório deu folga pra nós e a labuta só volta no dia 22. – Elzira dizia – Aí eu não venho pro Recife antes do dia 21, não sabe?

 

--Tudo bem, Elzira. – Camilla concordou – Mas, por favor... – pensava em como dizer – eu nem deveria dar pitaco, mas não vá botar tudo a perder. – aconselhou com carinho – Xarid anda muito mansinho, muito fofinho, só que...

 

--Quem ele quer é Aline Maria, eu sei. – completou a fala da outra – Já não me iludo mais, prima, e nem vou ficar dando cabimento. – suspirou – Lá no grupo de ajuda elas dizem assim: “quem não sabe amar a si mesma não pode amar ninguém e nem ser amada”. – gesticulou brevemente – Eu tô aprendendo a me amar e não vou voltar atrás nisso aí.

 

--Confio em você e vou pedir a Deus que te ajude a não fraquejar! – desejou

 

--Você e a tia têm sido minha força abaixo dEle! – sorriu emocionada – Não vou dar motivo de vergonha!

 

--Own, vem cá. – abriu os braços e a abraçou com carinho

 

***

 

--Bom dia, maama! – Camilla cumprimentou ao entrar no quarto – Acordando e levantando! – parou diante da mãe – Vamos encarar uma longa viagem de volta pro Recife, então é hora de começar a se cuidar. – ajudou-a se levantar – Até que hoje a senhora dormiu melhor. Quase não me chamou. – segurou as duas mãos dela

 

--Bom dia, filha. – olhou para a professora – Dormi não. Tava só matutando, não sabe?

 

--Matutando? – estranhou enquanto andavam – Bem, mas pelo menos essa matutação não lhe deixou ter crise de ansiedade. – sorriu

 

--Tive sim, mas acho que me controlei melhor, não sabe? – seguiam para o banheiro

 

--Já é um ganho. – entraram no banheiro – Suas coisas já estão aqui pra escovar os dentinhos. – apontou para a pia – Vou pra cozinha adiantar o café. Quando acabar a senhora me chama. – beijou-lhe a testa – Tá segura aí?

 

--Tô. – balançou a cabeça

 

Camilla seguiu para a cozinha e pegou o liquidificador. “Dinda é mesmo show!” – pensava – “Colocou meus irmãos pra dar uma geral na casa de maama e ainda fez umas comprinhas básicas!” – sorriu – Simbora labutar! – disse para si mesma

 

Após ajudar a mãe a se deslocar para a sala e sentar à mesa, a professora voltou para cozinha para finalizar a preparação do desjejum de ambas. Quando as duas mulheres terminaram a refeição, Camilla foi cuidar da louça. Deixou Suhaila sentada na poltrona para lhe aguardar.

 

--Pronto, maama! – voltava para a sala – Tudo limpinho. – sorria – Hora de tomar banho e se arrumar pra sair! – anunciou – A estrada nos espera!

 

--Eu não vou, filha. – respondeu simplesmente

 

--O que?! – não acreditava no que ouviu – Como assim não vai, maama? – parou diante da mãe – A senhora sabe que eu tenho que voltar hoje pra ir no Departamento essa semana e...

 

--Você volta pro Recife! – interrompeu a fala da filha – Sem mim!

 

--Ah! – não sabia o que dizer – Mas, maama, o que é isso? – ajoelhou-se diante dela

 

--Você já fez por mim tudo que podia. – respondeu mansamente – Agora é hora de eu desobrigar você e te deixar viver sua própria vida, não sabe?

 

--Mas, maama... – sentia-se perdida

 

--Vá simbora, Camilla. – tocou levemente o rosto da outra – E vá cuidar de sua vida pra ser feliz! – sorriu carinhosa – Eu deixo você ir! – afirmou mansamente – Então vá!

 

A professora não sabia o que dizer.

 

Fim do capítulo