Do céu ao inferno
No pequeno apartamento, feliz e ansiosa, Alice se arrumava, ouvindo Edith Piaf. O mais fiel retrato de uma romântica incurável, ainda envolvida no final de semana arrebatador que tivera com sua amada e encantadora Laura . Nem mesmo o tempo nublado, fora suficiente para lhe amargar os ânimos. Até o céu cinza, achara lindo. Os pássaros agitados pela possibilidade de chuva, cantarolavam melodicamente, canções gostosas de se ouvir. O café, recém passado estava mais saboroso e nada poderia ser mais belo, que seu sorriso, contemplado no espelho, vislumbrada por sua pele exalando beleza, a ponto de quase brilhar. Vestiu-se de um conjunto de calça, camisa, colete e blazer, cuidadosamente cortado por uma renomada alfaiate feminina da capital. Sobretudo, vestiu-se de alegria e entusiasmo por mais um dia poder fazer o que ama, certa de que faria o melhor, além de claro, estar com passaporte garantido para ingressar à sala de sua deusa do ébano e, poder completar sua alegria.
Na mansão imponente, nem todo o luxo em milhões, estacionados na grande garagem, eram suficientes para mensurar a felicidade estampada na face e pulsando no peito da famosa CEO mais falada da capital paulista. Acordou disposta e elétrica, fez um treino pesado, acompanhada de seu personal e amigo Gil, tecendo todos os elogios possíveis e imagináveis para sua amada e doce, Alice. Estava tão envolvida nas recentes e deliciosas lembranças do final de semana espetacular que vivera, que nem mesmo ler as atualizações do caso Gordon, lhe tiraram o bom humor e paixão no olhar. Ligou para seu assessor, e ordenou passe livre para tão aguardada visita que logo chegaria ao complexo, ansiosa por receber os beijos intensos de sua loira. A saudade apertara o peito, e ela mal podia chegar pela hora de poder reencontrá-la, agora no ambiente de trabalho, com uma certa adrenalina causada pelo ambiente, inusitado. Vestiu-se de saia lápis, com fenda lateral e camisa decotada, com intenção de chamar atenção da sua consultora. Seu olhar lascivo no espelho, ao maquiar-se, entregara suas memórias das inúmeras entregas corpórea que tiveram em apenas dois dias. Seu coração disparara com as lembranças e o desejo em repetir tudo, a tomou. Tão logo, saiu apressada, dirigindo seu Mustang branco pelas avenidas movimentadas, desejando que o caminho se encurtasse para que pudesse chegar logo e, encontrar Alice.
Enquanto Laura estava à caminho, Alice iniciava a reunião com os investidores das duas empresas sob sua responsabilidade de ascensão, no prédio lateral, ao que fica seu escritório. Estacionou na entrada principal e entregou a chave ao manobrista, apressada por subir logo ao oitavo andar. Adentrou seu empreendimento, a passos largos, com o coração batendo forte no peito. Os andares, passavam lentamente sob o cabo de aço que a içava dentro da caixa metálica. As portas de aço se abriram e ela, apenas cumprimentou doca Chica, com um sorriso encantado nos lábios, crente de que ao abrir a porta da sua sala, contemplaria a mais linda mulher do seu mundo particular.
