Capitulo 24
CAPÍTULO 24
Contém palavras de baixo calão
homofobia
Minha mãe, delicadamente, aconselhou Germano a ir embora.
― Antes de ter falado com Alberto para namorar minha filha, deveria ter perguntado a ela se ela queria a mesma coisa, Germano. Você já começou errando daí, não levou em consideração os sentimentos dela, e vou te dizer só uma vez: nunca mais chegue na minha porta querendo falar ou importunar minha filha, estamos entendidos? ― Dona Fabiana sentou, tirou a sandália e ficou massageando os pés. ― O melhor que você e sua família fazem é irem para casa e esquecer toda essa besteira. Amanhã o Alberto fala com você.
Quando todos foram embora, ela continuou falando com o meu pai:
— Onde você estava com a cabeça quando aceitou e deu permissão que um rapaz frequente nossa casa e namore nossa filha sem ela ter conhecimento? Sem ter ao menos perguntado a mim o que eu achava da ideia estapafúrdia, afinal, eu sou a mãe dela! Você não tinha... aliás, você não tem esse direito.
Alberto, que já estava meio embriagado, respondeu com ironias e ofensas:
— Desde quando eu preciso de autorização para qualquer coisa nessa casa? A filha é minha e é menor de idade. O rapaz é de boa família, estudioso e louco por ela, para mim já basta. — Ele enumerava nos dedos cada qualidade que, segundo ele, Germano possuía.
— Amanhã, chame o rapaz e desmanche essa merd* que você fez. Minha filha só vai namorar quando ela quiser e com quem ela escolher. Não cabe a você e nem a ninguém fazer tal escolha.
— Isso é o que você pensa. Ela vai namorar ele ou qualquer um que eu escolher, não vou permitir que ela fique pra cima e pra baixo com esse macho e fêmea. Eu a mato de peia primeiro e vou deixá-la lá em Curitiba, na casa da minha mãe. Quero ver essa pouca vergonha vingar. — Ele avançava para perto da minha mãe, que não se afastava nem um centímetro para trás, encarando-o como uma fera.
— Nem ouse tirar minha filha de dentro da casa dela! Aliás, Marcos, vá buscar umas roupas do seu pai e traga para cá. Hoje ele dorme aqui embaixo. Amanhã, que procure um hotel. Só quando eu esfriar a cabeça e pensar direito, eu decido o que vou fazer.
Meu mal-estar já havia passado e, diante das barbaridades do meu pai, eu não ia ficar calada. Se ele quisesse, poderia me bater. Eu não ia permitir que ele ofendesse Bia quando ela não podia se defender.
— Não vou namorar o Germano. Nem ele, nem ninguém. Se o senhor me mandar embora, eu fujo e ninguém me encontra. — Talvez eu tenha sido malcriada e birrenta com meu pai, mas eu precisava tomar uma atitude e essa foi a melhor em que pensei.
― Posso saber por que a senhorita não quer namorar um rapaz de família decente? Por acaso está de namoricos com algum dos amigos maconheiros do seu irmão Marcos? ― ele falava e apontava com desprezo para meu irmão, que sorria e mandava beijos com a ponta dos dedos para meu pai, que ficou mais irritado.
― Seu Alberto, pare com essas coisas de dizer que seu filho querido fuma maconha. Se os vizinhos ouvirem, sabe como é, vão dizer que tal pai tal filho. ― Papai se alterou mais do que o normal.
― Estou esperando a sua resposta, mocinha, por que não quer namorar o rapaz?
― Eu não gosto dele, tenho nojo dele e nem adianta querer me obrigar. Eu não vou namorar com ele, eu já tenho namorado. ― Essa última parte não estava nos meus planos dizer assim, escapuliu. Meu pai perdeu a compostura por achar que eu o afrontei.
Alberto desafivelou o cinturão e partiu, cambaleante, para cima de mim. No momento em que ergueu o cinturão, foi impedido por uma parede de homens fortes, decididos a me defender ficando na minha frente, mas eu saí de trás e fui segurada pelo Marcelo. Mesmo assim, continuei afastando meus irmãos para ficar frente a frente com o meu pai para lhe dizer umas verdades.
— Bate, bate, covarde! Bate e me mata, porque é a última vez que me vê. Me bata e eu dou parte na polícia. Você é meu pai, não meu dono. O tempo da escravidão acabou, não sou sua escrava para ser negociada, sou uma mulher livre e dona das minhas faculdades mentais.
— Fica quieta, Marina! Não vamos deixar ele encostar um dedo em você. Papai, se recomponha, isso lá são modos para um chefe de família? ― Marcelo, meu irmão mais velho, mais uma vez tomou a minha frente, encarando seu Alberto, que se apoiava na mesa, cambaleando para poder ficar de pé.
— O que é, Marcelo?! Vai dar uma de macho alfa e enfrentar seu pai? Vem! Aliás, podem vir vocês todos, seus bostas. — Pateticamente, ergueu os punhos fechados, chamando os filhos para uma luta corporal. Era vergonhosa a forma como se comportava.
