Capitulo 37
Cap 37 - Acontecimentos premeditados
Depois que vi o carro do Doi Notícia chegando ao velório e a Bruna saindo dele, a minha atenção foi reduzida a de uma fuinha. Por mais que eu quisesse parar de pensar nela, eu não conseguia, me senti frágil, sem poder sobre mim. Voltei andando calmamente até a Isabelle, ela se mantinha no mesmo local que eu a deixei, próximo ao sofá e a entrada posterior, dando acesso a visão de todos. Olhei pra ela questionando se tinha visto alguma coisa relevante.
- Nada, nem imagino que o mandante esteja aqui - falou mais baixinho.
- Também não imagino e se estiver é alguém grande, que não passa suspeita tão fácil.
- Você está bem? Voltou estranha. Viu alguma coisa? - A Isa me perguntou passando a mão no meu braço, amigavelmente.
- Não, tudo bem. Só não gosto de velório.
- Acho que ninguém gosta, é uma sensação de finitude, fragilidade da vida - a Isa falou.
- Não gosto dessa dicotomia de dor, uns chorando e outros achando que é encontro de amigos. Isso me incomoda muito.
- Dicotomia? - ela riu - tá com um vocabulário de 5º ano de direito já. Pra mim você já está formada e é delegada já, só falta a nomeação, certificado.
- Esse pequeno e sutil detalhe, o diploma e a nomeação - rimos suavemente, finalizando nossa conversa. Eu me distraí mentalmente, mas a tensão da presença da Bruna me incomodava, me causava curiosidade. Saber que eu estou no mesmo espaço que ela, não dar o braço a torcer, mas esperar algo é horrível. É uma sensação que não experimento há muitos anos, se é que experimentei algum dia.
- Viu se o café dali é ok? - perguntou a Isa
- Ah, o cheiro é melhor que o DP e tem tanta gente tomando que eu acho que deve ser razoável - respondi para a Isa e contrai toda com a presença da Bruna vindo em minha direção. Quando percebi que estava vindo falar comigo, meu coração apertou e o ar parecia não poder entrar. Ela olhou fundo pra mim, como sempre indecifrável, com uma postura firme em seu meio metro de salto, meio metro de altura.
- Posso falar com você? - Me perguntou sutil, leve, em um tom sedoso, amigável. Rapidamente olhei para o lado, a Isabele olhava para frente, mas conheço ela, prestando atenção em tudo.
- Estou trabalhando agora - respondi firme, sem me permitir a vontade de ouvir e beijá-la.
- É rapidinho.
- Estou trabalhando agora, não posso conversar - fui mais firm, quase ríspida. Ela acenou com a cabeça, para frente e para trás, como uma aceitação. Mas conheço a peça, não termina aqui. Ela virou o corpo e voltou em direção ao interior da capela, sem olhar para trás. Eu só consegui soltar o ar quando ela sentou dentro da capela, e claro, olhou novamente pra mim.
- Bonita ela - comentou a Isa, começando a puxar assunto.
- hum Hum.
- Quem é? - Perguntou a Isabelle, olhando pra frente, não sei se virando os olhos ou rindo.
- Ninguém importante não. Esquece isso Isa.
- Humm, não perguntei qual a importância dela, perguntei quem é só. Será que conhecia o morto?
- Provavelmente - me mantive séria, olhando pra frente
- Porque?
- Elá uma das editoras chefes do Jornal Doi Notícia, onde o armário do cara foi arrombado.
- Hum, gente grande Flávia?
- Gente pequena ne Isa, olha o tamanho da gnomo.
- Hum… ela então seria a sua namorada? - Isabelle, delicada igual um mamute olhou pra mim - Ou seria ex namorada?
- Ai Isa, que saco, chega!
- To só perguntando Flavinha. Tenho que saber esse tipo de coisa ne?!
- Saber pra que Isa?
