Capitulo 23
CAPÍTULO 23
SAINDO DO ARMARIO
Contém palavras de baixo calão e homofobia
Germano sorria, contente, e nem percebeu que eu estava chorando. Bia só me olhava, esperando que eu dissesse alguma coisa, e eu só fazia chorar, vendo meu mundo ruir. Germano veio sorrindo e pegou na minha mão. Nesse momento, tudo ficou em câmera lenta e nem sei o que aconteceu. Eu só ouvia os gritos.
— Largue a mão dela, seu imbecil! — Tive a impressão de ouvir Bia mandar ele soltar minha mão e uma grande confusão começou. Meu peito doeu ao saber que estava obrigando minha loirinha a passar semelhante humilhação.
— Quem o senhor pensa que é para estar fazendo a escolha no lugar da minha irmã? O senhor não tem esse direito, seu Alberto! — Matias gritava e tudo que eu queria era tomar as rédeas e assumir logo de vez, mas meu corpo não obedecia.
— Tenho todo o direito! Sou o pai dela, seu fedelho!
Nesse momento, uma tontura me invadiu e eu não senti mais minhas pernas. Fui descendo devagar e sentei no chão. Minha mãe correu e me abraçou e dona Luiza arrastou Bia de perto de mim imediatamente, antes que as coisas piorassem.
Tive uma queda de pressão não sei como. Talvez os acontecimentos tenham mexido com meus nervos. Fiquei tão tonta que quase caí. Se não fosse a Bia, que estava ao meu lado me segurando, eu teria caído. Senti alguém puxando-a e outras mãos me seguraram. Tentei abrir os olhos e consegui ver dona Luíza arrastar minha namorada pelo braço. Ela queria voltar enquanto meu pai dizia mais desaforos.
— Marina, está sentindo alguma coisa, minha filha? — Mamãe me abraçou enquanto passava a mão no meu rosto e pegava no meu pulso.
— Mamãe eu estou bem... Não deixa a Bia ir embora, por favor, chama ela logo. Olha, ela está indo. A senhora chama, mamãe? Por favor, chama ela de volta. Eu não quero namorar o Germano, eu o detesto. Promete? — Como eu já estava chorando, minha mãe tomou a frente.
— Fique calma que eu vou resolver isso — ela sussurrou, segurando minha mão. No mesmo instante, olhei para ver se ela dizia a verdade e, na minha frente, não foi minha mãe que eu vi. O que tinha ali era uma leoa que se levantava calmamente com o olhar fixo no meu pai, que pareceu ficar com receio do que via à sua frente enquanto eu me comportava como uma lebre assustada, mas não por muito tempo.
Minha mãe deu a festa por encerrada.
— Pessoal, diante dos acontecimentos, minha filha não está se sentindo bem e a situação aqui também não está das melhores. Peço que desculpem a falta de educação deste senhor, que, por uma brincadeira do destino, se tornou o pai dos meus filhos, já que o desvio de caráter, esse é mais difícil de desculpar. Sendo assim, a festa acabou. Agradeço a presença de todos e, mais uma vez, mil desculpas. —Voltando-se para o meu pai, continuou: — Era isso que você queria, Alberto? Está satisfeito com essa palhaçada que você, com sua insensibilidade, tão bem orquestrou? — Gesticulava com as mãos, formando um círculo para mostrar o espaço físico onde todos estavam. A maioria dos adultos ficou sem jeito, sem saber onde enfiar a cara.
Seu Alberto recuperando-se do susto de ver minha mãe daquela forma, ergueu a voz, como a mostrar quem mandava ali:
— O que não pode é essa menina andar para cima e para baixo com essa sapatão júnior! Melhor que arranje um namorado decente, de boa família e que gosta dela. — Ele se achava o dono da verdade.
— Você está cego ou é doido mesmo? Ela não gosta dele! Você não está vendo? ― Minha mãe apontava para a cadeira onde eu estava sentada, ainda chorando.
— Aprende a gostar. Você também não gostava de mim quando casamos e olha a família maravilhosa que a gente tem. — Apontava os filhos com orgulho.
— Eu não vou namorar o Germano, papai! Nem ele, nem ninguém! O senhor não pode me obrigar! ― eu gritei, me levantando.
— Vai, sim! Se não for ele, eu arranjo outro garoto bom ou então coloco você num colégio interno e só sai de lá quando completar dezoito anos. Ora! Onde já se viu uma fedelha dessas querendo me afrontar? Eu não quero essa sapatão perto da minha filha! Desde que essa raça chegou que essa doente aí não sai daqui. Também, filha de quem é. Ainda bem que a Marina não é da mesma laia.
— Meça suas palavras, Alberto! Enquanto você ofende só a mim, tudo bem, eu sei o quanto você é homofóbico. Mas destratar minha filha? Isso eu não vou permitir! Se disser mais uma palavra, eu abro um processo contra você! Vamos embora. Geruza, você vem? Vocês também, Roberta e Bernardo. — Dona Luíza saiu, puxando Bia pela mão, mas minha mãe foi ao seu encontro, impedindo sua saída.
— Luíza, por favor, me perdoe por tudo. Eu nunca pensei que Alberto fosse capaz de um papel desses. Além disso, a Marina pediu para a Bia ficar e eu também não queria que você fosse embora.
— Não se desculpe por esse louco, sempre soube que ele é homofóbico. Você é mais importante que tudo isso, mas não admito ele destratar minha filha, jamais! Eu tenho que ir, minha balinha de café. Se eu ficar, vou perder a razão e vou acabar dando uns tapas nesse monstro. Amanhã a gente conversa. Anda, vá ficar com sua filha. Não permita que ele faça nada que você venha a se arrepender mais tarde, não deixe que sua filha pague pelos nossos erros do passado. Cuidado e até amanhã. — Foi embora arrastando uma Bia que esperneava, querendo ficar. Antes, porém, ouviu minha mãe prometendo a dona Luíza, que já estava na calçada:
— Não se preocupe, não é ele que vai fazer da vida da minha vida um inferno. Aprendi a lição. Agora vá, a gente conversa depois.
