CAP. 28 – O susto
Seis meses depois... Bia
Estava chegando do almoço, folheando uns documentos em uma pasta, conversando com o Gerente de vendas, tentando entender onde ele queria chegar com aquela enrolação toda, o telefone tocou em algum lugar me tirando a concentração, olhei para o rapaz dizendo:
– Nicolas, marque uma reunião com o pessoal essa tarde e veremos exatamente o que está acontecendo, está bem?
– Claro, falarei com eles e aviso a Maria do horário.
– Agradeço, e pelo almoço também.
Sorriu seguindo o corredor, sentei e Maria chamou minha atenção dizendo:
– Bia, Ângela na linha dois, pode atender agora?
– Claro que sim, atenderei lá dentro – levantei novamente seguindo para minha sala. – Obrigada Maria, me mantenha informada quanto a reunião que o Nicolas irá marcar.
– Assim que ele me passar os horários, aviso você.
Agradeci e entrei na sala, peguei o telefone dizendo sorrindo:
– Olá vovó, surpresa boa receber sua ligação.
– Se eu não ligar você não me liga.
– Não seja injusta, ligo todos os sábados para vocês – sorri e ela bufou do outro.
– Ainda assim, não é o bastante – sorri, fiquei imaginando a expressão dela, segundos depois perguntou preocupada – como você está hoje, meu bem?
– Estou bem, apesar de estar trabalhando dobrado nas últimas semanas.
– Ah, Bia... você trabalha demais, querida. Precisa dar um tempo em tudo isso e relaxar um pouco, porque não vem passar esse final de semana conosco? Sei que a viajem é cansativa, mas precisa descansar um pouco.
Enquanto ela falava, levantei e fui até a janela, imaginando os diversos motivos para recusar aquele convide, cogitando-os, mas um em especifico que se chamava Samantha, me fez desistir, respondi:
– Não posso sair daqui agora, tenho muita coisa para fazer, que tal o mês que vem?
– Você está nos prometendo isso tem uns cinco meses, Beatriz.
– Não fica brava cariño, porque a senhora não vem ficar aqui comigo então? Assim pode cuidar de mim, o que acha? Fala com o vovô, que aliás, deve trabalhar bem mais que eu.
– Pensa que eu não tento, Bia? Sabe tão bem quanto eu que seu avô não deixará a empresa se você não vier ficar em seu lugar.
– Sem pressões, eu sei – ela sorriu do outro lado e cogitei – ainda não estou preparada para voltar.
– Bia, será que fugir foi uma boa alternativa?
– Eu não fugi, apenas fiz uma escolha.
– Escolha essa que nos deixou totalmente sem ação.
– Não queria fazer isso com vocês, mas foi o melhor que eu consegui fazer para mim, sem contar que posso cuidar dos negócios fora do país sem precisar cansar muito o vovô.
– É uma desculpa boa minha filha, só não acho a mais acertada.
– Precisava tomar essa decisão Ângela, não iria aguentar ir para a empresa todos os dias e...
– E o que Bia?
Fiquei em silêncio por um tempo, lembranças daquele dia voltaram a assombrar minha vida aquele momento, a voz daquela mulher ainda penetrava a minha mente e quando fechava os olhos era como se ela estivesse na minha frente me contando tudo aquilo, sentei e sussurrei:
– Desculpa Ângela, não quero falar sobre isso.
– Você nunca quer falar sobre o que de fato aconteceu para ter ido embora, minha filha, mas lhe darei o tempo que precisa, quando quiser pode se abrir comigo nem que isso leve mais seis meses – sorri balançando a cabeça dizendo apenas:
– Obrigada! – sorriu do outro lado dizendo:
– Tenho novidades para você!
– Quais?
– É sobre Samantha.
– Não faz assim comigo, por favor.
– Bia, eu estou tentando te dizer isso há dias.
– E a senhora não percebe que eu não quero saber?
– Até semana passada eu entendia o porquê não queria que tocássemos no nome dela, mas é uma novidade boa, você vai gostar.
Fiquei calada, a insistência dela me fazia querer saber qual era a tal novidade e como a sintonia era perfeita entendeu que o meu silêncio era um sim e começou a falar:
– A inauguração do Lion será em dois meses, seu avô está organizando uma pequena festa para arrecadarem verbas esse final de semana, por isso queríamos que você viesse, pois mesmo estando longe, tem sido uma peça importante para isso, Bia.
– Fico feliz por isso cariño, mas infelizmente não será possível me ausentar agora – ela inspirou fundo do outro lado e disse:
– Diana esteve aqui na semana passada, procurou por você e ficava a todo instante perguntando onde a “Tia Bia dela” estava, disse que estava com saudades.
