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EM BUSCA DO TAO por Solitudine

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Palavras: 21820
Acessos: 10491   |  Postado em: 27/04/2021

Notas iniciais:

Tradução: O que o seu coração deseja?

Este capítulo, que é o penúltimo do conto, certamente é o meu preferido. Chorei muito quando o escrevi, mas de emoção. E coloquei tanto de mim nele como vocês provavelmente nunca saberão. Espero que gostem!

ALBIK 3AYEZ EIH?

 

CAPÍTULO 192 – Planos para o Futuro

 

Janeiro despontava em seu primeiro dia. Raed e Amina preparavam milho na brasa enquanto conversavam com parentes e convidados, os quais aguardavam sentados em cadeiras colocadas no quintal.

 

--E ocês, minha genti, tão gostandu das festa na roça? -- Amina perguntou interessada -- Prepara us buchu qui quandu é fé vem mio na brasa! -- sorria prestando atenção nos milhos

 

--Eu adoro vir aqui, tia! -- Rebeca respondeu de pronto -- Desde que botei os pés na sua casa pela primeira vez, adorei esse lugar e as pessoas todas! -- sorria -- E simplesmente amei passar final de ano aqui!

 

--Eu só posso lhes ser grata pelo convite de passar as festas com essa família! -- Judite falava com sinceridade -- Também deixo claro que meu marido e eu fazemos muito gosto do namoro de nossa filha com Hassan! -- olhou sorridente para Georgina

 

--Eu também façu, num sabi? -- Georgina concordou

 

--E eu agradeço a costumeira acolhida do mesmo jeito que minha esposa fez! -- Benjamin balançava a cabeça positivamente -- Gosto muito de Hassan, que é menino sério, respeitador, e gostei muito dessa família! -- sorriu -- É a prova de que em Terra de Santa Cruz, os filhos de Dar-ulharb e de Cedro podem viver em paz sem problema nenhum! -- lembrava as distintas origens das famílias

 

--É issu mêis! Aqui num tem mutivu di nóis num si gostá! -- Raed concordou -- Mais eu queru sabê dessis mininu o que ocês pensa agora qui é o úrtimu anu di istudu nas Iscola Técnica, num sabi? -- olhou para os jovens

 

--Conta, meu fio, aquilu qui mi ixplicô! -- Georgina pediu orgulhosa

 

Hassan e Rebeca se entreolharam sorridentes. O rapaz então começou a falar: -- Esse ano nós vamos estagiar de dia e estudar de noite. Aí, nesse meio tempo, vamos estudando pra passar no exame pra faculdade da Capital e torcer pra tudo dar certo! -- olhava para os avós

 

--Eu vou tentar psiquiatria e Hassan psicologia! -- Rebeca continuou contando os planos -- E se a gente passar no exame, se Deus quiser, os dois vamos batalhar vaga no alojamento da Universidade!

 

--E vão cunsigui essis trem tudu aí! Desdi hoji vô cumeçá a rezá e botá todu mundu nessa roça pra rezá também! -- Amina afirmou com decisão -- "E já vô pidí nu centru di Mãe Agda!” -- pensou

 

--Eu já rezu desdi qui Hassan mi falô! -- Georgina respondeu de pronto

 

--Eles vão passar, tenho certeza! -- Benjamin confiava no potencial dos jovens. Sua esposa balançava a cabeça concordando

 

--Vão passá e nóis vai fazê uma festança modi comemorá! -- Raed planejou -- Agora pega us pratu qui us mio tão nu pontu! -- anunciou

 

--Ei, rapaz! -- Janaína deu um soquinho no braço de Ahmed João -- Não fique aí na fossa porque o namoro não deu certo. A vida é assim mesmo! -- tentava reanimá-lo -- Olha, vou te contar minha saga bandida até encontrar Aisha! Já te contei aquela história quando me apaixonei pela sanfoneira da rua 29? -- preparava-se para falar

 

--Ah, não, Janaína, pelo amor de Deus! -- Marco interrompeu -- Não vai encher a cabeça do menino com suas histórias malucas que vai acabar deprimindo o rapaz! -- olhou para a amiga com a cara feia

 

João acabou achando graça. -- Já ôvi muitu causu di Janaína, ya Marco. -- sorria

 

--Mas ela tá certa, garotão! -- Aisha deu força -- Você ainda é muito novo, tem muito chão pela frente e não deve ficar na fossa por causa de namoro que não deu certo! Aquela maluca foi que perdeu! -- cruzou as pernas -- Além do mais é hora de curtir a vida com leveza e cuidar do futuro pra não passar perrengue igual eu passei por ter desperdiçado tempo! -- aconselhou -- Mas veja que depois que engrenei não dei mais rata! Hoje em dia tô até ganhando direitinho no time da admistração do hospital Cedro-Suriyyah!

 

“E graças a isso já não vivo mais contando dinheiro!” -- Janaína pensou aliviada

 

--Eu num tô na fossa, não, só ficu macambuziu di quandu im veiz... -- esfregou as mãos uma na outra -- Mais num discuidei du futuru também. Tô firme e forti nus istudu e mi decidí a fazê agronomia na Universidadi. -- olhou para os demais -- Ocês vão vê! -- prometeu

 

--É isso aí, rapaz! -- Marco deu força -- Pra frente é que se anda!

 

--João! Vem jogá vôli na água! -- Ahmed Marcos corria com a bola na mão -- Uhu! -- deu uma cambalhota e se jogou no rio

 

--Vem, João! -- Ahmed Lucas imitou o irmão e pulou na água

 

--Ahmed Marcos tá um muito grande, né? -- Marco observou -- Vai ser altão que nem o pai!

 

--Já vai pra treze anos, né? -- Janaína comentou

 

--Aisha, anu qui vem o Marcos podí vivê na sua casa mais nóis? -- perguntou ao se levantar -- Eli qué fazê us cursu di mecânica!

 

--Claro que pode! -- respondeu tranquilamente -- Nossa casa vai receber essa garotada toda!

 

Janaína arregalou os olhos. “Ô, meu Deus, haja despeza...” -- pensou apavorada

 

--Ô, minha genti, vem tomá banhu di riu qui tá bão dimais! -- Ahmed acenava para a família com Yasirah sentada em seus ombros

 

--Povu só qué sabê di cumê, num sabi? -- Nagibe brincava -- Tudu di oio nus mio na brasa! -- mantinha Isabel sentada em seus ombros -- Mais nóis qué água, né, Bebel? -- brincava com a menina

 

--Ô, Chede, ocê qué mi cegá, mininu? -- Cid fingia que ralhava com o sobrinho cobrindo seus olhos -- Senta nus meus ombru pra mi fazê di cabra cega?

 

--Caba cega! -- o menino repetia rindo

 

--Bebel puxa cabelu! -- Yasirah achava graça da outra segurando os cabelos de seu tio

 

--Puxa cabelo! -- a garotinha concordava

 

--Ô, Avi Maria! -- Nagibe se divertia

 

--Essas criança tão crescendu rápidu, né? -- Dora comentou reparando -- Já tão tudu cum dois anu! -- jogou água no próprio cabelo

 

--E pensá qui Ahmed Mateus já feiz seis anu! -- Catiúcia comentou enquanto boiava -- Pareci qui foi onti qui eu tava isperandu eli!

 

--Isperô e eu cheguei! -- o menino respondeu antes de mergulhar

 

--Eu vô fazê novi anu! -- Cidmara anunciou pulando na água -- Daqui uns dia vô istudá nu Gyn!

 

--Oxi, mais óia só pra issu! -- Penha cruzou os braços divertida -- Mal saiu dus cuêru e já qué saí di casa, uai?

 

--Eu só saio de casa pra casar com Khadija! -- Deodoro informou enquanto nadava -- Antes disso, não!

 

--Eu vô tê qui saí antis dissu modi istudá, num sabi? -- a menina explicou ao pequeno amado

 

--E não vai casar comigo? -- perguntou entristecido

 

--Eu vô, uai! E vai tê festança! -- sorria

 

--Oba! -- Deodoro comemorou

 

--E eu possu cum essas criança? -- Dora se divertia

 

--É tão gostoso ver isso, né, camma? -- Zinara admirava a família com o olhar -- A cada ano que passa mais e mais os laços de amor que nos unem se tornam mais estreitos! -- sorriu -- Jayed jedan! (Muito bom!)

 

--Sim, eu percebo isso e fico sempre muito feliz! -- reparava na sobrinha -- Mas tô estranhando que você tá aqui comportada, ao invés de fazer bagunça com as crianças. -- sorriu para ela -- O que quer me dizer? -- perguntou mansamente

 

As duas mulheres estavam sentadas na grama na sombra da maior árvore do quintal.

 

--Nós temos que fazer planos pra poder concretizá-los na hora certa! -- respondeu de pronto -- Pelo que Jamila me disse, a indenização tem tudo pra sair nesse ano de 2019 e consequentemente a fazenda será de fato sua tão logo esse dinheiro pingar na minha conta! -- prometeu -- Sabe que isso muda tudo, não? -- prestava atenção na tia -- E7kili ra2yak fih, min fadlik. (Diga-me o que pensa sobre isso, por favor.) -- pediu

 

--Uai? -- Najla gastou uns segundos calada antes de responder. -- Eu morro de felicidade, de medo, de saudade antecipada, me sinto insegura... Cada sentimento por uma razão. -- brincava com a grama -- Nunca me conformei em perder a fazenda e recuperá-la, depois de tudo que passei, é como receber um prêmio, sabe? -- olhava para o verde em suas mãos -- Mas ao mesmo tempo me acostumei a viver aqui, mesmo sem ter renda própria, e vou morrer de saudade do convívio com Amina, Raed, Georgina, seus irmãos e as crianças. -- pausou brevemente -- Ao mesmo tempo fico pensando em como nos sustentar na fazenda. Deve ter um monte de obras pra fazer ali, temos que voltar a plantar, comprar coisas, nos organizar, de repente até contratar pessoal e depois nos preparar pra receber os refugiados. -- olhou para Zinara -- Não sei se teremos recursos e competência pra garantir tudo isso! -- abaixou os olhos timidamente -- E a você só tenho que agradecer muito!