De fato, dentro do ambiente uma lindíssima mulher a aguardava, mas, não era sua doce Alice. Vestida em uma calça social preta, modelo cigarrete e scarpin de salto fino, camisa de seda branca, cabelos longos, soltos, na altura da cintura e corpo definido, estava sua ex, Tatiane Rebouças. Laura tomou um susto que lhe revirou o estômago. Imediatamente suas mãos começaram a suar e a garganta secou. Tati, como ela assim a chamava, estava muito diferente da mesma persona, que há dois anos e alguns meses, deixara de frequentar sua vida. Com expressão madura e porte imponente, olhos delineados, em uma maquiagem clean, muito bem feita, lhe sorriu ao se virar e, fez suas pernas estremecerem. Essa era a primeira vez que a via, após o fatídico dia em que lhe flagrara, neste mesmo prédio, com a secretária. Desde então, Laura tentou aniquilar todos os possíveis resquícios de memórias e lembranças dessa mulher que tanto lhe amou, e machucou. Confusa com o que sentira ao vê-la, tão bela, ao mesmo tempo em que teve a impressão de que o tempo passou rápido demais, sentiu mais uma vez toda a raiva do momento derradeiro e, tentou esconder suas emoções. Cumprimentou cordialmente a ex, com um beijo despretensioso no rosto. Outrora, estava tão encantada pelas lembranças do final de semana, que chegou até acreditar não ser possível sentir atração por nenhuma outra mulher, no entanto, ao aproximar-se de Tati e sentir seu perfume adocicado, o mesmo cheiro que por mais de dois anos a envolveu diariamente, seus instintos mais selvagens e ausentes de raciocínio foram despertados. Tati sempre exerceu esse poder sobre ela. Poder feminino de proporcionar a perda repentina do juízo. Ao mesmo tempo que a espinha se arrepiou e asa borboletas no estômago baterem asas dentro de si, no prédio ao lado, no 15º andar, na sala de reuniões, Alice conseguia um feito inédito de parceria, possibilitando-a lançar ações, de baixíssimo custo e, assim, engordar a carteira de acionistas para, a partir de então, triplicar os lucros das empresas. Ela sabia como fazer, e a inspiração estava estampada em suas ações. Já no prédio principal, no 8º andar, na sala da proprietária, a conversa corria em tons ácidos, num encontro que não poderia, mas deveria acontecer para esclarecer assuntos inacabados.
Tão logo a reunião finalizou, e a experiente consultora, como uma menina querendo saltitar de felicidade, desejou compartilhar a conquista com a chefe e também amada. Desceu os muitos andares, afoita dentro da caixa de ferro e, andou pelos corredores que levavam até a sala de Laura, a passos largos, com o coração quase saltando à sua frente. A saudade dos beijos de empresária, a consumia. A ansiedade era tanta, que dispensou a espera pelo elevador no outro prédio e subiu pelas escadas da saída de emergência, pulando os degraus de dois em dois, para chegar mais rápido. Nem mesmo a canseira por subir oito andares foi suficiente para tirar-lhe o sorriso dos lábios e a emoção em encontrar, sua preciosidade.
Na sala, tomada pela fúria e sem abertura para ouvir algumas verdades a seu respeito, Laura, mandava Tati retirar-se da sua presença, e a belíssima e tentadora recém formada médica, a obedeceu. O que Laura não esperava, era que o desejo sem juízo iria tomar à frente das suas atitudes, sempre controladas, e num súbito relance, deixou-se levar pela saudade, que nem sabia que a habitava. Tati tão perto, linda, diferente, madura, a cegou o raciocínio. Um lado do seu cérebro sabia que era errado, mas o outro estava incontrolável. Acariciou o rosto daquela mulher que tanto amara, tocou-lhe a cintura, agora menos farta que outrora e seu polegar passeou por seus lábios, que há tanto beijou, os beijos mais ardentes e sem juízo que já existiu. A relação de Laura e Tati sempre foi marcada por muitas brigas e acidez que, acabavam nos momentos mais selvagens possíveis de se realizar entre dois corpos. Não diferente agora, quanto mais ácida Tati se mostrara, mais Laura a desejava. E, nessa dicotomia cerebral, de fazer ou não o que se desejava, sua amada e doce Alice chegara, completamente tomada pelo desejo em vê-la e compartilhar sua conquista.
Contemplar aquela cena estarrecedora, foi como tomar uma apunhalada certeira no coração, até então palpitante alegremente pelo vasto campo dos sentimentos de Alice. Sua linda e encantadora Laura, detentora de seus desejos mais ávidos e proprietária das recentes juras de vida promissora e longa, nos braços de outra mulher, dada ao prazer de um beijo. O sorriso até então fixo em sua face, murchou-se como uma flor que morre lentamente à espera de nutrição. As borboletas que habitam seu estômago, tiveram suas frágeis asas grudadas pela gosma melancólica da decepção e caíram ao chão, pálidas e sem vida. À velocidade da luz, suas memórias passaram em sua mente e o lugar reservado ao amor, imediatamente foi ocupado pela mágoa, que chegara acompanhada da raiva e descrença nesse sentimento que dizem ser nobre, porém, não mais pertencente ao seu frágil e machucado ser.
