Décimo oitavo
Lana olhou para os corpos adormecidos do casal em sua cama, sorrindo por um momento, sentindo-se melancólica. Vestiu uma camisa e colocou a calcinha, saindo do quarto com cuidado para não as acordar. Fevereiro já tinha levado a neve embora, e o calor sutil da primavera anunciava a proximidade do verão. Ela caminhou pelo corredor até o quarto próximo as escadas, entrando e acendendo a luz, a mera esperança de encontrar Daphne ali dormindo ainda ardia em seu peito, mas só encontrou o quarto vazio com os pertences restantes organizados e limpos. Foi até a prateleira com seus troféus do último ano, pegando uma das medalhas e movendo o dedo pelas pequenas letras no ouro.
—Espero que tenha conseguido muitas dessa, querida... — Sussurrou, guardando no lugar.
Kristin ligava uma vez por semana desde o último mês para falar como Daphne estava, mas a garota se recusava a falar com ela. Lana desconfiava de que Kristin tinha feito a pior imagem dela durante os 4 meses que tinha ido embora, e por isso a garota não queria falar com ela. Discutiu todas as vezes com Kristin, mas ela somente desligava o telefone e só ligava na semana seguinte. Sabia que tinham se mudado, porque Madson tinha voltado a Nova York no mês anterior e tentado encontra-las na antiga casa, mas outra família morava lá agora.
Saiu do quarto e desceu as escadas, indo até a cozinha e fazendo um pequeno lanche, levando para a sala e ligando a tv. Mudou de canal até encontrar um documentário sobre as tartarugas, comendo o sanduiche sem pressa. Não sabia que horas eram, mas acabou dormindo ali após algum tempo.
Pela manhã, Laura e Iori a encontraram no mesmo lugar, ainda a dormir, e trocaram um olhar preocupado. Iori a levou para a cozinha para não a acordarem, ainda mantendo os olhos nela no sofá.
—Isso não está certo. — Ela foi a primeira a sussurrar. — Já faz três dias. Ela não pode continuar com insônia.
—Eu sei. Vamos ter que insistir mais um pouco para fazê-la falar. É uma droga não poder fazer nada mais direto, me mata ter que assistir ela dessa forma. Mas ela precisa querer nos falar.
—Eu sei. Estou ficando maluca, mas sei que temos que respeitar o tempo dela, mesmo que esteja demorando demais.
—Vamos fazer o café. Vai animá-la um pouco e manter nossa cabeça ocupada.
Iori assentiu, ajudando-a a preparar waffles, bacon e ovos mexidos, cortando algumas frutas e fazendo três porções. Levaram em duas bandejas para a sala, colocando sobre a mesinha de centro, sentando-se no chão ao lado do sofá. Iori tocou a mão de Lana e acariciou enquanto Laura retirava os cabelos do seu rosto, beijando sua bochecha e o canto dos seus lábios.
—Oh... — Lana esfregou os olhos, olhando ao redor ainda deitada. — Eu dormi aqui de novo e nem percebi.
—Ao menos conseguiu dormir um pouco. — Iori sorriu por um momento, acariciando sua perna.
—Acho que sim. Vocês cheiram tão bem e já fizeram o café enquanto estou um desastre aqui.
—Desastre? Claro que não. — Laura manteve os olhos nela, ainda a mover os dedos em seus cabelos. — Você só acordou, não é como se não estivéssemos acostumadas ou se fôssemos te amar menos, pelo contrário.
—Estamos aqui para todos os momentos. — Iori sorriu para ela. — Está com fome?
—Não, mas vocês deviam comer, tudo parece ótimo. — Lana continuou deitada, olhando sem ânimo para as bandejas.
—Coma um pouco ao menos, vai te fazer bem. — Laura insistiu. — Fiz o café do jeito que gosta.
—Eu posso comer algo depois.
—Mas então não estaria tudo quente e fresquinho. Tente comer um pouco.
—Eu até achei o mel que você gosta. — Iori pegou o pequeno pote de vidro que tinha um bico todo enfeitado. — Vê? Um pouco de doce para adoçar sua manhã.