 

--Al’afw, camma! (Não há porque agradecer, tia!) -- fez um carinho rápido no braço da outra -- E acho que pra todas estas questões o segredo é ir com calma. -- considerou -- Primeiro tem que ver como as coisas estão na fazenda e daí ir usando o dinheiro pra consertar o que for mais emergencial. Planejar o que se quer fazer e em que momento, pra não investir em tudo ao mesmo tempo, e ter paciência. -- falava com delicadeza -- Assim como se deve esperar os resultados de um plantio, da mesma forma se deve esperar os frutos de um investimento. De mais a mais, ya sayyida (a senhora) não estará sozinha. -- sorriu -- Nunca mais estará! We dounia ma teb3idnash. (E a vida não nos manterá afastados.)

 

Olhou para a sobrinha. -- Eu sei que não! Inshallah! (Se Deus quiser!) -- ajeitou-se para se sentar mais de frente para a outra -- Usritina (Nossa família) mudou muito. Isso é nítido demais! -- prestava atenção na astrônoma -- Já não acha que é hora de assumir o que existe entre você e Clarice? -- perguntou com jeito

 

Ficou sem graça com o que ouviu. -- É uma boa pergunta... -- mirou a amada caminhando ao lado da mãe -- Laa acrif... (Eu não sei...) -- pensava na própria situação -- Law tiggy ta2oolha lee 2o9aadi, ma3rafsh sa3at-ha ana ha3mal eih... (Se ela vier e me disser isso, não saberei o que fazer...)

 

--E aí ela ficou com medo de vir, porque até hoje não arrumou emprego. Só um bico aqui e outro ali. -- Leda contava enquanto caminhavam -- Como Getúlio também tá num trabalho semi escravo na tal obra de Araribóia, ele também não poderia vir. Por isso que eu vim sozinha com as crianças.

 

--Já Cecília não veio porque tá super envolvida em ajudar uma moça que conheceu no grupo em que ela trabalha. -- Clarice dizia -- Ainda não sei detalhes, mas da última vez que nos falamos tava o maior rolo. E também umas brigas com Adamastor... -- gesticulou -- Sabe como é minha irmã, faz uma confusão danada explicando as coisas e eu quase não entendo o que acontece!

 

--Vocês são meio tudo doida! -- Leda afirmou de pronto -- Não sei a quem puxaram!

 

--Ah, é! -- achou graça do comentário -- E quando a senhora vem morar em Cidade Restinga, hein? -- queria saber -- Zinara quer lhe mostrar um imóvel pra ver se a senhora gosta!

 

--Menina, tem nem um mês que você foi, calma! -- olhou rapidamente para a filha -- E já disse que no carnaval eu vou lá na sua casa e a gente aproveita pra ver o tal imóvel misterioso que a caipira tanto quer que eu veja!

 

--Tem nada de misterioso... -- passou a mão nos cabelos -- Mas se demorar muito a decidir pode ser tarde demais!

 

--O que tiver de ser, será! -- respondeu despreocupada -- Falando em decidir... -- olhou para a filha -- notei que quase ninguém aqui sabe que você e Zinara tão morando juntas.

 

--Somente dona Amina e dona Najla. -- respondeu de pronto -- Nem Aisha e Janaína sabem.

 

--E quando vocês vão decidir sair desse armário, hein? E os planos pro futuro de vocês duas? -- perguntou diretamente -- Não digo de se assumir no trabalho, mas ao menos junto à família! -- gesticulava -- Suas irmãs sabem, mas os maridos não podem saber! Nem Ritinha e Zezé desconfiam! -- não entendia -- Nunca imaginei que minha gangue fosse tão trouxa a ponto de não se atinar de onde você estaria morando em Cidade Restinga! -- achava incrível -- Adamastor também é outro besta!

 

Clarice ficou sem graça. -- A coisa não é tão simples, mamãe... -- respondeu de cabeça baixa

 

--Acho que já passou da hora de vocês darem nome aos bois, ao menos junto de nossas famílias! Não dá pra passar o resto da vida fazendo esse teatrinho que vocês fazem! -- afirmou resoluta -- E quem não gostar, que coma menos! -- gesticulou de novo -- Deixe que se alguém vier de gracinha, Amina e eu resolvemos a parada! Ah, se vamos! -- esfregou as mãozinhas uma na outra

 

Riu da atitude da idosa. -- Eu não sei, mamãe... -- respirou fundo -- E... não sei se Zinara tá pronta pra isso... -- olhou para a amada -- "E se ela não estiver, não tenho coragem de tomar essa iniciativa por mim mesma...” -- pensou pesarosa

 

***

 

--Eu não aguento mais isso, Cecília! Ultimamente todo dia a gente briga! Todo dia! -- Adamastor reclamava -- E por causa de que? Pela mesma razão de sempre! -- olhava para ela de cara feia -- Porque você se meteu de ajudar uma rapariguinha mãe de gêmeos e me arrumou problema com gente perigosa!

 

--Ela tem nome, não é rapariguinha! -- respondeu de imediato -- E aqueles aliciadores de menores tinham que receber punição, sim! -- retrucou gesticulando -- Agora que a tal da Milu e os outros salafrários da patota dela sumiram, é menos gente sem vergonha pra se aproveitar das moças por aí!

 

--E você e as outra lá daquele grupo de mulher correram foi muito risco! Sabe lá o que gente do tipo daquela Milu podia fazer! -- andava de um lado a outro pelo quarto

 

--O que eles fizeram foi fugir quando a polícia entrou na jogada! -- cruzou os braços -- E Rosa e as outras moças que largaram aquela vida de prostituição precisam de ajuda!

 

--E essa ajuda cabe ao governo! -- retrucou de pronto

 

--Adamastor, entende uma coisa: -- caminhou até ele e o encarou -- eu quero me responsabilizar por Rosa! Tenho planos pra essa menina! Quero ajudá-la a mudar de vida e criar os meninos como se fossem nossos!

 

--Nossos?? -- perguntou indignado -- Eu pensei que a gente ia adotar menino igual a qualquer casal normal! E não uma rapariguinha de 17 anos com dois filhos pra criar!-- falava com mágoa -- Já não bastasse você não poder ter filho, ainda me vem com mais essa!

 

A mulher sentiu-se humilhada com o comentário.

 

--Eu não quero isso pra mim! -- Adamastor abriu o guarda-roupas e começou a juntar algumas peças

 

--Vai embora? -- perguntou magoada -- Tá me forçando a decidir entre ela e você? -- derramou uma lágrima

 

--Vou dormir na casa de minha tia e deixo você pensar! -- pegou a mochila e colocou suas coisas dentro dela

 

--Então pense você, porque minha decisão já tomei! Eu vou ajudar Rosa e seus filhos, mesmo que isso me custe você! -- afirmou resoluta -- Pode deixar que quem vai sair de casa sou eu, porque esse apartamento aqui é seu!

 

Desconsiderou o que ouviu. -- Amanhã ou depois eu volto e conversamos em definitivo! -- saiu sem olhar para trás

 

Cecília fechou os olhos e chorou com muita tristeza.

 

***

 

--Então foi isso, tia... -- Adamastor olhava entristecido para o copo vazio em suas mãos -- Saí de casa pra deixar ela pensar no que fazer.

 

--Mas parece que ela já se decidiu, não foi? -- Ritinha olhava para o sobrinho

 

--Coisa dita sem pensar direito! -- largou o copo e se encostou no recosto da cadeira -- Não tem o menor sentido querer botar em nossa casa uma rapariguinha com seus dois meninos! -- fez um gesto de desprezo

 

--Você já viu os meninos? -- perguntou interessada -- Ao menos conhece a moça? A tal Rosa?

 

--Conheço nenhum e nem quero! -- respondeu de pronto -- Daqui é pouco é carnaval e não quero saber de Cecília botando essa gente lá em casa pra passar o feriado. -- franziu o cenho -- Ideia de jerico!

 

Ritinha e Adamastor conversavam sentados na mesa da sala. Após uns segundos calada, a idosa resolveu rememorar um pouco do passado. -- Sabe, meu filho...? Há muitos anos atrás, quando eu ainda tinha os cabelos escuros e a pele sem rugas, morava com meu ex marido lá em Ponta da Fruta. -- contava -- Apareceu, então, uma senhora que vivia nas ruas e ela tinha filha de uns 10 anos. Eu ajudei as duas por um tempo, mas depois elas sumiram, depois tornaram a voltar... Às vezes elas sumiam por dias, meses a fio, depois voltavam. Numa dessas, quando apareceram, a filha dela já tava moça e grávida.

 

--Mas por que a senhora tá me contando isso? -- o homem não entendia

 

A idosa não respondeu e continuou a contar sua história. -- Ocorre que a moça foi abandonada pela própria mãe por causa daquela gravidez. Podia-se ver o desespero nos olhos dela ao constatar que estava só. Tinha apenas 15 anos.

 

--Aposto que nem sabia quem era o pai... -- julgou

 

--Eu decidi então que ia adotar ela e ajudar na criação do menino. -- mantinha a narrativa -- E foi por isso que meu marido me deixou e foi-se embora.

 

--Oxe! -- surpreendeu-se -- Então foi por isso que a senhora separou?? -- não sabia

 

--Foi difícil no começo, muito difícil, aliás. -- viajava no tempo -- Mas no final a gente se acertou. -- sorriu -- Botei ela pra estudar, pra me ajudar nas tarefa do lar e cuidamos juntas do menino quando ele nasceu.

 

--Mas... E a ingrata nem vem lhe ver, nem o menino dela... Quem foi essa moça que eu nunca vi? -- perguntou sem entender

 

--Sua mãe. -- respondeu de imediato

 

--O que?? -- arregalou os olhos surpreendido

 

--Ela acabou se casando aos 19 anos com um rapaz da nossa vizinhança, que era militar, e vocês logo se mudaram pra Maurítia. -- esclareceu -- Você era muito novinho, por isso não lembra. Depois também eu me mudei e vim morar aqui.

 

O homem estava pasmo.

 

--Foi muito difícil perder meu marido, mas quando eu olho pra você, tão bonito, bem empregado, vejo que fiz a escolha certa e não me arrependo de nada!

 

Adamastor se emocionou ao conhecer uma parte da história de sua vida que lhe era ignorada. -- Mas... maínha nunca me disse que... eu só sabia que ela era órfão...

 

--Talvez o passado a machucasse muito pra que ela quisesse lembrar. -- justificou

 

--E sempre pensei que paínho fosse mesmo...