- Humm, sabe … se você estiver solteira… - respirou fundo -... quem sabe tenho chance - ela mesma deu risada da sua fala. Eu sacodi o rosto em negação, em tom de deboche sem me preocupar ou dar corda.
O velório em si durou cerca de duas horas, não precisava de mais que isso mesmo. A urna estava fechada, já que o camarada foi achado já enterrado e cerca de 2 a tres semanas depois de seu falecimento. Quando deu o horário e o cortejo começou, uma multidão de pessoas apareceu, parece que sairão mais pessoas dos carros, não sei explicar. A urna foi colocada sobre um carrinho tipo de golfe, especificamente usado para carregar a urna. A mãe do jornalista foi sentada na frente, junto com o motorista.
O carrinho percorreu cerca de 100 metros, acho que nem isso, até o jazigo. Agora sim, um jazigo organizado e não uma cova aberta no meio do mato, por mais que as duas tenham o mesmo objetivo no final do percurso da vida. As pessoas ficaram ao lado do jazido, observando e assistindo a descida da urna. Eu e Isa ficamos mais ao fundo, afastadas, aguardando o processo, olhando o entorno, esperando alguma coisa, alguma informação, que dessa vez não teve, não aconteceu.
Quando iniciou o processo de fechamento do jazigo, as pessoas que estavam ao redor começaram a bater palma. Uma ou duas câmeras estavam filmando, acredito que por ele ser um jornalista investigativo, era menos exposto, mais restrito ao público. Porque, por exemplo, a Bruna é editora, ninguém nem sabe que ela que montou o jornal ou fez o designer da página, essas coisas que ela fala e faz. Enfim, eu própria não tive tempo ainda de aprender sobre o trabalho dela, quem dirá opinar sobre o trabalho de um morto.
Eu e a Isa ficamos lá, olhando a situação toda, até que os parentes e amigos foram se dispersando, ficaram só os pais, namorada, irmão, os mais próximos. Eu percebi que a Bruna ficou afastada, mas estava esperando a dispersão também, talvez me esperando, não sei ao certo. A mãe do jornalista estava acabando, o pai segurando ela, um sofrimento imenso. A namorada estava até calma, mas dava para ver a importante olheira nela e o olhar fundo. A Isa foi mais próxima a ela e se despediu, falou com tato que seriam convocados para depoimento essa semana. A namorada do jornalista me acenou, em agradecimento a ter vindo, não sei ao certo, mas foi o que eu senti. Quando finalmente todos entraram em seus carros, a Isa olhou pra mim e abriu a risada:
- Senhor amado, “vamo” embora daqui? - ela ria, quase desesperador
- O que foi? - falei começando a rir também
- Não aguento mais ficar aqui, esse clima, todo mundo se segurando… ai “vamo embora” - falou sacudindo o corpo, como se espantasse algum mal espirito ou mal agouro. Eu tentei me controlar mas continuei rindo, ela se sacudindo foi único. Andamos em direção ao caminho de cimento, a Isa a frente, tentando sair de perto dos tumulos, ainda se sacudindo, eu rindo, a situação era no mínimo cômica. Nos mantivemos profissionais enquanto foi preciso, mas nós duas também temos nossos medos pessoais, nossas dificuldades em aceitar a morte também. Fomos em direção ao carro da Isa, estacionado bem mais a frente, no primeiro bolsão.
- Flávia! - Ouvi assim que passei ao lado de um carro branco, que quando olhei era o carro do Jornal Doi Noticia. Virei em automatico e parei as risadas que eu estava com a Isa - Posso falar com você? - a Bruna me perguntou, ao lado do carro, esperando uma resposta. Eu rapidamente olhei pra Isabelle ao meu lado, minha carona e a resposta dela foi rapida e em audivel tom:
- Em dez minutos eu vou embora, se não estiver no carro vai se virar pra voltar - ela falou bem séria, toda fechada novamente, mas entendi a postura ofensiva e ao mesmo tempo defensiva dela. Sacodi a cabeça para cima e para baixo com o “entendi”. Virei com calma e fui andando até uma parede, enquanto a Bruna andava em minha direção, em um ponto comum.
