Capitulo 16
CAPITULO 16
Meu coração parecia a bateria de uma escola de samba no final do desfile. Eu tinha tomado um banho caprichado e lavado bem os cabelos, que estavam com a areia da praia até na raiz. Demorou um pouco para secar. Passei um creme hidrante na pele e escolhi uma sai preta justinha com uma blusa azul claro de alça. As mãos molhadas denunciavam o meu nervosismo. Apertei a campainha e em segundos a porta foi aberta. Bia estava banhada, cheirando a um shampoo suave que eu não sabia o nome. Ela me pareceu também bastante nervosa. Entrei, pedindo a Deus que ela não percebesse a tremedeira nas minhas pernas.
— Vem, vamos lá para a sala, eu preparei um lanche. Tá com fome?
— Hun-hun, vim direto para cá.
A sala, embora fosse idêntica à da minha casa em questão de formato, diferenciava-se na decoração em tons verde-água com uma iluminação toda diferente. As luminárias de led davam um ar de romantismo, casando com três conjuntos de sofá em L na cor grafite. No centro da sala, um tapete felpudo na cor branca, gostoso de sentir nos pés. Na parede, uma TV imensa, tal qual uma tela de cinema, e, para completar, uma mesa de som, dessas que só profissionais usam, ao lado de uma mesinha com hambúrgueres, suco e refrigerante.
Ela realmente havia pensado em tudo. Sentamos lado a lado e começamos a comer o pão de queijo e ovo com alface, cebola e pimentão. Estava com tanta água na boca que comi sem nem me preocupar se ela estava olhando. Depois de beber o suco de caju, Bia colocou uma música. Os primeiros acordes soaram e já sabia que era da Iza, uma cantora negra muito parecida com as cantoras norte-americanas e, segundo meus amigos, eu era a cara dela. A música “Complicado” estava tocando e senti que ela dizia exatamente o que eu sentia naquele momento.
— Eu gosto dessa música — falei, para lá de nervosa, com receio de que ela percebesse minhas mãos suando.
— Eu adoro. Quando vi o clipe, achei a cantora a sua cara, até seu jeitinho ela tem. Daí então, essa música passou a ser a minha preferida na hora de dormir. ― Seu olhar transbordava emoções que eu não sabia ler.
— Minhas amigas dizem que eu sou uma mistura de Iza com o rosto da Camila Pitanga. Na real... sou uma mistura do seu Alberto e dona Fabiana, do meu pai tenho a altura e o resto é da minha mãe.
— Também acho. Você é muito parecida com sua mãe. Vem cá, senta aqui. ― Bia me mostrou um local colado a suas pernas no sofá.
Meu estômago deu voltas de nervoso, mas eu fiz o que ela pedia. Ficamos bem juntinhas. Eu estava uma pilha de nervos. Bia, agora mais calma, passou o braço em meus ombros e segurou minha mão na outra extremidade, entrelaçando nossos dedos.
— Não precisa ficar nervosa... eu sei que para você tudo é novidade e eu queria ir com calma, mas é que estou a cada dia mais vidrada em você... Quando durmo, ou quando acordo, fico ouvindo som em tudo que eu faço, só dá você em meus pensamentos. Morro de ciúme daquele babaca a todo momento te tocando, querendo chamar sua atenção. Minha vontade é de partir para cima dele. Na real, eu pirei na sua boca, adoro seu sorriso, seus cabelos, deixa eu te beijar, vai? — ela falou tudo de uma vez.
Embora eu quisesse muito, estava morta de medo de vergonha e Bia falava rápido talvez com medo de não conseguir.
— Eu não sei como faz... nunca beijei — consegui dizer, pois estava com medo de ela desistir.
Eu me senti embriagada com o som da sua voz, seu cheiro e a sensação da sua boca junto à minha.
Seu hálito cheirava a morango doce. Senti seus lábios roçando os meus em uma carícia leve. Ela passou a ponta da língua neles, lambendo e ch*pando bem de levinho. Em nada se parecia com o que minha irmã tinha dito sobre ser nojento, era muito era gostoso e, sem sequer perceber, abri minha boca. Bia foi lambendo e mordendo meus lábios, eu estava de olhos bem abertos e vi o prazer que ela estava sentindo na minha boca. De olhos fechados, ela lambia, mordia e gemia, já toda em cima de mim com as mãos na lateral da minha cabeça, segurando por dentro dos meus cachos, e eu me perdi.
Eu estava morrendo de medo. Afastei-me um pouco e falei:
— Não! E se vier alguém? Tua irmã pode ver.
— Minha mãe viajou ontem e minha irmã está com o namorado na casa dele e Bernardo, só Deus sabe.
Assim que disse isso, voltou a me beijar e, dessa vez, quando seus lábios ch*param os meus, passei a língua neles, meio envergonhada.
E se estiver fazendo errado? E se ela me achasse criança demais e desistisse do beijo?, eu pensava, mas queria ser beijada, então não voltei atrás.
Lambi seus lábios e tudo que ela fazia comigo eu fazia com ela também. Quando nossas línguas se encontraram, fui à loucura. Rapidamente, Bia puxou minha língua com a sua para dentro da boca dela e ch*pou como se fosse sorvete. Deixei escapar um gemido, isso era gostoso. Ela continuou a ch*par e a acariciar meu pescoço. Quando parou de ch*par, foi distribuindo beijos e ch*padas em todo o meu queixo até os lábios, me abraçou e, no meu ouvido, sussurrou:
— Sua boca me enlouquece. Desde quando te vi, quis ficar com você, mas aí minha mãe me deu um sermão e fui obrigada a me afastar. Ainda assim, eu não conseguia parar de te querer, o tempo todo eu te olhava, onde ia, com quem falava. Sabia que você também me buscava, eu via sua sombra na janela sempre.