Levantei quando ela disse aquilo, meus devaneios me levaram de volta ao passado me mostrando os momentos bons que passei com a criança, esbocei um sorriso e a saudade apertou fundo no peito, do outro lado Ângela dizia algo, mas não entendi muito bem e perguntei:
– O que a senhora falou?
– Isabela também esteve aqui, caiu e quebrou a perninha esquerda, estava toda tristonha, Maria e José não estão nada contentes com você.
– Pelo que vejo, minha decisão decepcionou muito dos que eu amo.
– Não fala assim Bia, sabe que eles perdoarão você facilmente quando virem seu sorriso novamente.
– Obrigada, cariño.
– Não tem porque agradecer, meu bem – hesitou um pouco e disse – Sam esteve aqui ontem, enrolou um pouco mas acabou perguntando sobre você, aliás, todas às vezes que ela vem aqui pergunta e minha resposta é sempre a mesma.
– O que você disse a ela? – porque aquilo pareceu me interessar tanto?
– Digo a mesma coisa sempre, que você está presa dentro do seu mundo e mais nada importava para você.
– Ângela...
– Não se preocupe minha filha, apesar dela não me contar o que aconteceu, defende você e diz entender, sofre e chora com sua ausência – aquilo fez meu coração quase parar de bater. – Eliza diz que ela chora todas as noites desde a sua partida, acha justo fazer uma pessoa que ama tanto você sofrer assim?
– Não me julgue, por favor!
– Não estou, longe de mim julgar alguém, ainda mais sendo você, meu bem – inspirei fundo sentando novamente no sofá, do outro lado ela seguia falando – eu só queria entender o porquê estão afastadas, se isso machuca tanto as duas?
– Quando eu estiver preparada conto a vocês o que aconteceu, no momento não estou preparada para isso.
– Tudo bem Bia, sei que é responsável pelos seus atos, e confio em você.
– Obrigada, anjo!
Conversamos por mais alguns minutos, Maria avisou o horário da reunião e me despedi de Ângela. Me recompus engolindo minha dor e segui de cabeça erguida para fora daquela sala, deixando presa lá dentro aquela dor que me atormentava e me assombrava. Não queria mais pensar naquilo, e assim o fiz.
SamColoquei Diana na cama, estava lutando contra o sono quase dormindo no meu colo, aquele dia foi cansativo para ela, brincou a tarde toda com Isa, essas duas não tinham jeito. Mesmo estando com a perninha engessada aquela pequena não parava. Sorri babando em cima da minha filhota, ela quem me dava forças para seguir lutando cada dia que passava, ajeitei o cobertor em cima dela e fui até a janela, a lua estava linda aquela noite, inspirei fundo dando vasão as minhas lágrimas novamente.
De todos os dias, hoje era o pior, estava completando seis meses que a Bia foi embora da minha vida, notícias dela só sabia por Ângela, que se tornou minha melhor amiga e conselheira. Claro que não tive coragem de contar toda a história a ela, era vergonhoso demais e revelei apenas que havia mentido e isso a magoou muito.
Sempre que nos encontramos, acabava em lágrimas, ela me abraçava sempre dizendo a mesma coisa: “Deixa a Bia digerir tudo isso Sam, uma hora ela cairá na realidade e voltará para você, no momento está decepcionada… De tempo ao tempo!” Palavras essas que ela dizia sempre que nos encontrávamos para conversar. Dar tempo ao tempo, será que um dia ela iria me perdoar? Tinha dúvidas!
Ouvia e concordava com ela, conhecia a Bia e sabia que não voltaria atrás, infelizmente havia perdido o grande amor da minha vida. E sabia também que era culpa minha, pois em partes ao menos, poderia ter evitado... Poderia ter contado antes... Apesar da dor ser imensa, sabia que merecia esse castigo, mas no fundo rezava para ela me perdoar um dia, e quem sabe me dar uma segunda chance? Mas, são apenas conjecturas.
Ela talvez não saiba que estamos morando no Rio desde o incidente, pedi a gentileza de Ângela e Dr. Paulo não contarem, com medo disso prejudicar o relacionamento deles, sabia o quanto a Bia era ligada ao avô, jamais ficaria entre eles. Por hora eles estão me apoiando, mas caso ela perguntasse, não iria pedir que mentissem... A mentira acabou com minha vida uma vez, mas não o fará novamente.
Para o meu alívio, Eliza veio comigo e assim tinha ajuda dela com Diana. Bom, estou trabalhando na P&H Coffee, Dr. Paulo não aceitou meu pedido de demissão, mesmo dizendo a ele que não iria mais, insistiu tanto que acabei cedendo. Devido aos acontecimentos, meu irmão e eu adiamos nossos planos de montarmos nosso próprio negócio, ficamos de conversar em um futuro próximo.
