Capitulo 79
A Última Rosa -- Capítulo 79
A manhã do dia seguinte passou a jato, com uma sucessão de reuniões, entregas, telefonemas e pedidos insistentes de repórteres da imprensa da região, que queriam, de qualquer jeito, uma entrevista com Jessica para falar sobre os bebês resgatados na enchente. Finalmente, na hora do almoço, Jessica e Maya puderam se sentar e contar as novidades aos amigos.
-- Que triste! -- exclamou Valquiria, chorando, depois de ouvir a história toda.
-- Será que elas ficarão bem? -- perguntou Vitória.
-- O doutor Graebin disse que sim -- respondeu Maya.
Vitória sacudiu a cabeça em sinal de aprovação. Depois sorriu.
-- E o nome delas?
Maya olhou para ela com os olhos brilhando, cheia de orgulho.
-- Alessia e Alexia. Eu escolhi os nomes.
-- Caso elas queiram, no futuro, formar uma dupla sertaneja, não precisarão nem mudar os nomes -- o comentário de Pepe deixou Maya roxa de raiva -- O que foi? Disse algo que não devia?
Jessica olhou para o teto e engoliu a gargalhada.
A tarde foi quase tão movimentada quanto à manhã. No final do dia, o juiz telefonou.
-- Aconteceu alguma coisa? -- Jessica perguntou, assustada.
-- Elas estão ótimas.
-- Que bom! -- disse aliviada -- Apareceu alguém procurando por elas?
-- Não, ninguém apareceu.
Aquele suspense estava acabando com Jessica.
-- Então, o que foi? Diz logo senhor juiz -- sentiu um nó na garganta.
-- Conversei com a Melissa Valencia.
-- Quem é Melissa Valencia?
-- A assistente social responsável pelo caso. Bem, cheguei a falar com ela sobre vocês ficarem com a guarda provisória das meninas. Ela disse que não seria difícil providenciar os papéis para vocês, já que são pessoas conhecidas em Hills e bons pais adotivos é coisa rara hoje em dia. Inclusive Melissa ficou entusiasmada com a perspectiva de deixar provisoriamente as meninas em sua casa.
-- O que fazemos agora?
-- Vou passar o número do telefone da Melissa, liga para ela e combina o que deve ser feito.
-- Vou ligar agora mesmo -- disse Jessica, sentindo o coração disparar de ansiedade.
Maya entrou no laboratório naquele momento e encontrou Jéssica olhando fixamente para o celular.
-- Quem era amor? O que aconteceu? As meninas estão bem?
Jessica olhou para ela confusa. De um lado, sentia vontade de comemorar, cantar, dançar e pular de alegria. Mas por outro lado, sentia o medo da separação.
-- Era o juiz.
Maya empalideceu.
-- E aí?
-- Ele conversou com a assistente social e ela não vê problema algum em ficarmos com as meninas.
-- Isso é maravilhoso, amor. E agora? Quando podemos buscá-las?
Jessica sacudiu a cabeça e olhou para o rosto dela.
-- Você já pensou como será difícil se separar delas quando for preciso?
-- Sim, certamente o nosso coração ficará partido, mas temos que ser corajosas e fazermos o que é melhor para elas e não para nós. Não temos que ser egoístas e pensar que elas serão mais felizes com a gente do que com a família consanguínea.
Jessica deu um meio sorriso.
-- Bem, de qualquer forma agora não tem mais volta. Acabei de assumir o compromisso. Sinto-me responsável por elas, prometi para a mãe e não voltarei atrás.
-- É assim que se fala, Jess.
No final da tarde Jessica passou pelo escritório de Maya.
-- Vou dar uma saída. Nos encontramos em casa.
-- Aonde você vai, amor?
-- Ao hospital.
O olhar de Maya adquiriu um brilho especial.
-- Jess, não me diga que está indo buscar as meninas!
-- Ainda não sei. Depende do Dr. Graebin e da assistente social.
-- Não quer que eu vá junto?
