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A tragicomédia de Morgana por shoegazer

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Palavras: 3856
Acessos: 486   |  Postado em: 14/12/2022

Notas iniciais:

Preparem os lencinhos, que o momento chegou.

Qual era o seu pedido?

Há cinco dias que estou aqui.

No primeiro dia, não era capaz de responder nada. Era tudo muito confuso. Minha cabeça ainda estava ligada com tudo o que me aconteceu. Não sei dizer até agora se foi um sonho intenso ou outro tipo de experiência.

No segundo dia, já mais lúcida, vieram me perguntar das minhas reais intenções com a ingestão de medicamentos. Não respondi a nenhuma delas.  Deixei essa função para minha tia.

Fiquei com medo de ter que falar alguma coisa e me levassem de volta para lá. Dormi a maior parte do tempo.

No terceiro dia já conseguia me levantar da maca sem problemas. Tentei comer só, mas ainda ficava zonza. Efeito dos medicamentos. Também tiraram aquele cano do meu nariz.

No quarto eu pedi para tomar banho e mudar de roupa. Pediram mais alguns exames, mas me senti extremamente cansada de tudo. Ouvi rumores que teria que ir a um psiquiatra.

Ontem também veio as primeiras pessoas pra saber o que tinha acontecido comigo. Jornalistas? Curiosos? A polícia? Não quis saber.

A única coisa que pedi, ainda grogue quando acordei, foi que não queria nenhum tipo de visita. O que necessariamente não impediu de que ouvisse a voz delas.

Não queria que ninguém me visse nessa situação.

Afinal, até onde sei, quem me encontrou mais uma vez foi Isabela, que me levou logo para a emergência. Não sei como isso aconteceu, e minha tia diz que não importa. Pelo visto, não fora algo bom.

Até agora não sei o que aconteceu de fato. O pouco que sei é que me encontraram e me trouxeram, e que dormi por dias, agora não sei quantos. Concluo que deve ter sido mais de uma semana. Talvez minha tia não queira dizer para tentar me proteger ainda mais.

Porém, a única coisa que quis saber era se Isolda sabia e sim, sabe, e sim, reagiu mal, e sim, teve um surto. Ouvi minha tia falar com ela, mas também ouvi que ela queria falar comigo e que não importava a propina que ela tivesse que pagar ou bater em alguém, ela daria um jeito de me ver.

As demais, estou constrangida demais para interagir. A última vez que falei com Raquel eu gritei com ela pedindo pra que fosse embora, e depois ignorei Isabela como eu pude.

Inclusive, estou com o livro que ela me deu. Pedi para minha tia que trouxesse, e ela senta ao meu lado, segurando minha mão.

— Está se sentindo melhor hoje?

Assinto que sim, e ela gesticula para que eu me sente.

— Não quer dar uma volta antes de comer? - ela tenta dizer em tom brando, segurando meus dedos - Pegar um pouco de ar fresco pode te deixar melhor.

Dou com os ombros. Querer não quero, mas vejo que é necessário.

— Vem - ela gesticula para segurar minhas mãos e assim me levanto.

Passar tanto tempo deitada assim realmente é estranho. Parece que suas pernas não respondem por ti. Com certa dificuldade e sentindo câimbras, me levanto segurando seu braço. Já parei de tomar soro. Estou só em observação até meu corpo se limpar. Não que eu ache isso necessário, mas o corpo médico e minha tia concordaram com isso.

A passos lentos, passamos pelo corredor até chegar no hall. Meus lábios ressecados e olhos frágeis mal se adequam a iluminação natural que vem de fora. Das grandes janelas, vemos a cidade movimentada.

Minhas pernas fraquejam, e me encosto na parede. Logo ela se prontifica de me sentar em uma cadeira ali próximo.

— Tia, posso fazer uma pergunta? - digo olhando para fora.

— Claro - ela se senta do meu lado.

— Não se sente mal de ter que cuidar de uma pessoa como eu?

Olho-a de relance, e ela faz uma careta de desagrado.

— Sinto mal é que você continue pensando que é um peso para mim.