 

--Valdo? -- interrompeu-o mansamente -- Pai é quem cria! Ele te registrou, te criou... é seu pai, sempre foi.

 

Levantou-se e passou as duas mãos no rosto sem saber o que dizer.

 

--Não se aperreie pelo passado porque ele não vai mudar. -- prestava atenção no sobrinho -- O presente é que deve ser cuidado. -- levantou-se também -- Eu fiz gosto do seu casamento com Cecília porque sabia que uma filha de Leda não podia deixar de ser um bom partido pra você. Vejo que não me enganei. -- colocou uma das mãos no ombro dele -- Agora basta você descobrir isso também ou fazer igual meu ex marido. -- olhava nos olhos -- Fica pra você pensar. -- deixou-o sozinho

 

Adamastor permaneceu calado tentando digerir tudo que acabava de ouvir.

 

***

 

Cátia e Jamila estavam no município de Paraopebinha. O rompimento de uma barragem de rejeitos de minérios administrada pela empresa de Rio Foice foi o maior acidente de trabalho de Terra de Santa Cruz em perda de vidas humanas e o segundo maior desastre industrial do século. As duas seguiram com um grupo de voluntários que se dispôs a ajudar os sobreviventes.

 

--Isso é um absurdo! -- a geofísica dizia revoltada -- Os amantes da privatização falam tanta coisa, mas quando a empresa era estatal, havia manutenção da infraestrutura! -- caminhavam em meio ao lodo -- Existe um claro conflito de interesses entre se priorizar demais os ganhos dos acionistas e atender à população com se deve. Forçosamente a ganância empresarial leva ao sacrifício da segurança e do bem estar das pessoas! -- reclamava -- Aí o que se vê é isso! -- olhou rapidamente para a advogada -- Lembra do acidente da Samico e do que aconteceu em Fabiana?

 

--Com certeza lembro! -- Jamila respondeu de imediato -- É o que sempre digo em minhas palestras: certas coisas não devem ser deixadas ao sabor dos interesses privados. Não combina! -- caminhava com dificuldade -- O dilema da companhia de saneamento de Paulicéia durante a crise hídrica de 2014 foi bem por aí. De um lado, se incentivava a redução do consumo de água porque não tava dando vencimento. De outro, isso acabava colidindo com o interesse dos acionistas na bolsa de valores. -- lembrava -- A sede de dinheiro leva ao aumento dos preços pra população, falta de investimentos em infraestrutura e deterioração das condições de tudo!

 

--Inclusive de trabalho! -- Cátia complementou

 

--Exatamente! -- a advogada concordou

 

--Venham por aqui! -- um bombeiro sinalizou -- Há pessoas abrigadas no que sobrou daquela escola! -- apontou -- Temos que tirá-las dali e levar praquela igreja onde nos reunimos. -- orientou -- Pelo que soube a maioria está ferida.

 

--Quantos estão lá? -- uma jovem perguntou

 

--Uma pequena família de seis pessoas e uma garotinha que ficou órfão. -- o bombeiro respondeu -- Uma bebê de um aninho!

 

Ao chegar ao local, os voluntários começaram a ajudar as pessoas, fazendo curativos, improvisando talas, muletas e macas e recolhendo o que sobrou de seus pertences pessoais para que saíssem dali.

 

--E a bebê? -- Cátia perguntou aflita -- Cadê ela?

 

--Com minha filha. -- uma senhora respondeu -- Ali. -- apontou

 

A geofísica se aproximou da mulher que segurava a criança e sentiu seu coração acelerar, embora não soubesse porque.

 

--Moça, ajuda essa garotinha, -- foi logo dizendo -- porque se eu já era pobre antes, agora sou miserável! -- entregou a menina nos braços da outra -- Tava só esperando alguém chegar pra ajudar! Graças a Deus ela não se machucou. -- lançou-lhe um olhar desiludido e se afastou

 

--Ah... -- segurou a criança sem muito jeito -- Calma, neném, eu me acerto aqui... -- brincou -- Melhor assim? -- aninhou a menina em seu colo sentindo uma inesperada emoção

 

--Amor, a gente vai começar transportando aqueles ali... -- Jamila se aproximou falando mas se calou -- Smallah! -- surpreendeu-se com a cena -- Você com criança no colo? -- reparava na outra -- Tá chorando? -- não entendia

 

A loura não conseguia se conter. -- Querida, eu... -- não sabia explicar -- Eu não sei como ou se pode ser mas... -- chorava contidamente -- Eu quero ela... -- afirmou como se implorasse -- Você...? -- não conseguia completar a frase

 

--Eu quero o que te faz feliz! -- respondeu com intensidade -- Você quer uma filhinha? São seus planos agora? -- olhava ternamente para a criança -- Então vamos ter uma filhinha! -- sorriu -- Quem disse que casar com uma advogada não tem suas vantagens? -- brincou

 

--Eu te amo... -- afirmou com o rosto banhado em lágrimas

 

--E eu a você, minha galeguinha!

 

Dos Espaços, a mãe de Cátia sorria emocionada ao ver o reencontro de sua filha com a avó reencarnada.

 

***

 

Clarice e Magali conversam por chamada telefônica via QQOV?. Zinara estava fora, excursionando com alunos para apresentá-los ao observatório do sertão do país.

 

--Tô muito feliz por você, Magali! -- Clarice falava sorridente -- Já morro de saudades da sua companhia e vou sentir ainda mais depois que sair do país, mas é muito bom saber que o instituto no Kanatá preferiu te aceitar logo como pesquisadora convidada ao invés de investir num pós doc!

 

--E eu tô correndo contra o tempo pra providenciar tudo e poder zarpar logo no começo do ano que vem. -- contava animada -- Deixar os trabalhos aqui encaminhados, cuidar da minha licença não remunerada, da documentação, do visto, vender casa e mais tudo que eu não puder carregar!

 

--Nossa! -- ficou surpresa -- Você não acha isso muito arriscado? -- perguntou com jeito -- Claro que eu quero que tudo dê certo lá, mas ninguém sabe o que vai acontecer... se vocês quiserem voltar, não vão ter casa, móveis, nem nada...

 

--Amiga, escuta só, o visto de permanência por dois anos é uma pequena fortuna! Se não vendermos as coisas todas, não vai rolar dinheiro pra bancar! -- explicou -- Eu ainda saio na base da licença não remunerada, Lúcia vai pedir exoneração e rapar cada centavo que tem no banco!

 

“Meu Deus, que loucas!” -- pensou em estado de choque -- Mas, desculpa, só pra eu entender... Você falou em permanência por dois anos?

 

--Sob certas condições, renováveis por mais dois! -- respondeu de pronto -- Se a gente arrumar emprego e se estabelecer por lá, pode ficar de vez. Se não, é simbora de volta! -- passou a mão nos cabelos -- De minha parte acho que é certo conseguir, mas Lúcia vai suar um pouquinho. No entanto, tenho confiança que vá conseguir. Ela é safa e chegando lá pode fazer um curso e cair dentro atrás de emprego!

 

--Eu vou orar por vocês, pra que esses planos deem certo. -- prometeu com sinceridade

 

--E vão dar! -- respondeu confiante -- Mas como não sou de fazer desfeita, vai rezando aí que sei de teu poder no meio da divindade! -- riu brevemente

 

--Ai, ai, meu poder... -- riu também -- Quem tem poder é a fisioterapeuta de Zinara, que endireitou a coluna da síndica do prédio e ainda convenceu ela a nos vender o apartamento! -- comentou -- E é lá que mamãe vai morar. Ela adorou!

 

--Ui, que tudo! Já achou apartamento pra tua mãe e no mesmo prédio de vocês? Gentem, as duas são demais, não dá pra negar! -- surpreendeu-se -- Mas me conta! Como vai essa vida de professora num departamento novo e coordenando um programa de pós internacional? -- queria saber

 

--Menina, foi tudo tão louco! -- ajeitou-se no sofá -- Mal cheguei e encarei a vice coordenação, professor Felipe teve problemas pessoais, pediu pra sair e já herdei a coordenação, assim, na maior! -- resumia a história -- A vida tá a mil, mas com minha caipirinha do lado, eu dou conta... -- afirmou melosa

 

--Se tiver a mil na cama também, aí tá valendo, né amiga? É como dizem lá em riba: Jayed jedan! (Muito bom!) -- imitou Zinara e riu

 

--Ué? Já tá até falando a língua de Cedro também? -- achava graça

 

--Ah, minha filha, eu sou igual a tua bousa: posso não entender, mas capto uma sacanagem mole, mole! -- riu mais uma vez

 

Riu gostosamente. -- Eu posso com isso, gente?

 

 

CAPÍTULO 193 – Prenúncios de Mudanças

 

Hana e Khalayla trabalhavam duramente no plantio de oliveiras. Estavam pouco mais afastadas dos demais. Sem que esperassem foram surpreendidas por dois homens que espreitavam escondidos.

 

--Oh! -- Khalayla apontou a tesoura de poda -- Fiquem longe de nós! -- ameaçou -- La itkarraib Haddi! (Que não se aproxime de mim!) -- falou para o homem mais próximo a ela

 

--S’il te plaît, n’aie pas peur! (Por favor, não tenha medo!) -- falava baixo -- Como dizer na língua delas que somos amigos? -- perguntou para o outro -- Não sei se elas falam gálio e ainda não domino a língua de Cedro!

 

--Je parle votre langue! (Eu falo sua língua!) -- Hana respondeu com segurança -- Quem são vocês e o que querem? -- continuava falando em gálio

 

Os homens sorriram animados.

 

--Je suis Gabriel et voici Jean Louis! (Eu sou Gabriel e este é Jean Louis!) -- apresentou a ambos -- Somos de uma ONG de Cedro e temos buscado descobrir os campos onde se encontram trabalhadores escravizados. -- prestava atenção no ambiente -- Temos certeza que é o caso aqui!

 

Hana balançou a cabeça confirmando. Khalayla apenas prestava atenção sem entender.

 

--J'ai un plan, ne t'inquiète pas! (Tenho um plano, não se preocupe!) Apenas avise àqueles de sua confiança que voltaremos aqui com reforços. -- Jean Louis advertiu -- Vamos libertar vocês e levá-los para a cidade de Jasin. Estejam preparados!

 

--Pourquoi Jasin? (Por que Jasin?) -- Hana perguntou desconfiada -- E quando voltarão?