Ela entrou novamente e se virou com um olhar furioso para meu pai.
— Senhor Alberto, quem o senhor pensa que é para arranjar namorado para a sua filha? Aonde o senhor estava com a cabeça para decidir semelhante barbaridade sem antes me comunicar? — Fiquei admirada com minha mãe, nunca a tinha visto com tanta raiva.
— A filha é minha e menor de idade, então os namoradinhos dela sou eu como pai quem tem que dar a última palavra — ele falou, todo imponente.
— Pois saiba que minha filha não vai namorar nem esse rapaz e nem um outro que apareça aqui na porta. Ela só vai namorar com quem ela quiser! E você, Germano, pode tirar o cavalinho da chuva. Se eu souber que anda falando das minhas filhas por aí, eu mando capar você! — ela rasgou o verbo, pouco se importando com os pais de Germano, que estavam umas feras.
— A senhora, dona Fabiana, não pode tirar uma ordem minha ― Alberto ainda gritou, tentando impor sua vontade.
— Posso e já tirei! Se ousar obrigar a minha filha a fazer o que ela não quer, eu jogo suas coisas no meio da rua. Quem achar ruim pode ir junto! Quer saber? Acabou a festa! Todo mundo para casa. Betânia, peça desculpas às meninas em meu nome. Amanhã a Marina fala com vocês. A coisa aqui vai ficar feia.
― Não se preocupe com a galera, tia. Tudo mundo entende como é ter um pai assim. Nesse momento, a Marina é mais importante. Queria que minha mãe fosse assim como a senhora quando descobriu o meu namoro. ― Minha mãe sorriu, entendendo o que minha amiga dizia.
Minhas amigas todas vieram até a cadeira onde eu estava sentada, ainda meio atordoada com tudo que tinha sido dito, me abraçaram e saíram. Rosely me segredou no ouvido antes de sair:
— Se ele proibir vocês de se verem, minha casa está à sua disposição. Eu não quero nem saber dos problemas que isso pode causar. Betânia e a Lara também pensam do mesmo jeito. Nossas casas serão seus pontos de encontro, assim quando você queira. Duvido que ele permitia sua amizade com as meninas e, a essa altura, ele já sabe que elas podem ser namoradas. Nunca pensei que seu pai fosse homofóbico e preconceituoso.
— Obrigada, amiga. Nem eu, que sou filha, desconfiava, mas também a gente só se vê aos fins de semana. Sinceramente, nem conheço o pai que tenho, mas de uma coisa eu sei: nem que ele me mate de surra, eu faço o que ele quer. Manda um zap pra Bia, diga a ela que estou bem e que não durma. Quero falar com ela ainda hoje. Meu celular ficou lá no quarto.
— Pode deixar que vou avisar agora. Vou para casa de Uber, o seu irmão não pode sair daqui, pode ser que as coisas engrossem.
— Obrigada por tudo, cunhadinha. — Nós duas nos despedimos e Rosely se afastou um pouco com Matias. Ficaram um tempo conversando e vi quando meu irmão tirou o celular do bolso, provavelmente para pedir o Uber.
Em poucos segundos, um carro parou em frente à casa, o casal trocou beijos e meu irmão foi até lá fora ver a namorada ir para casa. Voltou em seguida, ficando perto da minha mãe.
Todos foram embora. Meus avós já haviam ido mais cedo. Agora, meus tios e minha prima, Gerlane, ficaram. Ela parecia se divertir com tudo e, graças a Deus, minha mãe não teve piedade e expulsou eles também. Meu tio, na maior cara de pau, ainda abraçou meu pai, dando-lhe todo apoio. Foi o suficiente para minha mãe mostrar a porta da rua a ele e à família. Até a chata da minha prima não foi poupada.
— Quanto a você, minha sobrinha, muito me admira que esteja se vangloriando de tudo. Quando você passou o dia dando em cima da Biazinha, até recado eu ouvi você mandando. Seu pai, todo certinho, apoiando o irmão nas barbaridades dele, se esquece de olhar dentro da sua casa. Seu pai sabe que você gosta de mulher? — Fabiana não dispensou nem a sobrinha com cara de santa.
— Tia, pelo amor de Deus, de onde a senhora tirou isso? É mentira, meu pai — a garota falava, desesperada, diante do olhar glacial do pai e da passividade da mãe, que nem ao menos erguia a cabeça para encarar o marido.
— Você quer que eu chame a menina aqui, meu cunhado? Para ela mostrar as mensagens que sua filha mandou o dia todo? — minha mãe sorria enquanto falava e o meu pai parecia que tinha visto um fantasma.
Meus tios não esperaram mais agrado. Meu tio, mesmo assim, olhou com desprezo para mim e para minha mãe também, que sorriu na cara dele. Eu tinha certeza de que aquele sorriso era de deboche. Mesmo amando, eu nunca tinha visto minha me dessa maneira. Parecia outra mulher. Meu tio arrastou a filhinha com a esposa e foram para o raio que os partisse.
Fim do capítulo
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HelOliveira
Em: 26/04/2022
Dona Fabiana tem a minha admiração....
Tão linda e tão difícil essa fase das meninas...
Parabéns
Resposta do autor:
ser mãe de adolescente, não é moleza.
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Marta Andrade dos Santos
Em: 24/04/2022
Nossa barril dobrado dona Fabiana.
Resposta do autor:
São as dores de ser mãe de adolescente.
que bom ter você de volta na historia das meninas.
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