- Fala - comecei assim, olhando para a frente, mas não para a Bruna.
- Pode olhar pra mim? - baixei 2 metros de altura e olhei para ela.
- Pronto.
- Você está bem? - ela começou a conversa
- Eu estou otima - falei direto, sem pensar na resposta.
- Quem é aquela mulher? - falou se referindo a Isa
- É a Isabelle, minha chefe.
- Seu chefe não é o Cantão?
- Nessa investigação minha chefe é a Isabelle.
- Humm, achei que ela fosse algum caso antigo, alguma coisa assim Fla.
- Bruna, você não me parou aqui pra perguntar isso né? Você tem alguma coisa útil para me falar? - continuei falando firme, quase ríspida, voltando a olhar para a frente.
- Sinto sua falta amor - ela tentou encostar a mao em mim, mas eu automaticamente dei um passo para trás. Minha vontade de abraçar ela está pau a pau com o quanto estou chateada - Não faz assim Fla.
- Sabe Bruna, eu me pergunto o quanto essa sua frase é de verdade. Faz três semanas do seu showzinho. Só agora sentiu minha falta?
- Amor, tive duas semanas muito complicadas, eu não…
- Mais um motivo Bruna, mais um motivo. Um motivo para ter ligado para sua namorada, ter pedido apoio, ajuda. Eu sou o que? João bobo?
- Eu entendo você está chateada Flavinha.
- Não entende não, talvez nem se preocupe com isso. Será que se não tivesse esbarrado comigo aqui, num velório, iria falar comigo?
- Fla…
- Teria me ligado? Teria perguntado como eu estou? Não ne?! - meu coração acelerou e apertou de um jeito que eu senti que iria explodir. Um carro ao fundo buzinou e chamou nossa atenção. Eu olhei rapidamente em direção a buzina, era a Isabelle com uma cara super fechada olhando para a Bruna. A Isa é uma figura, isso eu posso garantir.
- O que ela quer? - a Bruna perguntou também com a expressão fechada sob os saltos.
- Gostosa, tô indo embora, você vai comigo? - a Isabelle provocativa soltou essa, juro que consegui ver o ódio exalando da Bruna. A jornalista me olhou, com a mão na cintura, como se pedisse um "vai lá, responde ela". Eu, mais chateada impossível, sacodi o rosto e levantei o ombro, numa sutil expressão de "você sabe a resposta". Virei em direção ao carro e seguir andando. Consegui ouvir ao fundo um " Flávia?!"
A Isabelle é muito provocativa, ela ficou me olhando profundamente enquanto eu andava até o carro, me secando. Minha vontade foi soltar uma gargalhada, mas me segurei. Entrei no carro e sentei no banco do passageiro. A Isa antes de começar a rodar, olhou pra Bruna e mandou um beijinho, provocativo, irônico.
- Aí Isa - dei um toquinho no ombro dela - chega de provocar.
- AFF - deu duas buzinadinhas pra Bruna, rindo - Você é gostosa pra caramba, um beijo que meu Deus, inteligente, dedicada, desenrolada e a meio metro fica de cu doce? - virou o carro, descendo a alameda em direção a rodovia - Vou provocar mesmo. Se pudesse te beijava na frente dela.
- Você é sem noção Isa.
- Fala sério Flavinha! Se tem algo que eu não aceito é desdém com o que tem - Acenou para o porteiro do velório - A meio metro tava se achando, botando banca. Não aceito esse tipo de coisa.
- Não aceita o que Isa?
- Ah, tá errada e ainda quer se colocar acima. Realmente Flavinha, ela é bonita, tem um porte executivo, mas é esnobe. Não gostei dela - falou puta, dirigindo pela Rodovia Fernão Dias.