 

--Por que sabemos que os traficantes de pessoas têm se mantido na região das fronteiras e Jasin é a cidade livre mais próxima. -- esclareceu -- É lá que estamos sediados em segredo, em comunicação estreita com nosso grupo na capital! -- Jean Louis continuava -- Pelo menos daqui a cinco dias estaremos de volta. Mon group désire que vous soyez prêts! (Meu grupo deseja que vocês estejam prontos!)

 

--D'accord. (Está bem.) -- Hana respondeu simplesmente

 

--Venez, Jean Louis, sortons d'ici! (Anda, Jean Louis, vamos sair daqui!) -- Gabriel pediu preocupado -- Se formos vistos agora, nem eles, nem nós teremos chances! -- advertiu

 

Jean Louis não respondeu, apenas sinalizou com a cabeça e os homens correram abaixados por entre as folhagens.

 

--Quem são estes estrangeiros? O que eles queriam? -- Khalayla perguntou para a outra -- Ana xaafa! (Estou com medo!) -- olhava para todos os lados

 

--Vamos sair logo daqui e lhe explico tudo! -- Hana foi juntando sua carga -- Yaalah! (Vamos!)

 

***

 

Dois dias depois, Hana encontrava Khalayla em oração ao final de uma dura jornada de trabalho. A jovem estava ajoelhada no campo de oliveiras e saudou-lhe com um olhar esperançoso.

 

--Eu orei pedindo que Allah falasse ao meu coração quanto às intenções daqueles homens e ao final fui tomada por uma imensa sensação de paz! -- sorriu -- Podemos confiar neles! Eu sei! -- falava com muita fé -- B3ad el sneen dee kollaha... Kaanat seneen raa7 wa2taha... (Depois de todos estes anos... anos desperdiçados...) Depois de tudo que a guerra fez em nossas vidas, sinto que vivemos prenúncios de mudanças bem vindas!

 

Hana ficou impressionada e feliz com o que ouviu. -- Eu fiz como foi pedido e adverti àqueles de mais confiança e que sei que serão discretos. Os demais, no momento certo, virão conosco ou não, a depender do próprio livre arbítrio. -- ajoelhou-se ao lado da jovem -- Kaanat dee eih? (O que foi tudo isso?) -- olhou para o horizonte -- O que foi e o que tem sido esta noite que nunca permite o amanhecer em nossas vidas? -- emocionou-se e ficou uns instantes calada -- Eu sempre gostei de aprender idiomas, de me comunicar... Acredito que o diálogo é maior que a força bruta e decidi viver assim: dialogando. -- mergulhou no passado -- Tenho facilidade em aprender idiomas e falo saxão e gálio fluentemente desde muito cedo. Posteriormente me interessei por aprender a língua da Rossiya, dadas as influências políticas que este país sempre exerceu sobre nossa região, na disputa com Saxônia e Godwetrust. -- contava -- E como todos diziam que minha voz era bela, me inspirei em buscar trabalho como dubladora e assim foi. Dos 18 aos 23 anos trabalhei como intérprete e dubladora. Foi o Estado Radical quem deu um fim a minha breve carreira. -- afirmou com tristeza -- Wahrab men el shoo (Eu fujo da nostalgia), mas ela não me abandona...

 

--Penso que todos nós somos nostálgicos... -- Khalayla respondeu pensativa -- Ma32ool tensak enyya (É possível para meus olhos esquecer), nunca para o coração... -- suspirou -- Mas, me diga. -- não desejava pensar em coisas tristes -- O que você dublava? Filmes?

 

Hana sorriu e olhou para a outra. -- No começo, filmes de Godwetrust para os cinemas de Suriyyah e Cedro. Depois, novelas de Terra de Santa Cruz para as TVs da Rossiya. E assim aprendi um idioma novo: o de Terra de Santa Cruz!

 

--Smallah! -- surpreendeu-se

 

--A Rossiya é uma grande consumidora das novelas de Terra de Santa Cruz e dublá-las para o idioma deles foi algo que me rendeu um bom dinheiro! -- explicou -- Mas isso foi no passado e não me servirá de nada mais. -- levantou-se -- O que posso e devo dizer agora, é que sua fé mudou tudo na vida de todos nós. Ela nos salvou! -- sorriu -- Obrigada por existir, habibi! Yatamanna (A esperança), é o que você é! -- fez um gesto de despedida e partiu

 

Khalayla sentiu-se valiosa como há muito não experimentava.

 

***

 

Clarice e Zinara chegavam do trabalho quando o celular da morena acusou recebimento de mensagem no QQOV?.

 

--Mensagem de Jamila. -- comentou ao olhar para a tela do aparelho -- "Dá uma olhada no extrato daquela conta!!!” -- leu em voz alta -- Sahar! -- olhou para a amada com o coração acelerado

 

--Ai, meu Deus! -- empolgou-se -- Vai, amor, olha o extrato da conta! -- pediu dando pulinhos

 

--Ô, meu Pai... -- usava o celular para acessar o internet banking -- Tô tão nervosa que esqueci até a senha! -- tremia -- Sahar, 2oli 3alih, min fadlik! (Amanhecer, diga-me qual é, por favor!) -- pediu agoniada -- Aah ya laali iw-ya la laali iw-ya laali iw ya lala! -- falava apressada sem saber o que dizia

 

--Calma, amor, deixa eu ver. -- pegou o celular da mão dela -- Eu acho que é... -- estava nervosa também -- é... -- digitava e apagava sucessivamente sem confirmar -- Gente, deu branco! -- tremia

 

--Dah JaHiim! (É um inferno!) -- não conseguia se concentrar -- Até o pinguelo da garganta se contorce e a gengiva dá caimbra! -- gesticulava

 

Clarice achou graça. -- Hum! Lembrei! -- digitou -- Acho que é isso, agora vamos ver o que... -- emudeceu de repente

 

--Choo?? (O que??) -- queria saber -- O que você tá vendo... -- aproximou-se mais e olhou para o celular -- Smallah! -- arregalou os olhos

 

--Querida, você... -- estancou com o celular nas mãos -- Você viu quanto...?

 

--Sahar, eu não bebi nada, mas me sinto... -- a cabeça girava -- Ana sakraneh... (Estou bêbada...) -- caiu desfalecida no sofá

 

--Amor!! -- colocou o celular na mesinha e se aproximou da outra -- Amor, por favor, acorda! -- pediu aflita -- Você não pode desmaiar simplesmente porque ganhou uma indenização de... -- sentia-se tonta -- de... -- a cabeça rodava -- Ai... -- desmaiou em cima da astrônoma

 

***

 

Jamila e Leonor caminhavam lentamente pela orla da praia de Jatiúcas, em Cidade Restinga.

 

--Segunda vez com a gente nesse mesmo barco, né? -- Leonor perguntou entristecida -- Agora foi maínha quem nos disse adeus...

 

--Pelo menos no caso dela foi tudo em paz. -- a advogada respondeu olhando para o mar -- Do que você me disse, ela dormiu e simplesmente não acordou.

 

--É... -- balançou a cabeça -- Maínha se foi como sempre viveu: discreta.

 

--E você, minha irmã? -- perguntou preocupada -- Fala como você se sente...

 

Passou a mão nos cabelos. -- Eu me sinto como se meu lugar não fosse mais aqui. -- respondeu pensativa -- Não tenho mais o que me prenda nessa cidade, tô solteira, tô desempregada, não arrumo oportunidade em lugar nenhum... -- olhou rapidamente para a irmã -- Pra mim já deu!

 

--E o que pensa em fazer? -- tinha cuidado na outra -- Ou ainda não teve tempo de pensar?

 

--Não dormi pensando... -- mirou um ponto no infinito -- Depois de tudo, inclusive depois que aquele troço ganhou as eleições, penso em dar uma arejada, sabe? Passar um tempo fora do país... -- pausou brevemente -- Mas não vou fazer nada no desespero, se aperreie não.

 

--Eu vou cuidar do inventário, pode deixar. E vou abrir mão da minha parte no apartamento pra você. -- ficou uns segundos calada até que propôs -- Por que não passa uns tempos com a gente em São Sebastião? Você podia trabalhar comigo lá. Me secretariar... -- deu uma esbarradazinha proposital no ombro da outra -- Aí vai juntando um dinheirinho e na hora certa vai pra onde seu coração mandar. -- sorriu -- O que acha?

 

Ponderou sobre o que ouviu. -- A proposta é massa, mas a casa é da tua mulher, né? -- cruzou os braços -- E eu lá iria atrapalhar a intimidade de vocês. Fica chato...

 

--Ah, também não é assim! -- retrucou -- E não vai ser você a impedir a gente de ter intimidade. Coisa que Cátia e eu temos é criatividade e ousadia. -- brincou

 

--Imagino... -- deu um sorriso triste

 

Jamila deu um beijinho no rosto da outra e abraçou-a pelos ombros. Seguiram em silêncio por uns minutos até que recomeçou a falar: -- Sabe... recentemente ganhei uma boa soma de honorários, -- pensava na indenização de Zinara -- e vou começar a montar um escritório pra mim. Seria muito importante poder contar com você nessa hora. Não é fácil tocar um negócio desses, vai ser uma experiência nova pra mim e vou precisar de gente de confiança do meu lado. -- pausou brevemente -- Sou muito perseguida, caluniada, tenho inimigos poderosos... tenho certeza que vão querer me boicotar. -- considerou -- A gente vai investir em Direito Ambiental e também em Direito Trabalhista, porque vou me associar com alguns advogados que já trabalharam como contratados no Sindicato de Cátia. -- explicou

 

Leonor pensava no que ouviu. -- A proposta é tentadora, mas sei que vocês tão na maior batalha pra adotar aquela garotinha que ficou órfão e um casal que tá pensando nisso não tem condição de acomodar mais uma dentro de casa... -- considerou

 

--Aywah, ya habibi (Sim, querida), nós temos! -- respondeu de imediato -- Antes de viajar conversei com minha galeguinha sobre a possibilidade de você passar uns tempos conosco e ela concordou. -- falava a verdade -- Além do mais, com você por perto é mais uma pra dar força na luta da gente pra conseguir adotar a pequena Júlia. -- piscou para a outra

 

Leonor balançou a cabeça positivamente. -- Sendo assim, dê só o tempo de me ajustar e na Páscoa tô lá com vocês. -- decidiu

 

--Mumtaz! (Excelente!) -- ficou feliz -- Tenho certeza de que nossos pais aprovariam essa decisão!

