Capitulo 8
O SOL ESTAVA TENTANDO MATAR ASTRID PARKER.[1]
Ao menos era isso que ela estava achando quando tentou acordar naquela manhã seguinte sem resultado nenhum. Lembrou de ter saído com Jordan para comprar algumas coisas, comeram um pãozinho delicioso, ela cedeu a compra daquele relógio psicodélico que a outra fazia questão naquela aquisição e se dirigiram ao Taverna da Stella, na qual a loura precisava de uma garrafa de Syrah cheias até a boca na sua taça.
Não ficou bêbada, disso ela tinha certeza, mas toda a tensão das gravações do programa, repetir alguma fala que não ficou harmônica, tudo isso era cansativo demais, pois ainda tinha que voltar para o escritório para finalizar os acabamentos das bancadas, solicitar toda a parte burocrática, afinal já haviam se passado quatro semanas e em menos de duas semanas aquele projeto estaria finalizado e tudo precisava estar mais do que perfeito.
Então, Astrid Parker merecia uma garrafa do seu querido vinho.
Ela abriu os olhos ao ouvir a vibração que vinha da mesa de cabeceira, teve que piscar diversas vezes, até que todo o seu quarto se encontrasse em foco. Como aquele barulho estava perfurando os seus tímpanos agora. Astrid agarrou o celular da mesa de cabeceira e olhou para a tela, a foto da sua amiga Iris Kelly estava brilhando, forçando-a a estreitar os olhos para se acostumar com aquele brilho irritante.
- Que foi? – deslizou o dedo sobre a tela. Aquele tom fazia Astrid se lembrar de Delilah, sim, a irmã andava a influenciando em algumas coisas.
- E aí, está viva?
- Posso saber a razão de está me ligando?
- Por uma razão muito simples, depois de 400 bilhões de mensagens parecem não surtir efeito algum! – respondeu a ruiva.
Astrid se colocou a verificar aquela informação retirando o telefone da orelha e olhou o aparelho. De fato havia uma penca de mensagens das amigas que falavam “Oi”, “Cadê você?” “Chamando DesAstrid!” lotavam sua caixa de entrada.
- Aff, desculpa. – respondeu ela, caindo no travesseiro.
- Tudo bem, mas para onde você foi garota?
Astrid sabia para onde tinha ido, de fato tinha sumido por questão de trabalho, a equipe da Natasha Rojas, as intermináveis gravações, a ida as feirinhas, tudo isso e a saída dela com Jordan para beber depois daquele longo dia de trabalho. As meninas tinham marcado algo para comer na casa da Delilah, mas ela acabou não indo e muito menos avisado que não iria, então resultaria no seu sumiço.
Mas o mais embaraçoso de tudo aquilo foi um sonho estranho que tivera. Sim, ela estava sonhando com Jordan Everwood, estavam jantando, bebendo, pareciam estar se divertindo, porém, por mais que Astrid estivesse sorrindo algo no intimo do seu peito estava fora do lugar. Naquele sonho, a Everwood a conduzia para casa e dava um abraço de despedida, quando aquele abraço terminava e elas se afastavam, não era mais a Jordan e sim Piper Delacorte que estava diante dela e foi nesse momento que a sensação de algo fora do lugar desapareceu e Astrid pode sorrir novamente. Havia recebido um carinho no rosto pelos longos dedos esbranquiçados de Piper e um suave beijo para encerrar aquela noite. Porém, quando Piper se afastou para encerrar aquele beijo e agindo como um perfeito cavalheiro, a Astrid do sonho a agarrou e impediu que aquela noite terminasse em somente um beijo e a arrastou escada acima para o seu quarto. Os olhos de Astrid arregalaram ao lembrar desse sonho erótico com Piper Delacorte.
- Oi – chamou Iris.
Astrid se assustou, pois tinha esquecido da amiga na linha.
- Astrid, o que está acontecendo? – dizia Iris – Você morreu, o que houve?
- Iris, te ligo depois, ok?
- Astrid, não se atreva a desligar esse telefone na minha cara, Astrid, eu vou até aí e...
- Ai, merd*! – disse Astrid agora mais acordada do que nunca.
Astrid encerrou a ligação e estava confusa com o que estava ocorrendo consigo mesma. Precisava falar com alguém, mas com alguém que tratasse toda aquela experiencia de forma desinteressada, de um “tô nem aí” de que ela precisava no momento, ou seja, ela precisava do modo Delilah Green não está nem aí!