- Pega leve Isa - falei voltando a olhar pra frente, sem querer mais conversar. Eu fiquei o caminho todo pensando na Bruna, realmente ela estava linda de executivo. Ela tem um porte que chama a atenção, mas eu estou chateada com ela, triste na verdade. E com uma saudade absurda, sabe aquela vontade de abraçar, sentir o cheiro, o simples pele com pele.
- Quer que eu te deixe onde Flávia? - a Isa perguntou me trazendo de volta a realidade.
- Oi?!
- Quer que eu te deixe onde? No DP, em casa?
- Aí nem sei… acho que não vou pra aula. Me deixa em casa se não te atrapalhar.
- Você não tá na fossa por causa da meia metro não né?!
- Não… é que…
- Achei que eu fosse morrer e não ia ver Flávia Albuquerque Silva na fossa por causa de mulher - a Isabele falou em um tom irônico tão grande, quase riu na minha cara.
- Não…
- Não o cacete Flávia. Olha essa cara de fossa. Vamos fazer o seguinte, ainda não conheço sua casa. Vamos passar no mercado, pego uma cervejinha gelada pra mim, uma coisinha pra gente comer e ficamos batendo papo. O que acha?
- Não precisa Isa. Não tem porque.
- Ah, vou te deixar no fossa mesmo. Pelo menos hoje, vou ser sua brother. E já te canto uma bola.
- Qual?
- Tem que parar de chorar por mulher que não te merece hein. Você é bonita, gostosa, dedicada. Tem que ficar com quem quer você Flávia.
- E quem seria? Você Isa?
- Ah, que eu pago uma floresta pra você, geral já sabe. É só me dar uma chance que eu aceito! - ela mesmo riu, ela sempre foi deixou claro, não posso nega.
- Já tivemos nosso momento Isa, já tentamos.
- Eu sei, eu sei. Vale dar uma retap, reforçar. Vai que cola.
- Para naquele mercado na avenida Angélica, tem mais opções de coisas e você que bebe, já compra sua bebida.
- Acho bonito você não beber. E você mantém isso, independente de quem force a barra - falou embicando na entrada do mercado. - Partiu!
Ela desceu do carro leve, fazendo graça, já entrando no mercado. Puxou um carrinho e falou “vem oh dois metros” - de um jeito leve, gostoso, fomos passando no mercado, ela sempre perguntando: o que vai comer? Quem vai cozinhar, você né?! - Passamos pela banca de frutas e ela pegou algumas, brincando e falando que era um jantar zero calorias. Aos pouquinhos a Isabelle foi me distraindo que quando percebi já tínhamos feito a compra e estávamos entrando no meu apartamento.
- Isa, não repara a bagunça. O apê é bem simples.
- Vish Flávia, não vim pelo apê não gata - falou sorrindo e passando a mao no meu ombro, propositalmente e rindo depois. Ela é da em cima de mim na caruda e de um jeito brincalhão.
- Sem comentários - falei sem graça - Fica a vontade, coloca as coisas na geladeira. Vou trocar de roupa rapidinho.
- Quer ajuda? - ouvi ela falando enquanto eu entrava no meu quarto. A primeira coisa que fiz foi desarmar a pistola, tirei o carregador, dois golpes de segurança, guardei ela no armário, protegida. Depois peguei uma roupinha bem confortável, uma bermuda de tactel larga e uma camiseta de corrida. Soltei meu cabelo, o rabo de cavalo estava me apertando, dando uma dor de cabeça. Quando eu cheguei na cozinha novamente, a Isa tinha feito o mesmo com a pistola, deixando ela aperta sobre a mesinha.
- Você colocou sua cerveja no freezer? - foi a primeira coisa que perguntei, antes mesmo de ver a pistola, mas depois que vi perguntei - não quer deixar lá no quarto?
- Pode ser? Você guarda lá?
- É deixo no meu armário.
- Negativo, nem eu fico no armário, quem dirá minha pistola - ela mesmo dá risada das coisas que fala - levantou e colocou a pistola em cima da geladeira e o carregador na lateral da fruteira, do outro lado - mas diz aí, cadê sua colega de apartamento?
