Diga meu nome por Leticia Petra e Tany
Capitulo 3 - Inimigos em comum.
Eu necessitava de um momento de distração, o trabalho andava árduo. Não era do meu cotidiano ir a uma boate em plena quinta-feira, mas eu merecia. No domingo aconteceria o aniversário do meu pai, seria um dia complicado, no qual a nossa mãe se transformava na “melhor” mãe do mundo. Principalmente por causa da Amanda, a esposa de Alonso, que é a melhor amiga de dona Telma. A minha mãe adorava passar uma boa impressão a ela.
As pessoas realmente acham que a matriarca da nossa família é uma mulher doce, gentil, que cuida dos filhos.
— Vou trazer caipirinha, me espera aqui. – Antonella falou bem próximo ao meu ouvido.
A música estava no último volume.
— Tá...
Antonella se afastou, então olhei ao redor, procurando por algo interessante e vi uma mulher me encarando. Ela era alta, os cabelos curtos e claros, usava um vestido provocante. Desviei o olhar e quando percebi, ela já estava ao meu lado.
— Vou ser direta, fiquei louca por você. – Ela sorriu, mordendo o lábio inferior, me olhava sem decoro.
Eu gostava de pessoas assim, diretas, pois sabia que no momento seguinte, cada uma seguiria o seu próprio caminho.
— Dança comigo? – Ela tinha lábios fantásticos.
— Só se você me ensinar, porque sou péssima. – Fiz charme e ela sorriu.
— Pode contar comigo, te ensinarei direitinho.
Fomos para a pista de dança, ela grudou em mim, beijando sutilmente o meu pescoço e o ato me acendeu no mesmo momento. Segurei em sua cintura, busquei pela boca bem feita e a beijei.
Era fantástico.
Em algum momento, deixamos a pista de dança e subimos para o segundo andar. Eu adorava aquela casa de eventos pelo simples fato de existir os quartos privativos, muito discretos. Logo, senti a roupa que usava deixando o meu corpo.
Ficamos apenas de roupas intimas.
— Você é maravilhosa. – A garota a qual eu nem sabia o nome, me fez deitar. — Uma deusa.
Voltamos a nos beijar sem delicadezas, senti uma de suas mãos sobre o meu sex*, me abri para facilitar o ato. Ela apenas colocou a minha calcinha de renda de lado, massageando o meu clit*ris, enquanto sua boca explorava os meus seios. Então fui preenchida por dois dedos, levei a mão a boca, abafando o gemido alto. O vai e vem não era com gentileza e isso me enlouquecia.
Eu g*zei poucos segundos depois.
— O negócio foi bom, não é? – Antonella me entregou uma taça de champanhe.
— E a caipirinha? – Franzi o cenho.
— Esquentou... – Ela olhou para o relógio dourado em seu pulso. – Você ficou trinta minutos naquele quarto.
Bebi um gole.
— Seu celular tá vibrando. – Olhei para a tela e era a Ana.
— Oi, Ana... – Falei alto, por conta da música.
— Lara, você pode vir até um lugar? Lara? Ei? – A ligação foi encerrada, mas no momento seguinte uma mensagem chegou em meu WhatsApp.
“Venha até a casa da minha nutricionista. Precisamos conversar, Lara. É algo bem sério, a Yas está aqui.”
Abaixo estava o endereço.
— O que foi? – Antonella pegou o meu celular. — O que a Ana tá fazendo uma hora dessas na casa da nutricionista?
— Eu também não tô entendendo nada. – Guardei o celular.
— Vamos até lá... – Franzi o cenho.
— Sim, então vamos.
Antonella foi pagar a conta e deixamos a boate em seu carro. O que a minha irmã estava fazendo com a idiota da Yasmin? Teria acontecido algo grave? A preocupação começava a me apavorar. Mandei várias mensagens, mas não foram visualizadas.
Era quase meia noite.
“Como ela saiu de casa?”
— Acho que é aqui. – Paramos em frente à entrada de um pequeno condomínio.
— Boa noite, o seu nome e a sua identificação, por favor. – O porteiro, que parecia bem cansado, nos abordou.