Ele trabalha com Publicidade e Propaganda, na verdade minha carreira eu só segui porque ele me incentivou muito na época, a nossa ideia era terceirizar o nosso trabalho, por isso a ideia de montarmos nosso próprio negócio. Só não seguimos com isso porque ele me convenceu a deixarmos isso para o futuro, uma vez que tive que me mudar para o Rio e ele e Claudia estavam pensando em comprar uma casa perto de nós, o que eu achava muito bom, queria ter meu irmão por perto. E por conta disso, tivemos que adiar nossos planos, por hora.
Quanto a minha filha, não tinha um só dia que não perguntava da Bia, principalmente quando íamos visitar a mansão Olivier. Incrível, não questionava, até porque levei apenas dias para me declarar apaixonada por ela. Mas, as duas não tiveram tanto contato assim para esse apego todo, nem com Rebeca que era mãe ela tinha essa ligação, nem perguntava tanto quanto perguntava da Bia.
Falando em Rebeca, depois daquele dia, não nos vimos mais, graças a Deus, consegui nossa separação e agora desejo que ela mantenha distância, apesar de ainda me sentir mal por afastar mãe e filha, não tinha outra escolha. Deitei com minha filha e fiquei divagando até finalmente conseguir adormecer.
Os dias foram passando sem muitas emoções na minha vida, dois meses antes da inauguração do Lion, Luiz e Claudia vieram passar alguns dias conosco, iríamos dar início aos ajustes finais no casarão, agora que as obras de restauração terminaram e o novo projeto arquitetônico posto em ação, estávamos nos divertindo com pintura e organização das salas para recebermos os alunos, que até então, tínhamos uma lista grande de inscrições e outra no banco de dados de espera.
Várias pessoas da empresa se juntaram a nós, entre elas o pessoal da aldeia e claro, dona Maria e sua família, todas as crianças foram matriculadas em cursos diversos. Quinze dias depois que meu irmão chegou ao Rio, estávamos conversando animadamente quando entraram pelo pátio um micro ônibus e uma van, totalmente equipados para as crianças, e logo atrás Dr. Paulo e Ângela desceram do carro deles nos informando que aquele presente era da Bia.
Ela estava presente em cada pedacinho daquele lugar, embora longe, sabia de cada passo dado ali dentro, através de relatórios que eram mandados para a P&H Coffee, papéis esses que chegavam em mãos, me certificava disso toda semana com Ellen. Como prometido, ela estava se envolvendo de alma e coração, fazendo o meu disparar cada vez mais quando algo chegava e sabia que era dela. A minha vontade era de vê-la nem que fosse de longe, sabia que estava bem, em partes, mas queria ver com meus próprios olhos.
Um mês atrás Dr. Paulo foi para Madri, tinha uma reunião com ela, perguntou se eu queria fazer companhia a ele, já que Ângela não poderia ir, mas eu recusei, não poderia impor minha presença. A Bia tomou uma decisão quando foi embora e eu não estava em condições de pedir nada a ela, muito menos aparecer no lugar o qual ela escolheu como refúgio.
Enfim, uma semana para a inauguração, tinha acabado de desligar o telefone, estava em contato com uma empresa de diversão, fechando a data certa com eles. Após encerrar a ligação, fiquei divagando na minha sala quando Cleber, enfermeiro amigo de meu irmão apareceu na porta me chamando:
– Sam, tem um mensageiro na recepção querendo falar com você.
– Obrigada, estou indo!
Fechei meu e-mail e guardei meu note, estava na hora de ir para casa. Quando saí da minha sala um rapaz me esperava com o capacete nas mãos e um envelope grande na outra, me aproximei perguntando:
– Tem algo pra mim?
– Dona Samantha Chermont?
– Sim.
– Assine aqui, por favor.
Peguei a prancheta que ele me passou e assinei entregando de volta recebendo o envelope, agradeci perguntando:
– Moço, quem mandou entregar?
– Uma mulher, disse apenas que era pra entregar em mãos, tenha uma boa tarde!
– Obrigada – olhei o papel e fui rasgando o envelope, quando o Lu me chamou:
– Hei maninha, vem ver uma coisa.
Segui para onde ele me chamava, tinham pintado a sala de primeiro socorros e colocado alguns adesivos, sorri elogiando:
– Ficou ótimo… Eu adorei!
– Ficou mesmo, a ideia dos adesivos partiu da Júlia.
Olhei para a moça que estava ali e sorri, ela era uma voluntária, dentre muitos que apareceram quando souberam do nosso projeto, todos querendo ajudar, sorri agradecendo ainda analisando a sala.
– O que é isso? – olhei para onde meu irmão apontava e sorri dizendo:
– Acabei de receber, mas não sei o que é...