- Vixe, não sei. Não acompanho os horários dela.
- Então ela pode chegar por aí?
- Sei lá, pode sim - fui andando até a geladeira e pegar alguns dos ingredientes que havíamos comprado - porque?
- Ah, vai que chega aí e pega a gente no flagra
- Ai Isa, para de falar merd* - falei levantando da geladeira e indo em direção a pia.
- Ah Flavinha, não é assim né?! Vai que você me da uma chance hoje.
- Isa - falou virando de volta pra ela - já tivemos nossa chance!
- Ah, não custa tentar né?! Vai que a figurinha repetida descolou do álbum. Vai fazer o que para a gente jantar?
- Pode ser um macarrão? Como o programado? Um franguinho gostoso e é isso. Pega outra cerveja aí pra você.
- Cara, acho que vou pedir mais algumas pra mim. Posso?
- Isa, você é maior de idade, vacinada e seu carro ta ai embaixo, na garagem .
- Eu adoro quando você me dá essas respostas mais firmes. Até chega a arrepiar.
- Não força a barra não Isa. Você come cebola e alho?
- SIm, pode colocar - falou mexendo no celular - Captou alguma coisa lá no velorio?
- Cara, não consegui nada sólido, nada importante. Acho que um dos caminhos agora é levantar as características do médico e conseguirmos essa infiltração do antigo.
- Não gosto muito de colocar as pessoas nessa situação de infiltrado, mas as vezes precisamos - ela completou
- Parece que está um beco sem saída, mas já progredimos muito.
- Não tenho dúvida Flávia. Você evoluiu muito profissionalmente, esse caso é praticamente seu fechamento de investigadora.
- Só falta passar no concurso - Olhei pra ela - esse simples detalhe.
- Mas isso linda é uma coisa que vai acontecer no tempo certo, eu mesma, levei 5 rodadas de concursos para entrar. Quando foi o momento entrei. Não ficar se forçando, acelerando nada Flavinha, só estuda, se dedica e vai. Quando for, vai ser.
- Eu quero tanto isso Isa, tanto. Eu estou tentando manter o mundo, estudar, me levantar, seguir em frente, sabe, tanta coisa. Queria logo passar nesse concurso - Acabei desabafando olhando pra Isa. Ela carinhosamente levantou da cadeira, deu um passo, que é a distância da mesa até a pia e segurou minhas mãos, de uma forma amigável e amorosa.
- Eu sei o quanto você quer, todos sabemos. Pensa pelo lado bom, você já tem a habilidade técnica, isso é tão difícil de alguém conseguir - o choro veio na minha garganta, acabei sentindo um ambiente amigável, controlado - Eu sei o quanto está cansada Flavinha, dá pra ver em você. Mas sabe… acho lindo essa sua dedicação, vontade de crescer, esse seu esforço todo. Você é grande meu anjo, precisa estar acompanhada de grandes, de quem te impulsiona. Vem cá - falou me puxando para ela, num abraço fraternal, amigável. Eu me permiti receber esse carinho amigo, me permiti encostar no tórax dela. Nossa altura não é tão diferente, por mais que eu ainda seja mais alta. Fiquei com ela alguns segundos e me coloquei em pé novamente. É o que é - Você não aceita ser cuidada Fla - falou voltando ao banquinho.
- Tenho uma certa dificuldade com isso - Respondi voltando ao fogão e a pia.
- Percebi isso já - ela respirou fundo, deu pra ouvir, mas não virei pra Isa de novo, não é que queira fugir do assunto, mas ela não é com quem quero falar sobre isso - Tá então vamos ao assunto quer você está fugindo. Qual é a da meio metro?
- Ai Isa, precisamos conversar sobre ela?
- Acho que sim! Olha como você ficou depois do cemitério, toda borocochô.
- Ah, fiquei meio chateada. Mas nada importa.
- Como que você conheceu ela? - a Isa continuou insistindo.