— Boa noite... – Peguei a minha identidade. — Aqui, senhor...
— Aqui. – Antonella entregou a sua também. — Boa noite.
Ele entrou na modesta guarita e logo voltou segundos depois.
— Podem entrar, senhoritas. Aqui. – Entregou os nossos documentos.
Dirigi por mais algumas ruas, olhando a numeração. As casas eram simples, não era um condomínio de alto padrão, porém parecia ser um lugar seguro. Isso me aliviou bastante.
— Aqui... – Ana acenou em frente a uma casa de um andar.
Havia algumas plantas, as paredes eram pintadas em um tom bege, bem discreto e aconchegante.
— O que você tá fazendo aqui, Ana? – Ela sorriu. — Como conseguiu sair de casa?
— Falei pra mamãe que ia sair com você e a Antonella, que a Yas havia ido me buscar porque vocês duas viraram amigas.
Antonella deu uma risadinha.
— E por que estamos aqui? – Olhei ao redor.
— Entrem, a gente explica lá dentro.
A gente? Em que você se meteu dessa vez Ana Clara?
Ela saiu a frente, parecendo intima do lugar. Quando entrei, a primeira pessoa que vi foi a Yasmin e no mesmo momento, não pude controlar a minha cara de desagrado. Ela pareceu perceber, pois sorriu e isso só intensificou a minha raiva.
— Essa é a Antonella. – Minha amiga fez um sinal com as mãos.
— Nos conhecemos essa manhã. – Yasmin falou.
— Prazer, Antonella, sou a Rafaela...
— Prazer, Rafaela... espero que esteja cuidando bem da nossa menina. – Antonella abraçou a Ana de lado. — Tive ótimas referências a seu respeito.
— Estamos progredindo bastante. – Rafaela sorriu.
Era uma mulher extremamente gentil, diferente da amiga.
— Lara, a Yas tem uma coisa muito louca pra contar, então senta e não a interrompa. – Franzi o cenho, me sentindo ofendida.
A desgraçada riu.
— Eu tenho um milhão de perguntas, mas vou ouvir vocês primeiro. – Sentei.
Antonella sentou ao lado de Ana.
— Não liguem pra mim... – Apoiou a cabeça no ombro da minha irmã.
— Então, esta manhã eu conversei com o diretor Claudio. Sinceramente, eu não queria me envolver nisso, mas o pavor que vi nos olhos daquele homem me fizeram repensar, até o ponto de decidir contar a você, porque ele me pediu que fizesse. – Yasmin retirou cardigan que usava. — Ele me contou que não está saindo da diretoria por vontade própria e sim por chantagem.
Ergui as sobrancelhas.
— O Patrick tá chantageando-o.
— Como? E por quê?
— Ele descobriu algumas coisas sobre a vida particular do diretor e tá usando isso pra pôr a Nicole no comando. E isso seria só início, pelo que entendi, ele quer ficar com tudo. E ele vai usar o que estiver ao seu favor... – Aquilo não podia ser verdade.
Ela deveria estar exagerando.
— Então precisamos falar com os nossos pais, eles vão resolver isso. – Fiquei de pé. — Tenho certeza que não vão deixar que o Patrick e a filha abusem do poder que tem.
— Sim, eu pensei nisso, mas daí o Claudio vai ser muito prejudicado, Lara. – Yasmin se apoiou em uma cômoda branca.
Os moveis da sala eram todos no mesmo tom.
— E o que ele tem de tão grave contra o Claudio? E por que você envolveu a minha irmã nisso? Esse assunto não é pra ela. A Ana deveria estar em casa agora...
Yasmin rolou os olhos.
— A Ana, diferente de você, sabe ouvir e ela não é uma criança. E sobre o diretor, você sabe que o Claudio tem uma esposa e filhos. – Ela parecia hesitante.
— Fala logo... – Eu estava perdendo a paciência.
— Ele pega homens, o Patrick teve acesso a essa informação e prometeu vir a público, pra acabar em definitivo com a reputação do Claudio. Ele não procurou os nossos pais por conta disso, tá totalmente nas mãos daqueles dois.