Em contrapartida Laura, ao perceber ter sido vista, retomou seu juízo como uma luz que se acende ao acionar o interruptor. Sentiu vergonha pelo seu momento de lapso e armadilha desejosa. Teve ainda mais raiva da mulher à sua frente que já tanto a machucara e, como uma cobra a hipnotizara mais uma vez para aplicar-lhe um bote fatal. O olhar de Alice, outrora carregado de luz e brilho, a penetrou a janela da alma, com amargor e escuridão. Nem todos os muitos dígitos da sua conta bancária, seriam suficientes para fazer o tempo regredir e a consciência dominar suas ações.
Alice, apenas ausentou-se do ambiente, apressada em ir em preservar o que lhe restara de humanidade pulsante. Com a mesma pressa que chegou, saiu, agora, em fuga dos seus sentimentos. Desceu as escadas sem ver o chão. Quanto mais descia, mais queria descer. Metaforicamente descer, fazia todo o sentido ao que sentia. Seu espírito outrora dançante e flutuante, estava desmoronando num abismo até então nunca visitado. Em nenhum momento da sua vida, tinha se entregado tão intensamente ao nobre sentimento. Sentia vontade rasgar o caríssimo conjunto de linho puro, na tentativa de deixar sua alma desencarnar desse corpo, agora machucado pela atitude da sua infiel amada. Parou entre o lance de degraus para encontrar ar e, as lágrimas brotaram de seus lindos olhos verdes, como uma flor que desabrocha e lavavam sua face rosada, pela intensa atividade. Um soluço, vindo das entranhas, invadiu seu peito e boca. Ela tentava contê-lo, levando as mãos à boca, no entanto, tomou-a de tal maneira, que seu corpo foi diminuindo-se e fechando contra as pernas, fazendo-a ocupar o chão, no espaço gélido das escadas de saída de emergência. Completamente sozinha, com degraus acima e abaixo da sua pessoa, ela urrou. Um urro de desespero por sentir suas entranhas se despedaçarem. Sua dor era real e, seu coração, ardia em tristeza.
Separadas por uma parede que dividia a escada, do elevador, descia também em desespero, Laura, à procura de Alice. Diferente da sua doce e leve Alice, que sofria por decepção, o sentimento que tomava todo o ser da Laura, era de culpa e raiva. Há tanto desejou encontrar alguém que fizesse diferença em sua vida, não apenas no desejo, mas no espírito, e, quando encontra, age irracionalmente e põe tudo a perder. Ao chegar na recepção, certa de que a encontraria, ao menos no estacionamento, não a viu . Perguntou a todos quanto pode encontrar, e ninguém sabia do paradeiro de Alice. Foi então, até a sala disponibilizada dias atrás, e nem o cheiro do ambiente tinha a presença dela. Laura sentiu um vazio a preencher as entranhas. Nada mais fazia sentido. Tudo que olhava, lhe trazia rancor e raiva. A decoração de sua empresa a irritara. O som do seu salto, tocar o chão, despertou dentro de si, fúria e ranço. Teve raiva de si e, a vergonha lhe fez companhia. Após sua busca, sem sucesso, retornou para sua sala, decidida a desmarcar todos seus compromissos e procurar por Alice, no entanto, quando lá chegou, Tati ainda habitava o mesmo espaço. Enfureceu-se por isso. Vê-la mais uma vez à sua frente, não lhe despertou desejos, e sim raiva e furor. Tentou ter uma conversa onde iria mostrar seu controle e impiedade, mas o que encontrou, foi uma conversa franca, com muitas verdades que, por muito tempo, ela fingiu não ver. Tatiane tocou-lhe todas as feridas possíveis, explanando de forma clara seu fracasso, disfarçado de imponência e arrogância. Uma conversa necessária para abrir-lhe os olhos. Percebeu que, mais machucou, do que foi machucada e ainda, recebeu a receita para poupar-lhe de mais sofrimento: mudança de hábitos.