—Está bem. — Ela suspirou, movendo-se para sentar no sofá, esticando os braços sobre a cabeça para se alongar, só então deslizando pela beira do sofá até sentar no chão entre elas. — Se vocês insistem.
—É para o seu bem. — Laura pegou a caneca de café, servindo as xícaras. — Não te fará bem pular uma refeição.
—Eu sei, eu sei.
—O que ela quis dizer é que não fará bem ao nosso ego se você recusar nossa comida. — Iori falou em tom mais relaxado, beijando sua bochecha. — Queremos você bem disposta.
—Eu pude perceber ontem à noite.
—O que? Achei que tivéssemos te entretido o suficiente. — Laura pousou a mão em sua coxa, acariciando.
—E me mantiveram entretida. — Ela enlaçou seus dedos, levando-os aos lábios e beijando.
—Mas você não tem estado com a cabeça centrada em nossa cama nos últimos dias. Parece distante.
—Desculpa. Eu sei que preferem quando estou inteira ali, eu só não me sinto bem ultimamente, mas prometo que compenso da próxima.
—Você não precisa fazer isso. Você não precisa ir para a cama conosco porque queremos e se não está com a cabeça para isso.
—Desculpa por isso. Eu só achei que podia ter vocês duas ali se divertindo, e que eu pudesse dar isso a vocês. Achei que tivessem gostado.
—E gostamos, ao menos, eu gostei. — Iori segurou seu queixo e virou seu rosto para si para olhar em seus olhos azuis. — Você estava lá querendo nos dar prazer.
—Sim, eu estava.
—Mas uma parte sua não estava. O que está acontecendo, meu amor? Sei que tem algo te incomodando nos últimos dias. É algo sobre nós?
—Não, claro que não. Vocês têm estado aqui nos últimos tempos, eu não me sinto tão sozinha aqui e me deixa contente em ver ambas confortáveis na casa. — Ela suspirou, pegando a xicara de café e dando um gole, pausando para comer um pedaço de waffle com mel quando Laura levou até sua boca, saboreando sem pressa.
—Então o que há?
—Você pode falar qualquer coisa para nós, mi cariño, só assim podemos te ajudar a estar bem. — Laura voltou a levar o waffle na sua boca, beijando sua têmpora com maior afeição. — Estamos aqui para todos os momentos, lembra?
—Eu não sei como falar isso para vocês. — Ela falou enquanto mastigava, suspirando e voltando a tomar o café, esperando que elas continuassem a comer também, ainda que se mantivessem fixas na tarefa de a alimentar.
—Você só precisa começar. — Iori a incentivou.
—É uma longa história. — Argumentou. — E não uma feliz.
—Mas se é sua história, queremos ouvir.
—Se quiser falar. — Laura pontuou. — Estaremos aqui da mesma forma.
Ela assentiu, movendo a cabeça para concordar, preferindo continuar a comer, saboreando o que tinham preparado ainda que continuasse sem fome e sentisse seu estômago fechado, mas se forçou a comer somente para se manter ocupada enquanto pensava no que fazer. Quando terminou de comer, no entanto, se embalou no corpo de Laura, envolvendo sua cintura, pressionando o rosto em seu peito, as memórias se forçando a voltar em sua mente. As lágrimas vieram sem alerta, a dor de suas antigas vivências buscando seu caminho para fora.
Laura não hesitou em a abraçar de volta, apertando-a contra si e deixando que chorasse sem falar nada. Iori ficou parada por um longo momento, surpresa com o momento abrupto, sem saber o que fazer, assustada por nunca a ter visto tão frágil. Tocou suas costas ainda hesitante, buscando pelos olhos de Laura em busca do que fazer, ela somente assentiu, apoiando o queixo no topo da cabeça de Lana. Iori se aproximou mais, deslizando a mão pela sua cintura e pressionando em seu abdômen, sabendo que podia se aproximar quando sentiu sua mão pousar sobre a sua e envolver seus dedos com mais força. Então a abraçou, pressionando o corpo em suas costas e sentindo Laura pressionar a mão entre seus cabelos.