-- Prefiro que fique e feche o contrato com a empresa Americana. Esse contrato vai nos deixar tranquilos por muitos anos.
-- Verdade, mas me ligue, por favor. Pode ter certeza que estarei aqui roendo as unhas.
Jessica baixou a cabeça e beijou-a de forma longa e doce.
-- Eu te amo, paçoquinha de amendoim -- disse e saiu.
Jessica ainda sentia o coração disparado quando chegou ao hospital. Sentia-se nas nuvens, passou em disparada pela recepção e foi direto ao berçário. Uma enfermeira que a viu espiando através do vidro, pôs o rosto para fora e perguntou:
-- Por acaso você é a Jessica Parker?
Ela balançou a cabeça, afirmativamente.
-- O doutor Graebin falou sobre você. Estamos tão felizes, torcemos tanto para que o Conselho Tutelar aprovasse o seu pedido de guarda provisória.
-- Obrigada -- respondeu Jessica, esticando o pescoço para tentar ver as meninas.
-- Quer segurar um pouco elas?
-- Quero -- Jessica respondeu de imediato.
-- Espera naquela sala ao lado do bebedouro que eu volto logo.
Ela fez o que a enfermeira disse, mas a ansiedade era tanta que não conseguiu ficar sentada.
Momentos depois a enfermeira apareceu com uma das meninas no colo. Uma forte emoção tomou conta de Jéssica e, ela não pôde conter as lágrimas que marejavam seus olhos.
-- Essa é a Alessia -- disse a enfermeira -- É a mais sorridente das duas. Agora, eu vou buscar a Alexia.
A enfermeira saiu para buscar a segunda menina. Alessia dormia profundamente. Segurando a menina no colo, Jessica pensava em como teriam que ser rápidas para preparar a casa para a chegada das meninas. Teriam que comprar roupas, fraldas, brinquedos... No mesmo instante pegou o celular e ligou para Maya.
-- Oi amor, adivinha quem está dormindo no meu colo!
Ao imaginar a cena, os lábios de Maya se curvaram num sorriso doce.
-- Jura que você está com as meninas!
-- Estou com a Alessia, a enfermeira foi buscar a Alexia.
-- Ela está bem, não está? Come, dorme direitinho e tudo o mais?
-- Sim amor, está ótima, dormindo aqui no meu colo.
-- Que maravilha, Jess -- murmurou.
-- As meninas podem receber alta a qualquer momento. Estava pensando se não devemos ir ao shopping comprar algumas coisas mais urgentes.
Houve outra pausa.
-- A que horas gostaria de ir? -- perguntou Maya, finalmente -- Só posso sair depois das sete.
-- Está ótimo. Teremos tempo suficiente para comprar fraldas, algumas roupinhas e dois carrinhos de bebês.
-- Então tá, nos encontramos no Shopping Center da Praia Grande -- disse Maya, entusiasmada.
No sábado de manhã, Jessica e Maya estavam tomando café quando receberam a ligação do hospital:
-- As meninas estão liberadas, podem vir buscá-las -- anunciou a enfermeira.
As duas saíram correndo como loucas e em menos de quarenta minutos estavam colocando as meninas no carro.
-- Jess, ajeita a Alexia no bebê conforto -- pediu Maya, guardando as bolsas no porta-malas.
-- Qual das duas é a Alexia? -- ela perguntou, com as mãos no quadril, olhando para os anjinhos de bochechas rosadas e olhos castanhos.
Maya fechou o porta-malas e foi até ela.
-- A de cabelos mais claros -- disse, ajeitando, ela mesmo, o bebê conforto no banco.
Assoprando uma mecha de cabelo que estava em seu rosto, Jessica olhou para os bebês.
-- Não vejo diferença alguma entre elas. E agora? Precisamos fazer algo para que eu consiga diferenciar uma da outra.
Maya entrou no carro e prendeu o cinto de segurança.
-- Não inventa, Jess.
-- Mas, como vou ter certeza que eu não dei a mamadeira para o mesmo bebê? E que não dei banho duas vezes na mesma?