À medida que a conversa acontecia, Alice, já exausta de desaguar todo seu sentimento, decidiu ausentar-se por completo. Foi embora para sua casa, arrumar as malas para viajar à serviço para Maceió. Tomada pelo ressentimento e em busca de vingar-se, acreditando ser possível mascarar o que sentia, enquanto escolhia as roupas para levar na mala, mandou mensagem para Bia e assim retomaram as conversas.
Ainda na empresa e após Tati ir embora, Laura não conseguiu vencer seu vício, e entregou-se à algumas doses de whisky puro, com o intuito de se maltratar pelo que fizera e anestesiar os sentimentos. Só parou de beber, quando Tom, invadiu sua sala subitamente e, bastante assustado a avisou que teriam uma reunião emergencial com três dos principais investidores da sua empresa de maior valor de mercado. Levemente alcoolizada, Laura seguiu Tom até a sala de reuniões.
Fim do capítulo
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kasvattaja Forty-Nine
Em: 01/07/2022
Olá! Tudo bem?
Autora, que drama... Para que?
Sinceramente, a sua história estava muito interessante, e mesmo achando que esse momento chegaria, continuei a ler e a acompanhar o envolvimento de Laura e Alice, novamente, mesmo sabendo que esse momento clichê chegaria. Contudo, depois desse capítulo, vou dar um tempo na sua história e tentar voltar mais para frente. Quem sabe?
Decepcionante esse momento, perdoe-me a sinceridade.
Você escreve bem e estava até bem encadeado todo o drama, mas ficarei em stand by...
Agora, Bia? É sério?
Torço por você, fique certa disso...
É isso!
Post Scriptum:
''Quem não compreende um olhar, tampouco entenderá uma longa explicação. ''
Provérbio Árabe
Resposta do autor:
Olá! Obrigada por vir até aqui.
A leitura é livre. É uma pena que não continuará (talvez) a ler. Quanto ao drama,sim, teve o porque de nesse momento ter drama e, sinto lhe dizer, se continuar a ler, terá ainda mais drama rsrs romance sem drama é comédia romântica, e esse gênero eu ainda não me sinto apta à escrever rsrs. No entanto o que posso te falar é que em meio ao drama, terá romance e muito envolvimento.
De qualquer modo, obrigada pela sua contribuição.
Abraços da Laura e da Alice.
Resposta do autor:
Olá! Obrigada por vir até aqui.
A leitura é livre. É uma pena que não continuará (talvez) a ler. Quanto ao drama,sim, teve o porque de nesse momento ter drama e, sinto lhe dizer, se continuar a ler, terá ainda mais drama rsrs romance sem drama é comédia romântica, e esse gênero eu ainda não me sinto apta à escrever rsrs. No entanto o que posso te falar é que em meio ao drama, terá romance e muito envolvimento.
De qualquer modo, obrigada pela sua contribuição.
Abraços da Laura e da Alice.
mtereza
Em: 09/04/2022
A Alice é meio masoquista só pode ser está sofrendo e vai procurar mais sofrimento ainda sinceramente não entendi essa de Bia e a Laura com certeza precisa de terapia urgente para começar a superar os muitos traumas se amar para poder ter uma relação sadia com a Alice.
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Rafaela L
Em: 30/03/2022
Entendo a Alice.Mas,logo Biaaaa? Arghh
Realmente a mágoa n a deixou racionar.Levamdo-se em conta que a Bia tem pacto com Joseph.
Ahhh, falando nesse ser.Eu passei a achar que ele é irmão da Laura!
Posso tá viajando,mas em minhas teorias fazem sentido.Até uma certa parte.Porquê daí lembro que ele a quer como mulher.Por essa razão,tenho minhas dúvidas de tá errada.A menos,que ele não saiba.
Repetindo: logo a Biaaa AFFFFFFFER vou pra o próximo capítulo c medinho
Beijos,autora perversa. Rsrs
Resposta do autor:
huahuahuahuahua minha parte preferida na história são os comentários! Me divirto!! Amei meu novo apelido hauhauhauhauhauhauha beijinhos
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