Ficaram ali pelos próximos minutos, tentando confortar e apoiar Lana enquanto ela se permitia desabar na frente delas, chorando e fungando, incapaz de olhar para nenhuma delas ou deixar que a olhassem. Limpou o rosto na barra da camisa até Iori alcançar um guardanapo, oferecendo a ela, deixando que limpasse as lágrimas e assoasse o nariz.
—Você quer beber algo? — Laura a indagou mais baixo, observando seu rosto e seus olhos vermelhos.
—É muito cedo para vodka? — Ela olhou em seus olhos, sem conseguir manter o humor que quis mostrar.
—Você pode ter o que quiser.
—Uma dose então?
—Claro. Eu te acompanho.
—Eu também. — Iori voltou a abraçar Lana pelas costas, beijando seu ombro enquanto Laura se levantava para buscar a garrafa.
—Desculpa por isso. — Lana suspirou, mas Iori somente a abraçou mais forte, incapaz de a soltar. — Eu só... não pude mais segurar.
—Não peça desculpa. Todos choramos de vez em quando.
—Sim, mas... — Ela relaxou em seus braços, deixando a cabeça cair para trás e apoiando em seu ombro. — Eu não achei que fosse ficar assim por causa dela.
—Vamos continuar aqui se quiser desabafar, meu amor. Estou realmente preocupada com você.
—Você tem toda a nossa atenção. — Laura voltou, trazendo a garrafa e três copos, entregando dois para ambas e segurando o seu antes de começar a servir.
—Bem... vamos começar pela parte fácil. — Lana virou a dose de uma vez, grunhindo enquanto o líquido fervia em sua garganta. — Hoje faz um ano oficialmente que minha mãe morreu. — Ela se moveu para se sentar no sofá, afastando-se de ambas e deixando a cabeça cair para trás outra vez, encarando o teto. — E sim, faz mais de um ano, senão quase dois que estou aqui em Chicago, mas eu não estava lá quando ela morreu.
—O que aconteceu, Lana? — Laura segurou a mão de Iori, impedindo que ela tocasse Lana.
—Ah, ela teve câncer de pulmão. Ela nunca parou de fumar. Eu vim quando soube que ela estava na fase final, mas é claro que nem no leito de morte ela iria querer falar comigo. Ela me odiava tanto. — Ela cruzou os braços, suspirando com frustração, então olhou para ambas, que ficaram em silêncio. — Estou falando demais?
—Não, não. É só... Madson chegou a comentar um pouco sobre sua mãe e uma parte do seu passado em decorrência da sua relação com ela. — Iori falou devagar, hesitando, com medo de sua reação. — Eu não imaginei que sua mãe fosse te recusar perto até mesmo nos últimos dias dela.
—Claro que Madson tinha que abrir a boca. Por que você não me falou nada?
—Porque eu não sabia o que falar. Você nunca quer falar sobre o passado, eu tentei entrar no assunto com você, lembra? Você sempre diz que o passado está melhor no lugar dele.
—Você não iria querer saber se alguém me falasse do seu passado?
—Não me importa o que os outros falam, contanto que você sempre saiba que pode me perguntar o que quer saber. — Ela respirou fundo, apertando a mão de Laura, sentindo-se frustrada. — Eu não quis insistir para não brigar com você, Lana. Achei que me diria quando se sentisse pronta.
—Você não é uma pessoa muito fácil de lidar quando insistimos, mi cariño. Principalmente sobre seu passado. — Laura falou mais calma. — Você sabe que é teimosa, sabe que eu sou cabeça dura, e nós duas temos a cabeça quente. Pode nos culpar por ter cautela?
—Está bem. Vocês têm razão. — Ela cruzou os braços, contrariada. — O que Madson contou, afinal? Assim eu sei o que eu deveria explicar.
—O que nós precisamos saber? — Laura retrucou, sorrindo quando ela a encarou. — É você quem dita as regras, é seu passado, então você escolhe o que gostaria de nos contar.
—Bem... Minha relação com minha mãe nunca foi fácil desde que meu pai morreu quando eu tinha 10 anos. — Ela respirou fundo, revirando os olhos. — Digo, ela disse que ele morreu, mas nunca houve um funeral. Eles eram separados, ele quase não vinha me visitar, deve ter tido outra mulher e outra família e esqueceu de nós, eu nunca me importei em procurar saber.