-- Ai, Jess. Me poupe, vamos logo pra casa -- Maya olhou para os bebês e sorriu -- Não vejo a hora de curtir elas.
As meninas foram recebidas com festa. Todos os amigos fizeram questão de recepcioná-las, estouraram champanhe e paparicaram as meninas durante horas. Jessica passeava com os bebês nos braços, não cabia o seu coração no peito de quão orgulhosa que estava.
-- Nós somos uma família agora -- ela cochichou, passando os dedos pelo cabelo castanho de Alexia.
Foi uma semana que, apesar da maratona de mamadeiras e fraldas, Maya e Jessica se viraram muito bem. Na sexta, quando Jessica entrou com o seu conversível pelo portão da frente, Maya viu um carro estacionado na porta da casa.
-- Quem está aí? Você conhece esse carro?
-- O quê? -- Jessica estava tão distraída que nem notou a presença de um Audi Q3 iluminado pelos faróis do seu carro.
Imediatamente reconheceu o veículo e entrou em pânico.
-- É o juiz! -- disse, abrindo a porta do carro. Andou tão rápido pelo jardim da frente, que Maya teve dificuldade em acompanhá-la.
-- O que será que ele quer, Jess?
Jessica parou e virou-se para ela.
-- Pode ser que algum parente tenha aparecido para buscar as meninas.
Quando Jessica abriu a porta, Maya estava bem atrás, tremendo de medo. O que teria acontecido?
Assim que entraram, ouviram a voz do juiz conversando com Pepe. O juiz de cabelo grisalho estava sentado numa cadeira, segurando um bebê, enquanto Pepe tentava fazer o outro dormir.
-- O que está acontecendo? -- perguntou Maya, assustada.
-- Precisamos conversar -- respondeu o juiz, entregando Alessia para ela segurar.
Maya andava nervosamente de um lado para outro, dava tapinhas e embalava a criança.
-- Eu vou colocar a Alexia no berço e já busco a Alessia -- disse, Pepe e saiu rapidamente.
-- Eu vim até aqui, como amigo, não como juiz -- completou Everaldo Castro. Ele olhou para o bebê nos braços de Maya -- Como está diferente -- comentou -- Nessa idade, as crianças mudam a cada dia.
Maya sorriu, mas por dentro estava em pânico.
Jessica não suportou o suspense.
-- Pode falar juiz, estamos preparadas para qualquer notícia.
Ele sorriu, Pepe retornou para pegar Alexia.
-- Eu vou fazê-la dormir.
-- Obrigada, Pepe -- disse Maya, entregando a menina.
-- Vou ser direto -- avisou o juiz -- Descobrimos algumas coisas sobre a mãe das meninas.
Maya e Jessica sentaram-se lado a lado no sofá. O juiz continuou:
-- Ela trabalhava em um bordel mixuruca na cidade de Rio Grande. Depois que engravidou saiu de lá e veio morar em Hills. O dono do bordel não sabe nada sobre ela, sobre os familiares ou o pai das crianças. Seus documentos são todos falsos.
-- Poxa! -- Maya não sabia se ficava triste ou feliz -- Não sei nem o que dizer.
-- Na segunda-feira, peço que compareçam para uma entrevista com o Serviço Social, para pedir oficialmente a adoção.
Maya e Jessica se entreolharam. A perspectiva as encheram de esperança e otimismo.
-- Meu Deus! Isso é maravilhoso -- Maya se aproximou de Jessica sorrindo e abraçou-a -- Ouviu isso, Jess?
Jessica beijou-a no rosto, com os olhos brilhantes de felicidade.
-- Deus sabe o que é melhor para elas.
-- Sim, Jessica, ele sabe -- disse o juiz, levantando-se -- Acho melhor eu ir andando -- disse, num tom casual.
-- Muito obrigada, juiz -- agradeceu Jessica, enquanto caminhava com ele em direção a porta.
-- Não me agradeça, vocês merecem, as meninas merecem. Tudo vai acabar bem.