Abri a boca várias vezes, tentei formular uma frase, porém nada saiu.
— Eu sei que você não sabe o que é ter uma sociedade te julgando por causa da sua sexualidade, mas só pense por um momento.
Ana e Antonella me olharam naquele momento.
— Seria devastador, ele perderia a família, o prestigio e tudo mais que fosse importante. Aqueles dois não podem se dar bem nessa.
— E o que você sugere que façamos? – Yasmin voltou a pôr o cardigan.
— Sinceramente, Lara, eu odeio admitir isso. – Era a segunda vez que a via séria. — Mas você é a nossa melhor opção. É toda certinha, vai se encaixar melhor no cargo e nos quesitos do conselho. Já sabe como funciona o hospital. Se essa for a única forma deles não conseguirem o que querem, então que seja você a diretora. Você não tem nada que possa ser usado contra você...
Aspirei o ar com calma, pois aquela frase não era verdade, longe disso. Eu tinha sim algo a temer e era justamente o mesmo que o Claudio. Senti o meu celular vibrar, o peguei e havia mensagens de um número desconhecido no WhatsApp. Abri e ao fazê-lo, senti o meu coração vir a boca.
Sentei, pois não aguentei o peso do meu próprio corpo. Me senti levemente tonta.
— Lara, o que foi? – Antonella veio até a mim. — Você tá pálida.
— O celular... – Entreguei para ela. — Olha.
Ela pegou o aparelho sem entender e quando olhou para a tela, arregalou os olhos.
— Oh, merd*!
— O que tá acontecendo? – Minha irmã também olhou. — Merda.
— O que foi? – Rafaela perguntou.
Não, aquilo não estava acontecendo. Aquela desgraçada não tinha o direito...
— O que eu vou fazer? Isso não pode... – Levei a mão a cabeça. — Não pode ser espalhado.
Eram fotos minhas com a garota da boate. Em todas elas nos beijávamos e havia alguma de nós duas entrando no quarto. Em que momento? Eu nem ao menos notei que...
— Eles não estão pra brincadeira. – Antonella segurou a minha mão.
Olhei para Yasmin, não acreditando no que iria dizer.
— Também não sou a pessoa mais indicada, Yasmin. Eu também tenho algo que pode ser usado contra mim. – Estendi a minha mão com o celular, ela se aproximou e pegou o aparelho. — Olhe...
Pude ver a sua expressão mudando.
— Só pode ser brincadeira. – Ela me encarou. — Você conseguiu esconder isso muito bem. Caramba... isso muda tudo. Que droga!
A ruiva, diferente do que pensei, não fez piadinhas ou deboches.
— Você é lésbica. – Rafaela completou, sem precisar olhar para o conteúdo.
— Isso muda totalmente as coisas. – Yasmin falou outra vez. — Não acredito que vamos mesmo ver o hospital sendo tomado por eles.
— Eu tenho uma ideia, um pouco maluca, mas pode funcionar. – Ana falou. — Só escutem e não julguem antes.
Arqueei a sobrancelha.
— Lara, você e eu melhor do que ninguém sabemos o que é viver com uma pessoa extremante homofobia, mas que sabe dissimular muitíssimo bem. Aquele conselho jamais daria uma bola fora assim, não explicitamente. Se vocês duas fingissem que estão namorando, se assumissem perante todos...
— Tirariam o trunfo das mãos da Nicole e a Lara poderia continuar na disputa. – Rafaela completou, olhando para a minha irmã.
As duas sorriram, em um estranho entrosamento ou eu só estava com ciúmes da minha irmã? Droga, não era hora para isso.
— Mas nem pensar. Vocês estão malucas! Eu teria que dizer a todos o que sou e a mamãe, ela me mataria. Ana, olha o absurdo que você tá falando. Onde que isso me ajudaria?
— Detesto concordar com ela, mas a chatinha tá certa. Sem chances de isso acontecer.
— Chatinha? – Encarei Yasmin.