Delilah Green abriu a porta do apartamento.
- Que merd* é essa, Astrid?
- Desculpa. Sei que tá cedo.[2]
- Cedo? Ainda tá de madrugada!
- São sete e meia da manhã.
- E faz diferença? – Delilah deu espaço para a outra passar e se dirigiu até a cozinha para pegar um café quentinho.
- Eu preciso falar com você, a Claire não tá aqui não, né?
Delilah pediu um segundo, enquanto apontava para o café e o que dizia na caneca. “Só fale comigo depois que eu tomar café!”.
A testa de Delilah franziu e após terminar o seu café e está mais relaxada falou.
- Ela e o Josh tiveram uma reunião de professores da Ruby, então todas estivemos aqui e cada uma foi para sua respectiva casa, por quê?
- Eu realmente preciso falar com você sobre algo importante!
- Por Deus Astrid, eu estava fazendo algo claramente importante antes de você chegar, estava dormindo.
- Delilah!
- DesAstrid!
- Tive um sonho erótico meio com a Jordan Everwood e a Piper Delacorte.
Astrid soltou tudo de uma vez só para a irmã que a olhava com cara de paisagem. Delilah preencheu novamente a xicara com café e depois pegou uma outra caneca para Astrid que dizia “Não estou nem aí!” e serviu de mais café acrescentando um pouco de creme e um toque de canela ao café, do jeito que a loura gostava.
- Bom, acho que você está me confundindo com Iris Kelly e seu interesse por vasculhar a vida amorosa das pessoas. Aqui, toma. – Delilah ofereceu a caneca grande para a loira.
- Obrigada. – disse Astrid de forma feliz por reparar o que a irmã postiça havia feito. - Eu não posso falar com a Iris sobre isso, você sabe como ela iria reagir.
Sim, o grande sonho de Iris Kelly era o clã todo queer e para que seu sonho realizasse só faltava Astrid para completar o quarteto e essa seria uma noticia e tanto.
- É algo próximo a anunciar toda a comunidade, juramentos, farra e muita bebedeira com fogos de artifício no final.
- Algo próximo a isso. – Astrid sorriu.
- Então, vai contar os detalhes? – Perguntou Delilah.
Astrid estava sem jeito, então passou a contar todo o sonho que começou com Jordan e o aperto no peito, como também a mudança para Piper Delacorte e como aquela sensação mudou e a puxou para o quarto acima e tiveram relações. Não contou que acordou com esse desejo sendo realidade. Esse detalhe preferiu ocultar.
- E foi gostoso?
Astrid engoliu em seco, baixou os olhos se concentrando na sua caneca de café e assentiu. Delilah sorriu.
- Isso é muito bom!
- Por que você não está surpresa? Bom, eu não sou.. quer dizer, eu nunca..
- Isso não quer dizer nada! – disse Delilah tranquilamente. – Sexualidade não é algo estagnado, é fluído, não tem que se sentir culpada ou errada por isso. Se você está interessada por ela, está tudo bem. Embora você pense que seja a garota propaganda da heterossexualidade, não se sinta presa a isso, não há amarrar em você.
Astrid não entendeu e quis se defender.
- Do que você tá falando?
- Calma, calma maninha, não estou te xingando. – Delilah levantou as mãos em forma de rendição. – Só vou te lançar uma pergunta, nunca percebeu nada de diferente na forma que você e a Piper se relacionam ou mesmo você e a Jordan hoje em dia, já que sonhou com ela?
- Hã...?
- Só pense sobre isso.
Então Astrid começou a recapitular, relembrar das implicâncias, quando todas elas riram na cozinha, ela, a irmã e Piper sobre as chances de Anne e Diana serem lésbicas. Do quanto foi divertido a presença da mais alta. Lembrou quando Piper a protegeu no baile quando ela terminou com um cara por ter esquecido de comprar um arranjo de flores. Como era o nome dele mesmo? Henry Garrison, parece. Ele ficou tão furioso que queria empurrar Astrid e recebeu um soco certeiro no nariz. Ele não foi para o baile naquele noite por causa do seu nariz quebrado. Naquela noite, Piper a colocou o arranjo de flores que o Henry Garrison havia esquecido e lá estava ela, deslumbrante como sempre. Deslumbrante para ir ao baile com outro cara. Delacorte sempre implicava com ela, mas ao mesmo tempo exercia uma proteção e um cuidado que ela nunca tinha prestado atenção, apenas recordava daquela maldita festa na casa da Amira Karim e aquele refrigerante batizado. Então, no ensino médio recordava disso, da verdadeira razão de ter ficado chateada e empurrado Delacorte.