 

--É, minha irmã... Sinto que tudo isso é prenúncio de grandes mudanças... -- afirmou profética

 

***

 

Cátia retornava exausta para a sala de trabalho. Jogou-se na cadeira como se as pernas não tivessem mais forças. -- Meu Deus, que dia! -- esfregou as mãos no rosto -- E ainda tem que ir pro Sindicato encarar um Colegiado... -- suspirou -- Vida cachorra, vou te contar! -- reclamava consigo mesma -- Mas você se meteu nessa porque quis, né, minha nêga? -- ajeitou-se na cadeira para usar o computador -- E essa consumição sem fim pra poder adotar minha Julinha... Enquanto isso, ela fica lá num orfanato! Que merd*! -- reclamava sozinha -- Deixa eu aproveitar estes momentos finais de expediente pra dar uma lida nos e-mails e parar de pensar em coisa triste. -- pegou o mouse e passou os olhos nos assuntos e destinatários -- Opa! -- um deles chamou sua atenção -- Olha quem vejo aqui... -- clicou para ler

 

“Querida Cátia,

 

Espero que esteja bem! Dia desses vi na TV que te prenderam arbitrariamente e morri de preocupação. Depois soube que sua esposa te colocou em liberdade e fiquei feliz! Aliás, só por causa disso descobri que além de fazer mil e uma coisas a senhora virou dirigente sindical! Não sei como arruma tempo mas amei! Esse país precisa de gente do seu tipo pra mudar as coisas.

 

Também soube do trabalho voluntário de vocês em Paraopebinha e estou na torcida para que consigam adotar a menina que ficou só. Ela não poderia ter mães melhores!”

 

--Hum, que lindinha... -- sorriu para a tela do computador e continuou a ler

 

“Neste ano deveria me formar, mas vou trancar matrícula no segundo semestre para fazer um estágio na estatal de petróleo aí, em São Sebastião, por seis meses. Depois disso destranco e para o ano que vem vai faltar só a defesa da monografia e mais uma disciplina eletiva que praticamente não dá aula, só trabalhos de pesquisa.

 

Vou ficar vivendo na casa da tia de uma amiga, que mora perto do Centro da cidade. Já está tudo resolvido. Talvez, durante esse tempo, a gente se esbarre por aí. Ou então, se você quiser, me convide para tomar um café e te rever. Também quero conhecer a famosa Jamila Haddad pessoalmente.

 

Beijos, beijos e muito obrigada por tudo que fez por mim! Quero ver as duas (ou melhor, as três) aqui na minha formatura em 2020!

 

Lídia”

 

--Own, que orgulho! -- exclamou satisfeita -- O tempo passa tão rápido que a gente perde a noção! Ela já vai se formar! -- ficou emocionada -- Ai, ai, Lídia, hoje em dia eu vejo você como uma doce irmãzinha mais nova! -- continuava falando sozinha -- Vamos responder esse e-mail tão fofo! -- começou a digitar

 

A geofísica ainda respondeu mais alguns e-mails e às 18h se preparou para sair.

 

--Ih, meu Deus, tem que correr porque o Colegiado começa daqui a meia hora! -- revirou os olhos -- Mas, faz o que? Ajoelhou, tem que rezar! -- saiu da sala andando apressada -- "Sabe que eu tô orgulhosa de mim?” -- pensava satisfeita -- "Realmente não alimento mais qualquer pensamento sensual em relação a Lídia e nenhuma mulher mexe comigo, só a minha!” -- sorriu -- "Grande evolução! Tô pronta pra fazer família e virar mãe!” -- continuava pensando

 

Nisso, Vanessa cruza com Cátia pelo corredor e a cumprimenta com uma saudação oriental. Ao passar, a loura observou que novamente a túnica da jovem deixava pouco a se imaginar na parte de trás.

 

--Ô, meu Pai santinho, a gente quer andar na linha mas vem ela pra futicar a pantera! -- resmungou consigo mesma -- Como é que pode andar com toda aquela abundância de... -- pensava no que dizer -- de fé, à mostra desse jeito? -- olhou para trás mais uma vez -- Minha Nossa Senhora... -- respirou fundo -- É muita fé!

 

 

CAPÍTULO 194 – O Paraíso

 

Amina e Raed tinham a casa cheia. Todos os filhos, noras e netos presentes, além de Marco, Janaína e Aisha. Najla estava de malas prontas, coração batendo acelerado e olhos marejados de emoção. Reunidos na varanda, perto da cozinha, a ex miss Cedro 68 olhava para todos com alegria e tristeza ao mesmo tempo.

 

--Parece que foi ontem que cheguei nesta casa... -- Najla começou a falar -- Zinara me trouxe do asilo e me deu a oportunidade de revê-los, de me explicar, de pedir perdão... -- rememorava -- Foi um difícil começo pra todos nós, mas vocês me deram a chance de recomeçar, me acolheram em suas vidas e o mais importante: -- pausou para conter a emoção -- me perdoaram! E eu nunca, nunca vou ter palavras ou condições de agradecer por tudo isso! -- derramou uma lágrima -- Kissti wadHa fi jbini … (Essa história está escrita na minha testa...) E minha gratidão, da mesma forma, sempre será!

 

“Quando camma Najla falou daquele jeito, Kitaabii (Meu Livro), uma profusão de lembranças vieram a minha mente, além de uma incrível sensação de bem estar. Era como se eu me sentisse com um dever cumprido. No passado, alaa2i 7dood beenena (encontrei limites entre nós), mas hoje, todas as barreiras foram superadas. Por todos em usritina (nossa família)!”

 

--Ocê nus trôxi pra cá, muié. Pra essa Terra de Santa Cruz. Pra recumeçá! -- Amina lembrou -- Intonci num tem pricisão di agradicê. -- respondeu emocionada

 

--Num tem... -- Raed concordou mal disfarçando a emoção

 

--Tem sim... -- discordou com ternura -- Eu nunca vou esquecer daquele dia em que entrei humildemente pela porta dessa cozinha. -- apontou -- E hoje saio por ela pra me despedir... Com a mesma humildade! -- secou os olhos com as costas da mão -- E o coração cheio das lembranças mais maravilhosas que uma filha de Deus pode ter abaixo do Céu! -- olhou para a sobrinha -- Zinara, mesmo que eu vivesse por séculos nesta terra, nunca poderia agradecer o que fez por mim. Desde que me encontrou naquele asilo até hoje! -- agradeceu com muito sentimento -- Você me deu tudo! -- chorava contidamente -- Tudo!

 

--Ai, amor, eu fico tão emocionada... -- Clarice cochichou para a astrônoma

 

--Eu também, Sahar. -- confessou

 

--Estamos voltando pra fazenda depois de muitos anos longe dela. -- Najla voltou a falar -- E eu juro a vocês, abaixo de Deus e em nome de nossos ancestrais, que será tudo muito, mas muito diferente do que foi um dia! -- prometeu com muita verdade -- Najla Raja e seu marido, junto com nossos amados, contruiremos uma linda história naquele lugar!

 

--Marido?? -- Marco e Raed perguntaram ao mesmo tempo -- Minha Dona, então... -- o homem aproximou-se dela emocionado -- Então você finalmente aceitou o pedido que já lhe fiz há tanto tempo? -- olhava nos olhos

 

--E num é qui o Créu quiria casá? -- Raed comentou com a esposa

 

--Ô, homi lesu qui num percebi nada... -- Amina revirou os olhos

 

--Eu precisava do meu tempo pra te dizer sim. -- Najla segurou uma das mãos dele -- Agora que me sinto completa, digo: Aywah! -- pausou -- Sim!

 

--Minha musa! -- puxou-a pela cintura e beijou-a apaixonadamente nos lábios

 

--Aê!!! -- todos aplaudiram

 

--Hum... intonci num tem mais pricisão di cortá us trem di homi deli fora! -- Raed concluiu

 

--Coisa bunita di si vê, essas dispidida! -- Georgina exclamou emocionada

 

--É uma emoção qui chega dói! Tá acabandu cumigu... -- Dora falou para Penha e Catiúcia -- Avi Maria! -- chorava discretamente

 

--E eu... -- Penha chorava também

 

--Ô! -- Catiúcia passava um lencinho nos olhos

 

--As muié da famia são tudu dirritida, num sabi? -- Cid comentou para os irmãos disfarçando as lágrimas

 

Ahmed e Nagibe nem responderam porque fungavam secando o rosto.

 

--Pessoas, eu não sou muito boa nessa parte sentimental, mas... -- Aisha começava a falar -- Também queria agradecer muito a vocês por tudo... -- estava igualmente muito emocionada -- Sabe? Passa um filme na cabeça da gente... -- olhou para um ponto perdido -- Se eu tivesse que repetir tudo de novo pra poder chegar até aqui, acho que valeria a pena! -- sorriu -- Nenhum de nós é o mesmo de alguns anos atrás... E sabe qual a melhor parte disso? Hoje a gente pode dizer que finalmente é uma família! De verdade! -- reconhecia -- Aquela bem do tipo usritina têúdêô: TU-DÔ! -- gesticulou

 

--Ocê tá cum a razão... -- Nagibe concordou -- E num é purque nóis vai si separá di morá pertu, qui qué dizê qui a famia vai si disfazê. Purque nunca mais vai! -- olhou para os pais -- Hoji é camma Najla qui si vai, logu dipois vamu sê nóis, nossas muié e fio. -- apontou para si mesmo e para Cid -- Nóis já dicidimu assim e pedi a bênça! -- abaixou a cabeça respeitoso

 

--A bênça! -- Cid fez como o irmão

 

--Rahimaka Allah (Deus te abençoe), meus fio. -- Amina respondeu emocionada

 

--Smalla'Alik! (Deus proteja você!) -- Raed também abençoou -- Us dois!

 

“Eu acompanhava aquelas cenas, Kitaabii, e pensava em mim mesma quando saí de casa. Outro contexto, outras épocas...

 

Estávamos em abril, Nagibe e Cid partiriam logo em maio, com suas esposas e filhos menores. Khadija e Cidmara ficariam para completar o ano letivo e em dezembro partiriam para junto dos pais.