—Então seu pai pode estar por aí? — Iori perguntou com espanto.
—Provavelmente está, eu não me importo em descobrir se está mesmo ou não, tanto quanto ele não se importa de saber de mim, então... — Ela moveu os ombros, despreocupada.
—E sua mãe? Por que vocês não se davam bem?
—Ah, tantas coisas. Mas principalmente porque em todas as nossas discussões ela dizia que eu era igual ao meu pai, que gostava de a desafiar e a tirar a paciência. Só tínhamos minha carreira na dança em comum para falar depois do segundo casamento dela, já que ela decidiu seguir o novo marido na igreja e seus costumes, então já era impossível falarmos sem ela citar a bíblia para me convencer a seguir a mesma ética. Eu tentei. Tentei com meu primeiro namorado até engravidar e minha mãe me levar até uma clínica de aborto quando eu tinha 15 anos.
—Você engravidou com 15? — Iori indagou com surpresa, a perplexidade estampada na sua cara. — Eu nunca imaginaria isso.
—Faz tanto tempo que parece que foi em outra vida. Eu nem penso nisso mais. Digo, depois que Kris levou Daphne julguei que fosse uma punição divina por causa do aborto, mas acho que Deus não seria tão cruel.
—Claro que não. — Laura assegurou. — Foi um descuido seu a gravidez. Você era muito jovem para ter o maior senso de responsabilidade.
—Isso ou minha vontade de contradizer minha mãe. Ela não queria que eu namorasse. Eu não fui uma boa filha, não se deixem enganar. Eu sempre buscava formas de provocar minha mãe e ela sempre tentava me corrigir.
—Não é difícil imaginar você sendo uma adolescente revoltada. — Laura falou com maior descontração, Lana somente sorriu para isso.
—Sim, você pode colocar dessa forma. Minha mãe preferia os novos filhos de qualquer forma. Eu não a culpo, os garotos eram maravilhosos. Seguiam suas regras e não eram filhos do meu pai.
—Então você tem irmãos. — Iori afirmou.
—Meios-irmãos. Eu os encontrei novamente quando vim a Chicago, mas éramos desconhecidos. Eles eram crianças quando sai de casa com Kristin. Aí minha mãe cortou nossos laços de uma vez, eu não ajudei também, fiz tanta coisa para ela não confiar em mim, que depois do acidente de carro já não tínhamos nada em comum.
—Como aconteceu esse acidente? Digo... — Laura moveu a mão pelo braço em desconforto. — Você disse que estava a caminho de uma audição quando o acidente ocorreu.
—Ah... Estávamos discutindo, eu tinha cheirado uma carreira porque estava nervosa com o teste, devo ter ficado alterada demais, minha mãe acabou se distraindo nos sinais e um caminhão bateu do meu lado. Não foi um acidente realmente grave. Eu estava acordada o tempo todo. — Ela encarou a própria perna, movendo os dedos pela cicatriz com alguma melancolia. — Os garotos que desmaiaram com o impacto, mas nada aconteceu com eles. Estavam seguros no banco detrás, minha mãe sempre foi cuidadosa.
—Oh... — Iori franziu o cenho, sem esconder seu desgosto. — Você se drogava? Usava coca Lana?
—Coca foram duas vezes, mas maconha e cigarro foram mais vezes. — Ela se encolheu momentaneamente diante da acusação nos olhos cinzentos. — Eu não uso mais. Não desde que Daphne achou maconha nas minhas coisas, então parei de vez.
—Até Kris a levar embora. — Laura observou. — Eu já usei maconha durante várias festas na faculdade, reconheço o cheiro. E já o senti em você duas vezes desde que Daphne foi embora.
—O que? — Iori olhou entre ambas com espanto.
—Eu não falei nada porque nunca mais senti desde aquele dia que encontramos Helena.
—Porque eu nunca mais usei. Só o cigarro. — Lana se justificou em busca de afastar sua desconfiança.