Eu iria dar um soco nessa mulher.
— Escuta, Lara... a mamãe adora a mãe da Yas, ela jamais se colocaria contra. Você sabe perfeitamente o quanto ela é hipócrita na frente dos outros, imagina na frente da mãe da Yasmin. Ela jamais falaria nada ofensivo.
— Espera, a mãe de vocês realmente te mataria? – Yasmin perguntou diretamente para mim. — Aquela mulher gentil?
Não pude deixar de rir.
— Sim, aquela mulher gentil não iria soltar fogos se soubesse, ela não é o que aparenta. Minha mãe é extremamente preconceituosa, mas na frente das outras pessoas passa aquela imagem de boa, de mente aberta.
Passei a minha não sobre a cabeça, ambas tremiam muito.
“Estou tão ferrada.”
— Seria perfeito, Lara, você se assumiria sem retaliação da mamãe. Depois que o cargo fosse seu, vocês inventam um termino, sei lá. Pensa, ela não vai querer se envergonhar perante a Amanda.
Aquela ideia era absurda demais, arriscada demais.
— Quem acreditaria que eu e essa aí nos gostamos? – Yasmin ergueu as sobrancelhas. — É um absurdo total, Ana.
— Realmente, seria um absurdo. A minha família sabe que eu jamais me envolveria com uma mulher tão fresca e chata.
— Fresca? Fresca é a senhora sua avó.
— Olha, não fala da minha avó...
— Se não o que?
Passamos a bater boca.
— Chega! – Antonella gritou. — Calem a porr* da boca.
Dei as costas para elas, mirando um ponto qualquer.
— Lara, a ideia não é ruim. Faz muito tempo que você queria se libertar desse segredo, então é o momento perfeito. – Eu queria gritar.
Até você, Antonella?
— Yas, o que custa fazer isso? – Ouvi Rafaela dizer.
Ficou um silencio incomodo por vários segundos.
“Isso não tá acontecendo... não, não, não. Se essas fotos vazarem, eu vou ser rechaçada, a minha mãe nunca mais vai olhar em minha cara. Deus, o que eu faço?”
As três me encaravam, esperando uma resposta a qual eu não queria dar. Era maluquice demais até para mim. Conversar com o meu pai não me parecia mais uma ideia ruim, mas se eu contasse a ele, eles iriam expor Claudio e a Lara junto. Não que eu me importasse com ela, só que usar algo tão particular, algo que não os diz respeito para obter benefícios estava muito acima da canalhice. Eles mereciam uma lição.
“INFERNO.”
— Tá! Se ela estiver de acordo, eu aceito. – Lara se virou, me encarando em choque.
Deveria estar me achando uma louca e ela não estava errada.
— Lara? – Ana perguntou a irmã.
Era visível que ela estava em uma batalha interna.
“Eu deveria ter ficado em São Paulo. Por que o diretor tinha que me dizer alguma coisa?”
— Ok... – Ela disse por fim, sentando. — Eu aceito.
A gente iria mesmo fazer isso?
— E como será isso? – Ela perguntou e eu olhei para as três gênias. — Como vai funcionar? Como garantir que não nos mataremos no processo?
Era uma ótima questão.
— Domingo será o aniversário do papai. Só cheguem de mãos dadas depois que a mãe da Yas já estiver lá. Ou você pode preparar a sua mãe antes, Yas. – A cada palavra que saia da boca de Ana, eu achava mais absurda essa história toda. — O papai, eu tenho certeza que não irá se opor e pelo pouco que sei, sua família também não.
Sentei na poltrona.
— Hoje ouvi que a Telma vai visitar a mamãe amanhã à noite, podemos aproveitar a oportunidade. – Encarei Lara. — A escolha é sua. Só estará as duas lá...
“Por favor, diga não... diga não.”
— Deus... – Ela mordeu a unha pintada de preto. — Tá bom.
“Ótimo.”
— Eu vou te buscar as sete da noite. – Me dei por vencida.
— Estarei pronta. – Ela encarou a amiga.
