Capitulo 45
ELISA
-- Ninguém entra depois das seis da manhã -- Anunciou o segurança careca.
-- Sou amiga do Léo -- Disse Gabriela.
-- Conhece o Léo? -- Perguntou o outro segurança, desconfiado.
-- Conheço sim. E vocês conhecem meus amiguinhos aqui? -- Disse Gabriela, tirando algumas cédulas de dinheiro da carteira e exibindo-as -- Porque o Léo os adora.
Os dois se entreolharam.
-- E a sua amiguinha aí? -- Perguntou o careca apontando para mim.
-- A loirinha está comigo. -- Falou Gabi.
Para não deixar nenhuma dúvida de que “a loirinha estava com ela”, e me pegando totalmente de surpresa, Gabriela me puxou para si e tascou um beijo daqueles na minha boca. Percebi que tinha que “entrar na personagem” e encenei estar gostando daquilo.
Quando nos largamos, vi que aqueles homens não escondiam a satisfação de olhar para nós. Um deles com um sorriso descarado nos lábios.
-- A gente quer curtir -- Explicou Gabriela -- Aquela chuva de ontem esfriou nossa noite.
-- Certo. Vocês podem entrar. -- Disse o careca, finalmente liberando o portão para nosso carro entrar.
Gabriela estacionou o carro fora da vista dos seguranças só então respirei mais aliviada.
-- Desculpe -- Disse Gabriela -- Precisava ser convincente.
-- Tudo bem, mas prefiro que Ágata não venha a saber disso.
-- Não se preocupe -- Respondeu ela -- Isso fica entre a gente. Melhor que tudo que aconteça aqui hoje fique entre a gente. De acordo?
-- Fechado -- Falei selando nosso acordo com um aperto de mãos.
-- Agora vamos atrás de Becca.
Seguimos por um campo aberto até a casa maior. De vez em quando nos esbarávamos em alguém jogado pelos cantos, comparei-os a zumbis. Quando me deparava com alguma menina, observava atentamente esperando reconhecer Becca.
Continuamos até ouvirmos música alta, chegamos a um salão coberto onde havia pessoas dançando que pareciam estar possuídos, com as órbitas dos olhos vazias e os corpos se movendo aleatoriamente. O espaço era totalmente fechado, com paredes por todos os lados. Ali dentro não dava para saber que era dia lá fora.
-- Isso aqui é terrível -- Gritei ao ouvido de Gabriela, para ela me ouvir sobre a música alta.
Procuramos por Becca entre as pessoas, mas ela não estava lá.
-- Ela não está aqui -- Constatei, triste.
-- Tem razão. Vê aquela escada ali -- Apontou Gabi.
Observei uma escadaria que estava sendo barrada por um homem alto e forte. Devia ser mais um dos seguranças do Rancho.
-- É onde ficam os quartos -- Continuou ela -- Precisamos vê se Becca está lá.
-- Como fazemos isso? Tem um brutamontes guardando a entrada.
-- Do mesmo modo que entramos -- Responde ela.
-- Vou ter que te beijar de novo? -- Perguntei sem esconder meu descontentamento.
-- Ei! Também não morro de vontade de beijar você, sabia? -- Protestou a morena, com veemência -- Mas é o que temos que fazer se quisermos chegar aos quartos...
-- Então vamos acabar logo com isso.
-- Temos que parecer que estamos com muito tesão. Você pega nos meus seios quando estivermos nos beijamos e eu ponho as mãos no seu bumbum. -- Disse Gabriela explicando a logística daquele plano maluco.
-- Por que eu tenho que pegar nos seus seios? -- Questionei.
-- Porque são maiores que os seus, oras. E você tem um traseiro avantajado.
-- Tenho um traseiro avantajado? -- Perguntei, atônita -- Quer dizer... Tá, eu pego nos seus seios, mas não se aproveita de mim, ouviu?
-- Eu não quero me aproveitar de você. Antes fosse Ágata.
-- Não fala dela. Prometemos deixar Ágata fora disso, lembra?
-- Ok. Não vou mais mencioná-la. Melhor irmos logo, o tempo está contra nós.
Respirei fundo e caminhei ao lado de Gabriela até junto as escadas onde começamos nossa performance previamente ensaiada de agarra e agarra. Ela colocava a língua na minha boca e me beijava sem pudor, a garota com certeza sabia fingir muito bem ou apenas era muito boa naquilo. Já eu tentava me concentrar e fazer o que tinha de fazer, mesmo que parecesse terrivelmente errado.
Mas apesar da minha tensão, devíamos ter nos saído muito bem naquele jogo de mãos pelo corpo todo e de bocas se sugando vorazmente, pois o segurança não fez nenhuma objeção em nos deixar entrar.
Finalmente nos largamos. Recuperando o fôlego, abri a boca para dizer algo, mas Gabi falou primeiro:
-- Eu já sei, já sei. Nenhuma palavra sobre isso para Ágata.
Subimos as escadas e chegamos a um corredor mal iluminado. Haviam muitas portas distribuídas ali. As portas estavam entreabertas, para quem quisesse se sentir à vontade para entrar. Era assustador imaginar o que se poderia encontrar dentro daqueles quartos.
