Capitulo 13
Incrível como tudo pode mudar num lapso de tempo, era o pensamento de Walkiria enquanto buscava ordenar suas emoções. Agira com uma calma que não sabia possuir, mas a realidade era que estava a um ponto de explodir. Sua vontade era quebrar tudo, gritar, mandar Dália passear em plutão, no entanto, agira como uma mulher no controle das emoções. Ou seria covardia? Ah, foda-se! Queria era que Dália desaparecesse dali e pudesse, como que por mágica, voltar ao seu estado de plenitude.
Não demorou muito para o vulcão interno, expandir-se para o exterior se deu corpo. Começou a tremer, a boca ficou seca e o estômago embrulhado. Respirou fundo algumas vezes, buscando o equilíbrio.
Não saberia precisar quanto tempo esperou que Dália aparecesse, mas ela demorou. Soube-o pela respiração mais compassada e o coração batendo numa toada suave. Sentada no banco de madeira, abraçada às pernas e com o olhar perdido no breu da noite, vislumbrou a figura dela vindo em direção ao lounge.
-Peço desculpas pela atitude na receção...agi sem pensar e sei que perdi o controle. Mas estou cansada de me sentir usada. Nem sei se usada é a palavra certa, mas tu não dás a essa relação a importância devida. Se calhar não dás importância alguma...
-Dália....
-Não, tu vais me ouvir. Hoje, tu vais ouvir tudo o que está entalado na minha garganta.
Walkiria respirou fundo e encarou-a. Sua vontade era dizer que nunca tinha prometido nada. Ninguém tinha prometido nada. Só estavam juntas para passar o tempo, se divertir, quando fosse oportuno para ambas. Pelo menos era nisso que acreditava.
-Eu já sabia que eras assim. A tua fama corre solta no meio, fama de mulher que não se envolve com nada além do trabalho. Quer estímulo maior para uma predadora como eu? Eu sempre tenho tudo o que quero. As mulheres fazem fila para chamar a minha atenção. Confesso que entrei nesse jogo por pura diversão e para provar que ninguém resiste ao meu charme. Começamos bem, muito bem. Apesar dessa muralha toda que te cerca, quando conseguimos entrar, ah, é viciante...estimulante. Esse teu ar de inatingível é afrodisíaco, ainda mais se penso como és na cama...
A conversa causava incomodo em Walkiria, mas não tinha coragem de abrir a boca e muito menos ser o contraponto do discurso inflamado de Dália.
-Inventei de me envolver contigo justamente na pandemia. Péssimo timing. Fiquei presa a ti e sem mais possibilidades. O que seria uma brincadeira, passou a algo sério. Em escassos meses, de predadora virei presa.
Mais uma vez Walkiria teve vontade de gritar que não prometera nada, mas, permaneceu calada.
-Tu pareces desprezar as relações. Nada tem importância além dessa porcaria de hotel. Tenho certeza que se pudesses, casavas com a Pedras do Vale. - Riu com desdém.
A cabeça de Walkiria começou a fervilhar e a respiração mais uma vez, alterou-se.
-Sabias que eu apostei que te dobrava - Ria em completo descontrolo - Sim, apostei e por momentos estive crente que ganhara a aposta. Mas tu és surpreendente, ninguém alcança a tua alma, ninguém te alcança. É uma frieza exagerada...descaso...já disse, só vês essa merd* de hotel, tuas responsabilidades, esse mundo sem graça que abraçaste com garras fortes...que desperdício. No nosso clube, esse que não frequentas por ser perda de tempo, és tida como inalcançável. Há quem duvide se realmente gostas de mulheres. Eu sou a prova viva que gostas sim, muito. Pensando bem, talvez gostes apenas de sex* com mulheres...talvez nem saibas se gostas de alguma coisa...
A acidez no tom dela, perturbava Walkiria. Não concordava com grande parte das asneiras que ouvia, mas, algumas coisas faziam eco. Muito barulho na mente.
-Eu acho que és descompensada. Esse teu ar de superioridade, esconde uma dificuldade enorme em lidar com pessoas. Tu te escondes atrás desse hotel para não lidar com a vida, com as pessoas. E eu devo ser tão ou mais doida do que tu e sabes porquê? Sou apaixonada por ti. Não consigo controlar os meus sentimentos...