 

Hoje era muito claro para mim que maama e baba percebiam que os filhos não são posses. Eles são pássaros que eventualmente voam para longe, mas nunca esquecem o ninho. Nagibe, Dora, Cid e Penha sentiam que vida lhes dizia: Ana wa7yat 3aynak ha7a2a2o leek. (Pelo bem de seus olhos eu farei seus sonhos se tornarem realidade.) E eles seguiam por novos caminhos carregados de esperança.”

 

--E você, Janaína? -- Clarice perguntou enxugando os olhos -- Você não vai agora com Aisha e seus sogros?

 

--Não... -- secava os olhos também -- Hassan e Ahmed João vivem lá em casa por causa dos estudos e não dá pra deixar dois jovens menores de idade sozinhos... -- sorriu -- Eu fico em Gyn até o período de aulas acabar e vamos ver no que vai dar. -- colocou as mãos nos bolsos -- Tô levando a maior fé que Hassan vai passar pra Universidade e no ano que vem já se muda pra Capital. -- olhava para a outra -- E Ahmed João ainda vai ter mais um ano de Escola Técnica pela frente, mas aí vai completar 18, então dou umas instruída nele e tomo o caminho da roça. -- sorriu -- Ou melhor né? Caminho da fazenda! -- brincou

 

--Antis docês í, faiz qui neim camma Najla e passa lá nu centru modi abri us caminhu, num sabi? -- Ahmed falava para os irmãos -- Façu questão di pidí pra abri as luiz procês tudu!

 

--Ah, mas nóis vai! -- Dora logo respondeu -- Aqueli centru tem pudê!

 

--Tem pudê, tem... -- Penha e Catiúcia repetiam juntas

 

--Eu vô tê sardadi... -- Ahmed Mateus segurou uma das mãos de Khadija -- Sardadi... -- buscou uma das mãos de Hassan

 

--Ô, bichinho! -- Hassan se ajoelhou e beijou a cabeça do menino -- Se aperreie não, que nós vamos estar sempre juntos!

 

--Sempri! -- Khadija concordou -- Tem medu, não, Mateus! Tem não! -- beijou a cabeça dele também

 

--Inda anêim fomu e já tão si dispidindu? -- Cidmara cruzou os bracinhos sem entender -- Eu tivi im Paulicéia e vortei! Intonci?

 

--Intonci qui nas féria nóis vai lá nessa fazenda brincá! -- Ahmed Lucas deu um beijo no rosto de Cidmara

 

--Eu tô achandu muitu massa, purque vai tê a casa di baba, essa casa aqui, fazenda di camma Najla, casa di Aisha e Janaína nu Gyn e o lugá qui Hassan vai morar na Capitar! -- Ahmed Marcos comentou excitado -- Vô viajá pra todu cantu! -- sorriu -- "E haja lugá modi arrumá namorada!” -- pensou

 

--Ói o carrocêru aí! -- Georgina anunciou

 

--Ai, meu Deus, chegou a hora! -- Najla novamente secou o rosto com as mãos -- Já falei com todo mundo, já beijei e abracei todo mundo, agora eu vou! -- olhou para Marco e Aisha -- A gente vai... -- pegou uma bolsa

 

--Vamos, minha Dona! -- Marco pegava as outras bolsas -- Tá na hora!

 

--Amor, cê vai pro Gyn amanhã com os meninos, né? -- Aisha falava com a esposa -- Olha, se cuida, não come besteira... -- segurou o rosto dela -- E me liga todo dia pelo QQOV? porque senão eu vou morrer de saudade!

 

--Claro que eu ligo! -- suspirou -- Eu vou ficar na secura sem você! -- beijou-a com pena de vê-la partir

 

--Simbora, mininu, leva us trem pra carroça, anda! Ajuda o Marco! -- Amina pediu aos filhos, que obedeceram

 

--Hoje finarmente eu me sinto feliz e livre! -- João Cezário falava dos Espaços -- Vorta pra fazenda, Jilinha, com o homem que sempre soube te dar valor! -- derramou uma lágrima de emoção -- Vorta Aisha, com a mulher que você escolheu pra viver. -- olhava carinhosamente para as duas mulheres -- Fale com Zinara o que você pensa, Jilinha! Eu devo muito a ela também. -- incentivou -- Inté um dia... -- despediu-se mandando beijos e partiu

 

Tocada por uma intuição, Najla chamou: -- Zinara! -- aproximou-se da sobrinha -- A você devo um obrigado todo especial! -- sorria emocionada

 

--Ya sayyida (A senhora) já me abraçou, já me beijou, já me fez chorar... min fadlik! (por favor!) -- respondeu brincalhona -- Pare de emocionar a caipira desse jeito que senão num dô conta! -- imitou o sotaque

 

--Eu queria te pedir um favor! -- segurou o rosto dela -- Um grande favor, aliás.

 

--Bitichkii min eh? (Qual é o problema?) -- preocupou-se -- Ainda precisam de alguma coisa?

 

--Sim, preciso. -- olhava nos olhos -- Você me salvou de todas as formas como uma pessoa pode ser salva. Agora... faça isso por si mesma? -- pediu

 

--Choo? (O que?) -- não entendeu

 

--Pare de se esconder do mundo. -- pediu mais uma vez -- Seja você, quem você é, sem se esconder. -- soltou lentamente o rosto da astrônoma -- Você ajudou praticamente todo mundo aqui a se libertar. -- foi se afastando lentamente -- Liberte-se, habibi! -- olhava nos olhos -- Albik 3ayez eih? Bye7lam beh, 2oli? (O que o seu coração deseja? O que ele sonha, me diga?) -- falava mais baixo -- Liberte-o! -- soprou um beijo e seguiu para a carroça

 

“Aquelas palavras tiveram tamanho impacto sobre mim, Kitaabii, como nunca saberei lhe dizer!

 

Quando a carroça partiu, camma Najla estava sentada de costas para o caminho que viria e de frente para o caminho que ela deixava. Aisha e Marco fizeram o mesmo, cada um sentado de um lado dela.

 

Convoquei meus irmãos e sobrinhos e corremos atrás deles, todos nós; até mesmo Janaína se uniu ao bando. Estávamos sorrindo e gritando coisas como ‘até logo’, ‘tchau’, ‘te amo’, na língua daqui e na língua de Cedro, porém, mais que tudo, na linguagem do coração.

 

Eles riam de nós e ao mesmo tempo choravam. Acho que todos nós chorávamos também. Mas não havia dor, não havia sofrimento. Era apenas mais um daqueles momentos em que somente a distância separa mas o coração e o pensamento unem.

 

Por que tristeza? Eles se mudavam para o paraíso...”

 

***

 

--Então... -- Cecília abria a porta animadamente -- É aqui! -- fez um gesto -- Entrem!

 

--Oxe... -- Rosa entrou timidamente com Davi no colo e uma bolsa -- Tão bonito apartamento... -- olhava ao redor -- "E cheiroso...” -- pensou

 

--De agora em diante, o novo lar de vocês! -- Adamastor vinha atrás com Salomão sentado em seus ombros -- Deixa eu botar essas bolsa no quarto. -- seguiu com o menino

 

--Sem formalismos, garota! -- Cecília empurrou a última bolsa para dentro de casa e fechou a porta -- É o que Mastô falou: -- abriu os braços -- lar doce lar! -- sorriu

 

A jovem sorriu e colocou o menino em pé no chão junto com a bolsa. -- E como é o serviço aqui? -- perguntou interessada -- A senhora prefere que as limpeza seja feita de manhã ou de tarde depois do almoço? Também tem que saber como é jeito que prefere que eu faça as comida, que passe as roupa... -- gesticulou um pouco -- A senhora quer que eu faça as compra ou prefere ir junto e eu acompanho pra...

 

--Ei, garota! -- interrompeu-a gentilmente -- Cê quer saber das regras da casa, né? Então me escuta. -- falava amistosamente -- Primeiro de tudo, não chame nem a mim e nem a Mastô de senhora e senhor porque isso é muito down e eu tô até muito da inteirona, aqui! -- esticou a pele do rosto -- Quase nem tem ruga pra esconder! -- mostrou

 

--Tá certo... -- achou graça

 

--Segunda regra: aqui você não vai ser empregada. -- anunciou -- Todo mundo nessa casa faz a sua parte e assim vai continuar. Você divide os serviços da casa com a gente. -- cruzou os braços -- O que a senhora vai fazer mesmo é estudar!

 

--Vôti! -- arregalou os olhos -- Eu vou pra escola? -- perguntou excitada

 

--Vai. -- respondeu de pronto -- E tem por obrigação tirar nota boa! -- afirmou bem humorada

 

--Ave Maria... -- sentiu o coração acelerar -- "Será isso verdade??” -- não acreditava

 

--E aí, enquanto a gente trabalha e você estuda, os meninos ficarão com dona Ritinha, aquela tia de Mastô super fofa que cê já conheceu. -- explicava -- Quem chegar primeiro vai lá e pega eles. Provavelmente você.

 

--Nossa Senhora, mas eu... -- não sabia o que dizer

 

--Pronto! -- Adamastor voltava com Salomão -- Agora você, -- colocou o menino de pé no chão -- e seu irmão vão me ajudar levando o resto pro quarto. -- olhou para os meninos -- Simbora, cabrinha! -- bateu uma palma

 

--Simbora! -- Salomão repetiu

 

--Pode ir, maínha? -- Davi perguntou

 

--Vai, fio. -- concordou emocionada

 

--Você vai começar no supletivo e aí depois, quando tiver com ensino fundamental resolvido, podemos pensar num curso técnico. E depois em faculdade, por aí vai. -- continuou falando os planos

 

Rosa estava pasma. “Eu não acredito nisso... Será, meu Padim Ciço?” -- pensava emocionada

 

--Olha só, meu bem. -- segurou-a pela mão e ambas se sentaram -- Eu acho que no começo vai ser uma barra, sabe? -- cruzou as pernas -- Você já é grandinha, os meninos tão crescendo, eu sou de um jeito, Mastô é de outro, dona Ritinha é de outro... -- olhava para a moça -- Não é fácil acomodar tanto temperamento diferente junto, mas se tiver respeito, amizade, carinho... -- sorriu -- Amor... tudo se resolve! -- olhava bem para ela -- Eu e Mastô podemos nunca ser vistos por você como seus pais, mas é o que a gente quer ser...