—Vocês duas combinaram de tentar me enlouquecer? — Iori ainda estava inconformada no lugar. — Eu já pedi a Laura para largar essas coisas há anos, você vai me fazer pedir isso a você também?
—E por pedir você entende como ela vai te atormentar até você entrar num grupo de viciados em drogas e vai farejar todas as suas roupas. — Laura falou em tom humorado, mas Iori a encarou com raiva da mesma forma. — Você sabe que fez isso. E eu não acho que seja o caso de Lana. É só ela jogar o maço fora e fica tudo bem.
—Como sabe do maço? — Lana ergueu a sobrancelha.
—Eu te vi fumando no começo da semana, talvez tenha acendido um para lembrar a sensação.
—Mas que droga Laura! — Iori a bateu no ombro. — Você quer voltar a fumar numa altura dessa?
—Não comece o drama, foi uma vez, e eu não pretendo voltar a isso.
—Ei, ei, parem vocês duas antes que isso se torne uma guerra. — Lana se levantou e caminhou até sua bolsa ao lado da porta de entrada, procurando pelo maço e voltando para a sala, entregando para Iori. — Se é esse o problema está resolvido. Eu não compro mais. Não sou viciada e não vou reviver o vício de ninguém. Desculpa, Laura. — Ela sentou na beira do sofá, estendendo a mão para tocar seu rosto. — Eu não teria comprado se soubesse que vocês tinham problema com isso.
—Não é sua culpa. Você não tinha como saber. — Laura segurou sua mão e beijou seus dedos. — Mas dado o histórico de sua mãe, é melhor você não arriscar também. É difícil se livrar disso depois.
—Eu sei, foi só uma coisa temporária, me ajudou a ficar mais calma por alguns dias. Mas não usarei mais, vocês têm minha palavra.
—Obrigada. — Iori falou com sinceridade. — Significa muito para mim.
—Eu percebi, achei que fosse pular no meu pescoço quando falei drogas. — Ela sorriu, fazendo Laura rir.
—Você sabe que adoro demais seu pescoço, então definitivamente pularia nele, mas com outras intenções. — Iori sorriu, então indicou o maço que ainda segurava. — Isso é sério, e eu não quero nenhuma de vocês com vícios. Quero vocês saudáveis.
—É, a família dela é bastante fechada em relação a isso. — Laura olhou para Iori, que a encarou de volta. — Você sabe que é verdade, você sempre foi certinha demais. Até hoje implica com minha moto.
—Porque é perigosa. E qual o sentido dela agora, de qualquer forma? Somos em três. Como vai usar sua moto agora?
—Não coloque minha moto no meio disso, estamos perdendo o foco da conversa. — Laura voltou a olhar para Lana, acariciando sua mão. — Há algo mais que queira nos contar, mi cariño?
—Sobre minha mãe? Não. Digo... não há muito o que contar. Ela me cortou de tudo depois que ajudei Kris com Daphne. — Ela suspirou, desviando o olhar para o chão. — Ela nunca gostou de Kris, só colocou um fim definitivo em nosso vínculo depois do acidente. Eu fodi com tudo também. Minha carreira, nossa relação. Não havia mais nada a conversarmos sobre tudo no fim. Eu tive minha vida, ela teve a dela, e nenhuma fez parte disso.
—Não seja dura consigo mesma. — Iori estreitou os olhos. — Você pode ter feito todas as besteiras na vida, pode a ter magoado de verdade, mas ela era sua mãe. Nada muda isso. Ela podia ao menos ter dado uma chance de vocês se reconciliarem.
—Não. Ela já tinha encerrado tudo em relação a mim. A herança, o contato. Ela nunca me deixaria chegar perto dos filhos dela.
—Então em todos esses anos vocês nunca se falaram? — Laura perguntou, estreitando os olhos.
—Eu tentei uma vez. Achei que ela ficaria feliz quando soubesse que casei, mas claro, foi com uma mulher, então não é difícil imaginar o resultado.
—Mas você queria ter voltado a falar com ela?
—Não sei, talvez sim. Ela era minha mãe, afinal. Tinha esperanças de que ainda teria uma chance de ter algo bom no fim. Mas como eu disse, eu não a culpo, após tantos anos de terapia eu sei que ajudei a terminar dessa forma.