Walkiria arregalou os olhos ao ouvir a palavra apaixonada. Tinha certeza que ambas estavam na mesma pagina, diversão e ponto. Paixão? Que confusão era aquela? Ela não era a única descompensada da equação...
- Eu vou embora e espero que penses com clareza sobre o que acabei de dizer.
Walkiria tinha a sensação de que nada fora dito. Nada que fizesse sentido...
- Seja mais clara e honesta, se é que consegues. Desculpa por invadir o teu santuário a essa hora - ironizou - Quando quiseres, sabes onde me encontrar.
Ela arrastou-se dali em direção à saída do hotel. Os passos pareciam errantes, a silhueta em nada lembrava a mulher esguia e triunfante. A imagem dela foi engolida pela escuridão e Walkiria soltou o ar com força. Sentia-se sufocar...
Minutos se passaram, talvez uma hora e ela finalmente teve força para voltar para casa. A serenidade do ambiente noturno do hotel, contrastava com o turbilhão da sua alma. Não sabia o que pensar e quando tentava coordenar as ideias, a única palavra que ganhava vida era culpa. Sentia-se culpada pela falta de clareza. Culpada por ter induzido Dália a uma ideia errônea...culpada...culpada...
*****
Abraçada a Zuri, Walkiria tentava encontrar respostas nos sons da natureza. Costumava fazer perguntas às arvores, aves, nuvens, confidências também. Mas, naquela manhã sombria, ninguém parecia disposto a dialogar.
Estava cansada e sem conseguir raciocinar. Não tinha dormido mais de 3 horas e mesmo assim, um sono tumultuado. Abdicara do treino logo cedo, o que só acontecia em raríssimas ocasiões. Não tinha força, ânimo, nada. Como se não bastasse as complicações financeiras do seu empreendimento, agora tinha de lidar com questões emocionais. Não estava nos planos. Nunca estava...
Dália...que LOUCURA! Aquele discurso pareceu-lhe tão desproporcional. Mas o que entendia da dor alheia? O que entendia de emoções? Não era o seu forte, definitivamente. As acusações de Dália não eram justas. Não tinha prometido nada!
Olhou para Zuri e desejou que ele falasse a língua dos homens...
*****
Determinada a adotar novos e bons hábitos, sentou-se no lounge para tomar café. Depois de meia hora olhando ora para a natureza, ora para os hóspedes, notou que não comera nada. A chávena de café já estava fria, assim como suas mãos. Era puro nervosismo, nem estava tão frio assim...
-Dona Wiki, não gostou dos meus preparados? Não comeu nada...
-Ah Diana, teu serviço está perfeito como sempre. Acordei sem apetite...
-Parece preocupada também. Eu posso ajudar?
A sinceridade, aliada à simplicidade nos gestos daquela moça quase provocaram um choro convulsivo em Walkiria. Não estava bem. Há quanto tempo não chorava?
-Ajudas muito fazendo o teu trabalho com esmero. Obrigada, mas são problemas que só eu posso resolver.
-Se precisar de alguma coisa, qualquer coisa, eu estou lá na cozinha.
Sorriu e agradeceu com um gesto. Estava engasgada. A cabeça parecia uma grande nuvem carregada, vagando para lugar algum.
*****
Os acontecimentos no trabalho, ajudavam-na a abstrair-se da confusão emocional em que se encontrava. Tinham acabado de fechar contrato com uma nova operadora, o que culminaria em mais clientes. Tudo resultado do novo posicionamento da marca. A nova operadora tinha entrado em contato exatamente por mostrarem uma vertente até então desconhecida.
-Estou a um passo de sair gritando por aí de felicidade. Não desisti de fazer algo em agradecimento à Nahima. Aliás, obrigada Nahima, obrigada a ti e aos nossos funcionários. Ah e obrigada ao nosso hotel maravilhoso e a esse lugar mágico. - Greta era puro entusiasmo.
Walkiria estava feliz, muito feliz, mas não conseguia ter o mesmo entusiasmo que a sócia.
- A Nahima disse-me que vai fazer mais alguns vídeos, que causarão um impacto maravilhoso para as nossas vendas.
-Não temos como remunerar essa mulher...