- Eu fui no advogado resolver algumas coisa da compra desse apartamento, esbarrei com ela no elevador. Chamei ela pra tomar um café e ela aceitou. Acabou encaixando - olhei pra Isa, que virou mais um gole de cerveja.
- E você gosta dela! Da pra ver esse seu bode.
- Ah, acabei me soltando com ela. Sabe, é gostoso alguém te ligando, te dando carinho, bom de bate papo.
- Claro que é gostoso, sem contar a química no beijo, na pegação. Mas não é só flores pela sua cara. O que tem de errado com ela? - estiquei a mão e peguei uma forma mais bonita pra colocar o macarrão e a carne que já estavam prontas.
- Me incomoda algumas posturas dela.
- Tipo? - coloquei o macarrão sobre a bancada, enquanto mostrava para a Isa onde ficava os 2 pratos para ela pegar.
- Eu sou simples, sabe Isa. Nunca tive muita coisa, mas sempre dei conta do recado. Meu problema com ela é que não somos do mesmo mundo, o beijo pode ser bom, a pegada legal, mas sabe quando os mundos não encaixam. E sinto que ela não tá a fim de perder isso pela gente.
- Tipo ela não aceitaria ser simples? Isso?
- Ela não jantaria um macarrão com bife, simples igual a gente. Ela iria pedir comida.
- Humm. Será que não tem um lado seu de medo de crescer? - sentei na bancada, ao lado da Isa para comermos.
- Em que sentido?
- Você sempre foi da comunidade, passou perrengue e tal, isso não podemos nunca esquecer nem anular Flavinha. Mas hoje você tem casa própria, um emprego legal, tá terminando a faculdade. Você evoluiu na vida. Claro que não dá pra gastar mais do que você recebe, não é isso. Mas dá pra se dar algum luxo, se permitir uma vida mais leve.
- Ela acaba me forçando a comer em lugar que eu não gosto, viver de um jeito estranho.
- Estranho como? Comer alguma coisa chique? Vocês podem negociar uma vez por mês. Aí acho que vai do quanto vocês duas se permitem entender as necessidades juntas. O quanto cada uma quer ceder pra estar com a outra - caramba, não estava esperando uma conversa madura dessa com a Isabele.
- Não imaginei ter essa conversa com você Isa.
- Ah, mas é de pensar Flávia, o quanto você quer se libertar de seus demônios pra estar com a meio metro e o quanto ela aceita se adequar a sua realidade - abaixei a cabeça e enrolei o macarrão no garfo, depois levando a boca, pensando em silêncio - Flávia, já falei, você é grande, tem que estar com quem te joga pra cima.
- Hum - não respondi, mas fiquei pensando.
- E a Beatriz?
- A Beatriz o que? - levantei meu rosto quase que assustada, mas já esperando a pergunta.
- Já carimbou a figurinha? - Automáticamente foi levada aquela noite que a Bia tentou me beijar bebada e depois completamente sonambula. Tentei disfarçar.
- Claro que não Isa. Ela é namorada do Cantão e é hetero.
- Eu sei das duas coisas. Hetero eu não confirmo tanto não.
- Porque? - tentei disfarçar.
- Ah, nunca reparou nos olhinhos dela, brilhando.
- Não olho pra Bia assim, acho ela uma puta profissional. Me ajuda muito.
- Tá, mas e os olhinhos dela quando te vê?
- hummm?
- você chega e os olhos dela brilham!
- AFF Isa, você imagina cada coisa. Já é sintoma de esquizofrenia.
- Não cara, é sério, você chega ela muda, começa a sorrir, os olhos brilham.
- A gente divide apartamento, somos amigas. O sorriso faz sentido quando penso por esse ângulo.
- Pra você pode ser só amizade, broderagem. Mas acho que ninguém do DP pensa isso.
- Aí fica foda. O povo dá um gas errado. Ela é linda, mas só divide apê comigo.
- Os olhos dela chegam a ficar claros quando entra na sala de reunioes e você está lá.