— Olha a nossa situação... - passo a ponta da língua no lábio inferior - minha irmã é uma viciada, eu sou uma maluca que teve uma overdose...

— Não diga isso. Você não é maluca e sua irmã só precisa se resolver consigo mesmo - ela diz sucinta - que nem você está tentando fazer todo esse tempo, e conseguindo boa parte das vezes.

Minha tia faz uma pausa. Parece que falar disso é doloroso, mas pra mim não causa nenhuma reação. Acredito que é mais fácil porque ela contando assim parece que não é comigo. Eu tive dias ruins, me mediquei para não sentir mais nada e acordei aqui. O percurso é uma incógnita pra mim.

— Você quase morreu, Morgana - Berenice diz com pesar - só de você estar viva já é uma vitória.

Isso só pode ser uma piada. Eu ter sorte em estar viva ou azar por ter voltado e estar tudo ainda pior?

— Por quanto tempo eu dormi mesmo?

Ela hesita.

— Realmente é importante saber disso, querida?

Assinto que sim, e ela exaspera, como se não tivesse saída. Não é como se fosse a primeira vez que perguntasse isso desde que acordei.

— Duas semanas e meia.

Engulo em seco, olhando para o chão. Imagine você não existir por esse período inteiro e não fazer ideia disso.

— Suas amigas querem muito te ver - ela segura meu ombro, afagando-o.

— Não quero que elas me vejam assim... - Levo minha mão até a testa e toco a mais recente cicatriz que até agora não sei como adquiri. Treze - Sinto muita vergonha de ter sido um incômodo pra vocês.

— Não é ser incômoda - ela diz séria - é sobre se importar. Elas querem te ver, conversar contigo, saber que está realmente bem, não só por notícias minhas.

E se volta pra mim.

— Mas... - ela olha para o relógio de pulso, se levantando - sei que tomará a melhor decisão, não importa o que escolher. Vamos?

Berenice me ajuda a levantar e me leva para o quarto. A comida chega, e passo maior parte do tempo empurrando a colher contra o prato. Termino de comer, tomo minha água, mas minha mente só é tomada por uma questão.

— A senhora acha que tenho que contar tudo?

Ela tira a bandeja do meu colo, dispondo-a no armário que tem próximo da parede.

— Você quer fazer isso?

Inspiro devagar, e olho para sua direção.

— Acho que sim.

— Se for algo do seu coração... - ela se apoia contra a parede - eu aviso pra sua amiga que a visita está liberada.

— Pode fazer isso.

Ela assente, e pega o telefone, indo para o lado de fora.

Volto pra leitura e acabo dormindo mais uma vez. Meu sono nunca tem sonhos. Eu só apago e acordo, e dessa vez porque acordei ainda de madrugada. Está difícil regular meu sono tanto quanto minhas emoções.

Não sei se sinto raiva ou tristeza. Na verdade, elas andam lado a lado, então sinto tudo ao mesmo tempo.

Parece que estou do lado de fora, mais uma vez, sem saber o que fazer quando for sair daqui. O futuro é completamente incerto para alguém que não sabia que o teria.

Quando acordo, com os olhos ainda cerrados, vejo que não é minha tia que está no quarto.

É aquela figura alta, com roupas casuais, sentada do meu lado, enquanto a de óculos está parada em pé, próximo da porta, olhando ao redor.

— Morgana? - Isabela diz suplicante - Está me ouvindo?

Assim que ela diz isso Raquel vai até onde ela está sentada e levanta a mão como um aceno.

— Posso te abraçar? - Isabela diz, e cerro os olhos como resposta. Ela ri e me abraça com força.

— Não faz isso - Raquel a afasta - pode machucar - e segura minha mão - você está bem?

— Estava com tri saudades de ti, guria - Isabela diz já em um tom choroso - senti tanta tua falta!

Tem uma primeira coisa a dizer.

— Me desculpe por tudo - abaixo meus olhos - por ter sido um...

Os dedos de Raquel tocam meus lábios.

— Não vim de tão longe pra ver você se desmerecer.

Minha cabeça ainda é a mesma de semanas atrás, e sinto que o meu comentário a deixou desconfortável de algum jeito.