-Ela não quer dinheiro. Mas eu vou fazer algo para retribuir...simples, mas efetivo. Ei, estás bem? Estou aqui exultante e tu pareces apenas...normal...sei lá. Estou doida?
Walkiria levantou da cadeira e andou de um lado para o outro até posicionar-se à frente da janela. Cruzou os braços e encostou a cabeça no vidro.
-O que aconteceu, Wiki? Saíste daqui feliz para ir à Praia, encontrar a tua amiga, sair um pouco da rotina, mas parece que as coisas não correram muito bem.
-Com a Leida foi tudo maravilhoso. As coisas estão a melhorar por aqui, mas ainda não podemos celebrar. - Mudou de assunto. - Talvez paguemos o banco, as despesas daqui, mas não dá para respirar de alívio. - Concluiu, voltando ao desânimo.
- Walkiria, há duas semanas, sequer tínhamos perspectiva de pagar a parcela do banco, que dirá, pagar o banco e as contas do hotel. Consegues ver o copo meio cheio, por favor?
A indignação da amiga foi o estopim para Walkiria revelar todo o desconforto que a afligia. Aflita, saiu de perto da janela e sentou-se numa posição frontal à sócia.
-Greta, o que pensas sobre mim? Como me descreverias? - Seus olhos gritavam toda a sua inquietação.
-Como assim? Tu sabes o que penso sobre ti...
-E o que é? Qual é a minha característica mais marcante?
-Wiki, para quê isso agora? Eu te considero uma mulher maravilhosa. Eu te admiro muito e sabes disso...
Walkiria desabou na secretária e encarou a amiga com semblante de derrota. Em alguns minutos e de forma arrastada, relatou o que tinha acontecido na noite anterior com Dália.
-Wow...confesso que me surpreendi com essa reação dela. O que sentes pela Dália?
-Com toda a certeza, não estou apaixonada por ela nem nada que se pareça. - Desabafou bufando alto.
-Sinceramente Wiki, esse desabafo de Dália parece-me fantasioso, ou...- Pensou em manipulação, mas preferiu abster-se desse comentário. -Eu sempre achei que ela tinha como objetivo fazer-te cair de amores, já que sabemos que o ego dela é para se levar em conta. Dizem por aí que és difícil de dobrar, essas coisas que já estás cansada de ouvir...
-Por acaso nem sabia que era essa a imagem que tinham de mim e também não me interessa. Acreditas que ela apostou que me dobraria, que me faria cair de amores...
-E ela assumiu isso para ti? - Greta tinha os olhos arregalados.
- Sim, um pouco descontrolada, e talvez sem noção do que dizia, mas soletrou cada letra na minha cara.
- Isso para mim é pior do que ser egocêntrica, é infantil e quase doentio, afinal estamos a falar de uma mulher de mais de 40 anos, subentende-se algum juízo.
-Eu não estava à espera daquela reação. Não soube como reagir...e no final me senti culpada por não corresponder às expectativas dela...
-Ah Walkiria, calma. Vamos ponderar essa situação. Tu prometeste alguma coisa a essa mulher? Fizeram planos juntas? O futuro esteve alguma vez em pauta?
Depois de algum tempo vasculhando a mente, Walkiria concluiu que não tinha prometido nada.
-Então?
-Não sei explicar o que aconteceu comigo, aliás, o que está a me incomodar até agora. Ela atingiu algum ponto aqui dentro que nem eu sabia que existia.
-Tens frequentado a terapia?
-Sabes que não...não vou com a assiduidade que meu descontrole emocional exige. - Sentenciou.
-Vamos devagar com esse drama.
-A sensação que tenho é que foi aberta uma ferida gigantesca na minha alma e não tenho acesso à dor para expurgá-la. Consegues entender? Estou confusa...
Greta levantou de onde estava, contornou a mesa e abraçou o tronco da amiga que deixou-se embalar.
-Quem está confusa agora sou eu. Afinal, gostas ou não da Dália? Gostar não é a palavra certa, porque é obvio que sentes alguma coisa, ou não perderias o teu tempo. Mas afinal, o que é?
-Não entendi a pergunta.
-Estás a sofrer por ela estar chateada?
-Greta, eu não estou abalada pela Dália, estou triste por mim. Consegui identificar algumas coisas sobre mim ontem que não me deixaram em paz. No descontrolo da Dália tinha muita verdade sobre mim...