 

--Ah... -- derramou uma lágrima

 

--Mas você tá proibida de querer insinuar que Davi e Salomão são meus netos, porque tô muito nova pra ser vó! -- gesticulou ainda mais -- Eles serão nossos filhos também! A coisa geracional é só um detalhe! -- fez um gesto despreocupado

 

--Por que...? -- Rosa chorava de felicidade -- Por que vocês tão fazendo isso por mim? -- não entendia -- Eu, uma garota pobre, ex puta, que tenho nada pra retribuir...

 

--Você tem muito! Eu sei que tem! -- interrompeu-a novamente -- E o porque... -- deu um suspiro profundo -- Certa uma vez uma pessoa me disse que no dia que eu sentisse que podia mudar a vida de alguém, tudo faria sentido! Até o que parece não ter... -- tocou o rosto da jovem de leve

 

--Obrigada, obrigada! -- Rosa abraçou a outra com força -- Que Deus abençoe! -- chorava

 

Cecília ficou um pouco desconcertada no primeiro momento mas acabou retribuindo o abraço com muito carinho.

 

“Esse lugar vai ser meu paraíso!” -- Rosa pensou emocionada -- "Obrigado, meu Deus! Valei-me, Nossa Senhora!”

 

--Oh, akhuuya (meu irmão), me sinto tão emocionado... -- Khaled sorria com olhos marejados -- Ana mabsoutah! (Estou feliz!)

 

--Rosa buscou ajuda na oração, perseverou e a ajuda veio. -- Youssef respondeu mansamente -- Illi maktuub a’al-gibiin laazim tsuufu I-a’ein. (Todos encontram inevitavelmente seu destino.) Toda semeadura dá frutos; bons ou maus.

 

--Meu coração está muito próximo de encontrar a paz. -- olhou para o irmão -- Agora só me falta a felicidade de ver os irmãos encarnados em Suriyyah encontrando seu próprio paraíso!

 

--Allah fez ‘ala mawa’idi! (Deus cumpre com promessas!) -- Youssef assegurou -- "Bem aventurados os que choram, porque serão consolados”. -- citou um versículo de Mateus -- Tem fé e no momento certo, a solução virá.

 

***

 

Leda e Raquel acabavam de arrumar a casa após uma total reorganização dos móveis. Isabel pulava e corria pelos cômodos com uma boneca nas mãos. Estava satisfeita com a mudança.

 

--Aqui, bebê! -- mostrava tudo para a boneca -- Ó!

 

--Crianças... -- Raquel comentou bem humorada

 

--Pois eu tô feliz que nem ela! -- Leda exclamou -- Deu uma trabalheira do Cão, mas finalmente foi! -- limpava as mãos com um paninho -- Se Getúlio não tivesse arrumado aquele bando de homem pra ajudar, só Deus sabe quando a gente ia acabar!

 

--São os colegas dele da obra que pegou pra ver negócio de pintura lá em Pedra Bonita. -- esclareceu -- Parece que, pelo menos, até o começo de dezembro tem trabalho. Depois vai ser a batição de cabeça procurando outra coisa. -- tirou o lenço da cabeça -- Cansei, viu? -- sorriu para a mãe

 

--Mas ele vai achar. -- a idosa respondeu confiante -- Aquele menino não tem passado aperto pra encontrar trabalho com pintura. Seja em obra, em casa de família ou essas coisas de grafite! -- sentou-se na poltrona -- Cansei também!

 

Raquel ficou feliz com a forma como sua mãe se referiu ao homem. -- Quem tem passado perrengue sou eu... -- sentou-se ao lado dela -- Quando arrumo alguma coisa é sempre um bico temporário.

 

--Fique tranquila que você também vai arrumar alguma coisa boa! -- fez um carinho no braço da filha -- Toda noite eu rezo! Confia nas minhas alma que já coloquei todas elas à caça de emprego pra você! -- falava com convicção

 

A mulher achou graça. -- E a sua mudança pra Cidade Restinga? -- perguntou interessada -- Clarice já levou as coisas dela faz tempo, as suas acabaram de seguir viagem... quando é que a senhora vai? -- não queria que ela fosse

 

--Mandei só o peso pesado! Minhas coisas de dia a dia de velha ainda tão aqui. -- explicou -- Eu tô só esperando minhas reza se concretizarem. Daí vou embora. -- pensava em um emprego para a filha

 

--Vó... -- Isabel se aproximou das duas -- Quer dar aula! -- mostrou a boneca -- Quato! -- apontou para o quarto que dividia com a idosa

 

--Ô, coisa linda da vovó! -- beijou a cabeça da menina -- Pode ir pro quarto e começar a aula que daqui  a pouco a vovó vai pra você me dar aula também. -- sorriu para ela

 

--Mamãe vai! -- olhou para Raquel

 

--Nossa, que a sala de aula hoje vai tá cheia! -- brincou com a filha -- Pode começar, meu bem. A mamãe tem que conversar umas coisas com sua avó e depois as duas vamos pra aula! -- beijou-a também

 

--A hora! -- bateu no pulso mostrando o relógio de brinquedo que usava -- Vem, Sofia! -- falou com a boneca e correu para o quarto

 

--Essa aí vai ser professora que nem a tia! -- Leda acompanhou a neta com o olhar -- E daquelas que pegam no pé de aluno que chega tarde! -- achava graça

 

Raquel também acompanhou o trajeto da filha e ficou uns segundos calada até que teve coragem de perguntar: -- E como vai ser isso, mamãe? -- desejava entender -- Não queria que a senhora me achasse interesseira, mas eu fico me perguntando o que esperar do futuro. -- olhava receosamente para a mãe -- Clarice mora com Zinara, que comprou um apartamento pra senhora no prédio delas. Cecília mora com Adamastor e agora que adotou três pessoas precisa mais que nunca do dinheiro do aluguel do imóvel que deixamos... -- esfregava as mãos nas pernas -- Quais são seus planos pra essa casa aqui? -- abaixou os olhos -- Gê e eu temos que estar preparados pra quando a senhora quiser voltar ou se quiser vender a casa no futuro...

 

--Eu vou dar ela pra você. -- respondeu de imediato -- Tava só esperando resolver essa parte de leva meu peso pesado pra lá, traz o de vocês pra cá, pra poder conversar contigo, pedir documento, essas coisas todas que tem que fazer pra colocar uma casa no nome de alguém. -- olhava para a filha

 

--Mamãe... -- sentiu o coração acelerar -- Mas... e Cecília? E Clarice? -- estava nervosa -- Elas têm direito a parte delas na casa...

 

--Têm, mas abriram mão pra você. -- esclareceu -- E ai delas que não abrissem, que eu metia chinelada no rabo de cada uma! E com aquele chinelo de borracha da sola cheia de trequinho, que dói mais! -- gesticulou

 

Riu emocionada. -- Mas, mamãe... -- não sabia o que dizer

 

--Sempre me incomodou o fato de você não ter uma casa própria pra morar com sua família, mas antes vocês eram sem noção e não estavam preparados. -- falava com sinceridade -- Agora estão!

 

--Oh, mamãe! -- derramou uma lágrima -- A senhora não sabe o quanto me faz feliz! -- mal segurava o choro -- Essa casa pra mim sempre foi o verdadeiro paraíso!

 

--E agora é seu! -- afirmou emocionada

 

--Obrigada, mamãe! -- ajoelhou-se em frente a ela e a abraçou -- Me perdoe por todas as vezes em que fui uma filha ruim! -- chorava

 

--Não tem o que perdoar, meu amor... -- fechou os olhos

 

--Ó aula! -- Isabel chamou lá do quarto

 

As mulheres acharam graça mas ainda gastaram alguns minutos abraçadas em silêncio.

 

***

 

Zinara e Clarice estavam deitadas no chão da sala do que seria o futuro novo lar de Leda.

 

--Sahar, acho que nossa missão foi cumprida! -- sorria olhando para o teto -- Os móveis de ya Leda tão tudo nos devidos lugares, a casa tá limpinha e já colocamos até as cortinas nas janelas! -- deu um suspiro profundo -- Agora é só ela chegar com o que falta e morar! -- fechou os olhos -- A’jabani haqqan! (Eu gosto muito!) Espero que ela considere este novo cantinho como seu paraíso em Cidade Restinga!

 

--Ai, eu também me sinto aliviada e cada vez mais no clima de espera por mamãe chegar! -- virou o rosto para o lado -- Até que sua ex síndica deixou o apartamento super caprichadinho. A gente não precisou nem mandar pintar!

 

--Uma criatura que só vivia atrás de obra pra fazer no condomínio não podia ser diferente dentro de casa. -- abriu os olhos e virou o rosto para o lado -- Nem sei quantas vezes ela reformou esse apartamento! -- acabou achando graça -- Majnum! (Louca!) -- pensava na síndica

 

--Depois que mamãe chegar, -- mudou de posição e se debruçou no ombro da outra -- tudo vai estar nos seus devidos lugares e eu não vou precisar de nada mais na vida! -- beijou-a nos lábios -- Terei tudo que sempre quis! -- beijou-a novamente

 

--Pra mim ainda vai faltar um trem danado de importante, Sahar... -- beijou-a -- Wala dah eih? (Então o que é?) -- queria ver se ela imaginava

 

--O Planeta Nove, eu sei... -- deslizou um dedo no rosto da astrônoma -- Mas não se preocupe! Agora que você e aquele pessoal de Paulicéia conseguiram modelar o que seria a mais provável trajetória dele, todos os telescópios estão olhando pros lugares certos. Alguém vai encontrá-lo! -- beijou-a -- De preferência você, minha caipirinha safada... -- mordeu o lábio inferior da outra

 

“Não era bem nisso que eu pensava...” -- preferiu não revelar seus pensamentos -- Mas, enquanto isso, eu prefiro acompanhar a trajetória de minha estrela maior, da Sitol Nisaa (Rainha das Mulheres), brilhante e linda coordenadora do Programa de Pós-Graduação Internacional na área de Estudos sobre o Clima! -- beijou-a repetidas vezes -- Oh, Sahar, não canso de dizer que morri de orgulho de sua sagacidade ímpar ao trazer nosso grupo de estudos internacional pra dentro desse programa! -- elogiava -- Kont fein ya shaghili hawaya? (Onde você esteve que roubou meu amor?) -- brincou antes de beijá-la novamente

 

Ficou toda prosa. -- Ah, não teve sagacidade nenhuma... -- respondeu timidamente -- O grupo tava quase se desmantelando por falta de verba, então pensei que seria bom unir o útil ao agradável e trazê-lo pra dentro do programa. -- justificava-se -- Sem contar de que os alunos vão poder ter aulas com a tropa de elite de estudos ‘fora da caixa’ -- fez aspas com os dedos -- sobre o clima. Aí eles poderão decidir qual abordagem consideram mais sensata. -- considerou

 

--Ou seja: genial! -- beijou-a mais uma vez -- John Peterson virou seu fã de carteirinha! Especialmente depois da sua ideia de implementar aulas remotas no caso dos professores fora do país. Mumtaz! (Excelente!) -- sorria orgulhosa

 

--Calma, meu bem, ainda não foi implementado... -- fazia um carinho no rosto da outra -- Estamos trabalhando pra isso. -- pausou brevemente -- Falando no grupo, aquela sua amiga... -- baixou os olhos -- A professora Karim... te mandou um beijo.