Meus irmãos mais velhos e minha mãe pareciam estar acostumados a vê-lo assim, agora eu e os menores, não. Virginia assistia a tudo num canto e só chorava, abraçada a si mesma, talvez apavorada com tudo que estava acontecendo.
Eu não esperei ouvir mais nada. Soltei-me do meu irmão e corri para o meu quarto. Quando entrei, me senti sufocada com o choro preso e nem sabia o que fazer ou que seria da minha vida. Fui para o terraço e de lá dava para ouvir e ver tudo que estava acontecendo próximo à piscina. Sentei no chão. O mármore frio fazia minhas pernas doerem e encostei meu corpo nas colunas, liberando o choro que convulsionava cada centímetro do meu corpo, que balançava como se eu sentisse febre alta.
— Já chega. Acabou a palhaçada, Alberto. Não está vendo que está assustando as crianças? Venha cá, Virginia, ele não vai bater em ninguém. ― Vivi foi, meio encabulada, e minha mãe a abraçou enquanto ditava as ordens: ― Todos para dentro e você, valentão, a hora que ficar bom desse porre, pode entrar na casa e procurar o quarto de hóspede. No quarto onde eu durmo, você não entra nem para trocar a roupa. Isso se eu não mudar de ideia e mandar você para um apart. Ou então arme uma rede aqui mesmo e durma. Vamos, meninos. — Minha mãe interveio.
— Vão, acompanhem a mamãezinha de vocês, bando de maricas. É isso que todos vocês são, um bando de bichinhas — enquanto falava, meu pai apontava para cada um dos filhos.
Matias ainda quis voltar e foi impedido por Fabiana.
— Deixe para lá, meu filho. Não vale a pena. Amanhã, quando ele acordar, talvez nem se lembre de nada e, se lembrar, vai ficar todo arrependido pelo fato de ter levantado a mão para bater na filha. Mesmo que ele a ame como eu sei que ama, ela não vai esquecer o que ele fez e, se eu ensinei bem a ela, também não vai perdoar com facilidade.
— Mamãe, a senhora acha que ele vai obrigar ela a ficar com quem ele quiser?
Eu ouvia as vozes deles subindo as escadas e corri para meu quarto. Entrei no banheiro e liguei o chuveiro para minha mãe ter a impressão de que eu estava no banho. Voltei e me escondi atrás da porta para ouvir o que diziam.
— Talvez sim. Seu pai não conhece a palavra “não”, mas com minha filha é diferente, ela só vai namorar quem ela quiser.
— A senhora sabe que ela e a Bia... é mais que amizade, não sabe?
— Uma mãe sente, Matias, tudo que está se passando com os filhos. Há algum tempo, eu percebi a mudança nela, o sorriso ficou mais aberto, os olhos estão sempre procurando a casa ao lado, não sai do celular e, quando vê Biatriz, só um cego como o seu pai não enxerga. Eu sei muito bem como é isso, já tive a idade dela. Você, por exemplo, mesmo que não diga nada, está levando a sério a Rosely, mais do que queria. Estou mentindo? ― dona Fabiana mudou repentinamente de assunto.
— Certíssima, estou só deixando rolar pra oficializar. — Os irmãos ficaram assobiando e dando tapinhas nas costas do Matias, que só fazia rir e se afastar.
— Vamos dormir que é o melhor que fazemos. — Minha mãe deu a brincadeira por encerrada.
Quando todas as portas foram sendo trancadas, ainda ouvi minha mãe gritando:
― Não quero saber de ninguém importunando a Marina, ela deve estar muito magoada e sofrendo. Eu vou só tomar um banho e vou lá falar com ela. ― Todos concordaram, mas ainda ouvi a voz de Matias:
― Mamãe, a deixa dormir, amanhã a senhora tem essa conversa. O dia hoje foi muito carregado de emoção. Não a julgue, ouça o que ela tem para dizer.
― Você sabe mais do que está dizendo, não sabe? ― Imaginei a cena da mamãe passando a mão nos cabelos do Matias, arrumando seus cachinhos que pareciam macarrão parafuso na sua cabeça, e ele sorrindo abobalhado com o carinho, como sempre fazia.
― Isso é coisa de irmãos. Se tiver de saber, vai ser por ela, que só está com medo de decepcionar a senhora.
O resto da conversa, não fiz muita questão de ouvir. Eu estava tão sem rumo. Meu maior medo era de ser mandada para longe. Eu não ia resistir a passar dois anos trancada em um colégio interno, que era o mais provável que papai faria comigo quando soubesse a verdade. Eu precisava conversar com a Bia. Ela tinha saído tão preocupada. Peguei o celular e, na hora de mandar a mensagem, uma ideia tomou conta de mim. Era o que eu precisava fazer. Depois disso, não tinha mais volta.
Fim do capítulo
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Marta Andrade dos Santos
Em: 01/05/2022
Eita não vai apru Mariana.
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