-Não se martirize pelas expectativas dos outros. Tu nunca prometeste nada demais...
-Será que não? Meu silêncio conivente deve ter dado margem a muitas interpretações.
Fez-se silêncio por alguns minutos. Cada uma divagando sobre o mesmo assunto, e com perspectivas nem sempre convergentes.
-Greta, tu namorarias comigo? - Perguntou num rompante.
Greta riu e se afastou um pouco do abraço. Parecia pensativa.
-Eu não me sinto atraída por mulheres...nunca passou pela minha cabeça...
-Esquece esse detalhe. Tu me considerarias uma pessoa interessante? Uma doida de quem manterias a máxima distância?
Greta retornou à sua cadeira e encarou Walkiria com um leve sorriso no rosto.
-Eu sou romântica, quero ter uma família, filhos lindos e amados, quero e preciso me sentir amada e amar profundamente. Eu sou tradicional, careta se preferires...
Riram.
- Acredito em amor para a vida inteira e sei que um dia vou ser agraciada com o melhor amor. Para mim, o amor virá sempre em primeiro lugar. - Concluiu sonhadora.
-Jamais namorarias comigo! Mais claro do que água. - Concluiu para gargalhada de ambas.
Apesar do tom de brincadeira que se seguiu, aquele assunto ficou a martelar na cabeça de Walkiria pelo resto da tarde.
*****
No final da tarde, saiu para caminhar pela natureza. Precisava aliviar a mente e a tensão que sentia na nuca. Se por um lado, a conversa com Greta tinha ajudado a desanuviar, por outro, adensara as indagações sobre quem era afinal. Não estava inclinada a encontrar um amor e viver feliz para sempre como sonhava a sócia, mas, de repente, fazia sentido uma relação diferente. Talvez estivesse carente, desorientada...talvez sim, mas cogitava uma relação de maior companheirismo. Queria alguém para incendiar a sua cama sim, disso não abria a mão, mas queria também alguém com quem pudesse desabafar, chorar, pensar junto e porque não, fazer planos. Talvez fosse o avançar dos anos, afinal já não era uma jovem sem compromissos. Tantas dúvidas e pensamentos que jamais tinham causado tamanha inquietação.
Todos os caminhos a levaram à casa de Nahima. Quando percebeu, estava à entrada da Aldeia Vinniard. Sem qualquer hesitação, seguiu o trilho até o chalé dela. Assim que contornou a curva que levava á entrada de Nahima, viu-a saindo pela porta principal. Um sorriso brotou na sua face e apressou os passos. Tinha pressa, ainda que não soubesse exatamente de quê.
-Parece que cheguei a tempo de experimentar a milagrosa sessão de yoga. - Brincou.
Nahima sobressaltou-se e um sorriso luminoso emoldurou a sua face.
-Chegaste na hora certa.
Abraçaram-se sem qualquer cerimónia. Permaneceram. Parecia o encontro certo, no tempo perfeito.
-Chegaste há muito tempo?
-Não...o almoço estendeu-se por mais algumas horas. Encerramento de evento, já deves imaginar...
-Hum-hum...
-Estás bem? Vejo umas olheiras que ontem não estavam aqui, - Brincou e acariciou-lhe a pele por baixo dos olhos com a ponta de um dedo.
Walkiria esforçou-se muito para não desabar. Sua vontade era chorar e desabafar toda a sua confusão mental. Mas a que propósito?
-Não te importas se eu ficar quieta e apenas observar? Acho que hoje não conseguiria iniciar nada...- A voz soava fraca.
-Estás á vontade para fazer o que quiseres, inclusive nada. Aproveite a música, o aroma calmante do incenso e a natureza divina. Vais ficar mais calma. Eu prometo.
Walkiria respirou fundo e fechou os olhos.
-Isso...respire...mais uma vez. Boa. - Sorriu. - Vou praticar.
Ela deslizou como uma pluma em direção ao canto onde praticava, e Walkiria foi sentar-se na cadeira de baloiço.