— Você não tem uma namorada ou ficante a quem deva explicações? Isso com toda a certeza vai se espalhar muito rápido. – Cruzei os braços.
— Não, eu não tenho nada disso...
— Lara tem pavor de relacionamentos. – Antonella falou e recebeu um olhar gélido de Lara.
— E quanto a você? – As quatro me encaravam.
Limpei a garganta.
— Nada também...
Silencio.
— Quando nos vimos, você estava dando em cima da recepcionista da clínica. – A chata soltou, Rafa me olhou feio, mas Ana e Antonella riram.
“Que legal, eu estava sendo colocada contra a parede e não era da forma que gostava.”
— Só rolou um flerte sem nenhuma maldade. – Dei de ombros.
— Yasmin? – Rafaela ficou indignada.
— Que?
— Vamos pra sua casa, Antonella? Eu preciso organizar essa bagunça. – A chatinha parecia que iria desmaiar. — Tem muita coisa pra digerir.
— Vamos, sim. Você precisa relaxar um pouco. – As duas ficaram de pé. — Tem vinho.
— Vou precisar.
— Eu posso ficar aqui e...
— Nem pensar, Ana. Deixa de ser mal educada, não se convida pra dormir na casa dos outros. – Ana Clara apenas desistiu.
— Boa noite, pessoal. Até breve... – Antonella apenas acenou.
— Boa noite... – Rafa e eu dissemos.
As três deixaram a casa da Rafaela, em questão de segundos ouvimos o carro dando partida. Me joguei no tapete macio, escondendo o meu rosto com os braços. A minha cabeça passou a doer.
— Não era isso que eu esperava que acontecesse quando procurei a Ana. Além de um baita problema, ainda vou ter que fingir estar gostando da Lara? Estou sendo castigada por tudo de ruim que já fiz? Deus tá me castigando, Rafa, porque não é possível. Por que voltei de São Paulo?
Rafaela riu baixinho, mas logo o riso se transformou em gargalhada. Tentei me manter inerte, mas acabei rindo junto.
— Eu não queria estar no seu lugar.
— Muito obrigada, Rafaela. Isso ajuda muito... – Ela riu mais ainda.
— Mas olha pelo lado bom, Yas. – E tinha um lado bom? — A Lara é uma mulher muito bonita e interessante. Por mais que você diga que ela não faz o seu tipo, sabemos que é mentira.
Franzi o cenho.
— É bonita e insuportável na mesma proporção. – Rolei os olhos.
— Mas continua sendo linda...
— Então fica com ela, oras. – Essa fala infantil só fez Rafaela rir mais alto. — Além do mais, você sempre me condena quando faço bobagens, o que deu na sua cabeça pra concordar com isso? Pior ainda, me incentivar.
— É por uma boa causa, Yas, a gente já passou pela fase de aceitação alheia, eles não. Sabemos o quanto dói. Que custa ajudar?
— Fala isso porque não vai ser você quem terá que fingir ser namorada da...
— Gata da Lara Pinheiro?
— Vai foder, Rafa.
Levantei.
— Eu vou tomar banho, não vou ficar aqui sendo sua diversão, Rafaela Almeida.
— Que mulher sensível, meu Deus.
Usei o banheiro do corredor, a água fria foi extremamente relaxante. Fechei os meus olhos, gem*ndo em satisfação. De todas as coisas que já fiz na vida, essa com toda certeza merecia palmas e alguém me colocando um par de orelhas de burro.
— Algumas semanas... são só algumas semanas. – Aspirei o ar com calma. — Não vai ser tão ruim assim. Ela é gata, posso tirar uma... argh.
Louca! Estou louca.
Dormi com Rafaela me azucrinando a cabeça. Ela estava muito engraçadinha para o meu gosto.
Sábado.
Acordei muito cedo, cheguei em casa e os meus pais ainda estavam dormindo, então aproveitei para correr um pouco. Encontrei o meu irmão no caminho, que também teve a mesma ideia.
— Você não teve muito tempo pra mim. – Ele reclamou.
— Desculpa, mas você também vive fora. A faculdade deve estar te consumindo. – Hugo sorriu.