Abri sorrindo e brincando com ele, mas o sorriso foi morrendo à medida que via as fotos e uma pequena mensagem que dizia: “Você é minha e não será de mais ninguém!”
– Samantha? Hei… – tudo ficou escuro.
Quando acordei, Luiz estava pálido na minha frente, com o telefone na mão falando com alguém, levantei com a cabeça doendo, perguntei:
– O que aconteceu...
Lembranças das fotos e do bilhete vieram em minha mente, levantei desesperada e aos prantos:
– Ela está com Diana… Luiz, ela pegou minha filha… eu quero minha filha de volta.
Entrei em pânico chorando desesperada, e logo meu irmão me abraçou sussurrando:
– Calma Sam, não sabemos ainda, por favor, sei que é difícil, mas mantenha a calma, Rebeca não vai fazer nada com a Di, ela a ama… Não fará nada com a criança.
Um celular tocou em algum lugar, me dei conta de que havia mais coisa dentro do envelope, peguei no momento em que tocou novamente, atendi desesperada vendo que era número privado, ouvi a voz do outro lado:
– Oi meu amor, sentiu minha falta?
– Rebeca… Onde você está, cadê a nossa filha, Eliza... Pelo amor de Deus devolve meu bebê! – ela gargalhou do outro lado vendo meu desespero:
– Que isso meu amor, nem falou que sentiu minha falta, vou ficar triste assim.
– Rebeca, por favor! O nosso bebê, não tem nada com isso… Eu faço qualquer coisa, mas traga a minha filha de volta.
– Calma Samy, não estou com nossa filha... Ainda! – sorriu ironicamente: – Infelizmente estou longe dela por sua causa, mas isso não irá ficar assim.
– Do que está falando sua doida?
– Ficou com tanto medo que nem percebeu que foi você mesma quem tirou aquelas fotos, há dois anos... Falta de atenção, você não era assim, querida!
Ela ainda dava risada, passei a mão nas fotos e percebi que tinha dito a verdade, como deixei passar isso? Meus Deus, fechei os olhos perguntando quase sem voz:
– O que você quer Rebeca?
– Quero você e nossa filha! – Ouvi uma freada brusca do outro lado e a voz dela carregada de ódio. – Cadê a sua namoradinha, não está aí com você? – Entrei em pânico, ela parou de rir e começou a usar de ironia: – Seria uma pena se acontecesse algo a ela também, uma vez que me privou de ver minha filha para sempre Samantha, e eu ainda fiquei presa naquele inferno.
– Ela não está aqui comigo, sabe muito bem que nos separamos por culpa sua – estava desesperada e com medo – você mesmo plantou isso, não coloque a culpa das suas loucuras na Bia, ela não tem culpa de você ter sido tão cruel.
– Acha que fui cruel, meu amor? – gargalhou, fiquei ainda mais com medo: – Não foi eu quem mentiu para ela! – estava fazendo caso do outro lado e quando voltou a falar senti fúria em sua voz: – Você vai voltar para mim Samantha, entendeu? Custe o que custar, não será de mais ninguém…
– Rebeca, pelo amor de Deus, olha o que está dizendo...
Mas como se não tivesse me ouvido ainda ameaçou:
– Diga a sua namorada que a matarei se cruzar o meu caminho novamente… Roubou minha mulher e filha, tirou a minha liberdade... – ela estava desnorteada, não sei se falava comigo ou com ela mesmo: – Mas agora não deixarei que me tire mais nada, está avisada!
E antes que eu dissesse alguma coisa desligou o telefone, minha cabeça rodou naquele momento, senti alguém me abraçar dizendo:
– Diana está aqui, Sam.
Olhei sem entender nada até ver minha filha correndo na minha direção.
– Oh! Meu Deus!
A peguei no colo apertando com forças, pedindo a Deus para que aquele pesadelo acabasse logo.
– O que aconteceu? – Eliza nos olhava sem entender, ouvi meu irmão perguntar:
– Liza, você por acaso encontrou com Rebeca por aí? – ela olhou de meu irmão para mim e suspirou dizendo:
– Eu não ia contar, dona Samantha, para não apavorar a senhora, mas tive a impressão de ter visto dona Rebeca passar de carro em frente da escolinha da Di.
Não sentia mais o chão, tudo estava desmoronando, alguém tentou tirar minha filha dos meus braços, mas não permiti. Ninguém iria tirar o meu bem mais valioso de perto de mim... Minha filha e a Bia… Nada mais importava, se acontece alguma coisa com elas, não me perdoaria nunca. Nunca pensei que fosse cogitar algo assim, mas iria procurar a única pessoa que poderia me ajudar... Meu avô!
Fim do capítulo
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