Absorta pelo ambiente, de olhos fechados, ela viajou para mundos coloridos e sem qualquer som perturbador. Conseguiu alcançar um lugar de paz que não sabia que existia, pelo menos não dentro da sua mente sempre agitada. Por ali ficou por algum tempo, sem que ficasse claro a contagem exata do mesmo. Abriu os olhos devagar e experimentou a paz, agora em estado consciente. Baloiçou o corpo na cadeira e gem*u de satisfação. Estranhou o completo silêncio no ambiente, até que depois de uma profunda respiração, notou que afinal tinha uma música suave tocando algures. Girou o corpo em direção ao som e imediatamente ficou estática. Seus olhos presenciaram a perfeição. Era exatamente essa a definição para o que via á frente dos seus olhos. Nahima se movia num misto de força e leveza e numa sincronia desconcertante. O corpo se movia numa cadência perfeita e o que ela conseguia dele era impressionante. Contorcia-se, até ao limite, dando a sensação que não tinha ossos. As inversões, paradas de mãos, pareciam a coisa mais corriqueira da face da terra e a transição dos movimentos deixava Walkiria sem respirar. De repente sentiu-se tentada a entrar naquele flow, tamanha a admiração, mas sabia que não conseguiria realizar nem o mais simples dos movimentos. Não com aquela perfeição. À medida que ela se mexia, Walkiria experimentava sensações diversas que iam de admiração, leveza, entusiasmo ao mais primitivo tesão. Pulou da cadeira ao notar que exalava calor por todos os cantos do seu corpo. Um calor abrasador que a impulsionava a extravasar. Que loucura! Como poderia ir da absoluta paz, à vontade desenfreada de se embrenhar em todas as nuances daquela mulher. Foi acometida de um desejo insano que não tinha memórias de já ter experimentado. Que grande confusão. Já não bastava a confusão mental, agora tinha que aplacar o fervor do corpo. Testando os seus limites, olhou para o canto onde Nahima estava. Experimentou outra emoção à qual não estava habituada. Ficou inebriada, pasmada na sua figura. Ela fazia o ritual de agradecimento pela prática, isso já conhecia de tanto ver as aulas de Greta. Num movimento que mais pareceu um sonho para a mente confusa de Walkiria, ela materializou-se à sua frente.
-Vem. - Puxou-a pela mão e juntas sentaram-se no sofá de bambu. - Adoro minha cadeira de baloiço, mas aqui temos mais conforto. - Sorriu.
Como ela poderia aparentar tamanha leveza depois de tanto esforço? Era uma das várias perguntas que pululavam pela mente agitada de Walkiria.
-Conseguiste acalmar a alma? - Mantinha o sorriso e a leveza apaixonantes.
-Para ser bem sincera, nem sei o que está a acontecer neste exato momento...
-Estás a referir a quê?
-Ah deixa para lá. Eu sou bastante complicada. - Sentenciou.
Num gesto aparentemente corriqueiro, Nahima segurou uma mão de Walkiria entre as suas e levou aos lábios. Ato simples e despretensioso que elevou ainda mais a temperatura dela.
-Alem de tensa, estás muito quente. O que se passa? Eu costumo ser excelente ouvinte. - E sorria com a leveza desconcertante.
Walkiria suspirou e inquietou-se ainda mais.
- Não conseguiste relaxar com a música e a atmosfera?
-Nem sei o que vim fazer aqui. Pareceu-me o mais certo...se é que isso faz sentido. Mas agora quero correr para longe...de mim...estou tão confusa, nem consigo gritar, arremessar esse desconforto para longe...
-Ei, aqui podes tudo. Grite se quiseres, berre, chore - Nahima fez um movimento e sentou-se na costa da cadeira e abraçou Walkiria que ficou de costas. Ambas soltaram o ar em simultâneo.
-Como posso gritar? E os teus vizinhos?
Nahima riu e intensificou ainda mais o abraço.
-Aqui perto só tenho o James e ele não está e se estivesse, não se importaria...
O abraço estreitou-se. Era carregado de afeto, acolhimento, tudo que Walkiria precisava para lavar a alma. E fê-lo. Chorou como não fazia há muito tempo. De repente, lembranças de longe vinham para o presente, dores da adolescência, a necessidade de ser forte a maior parte do tempo para não fragilizar a mãe...tantas coisas que achava que já tinha ultrapassado...e o choro vinha sem pudor...
-Estou me sentindo tão perdida.... Parece que tudo resolveu acontecer ao mesmo tempo, me atropelando, fazendo meu bom senso tirar férias...será que tenho algum bom senso? A única coisa que sei, é que me sinto uma perfeita idiota.