Havia outras recordações, inúmeros momentos que havia muito tempo e ela não atribuía a outros sentimentos, só a boa e velha irritação.
-- Que merd* – disse ela, escondendo o rosto nas mãos.
- É, maninha, parece que você acabou de encontrar algumas respostas.
- Tipo, puta merd*!
- Calma, isso não é o fim do mundo, todo mundo tem um sonho erótico. Agora o importante é se você gosta da Pi.... ou da Jordan.
Astrid se endireitou
- Eu... hum...
- Pode falar, está comigo.
Astrid revirou os olhos.
- Talvez eu não esteja focada em trans*r com ela... sabe?
- Hrum, sei! Você quer enganar quem? – Delilah voltou a tomar seu café – Além disso, não fui eu que sonhei fodendo com a Piper Delacorte.
Astrid suspirou.
- Você é bem irritante, sabia disso?
- Sabia! Mas você veio falar comigo justamente para ouvir a real!
E sim, foi por essa razão que Astrid foi falar com Delilah e não com suas outras amigas, não queria o conforto da Claire ou os fogos de artifício da Iris, queria simplesmente a reflexão e a verdade.
- E aí, você gosta dela? – perguntou Delilah.
- Do quê?
- Você quis dizer de quem, certo?
- Ela não está interessada em mim e nos conhecemos a tanto tempo, está na cara que se ela fosse sentir alguma coisa seria antes e deve me ver como uma propaganda de hetero compulsiva como você mesma disse.
Delilah sorriu por saber a verdade e ser justamente o contrário de tudo aquilo que a outra estava dizendo, mas não podia atrapalhar ou intervir assim. Ambas precisavam estar certas do que queriam, mas nada impedia de dar um empurrãozinho.
- Então resolva esse mal entendido, você é boa em resolver os problemas, não é?
Astrid suspirou, então esse era o probleminha que ela teria que resolver?
Astrid estava de volta a sua casa e decidiu procurar no seus contatos o nome“Aquela que batizou o seu refrigerante” e mandou uma mensagem perguntando se Piper gostaria de sair. Com pouco tempo a resposta logo veio com as palavras escritas:
Oi, como vai? Quem está falando?[3]
Astrid respondeu depressa e com um sorriso travesso: Aquela que te empurrou no armário e quebrou o seu dedo.
Os três pontinhos voltaram a pular na tela assim como o seu coração enquanto a loira esperava pela resposta.
A que devo a honra de Astrid Parker me mandando mensagem?
Astrid mordeu o lábio e respondeu: Ora, como disse, gostaria que pudéssemos sair qualquer hora dessas. Pode ser?
Novamente os pontinhos pularam e ela suspirou e sentiu uma subida insegurança.
Eu adoraria, mas você anda ocupada demais com o trabalho e não desejo atrapalhar você e a Jordan.
Por que está dizendo isso?, escreveu Astrid.
Só não quero atrapalhar você e a Jordan.
Está falando sobre a Jordan e eu de uma forma diferente
Ah, é?
Sim
Um silêncio se passou até Astrid ver os três pontinhos de Piper pularem de novo e tudo o que a outra escreveu foi um:
Lamento. Só não quero mesmo atrapalhar vocês. Precisarei ir, boa noite.
Boa noite.
Astrid apagou a tela do celular e o guardou de volta no bolso antes de encostar a testa na superfície fria da sua geladeira. O que tinha sido aquele tipo de conversa? Lá no fundo lembrava do que Delilah havia dito, mas claramente, estava sendo rejeitada pela outra.
[1] Astrid Parker nunca falha, página 163. Boa parte desse capítulo foi inspirado no capítulo dezesseis da obra originai, sendo assim há um alerta de spoiler para quem
[2] Falas de Astrid Parker nunca falha. Página 169.
[3] Astrid Parker nunca falha, página 253.
Fim do capítulo
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