Como combinado, segunda-feira, Jessica e Maya estavam sentadas diante da assistente social preenchendo formulários para a adoção das meninas. Melissa Valência, recostou-se em sua cadeira enquanto elas respondiam a dezenas de questões.
-- Vocês já devem saber que uma criança abandonada fica sob responsabilidade do Estado por pelo menos um ano -- explicou -- Para se ter certeza de que os pais não foram encontrados. Depois disso, as meninas poderão ser adotadas.
-- Poxa, tudo isso? -- Jessica perguntou, preocupada -- Na sua opinião, pode haver algum problema? Ou melhor, pode aparecer alguém disposto a adotá-las?
-- Sempre existe essa possibilidade. Mas como vocês já estão com elas provisoriamente, já levam uma vantagem, e é provável que consigam adotá-la. Entretanto.
Maya remexeu-se na cadeira. Jessica sentiu o estômago revirar.
-- O quê, Melissa?
-- Há um casal na lista de espera para adoção das meninas.
Jessica olhou de lado para Maya e a viu desmoronar.
-- Eles estão há muito tempo na fila? -- Maya perguntou num fio de voz.
-- Não é esse o problema.
Jessica ergueu uma sobrancelha para enfatizar o que diria.
-- E qual é o problema?
Melissa respirou fundo.
-- A situação de vocês é que complica as coisas.
Maya sorriu com ironia.
-- Ah, entendi!
-- Não existe nenhuma proibição sobre a possibilidade de casais homoafetivos adotarem uma criança. O reconhecimento da união estável homoafetiva em 2011 facilitou e abriu as portas para o novo conceito de família. Neste contexto, não há nada que impeça um casal homoafetivo de participar de um processo de adoção. Pensei que o governo não se importasse mais com isso.
-- Não, mas os casais héteros ainda têm a preferência -- Melissa engoliu em seco, preocupada com a reação das duas -- Eu sei que é um absurdo e sou totalmente contra -- a assistente social respirou fundo antes de continuar -- Só estou dizendo que não existe garantia nenhuma de que fiquem com as meninas. Se estivessem pelo menos casadas, era um ponto a mais a favor. Hills é uma cidade pequena e antiquada, os moradores antigos são os mais preconceituosos. E, infelizmente, são os que influenciam em uma decisão dessa natureza.
Jessica sentiu um calafrio na espinha, uma reação que costumava ter quando estava prestes a tomar uma decisão importante.
-- Existe uma possibilidade -- disse Jessica, com um tom misterioso na voz.
Maya e Melissa olharam-se curiosas.
-- Qual possibilidade, Jess? -- Maya perguntou, esfregando os músculos tensos da nuca.
Jessica se levantou.
-- Te conto no caminho de volta -- ela estendeu a mão para se despedir da assistente social -- Nos encontraremos o mais breve possível. Hoje para nós começa uma corrida contra o relógio.
Jessica saiu da sala de Melissa como um foguete, Maya a seguiu sem entender nada.
-- Vai me contar ou não? -- Maya parou e esperou que Jessica também parasse, mas ela não parou -- Ei, espera por mim!
Jessica entrou no carro esporte vermelho, abriu todas as janelas e esperou Maya entrar.
-- Não é nenhuma ideia piramidal brilhante, apenas vamos seguir tudo aquilo que planejamos para o nosso casamento -- ela ligou o carro e saiu com destino a rodovia -- Se eles querem um casamento, eles terão um casamento -- ela diminuiu a velocidade e se virou para Maya -- Mas não será um casamento qualquer, será o casamento!
Maya abriu um sorriso largo.
-- Entendi. Será o casamento que Hills jamais esquecerá.
-- É isso aí, baby!
Fim do capítulo
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HelOliveira
Em: 16/06/2022
Essa casamento vai ser o grande evento....
Jess e Maya vão conseguir...
Bjos Vandinha
Marta Andrade dos Santos
Em: 15/06/2022
Espero que as meninas fiquem com elas.
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