-Ei, para. Não és idiota, não sei o que aconteceu, mas não se martirize assim.
- Estou confusa...briguei com a Dália, ela brigou comigo.
-Hmmm... e queres falar sobre isso? - Walkiria não podia ver a fisionomia de Nahima, mas a menção daquele nome provocou uma leve alteração no seu semblante.
-Juras que tens paciência?
Nahima não disse nada, apenas beijou-lhe o topo da cabeça como encorajamento.
- Ontem eu voltei tão feliz da Praia. Tudo fluiu bem, os acontecimentos planeados, as surpresas...cheguei em casa quase pisando em nuvens e não é exagero.
Nahima sorriu ao notar que uma das razões da felicidade dela era o encontro ao acaso no bar da praia de Kebra Canela.
- Cheguei já passava da meia-noite e ela estava à minha espera ...disse-me tanta coisa, estava descontrolada, doida, agressiva...fiquei com medo de ser a causa do descontrolo, de ser uma pessoa ruim...ela me fez sentir assim.
Mais uma vez, desabou num choro convulsivo.
Algum tempo depois, já mais calma e ainda na mesma posição, acolhida no abraço, Walkiria suspirou profundamente.
-Desculpa se o que vou dizer agora possa soar invasivo, mas cuidado com as armas que dás aos outros e que podem ser usadas contra ti.
-Eu não entendi. Podes explicar melhor?
-És apaixonada por essa mulher?
A pergunta soou como um insulto na cabeça confusa de Walkiria, e num movimento brusco, ficou de frente para Nahima.
-NÃO! Eu posso estar confusa, não saber muito bem em que merd* estou metida, mas não estou apaixonada pela Dália. Ela se diz apaixonada por mim, e isso é coisa de pouco tempo para cá. Antes, parecíamos estar na mesma página, curtindo passar bons momentos juntas e ponto.
-Como é a vossa troca? Faço essa pergunta porque já vivi experiências em que havia alguma falha na comunicação, o que culminou em muita frustração...
-Queres saber se conversámos? O nosso forte não é o diálogo... para ser bem sincera, eu não penso sobre o motivo de estar com ela, apenas estou...no começo era bom, até que comecei a perceber que não tenho nada a ver com ela...expectativas tão diferentes, sem falar na irresponsabilidade com que encara o trabalho...mas eu não exponho o que penso, tenho essa mania de deixar as coisas seguirem e ver se resolvem sozinhas...talvez seja fraqueza. A comunicação não é o meu forte...
-Eu gosto da nossa troca...gosto de captar as tuas minucias e decifrá-las...eu gosto...
O tom da voz, o brilho e a intensidade no olhar, tudo naquela frase despertou um verdadeiro vulcão dentro de Walkiria. A explosão deu-se no momento em que Nahima tocou-lhe os braços. Ambas tinham a respiração alterada e queimavam, na pele, nos olhares. Nahima baixou o olhar faminto para a boca de Walkiria, que sem qualquer receio agarrou-lhe a nuca e puxou-a para um beijo. Tudo ardia e gemiam insaciáveis. Walkiria a puxava cada vez mais para si e o entrosamento era perfeito. Mexiam-se sincronicamente e o desejo aumentava numa velocidade enlouquecedora. As bocas não se desgrudavam, as línguas se devoravam numa dança perfeita. Sorriam, gemiam e se entregavam. Lá longe, tocava uma música cujo efeito deveria ser relaxante, mas incendiava ainda mais os corpos que se buscavam freneticamente. Envolvida pelo desejo inequívoco, Walkiria meteu as mãos dentro da camiseta de Nahima e o toque na pele dela provocou uma sensação de vertigem, algo doce, inebriante. Nahima gem*u e arqueou o corpo ainda mais para deleite de Walkiria que queria mais. Os corpos estremeciam aos toques e as bocas exploravam recantos perfeitos de prazer.