Ela está usando a camiseta que dei de presente.

Pressiono os lábios, balançando a cabeça para o lado. Não quero ter que encarar ninguém.

— Só queremos deixar pra lá esses dias ruins... - Raquel continua a falar.

Da última vez que a vi, ela estava chateada e confusa. Agora, está triste e aparentemente aliviada. Ela beija minha pálida mão e Isabela, sempre emotiva demais, parece que vai chorar a qualquer momento.

— A xarope aí tem razão, Morgana - diz ela passando a mão devagar nas bochechas - e outra, não tem coisa melhor do que te ver aqui com a gente.

Continuo em silêncio. Pensei que quando isso fosse acontecer, seria diferente, impactante, mas sinto que é o que realmente devo fazer.

Talvez quando você morre e volta, como minha tia disse, acaba vindo com uma outra percepção, principalmente por tudo aquilo que vivenciei quando estive dormindo. Provavelmente, tendo finalmente mergulhado em mim mesmo me mostrou uma ótica a qual não tinha visto, ou sequer queria ver.

Ainda lembro das palavras de Valentina falando que as coisas só iam melhorar quando eu aceitasse quem eu sou. E esse talvez seja o primeiro passo para tentar novamente.

Boca amarga. Respiração pausada. Elas me olham atentas, rentes.

— Eu preciso falar pra vocês algumas coisas sobre mim...

Acho que essa história chegou no fim de sua linha.

— Meu nome de registro é Morgana Kercher Vilella - digo pausadamente, sem conseguir encarar a ninguém, até que escuto o pigarro de Isabela.

— Kercher? - ela cerra as sobrancelhas - Tipo daquela bailarina tri famosa, a Eleanor? Minha mãe a acha muito chique!

Tenho vontade de rir, e assim o faço. Fico surpresa por Raquel não ter dito nada para Isabela do que sabia ou sobre o que sabia, mas ainda mais de ver alguém falar dela assim.

— Bah, desculpe - ela diz confusa - é que não é um sobrenome comum e...

— Ela é minha mãe - digo por fim, e Isabela parece ficar perplexa.

— Barbaridade! - ela exclama com as mãos contra a boca - Jura? Eu nem sabia que ela tinha filha, muito... Não, mas isso não faz sentido, guria - e começa a gesticular - tua mãe é conhecida, tua família toda, como...?

Silêncio. Raquel coloca a mão contra Isabela, gesticulando para que ela pare de falar, e assim o faz.

— Meu pai não queria exposição da mídia, entre outras coisas que aconteceram - falo com amargor - enfim...Isolda é minha irmã, mas só por parte de mãe.

— Sério? - Raquel deixa escapar, e assinto que sim.

Silêncio.

— Eu toco piano clássico desde criança e minha mãe... - cerro os olhos - Tinha um jeito de me colocar na linha pra ela. Quando eu errava, era castigada, e eu fui muito castigada porquê... Não conseguia acertar sempre.

Levanto minha camiseta devagar, e deixo que minhas cicatrizes sejam expostas, algo que as espectadoras olham com um notável desagrado, quase asco.

— Mas... - abaixo a camiseta devagar - essa não era a pior parte.

E o silêncio sepulcral anuncia o que está por vir.

— Meu pai abusava da minha irmã.

Ambas fazem uma careta repleta de repulsa, nojo.

— Eu o vi fazendo isso mais de uma vez.

Isabela fica desacreditada, e Raquel se levanta. Dessa vez, nenhuma delas fala nada.

— Ela teve o primeiro aborto aos dezesseis anos - exaspero devagar, deixando o ar escapar -  Só eu soube disso porque a vi nessa situação e tive que a ajudar, mas eu era nova demais pra entender isso. Ela só disse que estava tendo um período ruim, e... Ela teve pelo menos dois períodos ruins.

Raquel parece fazer menção de que está passando mal. Olhos injetados, respiração curta, mas respira fundo. Já Isabela não parece nada bem.

— Minha irmã começou a beber com catorze anos, sabe? - agora sinto as palavras saírem ainda mais cortantes da minha garganta - Foi internada logo depois a primeira vez...