—Você começou a terapia por causa da sua relação com sua mãe?
—Não diretamente. Eu desenvolvi alguns problemas depois do acidente, ainda tenho questões a tratar, então toda semana faço uma chamada para meu terapeuta, mantendo o ritmo para frente. — Ela se recostou no sofá, balançando os ombros. — Estresse pós-traumático, depressão. Mas estou melhor.
—Oh, você continua em tratamento?
—Sim. Digo, voltei. Eu tinha parado quando me mudei para Chicago. Agora achei melhor voltar, depois de uma recaída, mas tem sido bom. Voltei aos trilhos certos.
—Que recaída, querida? — Iori perguntou sem esconder a preocupação.
—Ah, nada grande. Você não precisa se preocupar. — Ela suspirou, incomodada, cruzando os braços e desviando o olhar.
—Lana... nós percebemos. — Laura falou com cautela. — As marcas no braço.
—Não tínhamos notado até Madson dizer. — Iori tocou sua perna quando ela a olhou com maior irritação. — Meu amor... ela não falou por mal. Também ficou preocupada com você depois do acidente.
—Isso não a dá o direito de falar essas coisas de mim. — Falou com mágoa. — Ela não tem qualquer direito. É minha história, não a dela.
—Ei, eu sei, eu sei. Ela só julgou que eu já soubesse. — Iori se levantou e sentou em seu colo, segurando seu rosto em mãos. — Ela só queria ter certeza de que eu continuaria cuidando de você.
—Eu sempre me cuidei sozinha.
—Então não faz mal se eu também cuidar, não é?
—Sasaki... — Lana abriu a boca para protestar, mas parou diante da afeição que encontrou nos olhos cinzentos. Suspirou, movendo as mãos por baixo de sua camisa, sentindo sua pele quente nas costas enquanto deslizava com suavidade. — Não, não faz mal.
—Vê? Ninguém sai perdendo nisso. Eu vou sempre cuidar de você. — Iori beijou seus lábios, acariciando suas bochechas. — Eu amo você, não importa o que aconteça. Então não precisa ter medo de contar qualquer coisa para mim, está bem? Nós lidaremos com isso, juntas.
—Você não está sozinha aqui mais. — Laura sentou ao lado delas, inclinando a cabeça ao apoiar na mão.
—Parem com isso, vocês vão me fazer chorar de novo. — Lana sorriu, ainda que seus olhos lacrimejassem.
—Se for por algo bom, continuarei a falar. — Iori sorriu, voltando a beijar seus lábios enquanto ela deixava a cabeça cair para trás. — Eu amo você. — Repetiu, sentindo-se aliviada, sentindo as mãos dela pressionarem em suas costas, mantendo-a perto. — Eu sei que não gosta de falar, mas ao menos escute, porque não deixarei de dizer.
—Eu sei, meu amor. — Lana deixou uma lágrima cair de ambos os olhos, ainda a mirar a cor cinzenta que a miravam com ternura e paixão, apreciando seu zelo mesmo que a deixasse ver seus medos, seus erros e as suas partes mais profundas.
—Eu te amo, nada mudará isso.
Lana se inclinou e a beijou, sem conter a vontade ao aprofundar o beijo e a abraçar mais forte contra si, deixando que o gesto falasse por si as palavras que não bastariam para expor o que estava sentindo. Iori apreciou o gesto, deixando-se envolver no beijo enquanto movia a língua sobre a dela, não importando-se com o tempo que ficaram trocando beijos e caricias. Elas sorriram quando se afastaram, Iori selou seus lábios antes de sentar ao seu lado, segurando uma de suas mãos. Lana virou o rosto para olhar Laura, que sorriu, segurando sua outra mão.
—Como se sente agora? — Laura a questionou, mantendo a atenção em ambas.
—Mais leve. — Ela sorriu. — É bom que saibam isso tudo agora.
—Obrigada por nos confiar isso. Eu realmente aprecio seu gesto.
—Você quer fazer alguma coisa hoje? — Iori perguntou. — Em relação a sua mãe, eu não sei. Ou só ficar em casa?