Fiquei calada, só ouvindo. Sua voz me arrepiava toda, parecia que eu estava em um sonho do qual tinha medo de acordar. Eu, euzinha, havia sido beijada e beijei e tinha gostado. Gostado, não, eu tinha adorado.
E agora? A própria Bia me disse certa vez que não namorava, só ficava ou dava um tempo. O que eu faria? Que eu era lésbica, eu já não tinha dúvida, ou tinha? Não. Eu tinha certeza. Sabia o que estava sentindo, tinha me encaixado no jogo da vida. Meu corpo não me deixava ter dúvida, tinha encontrado meu lugar, ou seja, seria nos braços de outra garota, disso eu tinha certeza. O que eu faria com essa certeza, eu ainda não sabia, portanto não ia encanar. Também não podia deixar esse momento escorrer por entre meus dedos. Toda garota passava isso com um garoto a primeira vez que beijava. No meu caso, a diferença era que estava acontecendo com outra garota.
Como eu poderia encarar alguma coisa? E meu pai? Ele iria me matar ou me mandar para um colégio interno. Será que minha mãe ia ter nojo de mim? Só de pensar nisso, meu coração doía, estava pesado, assim como o peso que eu estava sentindo em cima de mim, com o calor de outro corpo.
— Você sabia que tá deitada em cima de mim e me sufocando? — falei, rindo e olhando dentro daquele mar verde.
Ela também sorriu, sentou e me colocou entre suas pernas, mas eu estava usando saia curta, o que dificultava a posição. Entretanto, resolvi ficar no sofá e ela sentou no meu colo. Nos beijamos mais um pouquinho, eu estava pegando jeito na coisa de beijar. Ficamos caladas, só abraçadas.
— Para quem nunca beijou na vida, você se garantiu — ela me elogiou e eu fiquei com um pouquinho de vergonha. Precisava começar a me soltar, se não fizesse isso, não me sentiria bem.
— Então quem se garantiu foi você. Só repeti o que estava fazendo comigo.
— E então? Foi bom? Por que para mim foi um dos melhores. — O sorriso de felicidade estava estampado em seu rosto e eu tinha medo de que fosse de vitória por ter conquistado a garotinha da casa vizinha, mas, olhando dentro dos seus olhos, eu via que meus medos eram infundados, ela também estava se sentindo da mesma forma que eu estava.
— Foi ótimo. Não tenho com o que comparar, mas eu gostei.
— Nada de sair por aí beijando, viu?
— Se eu não posso, quer dizer que você também não pode, o que me diz? ― Ela me olhou com aquele jeito de moleque, rindo e tentando me beijar outra vez. Coloquei as duas mãos em seu peito, mantendo certa distância e continuei.
― Afinal de contas, eu soube que toda noite você fica com uma menina diferente lá na quadra. Se for para a gente ter alguma coisa, isso acaba hoje. Não quero ouvir que você ficou com alguém. Se isso acontecer, a gente acaba.
Não sei se foi o certo a dizer, a garota só me beijou e eu já queria mandar. Ainda assim, era desse modo que eu me sentia, queria começar sendo verdadeira comigo mesma e com ela.
— Está querendo dizer o quê? Quer ser exclusiva? Vai se assumir? Para mim, está beleza, eu estou querendo namorar você mesmo, tudo dentro dos conformes, mas, como sei que você não tem experiência, pensei que não queria se assumir.
— Não sei o que pensar. Não tenho coragem de dizer para minha mãe, também não quero perder isso, não sei. Não sei o que fazer. Eu sou menor de idade. E se der merd* e você for acusada de assédio? E se meu pai piorar tudo por causa da minha idade? Eu tenho muito medo dele me mandar para um colégio interno.
Bia ficou calada um bom tempo, analisando tudo que eu disse, só então respondeu:
— Bom, vou perguntar a minha mãe por alto como sua mãe reagiria caso descobrisse que a filha está gostando de meninas. Não, melhor não. Ela já me proibiu de dar em cima de você, foi bem clara, posso ficar com qualquer garota, menos com você.
— Mas por quê? Ela não gosta de mim?
— Não é isso. Parece que sua mãe pediu para ela, foi uma coisa assim. Vi as duas conversando e, quando a sua mãe foi embora, minha mãe quase me bateu. Fez eu prometer que ia te respeitar. Eu só não podia era fingir que você não existia. — Ela me beijou mais uma vez, dessa vez um beijo longo, que retribuí com gosto.
Eu tinha mil e uma perguntas e medos, mas o mais certo era, por enquanto, manter só entre nós.
— Por enquanto, vamos manter em segredo até eu criar coragem e falar com a minha mãe, tá certo? Tenho que ir, já está tarde — eu disse, meio desanimada.
— Tudo bem, eu sei como é sair do armário, não é fácil para ninguém. É como quebrar a casca do ovo sem garantias do que vamos encontrar lá fora. Quando estiver pronta, eu vou estar do seu lado. Agora vem, vou contigo até o portão.
Fim do capítulo
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