Silêncio.

— O engraçado é que meu pai nunca encostou um dedo em mim - cerro as sobrancelhas, mergulhando ainda mais nas lembranças - na verdade, ele era ótimo, mas só comigo. Prestativo, atencioso. Foi a única pessoa que me apoiou a seguir com o que gostava. Ele só gostava de mim. Ele e minha mãe se detestavam.

O ar começa a ficar mais pesado.

— Eles brigavam muito. Ela quebrou o braço dele, ele a surrava com frequência, ela quebrou seu nariz, ele a derrubou da escada...

O incômodo delas fica frequente.

— Isolda pediu pra que eu não contasse, mas... - mordo os lábios devagar - Vocês não sabem o que é viver no inferno. Não quis mais ver a minha irmã sofrer, mesmo que eu pagasse com aquilo, então disse pra minha mãe o que estava acontecendo.

Dessa vez não prossigo.

— E... - Isabela diz com a voz falha - o que... - seu rosto está sem cor - Aconteceu?

— Ela culpou Isolda pelo ocorrido e disse que isso arruinaria nossa família - rio com ironia - e status, então no dia do meu aniversário...

Engulo em seco. Essa parte não é fácil porque ainda é muito vívida na minha memória.

— Foi a pior briga que tivemos.

Elas se entreolham.

— Éramos uma tragédia anunciada.

Fecho os olhos. Parece que posso ver a cena.

 

 

 

CENA IIX

ELEANOR

Eu vou te matar, Renato! Você acabou com minha vida!

RENATO

Como se você se importasse com qualquer merd* além de si mesmo!

ELEANOR

Se isso cair na imprensa, tudo o qual me esforcei vai pro lixo, seu canalha de merd*! Imprestável!

Ela vira a mesa. Pega uma faca de serra e vai na direção do marido. Morgana olha para a cena sem reação. Se encolhe contra a parede, com as mãos na cabeça.

Ele pega de dentro do criado-mudo do lado da poltrona uma pistola .38, e aponta na sua direção. Dá pra se ouvir o clique.

RENATO

Mais um passo, e te mando direto pro inferno.

MORGANA

Pai, por favor, não!

ELEANOR

Você não é homem o suficiente pra me matar.

Ela dá uma risada ensandecida. Renato volta a colocar o dedo no gatilho, mas suas mãos tremem.

RENATO

E você nunca foi mulher o suficiente. Por isso que Isolda estava à disposição.

Morgana chora no canto, e grita.

MORGANA

Por favor, parem!

ELEANOR

Cala a boca!

Eleanor grita pra Morgana

ELEANOR

A única coisa que você podia fazer que prestasse você não faz, que é ficar calada.

Morgana corre até a mãe, segurando-a pela cintura, olhando para o pai.

MORGANA

Por favor, pai...Eu não aguento mais isso...

Eleanor a segura contra a parede e bate a sua cabeça. Ela acaba caindo pra trás, tonta.

 

ELEANOR

Eu já te mandei calar a boca!

RENATO

Tira as mãos da minha filha!

Ele atira na direção dela. O tiro pega de raspão, fazendo seu braço sangrar. E mais um grito lancinante corta o ambiente.

Eleanor corre até ele, e antes que ele pudesse recarregar a arma, apunhala seu ombro. Ele grita e cai pra trás.

Ela volta a apunhala-lo com a faca. Morgana ouve os gritos de dor dele, e quando Eleanor se levanta, está banhada de sangue. Incrédula, em êxtase.

Morgana corre até o pai, que cospe sangue e se retrai. Sua roupa está coberta de furos e manchada de vermelho.

Eleanor treme, jogando a faca de lado. Olhos gritantes, esbugalhados, as mãos contra a cabeça. Não acredita no que acabou de fazer.

ELEANOR

A... A culpa é sua, Morgana! Olha o que você fez!

MORGANA

Pai! Pai! Por favor, não...

Seu choro é nítido. Lágrimas caem contra o peito do pai, que segura suas mãos com as dele, manchadas de sangue.

RENATO

Shh...