Tentamos a primeira das portas. Havia dois solitários, um jogado sobre a cama e outro no chão, não dava para saber se estavam dormindo ou acordados. Tentamos outro quarto que estava vazio. Na terceira porta, flagramos um cara repugnante trans*ndo com duas mulheres ao mesmo tempo. Mesmo não gostando nada daquilo, joguei a luz do celular sobre os rostos das moças. Com grande alívio percebi que nenhuma delas era Becca. O cara ainda nos fez um convite indescritível que me deixou tão indignada que Gabi precisou me tirar de lá de tanto que eu xingava.
-- Você está bem? -- Perguntou Gabi quando deixamos o quarto.
-- Estou bem.
-- Não sabia que você conhecia tantos palavrões.
-- Acredite é a primeira vez que eu os uso. Vamos continuar?
Ela assentiu e adentramos o próximo quarto que era o mais escuro de todos. Estava silencioso, como nos outros havia apenas uma cama solitária e nenhum outro móvel. Naquela escuridão achávamos que não havia ninguém naquele quarto.
-- Está vazio -- Disse Gabriela -- Vamos em frente, Elisa.
-- Elisa? -- Grunhiu uma voz na escuridão, mal a morena pronunciara meu nome.
Lancei a luz do celular até o canto escuro do quarto de onde vinha a voz que reconheci ser de minha amiga.
-- Becca?
Ela estava encolhida no canto, quase imóvel. Fui até ela e a abracei.
-- Que bom que te encontrei.
Becca se agarrava em mim fortemente. Eu mal conseguia ver ser rosto, mas ela estava chorando.
-- Vamos sair daqui -- Falei -- Vem comigo?
Consegui conduzir Becca pelo corredor. Ela não conseguia balbuciar uma palavra por inteiro, apenas choramingava.
-- Como vamos passar pelo segurança? -- Perguntei a Gabriela -- Alguma ideia?
-- Vou distraí-lo e vocês passam por ele. Melhor não o deixar pôr os olhos sobre Becca. Pode descobrir que viemos aqui só resgatá-la.
Gabriela seguiu na frente, fomos um pouco atrás. Conseguimos passar de fininho pelo segurança que prestava atenção apenas em Gabriela.
Continuei me afastando daquela sala com Becca até que Gabriela voltou a se juntar a nós.
-- Nojento tarado! -- Reclamou ela -- Vamos sair daqui o quanto antes. Esse lugar me deixa doente.
-- E os seguranças no portão?
-- Ele que me aguardem -- Prometeu ela, irritada -- E se outro filha da puta vier dá em cima de mim, eu não hesito em matá-lo!
Passamos pelos zumbis espalhados pela casa. Chegamos até o carro. Entrei no banco de trás com Becca que se abraçava a mim como se sua vida dependesse disso. Ela estava calada, mas já parecia se dá conta do que acontecia a sua volta. Com alívio, observei que ela não parecia estar machucada, embora suas roupas estivessem rasgadas em alguns pontos e seus cabelos estivessem despenteados. Não havia algum sinal de machucado aparente.
-- Apertem os cintos -- Disse Gabriela. -- Está na hora de mostrar para esses caras que eu não estou de brincadeira.
Gabriela acelerou seu quatro por quatro e cantou pneu. Ela deu uma guinada no carro e acelerou em direção ao portão.
-- Gabriela, você não vai... Vai?
Sim, ela foi. Ela foi para cima do portão e o colocou a baixo, assustando o segurança taciturno e o careca, ainda gritou para eles lhe mandarem a conta.
-- Você é maluca? -- Perguntei, embora estivesse aliviada.
A vi sorrir pelo retrovisor.
Retornamos a cidade. Em minha casa, Gabriela me ajudou a conduzir Becca para dentro, onde fomos recebidas por meus pais e Tia Drica. Todos ficaram felizes ao ver Becca de volta. Apesar das perguntas que faziam sobre o que acontecera com ela, Becca não disse nada. E eu me limitei a inventar que a havia encontrado por aí.
Após um tempo, Gabriela disse que precisava ir.
-- Obrigada por tudo. De verdade, você foi uma verdadeira heroína -- Falei
Gabriela sorriu, constrangida.
-- Quanto a seu carro. Ajudo no conserto.
-- Não precisa. Eu mesma levo na oficina, não deve demorar nada.
-- É o mínimo que posso fazer.
-- Já faz o bastante se continuarmos a manter toda essa situação em segredo para Ágata.
Concordei com ela.
-- Quero que me prometa uma coisa -- Disse Gabriela -- Prometa que fará Ágata feliz. Não a magoe mais.
-- Não se preocupe, Gabi. Eu prometo que a farei feliz todos os dias enquanto eu viver.
Ela assentiu.
-- Ah, e quanto ao embrulho. Vi que continua com você. Por que não deu a Ágata?
Ela me olhou envergonhada.
-- Vou fazer isso. Afinal, é algo de que ela precisa muito. -- Falou misteriosa.
-- Tudo bem. Vemo-nos por aí?
-- É, nos vemos por aí.
Gabriela estava de saída quando algo inesperado aconteceu. Vendo-a ir embora, Becca correu até ela e a abraçou. Repetindo palavras de agradecimento. A morena estava totalmente confusa e ficou sem ação. Tive que dizer a Becca para soltá-la ou do contrário ela não a deixaria ir.
Eu só esperava um dia poder esquecer aquele lugar triste. Mas e Becca? Será que um dia ela falaria sobre o aconteceu com ela quando esteve lá? Decidi dá um tempo a ela e estaria de braços abertos para ajudá-la caso ela precisasse, afinal não se entra num lugar daqueles e sai a mesma pessoa. Algo muda. Algo sempre muda.
Fim do capítulo
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