-Eu não sei o que acontece...ahhh...eu quero muito...eu quero... - Walkiria delirava a cada toque de suas mãos pela pele quente e macia de Nahima. Seus dedos tentavam invadir o cós do top de ginástica, mas era apertado demais. Nahima riu e as duas se olharam. Tinha tanto ali...tanto que assustava. Nahima sentiu que podia mergulhar naquele olhar e ficar. Walkiria, por sua vez, sentiu algo que jamais ousara permitir-se. A ânsia de consumar o desejo, fê-las mergulhar em mais um beijo. Agora mais calmo, explorador, intenso e delicioso. Nahima puxava o corpo de Wiki para grudar no seu. Puxava com vontade, o desejo louco gritava por todos os recantos de seu corpo.
Olharam-se mais uma vez entre beijos ardentes. Walkiria assustou-se com a enxurrada de emoções que os olhos de Nahima gritavam. Mas, o que fez com que pulasse dali como um animal assustado, foi perceber-se entregue como jamais estivera. Tinha mais do que apenas desejo carnal, disso entendia bem. Queria sex* com ela, ah, como queria. Queria naquele momento e em muitos outros, mas tinha mais. Como? E esse mais significava o quê? Não estava preparada para mais confusão. Não lidava bem com novidades...
-Cuidado! - Nahima gritou diante do desequilíbrio de Walkiria que quase caiu. Passou as mãos pelo cabelo e buscou o ar com força.
-Ai - Walkiria gem*u ao bater a ponta do pé numa mesa. - Desculpa...eu estou completamente desequilibrada e confundi tudo. Não sei mais o que faço...desculpa...- Tremia.
Sem dizer uma única palavra, Nahima levantou do sofá com a mesma leveza com que se movimentara no yoga e entrou em casa. Lá dentro, levou a mão primeiro ao peito e depois à boca. Tentou normalizar os batimentos do coração com a respiração adequada. Seu corpo parecia ter ganhado mais dez vidas. Tudo fervia, explodia vida. Mais calma, encheu um copo de água que foi engolido num único gole. A cabeça não conseguia pensar de forma lógica, em compensação, o corpo flutuava. Sorriu. Respirou fundo tentando ordenar o pensamento. Talvez tivesse razões para se preocupar, talvez...
Alguns minutos depois, já recomposta, saiu para o pátio. Surpreendeu-se ao encontrar Walkiria sentada na ponta do sofá. Tinha certeza de que ela tinha ido embora...
-Não consegui ir embora. Não queria que pensasses que sou uma doida, leviana. - O abalo emocional estava expresso em cada palavra que lhe saía da boca.
-Não tenho por hábito julgar ninguém...e já sabes disso. Foi uma atração...um momento...
-Isso...um momento de loucura. - Pela sua cabeça martelava a frase, mais um momento de loucura - Vou para casa.
-Queres que eu te leve? Sei que é perto, mas insisto.
Walkiria apenas concordou com a cabeça. Não estava em condições de argumentar.
*****
-Obrigada por me trazer. Amanhã conversamos com mais calma e sobriedade. - Forçou um sorriso, mas seu olhar carregava constrangimento.
-Temos trabalho a fazer e sei que isso te anima. - Sorriu, mas seu olhar também escondia algumas incógnitas.
Walkiria pegou as mãos dela entre as suas e beijou com ardor. Sem dizer mais nada, saiu.
Com a respiração alterada, Nahima seguiu-a com o olhar até perder de vista.
-Tantas novidades, e a minha intuição me diz que a viagem vale a pena. Salvas pelo controle dela...quem foi salva e de quê? Ahhh...tempo...tempo...
Suspirou e manobrou o carro para a saída da Pedras do Vale.
Fim do capítulo
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thays_
Em: 17/04/2023
Wiki tá morrendo de medo... e elas insistem que é apenas uma coisa de momento... é amor, tá na cara das duas!!
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Se é amor, não sei, mas que há alguma coisa, ah disso não tenho dúvidas. Precisam é tentar descobrir o que é rsrsrs
Bjs e muito obrigada
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mtereza
Em: 09/04/2023
Se joga Wiki mulher se solta rsrsrs
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Não é? Oh mulher para ponderar rsrsrs
Bjs e muito obrigada
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patty-321
Em: 08/04/2023
Uau! Que confusão, Wiki tá na beira de um precipito emocional.
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Pois está...tadinha.
Bjs e muito obrigada
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Marta Andrade dos Santos
Em: 05/04/2023
Wiki dá um chega pra lá em Dália já deu essa relação.