Renato leva o polegar pelo caminho de lágrimas da filha. Seu sorriso é manchado de sangue que saí da sua boca.

RENATO

Não chore. Eu vou ficar bem... Você vai...

Ele tosse mais sangue.

RENATO

Você vai ficar bem...

MORGANA

Não me abandona, por favor, fique comigo...Por favor, pai!

RENATO

Me perdoe. Eu queria ter sido melhor pra você.

E sua respiração cessa. Seus olhos encaram o vazio.

MORGANA

Pai!

Seu grito seco ecoa pela sala vazia.

 

 

 

Isabela chora.  Pressiono os lábios, tentando me conter, mesmo sabendo que será em vão. Não estou muito bem pra continuar a falar o que aconteceu depois. Isso já me tomou o suficiente. Agora, minha tia também está no quarto, ouvindo a tudo aquilo assentindo silenciosa. Raquel se volta pra ela.

— O que aconteceu?

— Fiquei com a guarda delas. Eu já queria há tempos - ela diz séria, andando pelo quarto - e depois de tudo isso, eu consegui a guarda parcial, mas até que conseguisse tudo demorou...

— Mas ficou por isso mesmo? - Raquel diz indignada, segurando minha mão.

— Foi dado como legítima defesa - ela dá com os ombros - mas, de um jeito ou de outros, eles iam acabar se matando.

— Foi por isso que mudaram de nome? - Raquel pergunta novamente, provavelmente para sanar as dúvidas anteriores.

— Alguém precisava protege-las... - ela diz entre um inspirar e outro - A única coisa que queria que tivessem era paz.

Raquel cerra as sobrancelhas, como se arrependesse de algo que fora dito. Levo minha mão até seus lábios, negando.

— Não tinha como você adivinhar.

— Então vocês foram morar com sua tia, não é? - Isabela diz ainda chorando, se voltando pra mim. Neguei, e vejo Berenice hesitar de fundo.

— A Morgana entrou em um estado catatônico após esse acontecimento, e... - Ela complementa - precisou de cuidados espec...

— Eu fui pra uma clínica psiquiátrica.

Encaro-as séria, de um jeito que provavelmente nunca fiz na minha vida. Parece não entender que quis dizer literalmente isso.

Falar isso foi menos pior do que imaginei. Ambas ficam sem reação.

— Passei mais tempo lá do que podem imaginar.

Não estou com meu emocional no melhor estado. Seguro a coberta com firmeza, mordendo os lábios, já sentindo meus olhos úmidos.

— Mas por quê?

— Entramos em consenso de que ela ficaria melhor lá do que aqui fora... - Berenice vai até meu lado, tentando me acalentar - Demos o tempo que ela precisava.

— Me desculpem pelo que fiz a vocês... - mais uma vez eu caio - Não queria causar mal a ninguém, só trouxe problemas para suas vidas... Eu sou um grande problema.

Me sinto tão exposta que recuo pra mim mesmo, deixando o ar sair pela boca trêmula.

Mas, sinto uma mão tocar a minha. Uma calejada, coberta de contusões. Ela olha para nossas mãos, e respira na mesma intensidade que eu.

— Você nunca... - Ela puxa o ar mais uma vez - Será um problema, Morgana.

Nunca a vi nessa posição tão emotiva. Isabela já está coberta de lágrimas.

— Bah, se tivesse falado antes, seria melhor... - ela enxuga as lágrimas - não tinha necessidade de carregar isso.

— Não gosto de ser um incômodo...

— A única coisa que é um incômodo é sua falta - ela segura minha mão com mais firmeza - não quero ter que sentir isso de novo.

Lembro que no meu sonho Valentina dizia algo como ser agredida por tanto tempo a ponto de não conseguir diferenciar afeto de violência, e rejeita os dois por medo.

E acho que não consegui reconhecer que tinham pessoas que realmente poderiam se importar comigo, sem se ater a quem eu sou de fato.

Tive tanto medo da reação do mundo que não percebi que a maior rejeição que tinha era de mim mesmo. Raquel parece que vai ruir a qualquer momento acariciando meu rosto, sussurrando alguma coisa que não consigo entender. Seguro sua mão e a beijo, fechando os olhos.