Sentamos no meio fio, embaixo de uma árvore.
— E está... medicina definitivamente fode com a cabeça da gente. Ainda bem que você escolheu administração, Yas.
— Acredite, não é tão fácil assim. Agora mesmo, estou em uma tremenda enrascada. – Eu não parava de pensar no assunto.
— Quer compartilhar?
— Prepara, que o negócio é complicado.
— Mais uma aventura de tantas? Estou sempre preparado. – Ele riu.
— Só que essa eu não estou prevendo diversão. Ontem o diretor Claudio me mandou tomar cuidado, infelizmente, o Patrick é um canalha e está chantageando o diretor pra deixar o cargo.
Hugo ergueu as sobrancelhas.
— Isso é sério? E onde você entra nessa história?
— Ele me aconselhou a falar com a Lara, pra ela tomar cuidado, mas ela também tem o rabo preso, recebeu até umas fotos de advertência.
— Eles estão ameaçando o diretor e a Lara de morte?
— Não, não chegou a esse ponto. Eles estão ameaçando expor segredos, que foderiam a vida de ambos.
— Caramba, Yas...
Então passei a narrar a conversa que tivemos na casa de Rafaela.
— Você topou mesmo isso, Yas? – Hugo gargalhou. — Eu estou dividido entre ficar com medo e rir da sua cara.
— Você já tá rindo da minha cara, Hugo. – O empurrei pelo ombro.
— Mas falando sério, precisa tomar cuidado. Acho que você deveria conversar com o papai. – E eu também.
— Ele vai confrontar o Patrick. – Tomei um gole da água. — Se essa loucura der certo, a gente tira esse desgraçado da jogada sem precisar expor o diretor.
— A Lara, ela vai ser muito corajosa. Ainda estou impressionado que a Telma seja esse tipo de pessoa. Não dá pra entender...
— Aquele ditado é real. – Fiquei de pé. — As aparências enganam.
O ajudei a ficar de pé.
— Você deveria contar a verdade ao menos pra mamãe, sabe, ela poderia ajudar. – Franzi o cenho.
— Você tem razão, ficaria mais fácil essa farsa toda.
Voltamos para casa, tomamos café juntos e depois que o Hugo e o papai saíram, fui até o quarto da minha mãe para conversar com ela. A coragem estava quase me abandonando.
— Filha, aconteceu alguma coisa? – Ela saiu do banheiro, limpando o rosto.
Sentei na beirada da cama.
— Eu nem sei por onde começar, mamãe. – Minha mãe sentou ao meu lado. — Eu só peço que não diga nada ao papai, por favor.
— Agora você tá me assustando, Yasmin.
O meu celular tocou, olhei para a tela e não reconheci o número. Detonei a ligação, porém ele continuou insistindo.
— Só um segundo, mamãe.
Atendi a chamada.
— Yasmin? – Então é ela.
— Lara... – Olhei para a minha mãe. — Eu já volto, mamãe.
Deixei o quarto.
— Pode falar...
— Eu... só liguei pra confirmar se ainda vamos fazer isso. – Aspirei o ar com calma. — A hora...
— As sete vou te buscar. – Podia ouvir a respiração dela.
— Ok... até as sete. Ah, salve o meu número.
— Vou fazer isso...
Demorou poucos segundos, até a chamada ser encerrada. Fiquei parada diante da porta do quarto da minha mãe, criando outra vez coragem para prosseguir, mas desisti.
— Mãe, surgiu algo, a noite conversamos, tudo bem? – Perguntei da porta.
— Sim, filha, tudo bem. Você vai sair agora? Cuidado com o seu pé, Yas. Até correndo já está.
Olhei as horas e decidi ir até o hospital.
— Sim, vou no hospital, o movimento deve estar calmo, então vou aproveitar pra bisbilhotar um pouco. O meu pé já melhorou bastante, mãe. Prometo que estou pegando leve.
Ela sorriu.
— Tudo bem, minha filha, vou confiar em você. Tome cuidado e volte pro jantar. De viciado em trabalho, já me basta o seu pai. – Dessa vez quem sorriu foi eu.