—Podemos dar uma volta no parque aqui em frente, não deve ter muita gente hoje. — Lana sugeriu, mas Laura estreitou os olhos.
—Qual o problema se tiver? — Indagou em tom leve. — Está com vergonha de nós, senhorita?
—Eu? Não, não. Vocês sabem que não tenho qualquer problema com isso. São vocês que tem uma história a zelar antes de mim até falarem com quem conhecem sobre nós.
—Te damos a impressão de que evitamos o público por causa disso? — Iori questionou, atraindo sua atenção.
—E não? Ficamos mais em casa ou buscando novos restaurantes. — Ela riu, sem se preocupar. — Mas eu entendo. É um assunto difícil, então não me incomodo em ser apresentada como amiga de vocês para seus amigos, ou seus eternos primos. — Ela sorriu para Iori. — Eu sei me comportar em público, viram que sou uma amante discreta.
—Ei, não diga isso.
—Relaxa, só estou brincando com vocês. — Ela se inclinou para beijar seus lábios, levantando-se e se virando para Laura, apoiando-se nos seus ombros para selar seus lábios também. — Eu vou tomar um banho e volto em breve. O café da manhã estava ótimo como sempre.
Laura ofereceu um pequeno sorriso antes de a ver se afastar, acompanhando seus passos em direção a escada, suspirando quando ela já não estava ao seu alcance, voltando a mirar a mulher ao lado.
—Eu não gosto disso.
—Do que?
—Querida, nunca escondemos que estávamos juntas, nossas famílias sabendo ou não. Então não deveríamos fazer Lana passar por isso.
—Conhecemos gente demais, sabe que não é tão simples. — Ela suspirou ao se levantar, pegando uma das bandejas e levando para a cozinha.
—Não importa que não seja simples. Ela é nossa namorada, Iori, mas as vezes parece que continuamos tratando-a como uma pessoa a parte de nossa relação. — Laura a seguiu, levando a outra bandeja. — Ela merece mais que isso.
—Lana merece tudo, querida, eu sei disso, você não precisa me lembrar.
—Então por que esperar?
Iori suspirou, abrindo a lavadora e começando a colocar a louça, olhando a expectativa nos olhos da companheira.
—Por que a pressa? Nem ela está nos apressando em relação a isso.
—Porque colocamos isso de condição para morarmos aqui com ela. Falar com nossas famílias.
—Eu não quero fazer isso agora, Laura. Pode me chamar de covarde, mas eu não quero dar satisfação para a minha família.
—Eu sei que eles são difíceis e não vão entender no começo, mas ao menos eles saberão. Odeio esconder Lana quando estamos em público. Me mata não poder dizer que estamos com ela.
—Você acha que não sinto o mesmo? Laura... Eu não quero dar qualquer abertura para ela se afastar e cair nas garras de Madson ou qualquer outra pessoa. E eu sei que teremos que contar para todos sobre isso, mas já foi difícil demais quando éramos somente nós duas. Por que acha que não nos convidam para o natal?
—Eu sei que é difícil para você. Mas eles vão acabar sabendo. Não é melhor que anunciemos isso de uma vez para ficarmos livres?
—Talvez você tenha razão. — Ela se aproximou dela, prendendo os dedos na sua nuca. — Mas isso pode esperar. Podemos passar mais tempo aqui, o que acha? Vir durante a semana, voltar aos finais de semana para pegar a correspondência e checar a casa. Não recebemos visitas lá durante a semana de qualquer forma.
—Podemos tentar assim, mas não por muito tempo. Eu quero que minha mãe a conheça. Então vou começar a preparar meus irmãos e ela para a notícia. Tudo bem? Você devia fazer o mesmo.
—Você é mais corajosa que eu. — Iori constatou com pesar.
—Você está certa sobre não dar satisfação a sua família. Você é adulta, tem seu trabalho, paga suas contas. E nunca fez nada fora da lei. Você só trouxe orgulho a sua família. — Laura acariciou seu rosto, beijando sua testa. — Eu também tenho orgulho de você. Você decidindo contar a eles ou não, demorando mais tempo ou não, eu vou continuar me orgulhando de você, porque você sempre me protegeu quando tentaram me atacar. E sei que você sempre vai proteger Lana disso também. Então sem pressão, mas tente pensar um pouco mais sobre isso.