— Obrigada - é o que sai de minha boca.

— Pelo quê? - ela volta a dizer.

— Por vocês me ajudarem a me sentir alguém novamente.

Todas parecem chorar ou querem. Raquel me abraça, segurando meu pescoço. Ouço sua respiração ofegante como se tivesse se deixado levar pelos sentimentos. Isabela nos envolve com outro abraço. Creio que já está claro que o clima aqui está emotivo e, provavelmente por conta disso, otimista.

Sei que nossa vida não tem que depender dos outros, mas tenho que admitir que o outro faz diferença. Se não fosse por minhas amizades eu possivelmente estaria morta, nunca teria realizado meu sonho de conhecer o mar, não teria me apaixonado, conseguido o trabalho, rido, me divertido, visto outras coisas...

Jamais pensaria em ter amigas como tenho. Que Isabela, minha vizinha e maior companhia, estivesse em minha vida. Que ocasionalmente encontraria Raquel e, sem perceber, não conseguia mais tirar ela dos meus pensamentos. Que encontraria antigas conhecidas, e que trabalharia com o que realmente gosto e melhor, que me aceitariam, mesmo com uma e outra desavença.

Não teria vivido uma vida diferente da que estava destinada a mim. Se eu tivesse continuado, se eu tivesse me calado... São perguntas as quais nunca terei respostas, e há tempos me cansei de procura-las.

E percebo que, não é só porque Eleanor não me amou que não poderei amar e ser amada novamente. Foquei tanto que ela me amasse e me aceitasse que não tive olhos a não ser para aquilo que nunca terei. Tiro pela minha tia que sequer tinha a obrigação conosco, mas fez o que pôde e até hoje está ao nosso lado. Quis tanto ignorar minha vida na tentativa de não me machucar mais que esqueço que ela sempre esteve ali.

Assim como Valentina que, de um jeito ou outro, me fez sentir especial e ouvida como não tinha sentido há tempos, abrindo o caminho do meu coração que vou calçando aos poucos, temerosa.

Ou Isolda, que mesmo com seus problemas, nunca saiu do meu lado. Eu a amo de um jeito que possivelmente não terei como amar outra pessoa, e sei que ela sente o mesmo por mim. Somos como um só, mesmo que não estejamos em sintonia o tempo todo. Se ela sofre, eu sofro, se ela está bem, eu fico bem também. Isso não deixa de ser amor.

Não é porque alguém não me quis que ninguém irá me querer e não é meu passado que vai calçar meu futuro. Morgana Kercher sou eu, e Alencar também.

Eu sou alguém que tocava mas agora escreve, e sim, que se atrai por mulheres e sim, teve um e outro problema mas, ainda assim, saiu e tentou mais uma vez, e vai tentar novamente. Porque a vida é nada mais do que tentativas e erros entre lágrimas e sorrisos, medos e anseios, e algo que talvez, até posso arriscar chamar felicidade.

Fim do capítulo

Notas finais:

E aí, como estão as expectativas para o ato final da história?


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Comentários para 34 - Qual era o seu pedido?:
Marta Andrade dos Santos
Marta Andrade dos Santos

Em: 15/12/2022

Barril viu mas acho que Morgana esta conseguindo se encontrar nesse mundo.

Responder

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Billie Ramone
Billie Ramone

Em: 15/12/2022

Foi até melhor do que eu esperava, pq caricaturar é uma forma de apresentar a crueza dos fatos sem feriri em excesso. Essas coisas precisavam finalmente sair de dentro dela. Uma dúvida e uma falta que senti: o pai dela morreu? E gostaria de ter visto, nem que fosse um pouquinho, do processo terapêutico da Morgana, pq acho que tudo o que é dito e feito ali é fundamental na mudança de vida de alguém.

Aliás, que peninha que já tá no fim. Eu gostei bastante no geral, espero que tenhamos um final coerente. Não sou fã de romantizar transtornos mentais com final de filme adolescente água com açúcar, mas espero pelo menos ver nossa querida personagem a caminho de seu restabelecimento pessoal.

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