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Não é? Walkiria às vezes me dá nos nervos rsrsrs
Muito obrigada. Bjs
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Mille
Em: 04/04/2023
Dalia querendo atingir a Wiki com seu veneno.
Nahima e Wiki se queimando kkkk essas duas tem uma ótima conexão que vai além do desejo.
Bjus e até o próximo capítulo
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Excelente conexão. Aproveitem lá, mulheres rsrsrsrs
Bjs e muito obrigada
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Dandara091
Em: 03/04/2023
Alô autora!
Essa misteriosa além de tudo tem super poderes! E quem não quer pegar uma X-Men tá ligada? Que mais falta pra Wiki baixar o cospe fogo e tirar a Dalia murcha do pedaço? Tô boladona no último nível da escala das sapas!
Aí Diva pensa comigo. A mulher flutua, tem solução pra tudo e ainda traz uma bruschetta importada e temperada no capricho! Quer mais o que??
#tembruschettaqueehsagrada
#exucospefogonadaliamurcha
#acordapravidawiki
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Alô Dandara!
Kkkkkkkkk, ai, ai, eu morro de rir.
Walkiria tem lá o timing dela para resolver as coisas, vamos ver onde isso vai dar...
Eu não resistiria à Nahima, mas não sou a Walkiria...ou será que não resistiria à Walkiria? Agora fiquei em dúvida rsrsrs
Bjs e muito obrigada.
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NovaAqui
Em: 02/04/2023
Dália achando que iria fazer Walkiria se apaixonar por ela? Sabe de nada kkkkk
E não é que elas se beijaram novamente kkkk Nahima está bem saidinha! Acho que ela está caidinha pela Wiki
Boa semana procê
Beijo ![]()
![]()
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Kkkkkkkkk, Dália está levemente equivocada.
Acho que os beijos entre elas vão virar uma constante daqui para frente. Oremos! rsrsrs
Bjs e muito obrigada.
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brunafinzicontini
Em: 02/04/2023
Uau!!! Sem fôlego aqui! Que momento! O encontro de Wiki e Nahima é sempre inebriante! E Wiki já percebeu que existe muito mais do que simples sintonia sexual entre elas.
Walkíria precisa acalmar seu coração e esfriar sua cabeça para enxergar com clareza que não há motivo para sentir culpa pela reação de Dália, que, claramente, já analisou a história das duas, o que é suficiente para que Wiki dela se despeça sem peso na consciência. Liberta dessa pressão / prisão, Wiki tem mais é que deixar seus sentimentos se expressarem livremente, para alegria de Nahima – e nossa também.
A italiana é uma criatura fascinante, que vem provando ser capaz de despertar o que há de melhor em Wiki, além de estar se mostrando capaz de oferecer aos seus negócios o incentivo que precisariam. Que momento mágico o da prática de yoga! Hipnotizou Walkíria, incendiando todo seu ser e nos deixando em êxtase. Que venham muitos instantes assim!
Lindo capítulo, Nadine! Obrigada, mais uma vez! Talvez precisássemos da ajuda de Nahima para cuidar da parte de marketing da sua obra no Lettera, a fim de alcançar o destaque que merece! Sua escrita é maravilhosa e precisa ser lida por todos que tenham bom gosto.
Boa semana, querida!
Beijos,
Bruna
Nadine Helgenberger
Em: 17/04/2023
Autora da história
Olá Bruna,
Atrasada, mas cá estou rsrsrs
Essas mulheres são um caso sério e eu adoro muito tudo isso rsrsrs
Teremos mais cenas de yoga...e mais não digo.
Ando sem tempo e sem inspiração para criar, mas vamos reagindo e fazendo o que dá. Se eu parar, aí sim é que nunca mais isso anda e preciso concluir logo essa aventura.
Ah meu bem, desisti de esperar alguma coisa do Lettera, acho que os tempos são outros rsrsrs. É um pouco desanimador, claro que sim. Escrever, ter considerável número de acessos e pouquíssimas reações é desestimulante. Só não largo de mão porque não deixo nada pela metade. Enfim, sigamos como der rsrsrs
Bjs meu bem e muito obrihada
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Nadine Helgenberger Em: 14/12/2023 Autora da história
Que bom que estás a gostar.
Bjs e muito obrigada.