Iori a beijou, contente com suas palavras, feliz com sua iniciativa. Ficaram assim por alguns instantes, sorrindo ao fim.
—Eu vou ver Lana e já volto. — Laura anunciou com um sorriso de lado.
—Sua tarada.
—Não pode me culpar, eu adoro olhar para ela. Você pode vir também.
—Não, pode ir, eu vou limpar as coisas aqui. Mas se demorarem eu vou.
Laura riu antes de se afastar e subiu as escadas.
Fim do capítulo
Olá pessoal!
Queria prestar alguns esclarecimentos.
1- Sobre o capítulo anterior, esqueci de separar as cenas com sexo, mas como estava junto da cena em si, não vi porque tirar kkkk como ninguém falou nada, devo manter sem avisos?
2- A Alex mencionada no capítulo anterior não sou eu kkkk Eu uso o nome Alex Mills porque é um pseudônimo, então a amiga da Lana não tem nada a ver. Quando eu fiz a Alex da história eu nem ponderava sobre postar a história em algum lugar, pelo contrário.
3- Eu organizei os capítulos, ao todo serão 45 capítulos. Eu sei que é grande, parece uma novela, e eu podia escrever mais duas histórias em cima dessa kkkk antes dessa história e o depois, quem sabe? Mas se alguém não tem interesse em ler história grande, eu compreendo, mas agora estão todos cientes :D Garanto que vale a pena acompanhar a trajetória desse poli amor :)
4- O próximo capítulo contém menções de suicídio e mutilação. Se tem alguma intolerância ao assunto, basta pular para o próximo. Se desejar um resumo do que houve no capítulo basta me enviar mensagem :)
5- Quem quiser conhecer minhas outras histórias, basta acessar meu perfil aqui no Lettera ou nos outros sites :D ajudem a repassar!
Obrigada por todo o apoio e por quem chegou até aqui! Contem-me o que acharam dessa primeira parte do passado da Lana!
Até domingo ;D
Comentar este capítulo:
Dolly Loca
Em: 06/05/2021
Acho as cenas de sexo bem contextualizadas, são muito bem escritas e não ficam massantes. Gosto da forma como você mescla as ações e os sentimentos que as envolvem.
Kristin certamentente está envenenando Daph, mas acredito que o sentimento dela pela Lana seja mais forte.
Parabéns pela história!
Bjos
Resposta do autor:
Olá Dolly!
Que bom que acha isso, me faz perder o medo de postar as cenas de sexo :D
Kristin é uma caixinha de surpresas, será que a Lana vai conseguir chegar até a Daphne?
Obrigada! É muito bom saber que a história está sendo bem recebida. :D
Abraços!
Flavia Rocha
Em: 06/05/2021
Olá, autora.
Com relação as cenas de sexo na sua história. Eu lembro que em algumas notas suas você tocou no assunto querendo saber nossa opinião. Agora, nesta nota, também.
Quero dizer que, para mim, as suas cenas estão boas, as cenas de sexo estão combinando com a história, não estão atrapalhando o desenvolvimento da história, são como consequências do desenrolar da história, ta normal. E eu adoro essas cenas.
Mas também, eu sou uma pessoa que se irrita e para de ler histórias quando as cenas de sexo atrapalham o desenvolvimento da história. E esse, definitivamente, não é o caso da sua.
Sobre o capitulo de hoje, eu acho que a Kristin está mentindo sobre a menina não querer falar com a Lana.
Mas essa Kristin é tão ingrata, minha nossa.
boa semana, autora.
Resposta do autor:
Olá Flávia!
Fico feliz em saber sua opinião sobre as cenas de sexo! Eu também fico com receio de não ser pertinente na história, então estou sempre averiguando porque sei de muitas situações que isso realmente incomoda no sentido de ser exaustivo kkkk
Essa Kristin realmente, né? O que será que se passa na cabeça dela?
Obrigada! Boa semana para você também!
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