— Até daqui a pouco...
Fechei a porta.
Me afundei no trabalho, almocei dentro da minha sala e não vi o diretor. Recebi algumas mensagens de Ana, ela parecia muito ansiosa pelo que viria. Lara seria mesmo corajosa em se assumir dessa forma. O preconceito dói e quando vem de algum familiar, dói mais ainda.
Sorte a minha que a minha família é maravilhosa.
— Chatinha, insuportável.
— Falando sozinha? – Olhei para a porta e Antonella estava parada com uma sacola nas mãos.
Se eu fosse diretora, mudaria esse verde estranho dos uniformes.
— Acho que cheguei ao ápice da loucura. – Ela sentou a minha frente.
— Antes de enlouquecer, coma esse doce comigo. A mãe de um paciente me deu... – Ela abriu a sacola e tirou um pote com pudim.
— Eu adoro pudim. – Antonella me entregou uma colher de plástico.
— Quero agradecer pelo que irá fazer, Yasmin. A Lara precisava de um empurrão... – Ela me encarou. — Mesmo não gostando dela, tá fazendo isso. É muito louvável da sua parte.
— Talvez, só talvez, eu tenha ficado comovida com a parte da Telma. – Levei um pedaço a boca. — Que delícia.
— Seja qual for a sua motivação, obrigada. Lara não tem exatamente uma vida de contos de fadas, ela sempre tentou agradar aquela velha mal amada. Nem todos tem a sorte de ter uma mãe de verdade.
— Esse é o seu caso também? – Antonella sorriu, mas era um sorriso triste. — Pareceu pessoal.
— Os meus pais são dois bundões, vivem na Europa há anos. Fiz tudo sem eles, me formei sem eles, virei uma mulher sem eles, comprei o meu apartamento sem eles, fiquei doente e quem estava sempre lá por mim era a Lara e a Ana. Conheci a Lara quando eu tinha quinze anos e desde lá, não nos separamos mais. Ela é a irmã que nunca tive...
— Só considerando uma irmã pra aturar. – Antonella riu. — Acho que você se saiu super bem sem eles. Andei perguntando por aí, soube que é uma pediatra muito foda. Já realizou muitas cirurgias que mudou o rumo da vida de muitas crianças. Eles quem estão perdendo.
Antonella apenas ficou me encarando por alguns segundos, até soltar o ar calmamente.
— Você tá tentando puxar o saco da melhor amiga da sua futura namorada?
— Futura falsa namorada. – A corrigi. — E não, eu realmente fui com a sua cara no instante que pisou aqui a primeira vez.
Ela sorriu.
— Também andei procurando saber sobre você, se não fosse as circunstancias, você e a Lara formariam um belo casal. - Ergui as sobrancelhas.
— A chatinha e eu um belo casal? Certamente, uma de nós acabaria na prisão por tentar matar a outra.
Antonella riu de meu exagero.
— Isso vai ser divertido de assistir. – Ela ficou de pé. — Podem contar comigo.
— Ei, vai levar o pudim?
— É claro que vou! Foi dado pra mim...
E ela simplesmente foi embora.
Estranhamente, a conversa com a Antonella me deixou bem mais calma. Seria apenas algumas semanas, o hospital ficaria nas mãos da chatinha e assim, poderíamos contar aos nossos pais sobre o Patrick, sem comprometer o diretor.
Todos sairão ganhando.
— Sim, é isso...
Fim do capítulo
Oi, lindas.
O cap da nossa segunda.
Obrigada pelas leituras e pelos comentários.
Tany e eu ficamos muito gratas.
Boa leitura.
Comentar este capítulo:
Dessinha
Em: 24/10/2022
Nossa, que delícia de estória!! Já sinto que vou precisar de ansiolíticos haha. Abraços, autora!! Muito legal!
Resposta do autor:
Haaa que bom que está degustando ela, ainda tem muita coisa boa vindo nos próximos capítulos, segura o coração e aproveite cada momento.
Um abraço,
ps Tany
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