- Não sei não Flávia, conheço a Bia de outros carnavais já. De quando ela trabalhava lá no DP do Carandiru, quando ainda estava com o Ricardo. Você chegou a conhecer aquele rato?
- Tive o desprazer de ver ele rondando a região, atrás dela. Mas pq ele é rato?
- Mega corrupto. De jogo do bicho pra baixo e a Beatriz sabe de tudo isso - falou reduzindo a voz, como se ninguém pudesse ouvir - Ela já chegou a aparecer de olho roxo, arranhado fundo, essas coisas.
- Mas cara, ele é da “correge””.
- Onde melhor para um rato estar se não no mecanismo da ratoeira. Ela deu uma boa melhorada no humor depois que veio morar com você.
- Eu só dou atenção e cuido como faria com qualquer amiga de apartamento.
- Não sei, melhorou muito. Ela está mais atenta, mais sorridente. Por isso achei que você tinha carimbado.
- Não, jamais. É mulher do meu amigo. A melhora dela pode ser por se sentir mais segura, não estar tão vulnerável a ele.
- Pode ser, ambiente seguro. Uma segurança de 1,80 que sabe ser brava quando quer. Você fala toda hora que não ficaria por ser namorada do Cantão, acha que o Cantão iria poupar alguem por “broderagem”?
- Não sei, mas eu não vou atacar ninguém só por atacar, só carimbar. Não sou assim.
- Flávia, essa aí não cola! Quantas você pegou esse ano? Só esse ano?
- Não importa Isa! Nunca fiz isso por número. Eu curto o flerte, a disputa inicial, até ficar, até beijar. Só isso.
- Comigo foi só isso? A disputa até um beijo?
- Isa.. não precisamos voltar nesse ponto.
- Sabe que eu gosto muito de você né Flavinha?! E você não é pra mim uma figurinha só, queria a chance de ser seu álbum todo.
Fim do capítulo
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FENOVAIS
Em: 25/01/2024
Olá autora.
Gostei bastante da tua obra. Tô acompanhando de pertinho.
Sou fã da Flávia, apesar de nunca ter tido um terço da vida descrita dela, dá pra sentir um pouco do peso.
Pela descrição da história nem posso ficar esperançoso por um par que não seja a Bruna. Ela começou bem e tal, mas três capítulos depois eu já falei mentalmente: próxima. Já deu fia.
Pra mim sempre ficou claro um bom "doar" da Flávia (mesmo com a limitação dela) e pouco "doar" da Bruna. Há referência de ótimo sexo, cuidado, boa pegada, faz gostoso e pipipi faz sentido nas primeiras semanas, mas com quase 2 meses espera-se um pouco mais de quem quer uma relação mais completa.
Teve uma outra pessoa comentado que a imaturidade da Bruna é cansativa. Concordo totalmente.
A Flávia carrega 2 mundos na costas. Foi forçada a amadurecer na dor todo santo dia (se brincar). Ter que ficar pensando em qual chocolate belga do Shopping Iguatemi a gnomo gosta, quando tem conta pra pagar e tá rachando apartamento... me parece muito trabalho pra pouco retorno.
Também tô começando a achar que a Bia pode ter uma quedinha. Seria meu sonho? Não sei.
A Bia ainda tá uma incógnita para mim.
A Isa também parece legal, mas a postura dela é 50% legal e 50% irritante.
Vamos ver cenas do próximo capítulo.
mtereza
Em: 23/01/2024
Eita que são muitas mulheres dando em cima da Flávia parece que tem mel a bicha kkkk. E o pov da Bruna não vai ter mais autora querendo entender o que realmente aconteceu com ela pq ela sempre foi mimada , esnobe e elitista mais parecia gostar muito da Flávia era só sexo ?
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Sem cadastro
Em: 22/01/2024
Também acho que a Bia gosta da Flávia!!
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Marta Andrade dos Santos
Em: 21/01/2024
Tá complicado em Flávia a Bia está caidinha. Kkkkk
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