 

--E cadê, que eu não recebi? -- brincou -- Hatee booseh (Beije-me) -- beijou-a intensamente

 

--Hum... -- mordeu o lábio inferior da outra -- Então o beijo que ela manda pra você é na boca, é? -- reclamou enciumada ao se sentar -- Caipira sem vergonha! -- fez um dengo

 

--Pare com isso, Sahar... -- sentou-se também e beijou as costas do pescoço da amada -- Khayef men eeh, habibi? (Do que você tem medo, querida?) -- sussurrou no ouvido enquanto mordia a orelha de Clarice -- We ya aghla el nas alayya... (Pessoa mais preciosa para mim...)

 

--Ai, amor, para! -- retrucou melosamente -- Safadinha... -- sorria sentindo suaves mordidas no pescoço

 

--Eu quero... -- seguia beijando o pescoço e abraçando a paleoceanógrafa -- Bousa ala shafayef... (Beijo nos lábios...) -- virou-a de frente para si -- Tacaalii? (Vem?) -- pediu

 

--Zinara?? -- desvencilhou-se dengosamente -- Mamãe vai morar aqui! -- levantou-se

 

--Uai? -- não entendeu

 

--A bousa aqui, não! -- fez sinal negativo com o indicador -- Mais tarde e na nossa casa! -- ajeitou-se toda -- Agora vem! Você disse que ia trocar a lâmpada da área e só falta isso pra terminarmos aqui! -- seguiu para a cozinha

 

--Mas... a gente não tava se beijando aqui antes? -- não entendia -- Bem, vamos trocar lâmpada, caipira! -- levantou-se e foi até a área

 

--Aqui, amor! -- Clarice entregou a lâmpada -- Agora pega a escada pra subir que você é mais alta do que eu! -- ordenou brincalhona

 

--Aywah! (Sim!) Você manda. -- piscou para ela e foi pegar a escada -- Sahar, acredita que ontem apareceu um aluno lá no Departamento puxando briga com todo mundo porque disse que continuamos a esconder de todos que nosso planeta é cúbico? -- achava graça -- Falou que nem um deputado e depois foi embora porque ninguém deu confiança. -- pegou a lâmpada e subiu na escada -- Wana amil eh? (Fazer o que)?

 

--Ah, pelo amor de Deus! -- revirou os olhos -- É mais uma das coisas ridículas que veio no pacote do maldito Bozo! -- reclamou -- E falando em ignorância, você continua recebendo aqueles e-mails hostis? -- perguntou preocupada

 

--Diariamente! -- tirava a lâmpada queimada -- Outra coisa foi que o presidente atual, assim como o antigo interino, não me tirou da representação nas Nações Amigas. Porém, assim como no governo de Brener, eu nunca sou chamada pras reuniões. -- colocava a lâmpada nova -- Dah mumill! (Isso é um saco!)

 

--Injustiças, meu bem! Mas elas vão acabar um dia! -- Clarice recebeu a lâmpada queimada -- Vai chegar o momento em que eles vão te implorar pra colocar os pés numa reunião das Nações Amigas! -- colocou a lâmpada num saco para descarte -- Ah, se vai!

 

--Pode ter certeza disso! -- Valentina respondeu sem que elas pudessem ouvir -- Tenham paciência pois o tempo das ridicularizações ou restrições ao nome de Zinara vai acabar! -- prometeu

 

***

 

“Jasin. Yuulyu (Julho).

 

Foi em um mês de julho que eu comecei a escrever. O ano era 2016... Neste meio tempo, quanta coisa aconteceu! Fatos inacreditáveis ocorreram e mais uma vez nosso destino mudou. Estamos em 2019, vivendo em Cedro e, desta vez, livres da escravidão!

 

Trabalhávamos arduamente em campos de oliveiras, de tâmaras, de cannabis e na irrigação de solos secos para receber outras culturas. Mal tínhamos tempo de zelar por nossos filhos, que ficavam com ya Kira e Kalil, ambos poupados do trabalho nas lavouras. Ela, para ficar com todas as crianças e ele por ser deficiente físico. Ainda assim, imagino o desgaste de cuidar de cerca de vinte e cinco pequenos o dia inteiro e todos os dias.

 

Hana nos segredou que homens de uma ONG viriam nos socorrer e eles realmente vieram. Acompanhados por militares da Gália, invadiram o cativeiro em que vivíamos, trocaram tiros com os sequestradores e por fim nos libertaram. Foram quase quatro horas de terror, ao final das quais quase todos os traficantes foram mortos e três dos nossos partiram desta terra: dois camponeses Awazid, cujos nomes não sei, e ya Mustafá, o professor. Que Allah os conserve!

 

Agora discutimos sobre nosso futuro. Os membros da ONG nos falam de asilo político em outros países. Isso me lembra aquele sonho da viagem para um lugar distante... Será possível? Existirá um pequeno paraíso sem guerras onde possamos viver em paz?

 

Albii elli ken zaman fadhi, etmala e7sas mosh 3adi... (Meu coração que costuma ser vazio, foi preenchido por sentimentos incomuns...) Talvez, esperança, talvez fé!”

 

--Tenho notícias que talvez os interessem. -- Haifa falava a todos em voz bem alta -- Por favor, será que poderiam prestar atenção? -- pediu olhando para o grupo -- Chukran! (Obrigado!) -- agradeceu ao perceber que as pessoas silenciavam

 

A ONG de amparo às vítimas de guerra havia estabelecido um núcleo de apoio na cidade de Jasin, ocupando um terreno abandonado perto de um pequeno riacho. O terreno fora cercado por mourões e arame farpado, barracas de lona foram montadas e uma construção temporária de madeira servia de cozinha para preparação de alimentos. Havia cerca de oitenta refugiados no local.

 

--Recebemos um contato da sede da nossa ONG na capital -- Haifa dizia -- e eles nos informaram que foram procurados por ex representantes de relações internacionais de um país chamado Terra de Santa Cruz. -- olhava para os demais -- Há muitos compatriotas de Cedro e de Suriyyah vivendo lá e uma dessas pessoas é dona de uma imensa fazenda no coração do país. -- sentia-se feliz com as notícias -- Ela está disposta a receber refugiados daqui e lhes proporcionar a chance de uma nova vida. Assim como um dia foi feito com a família dela. -- pausou brevemente -- Mhma ha7ky elly fe 2lby w elly nefsy a2olo leeky mesh! (Não importa o quanto eu tente dizer o que está no meu coração, não conseguirei!) Mas, quando recebi este comunicado, fiquei realmente feliz! -- sorriu

 

--Terra de Santa Cruz! -- Hana sorriu para Sara -- E eu falo a língua de lá! Ana a’arfa! (Eu sei!) -- estava excitada

 

--Eu quero ir, maama! -- Elissa pediu inocentemente

 

--Own, awlaadii... (minha criança...) -- Hana sorriu para a filha -- Nós vamos discutir sobre isso com o clã, entendeu? -- explicou gentilmente

 

--É uma decisão muito individual, cada clã deve decidir por si, -- Haifa continuava -- mas eu os aconselharia a aceitar. Incrivelmente até mesmo o presidente de Suriyyah está disposto a oferecer recursos para viabilizar a viagem de navio. -- explicava empolgada

 

--Eu também quero ir, maama! -- Abdullah pediu a Khalayla

 

A jovem sorriu. -- Awlaadina (Nossas crianças) já estão seduzidas por este país tão distante! -- comentou sorridente com as outras mulheres

 

--Maama! -- Safia chamou gentilmente

 

--Choo, habibi? (O que, querida?) -- abaixou-se para ouvi-la melhor

 

--Mas2oleye sa3ba gedan konte 2d el ekhtebar. (Uma dura responsabilidade mas você a tomou para si.) -- olhava nos olhos da mãe -- Diga ao clã que devemos ir. Todos nós!

 

Sara congelou ao ouvi-la. “Baba me fala através de você, habibi?” -- pensou em estado de choque

 

--Giddu, gidda! (Vovô, vovó!) -- Kalil puxava as roupas dos avós -- Vamos embora! Terra de Santa Cruz é por nós! -- sorria -- Yaalah! (Vamos!) -- pediu

 

Emir e Kira se entreolharam surpresos.

 

E todas as crianças pediam a suas famílias que dissessem sim.

 

Youssef sorria.

 

 

CAPÍTULO 195 – Os Desejos do Coração

 

Lídia tomava um café na casa de Jamila e Cátia.

 

--E minhas novidades são essas. -- contava empolgada -- O estágio tá muito massa e se não abrir concurso pra estatal, eu vou buscar emprego numa dessas empresas contratadas só pra não ficar de fora do mercado, visse? -- olhava para as mulheres -- Pra adiantar já tô escrevendo a monografia e pro primeiro semestre do ano que vem basta defender e cursar a última eletiva que me falta. -- sorriu -- Aí tô formada!

 

--Que maravilha, Lídia! -- Cátia sentia-se orgulhosa -- Você não sabe o quanto te rever e ouvir essas novidades me deixam feliz! -- olhou para Jamila -- E pensar que quando conheci essa menina, ainda nem tinha entrado pra faculdade! -- sorriu

 

--É bom acompanhar as pessoas evoluindo! -- a advogada gostava de ver aquela felicidade -- Da mesma forma será você! -- olhou para a irmã -- Tem sido meu braço direito no escritório e vai fazer bonito lá no Kanatá!

 

--Deus te ouça! -- Leonor desejou -- Tão logo sinta que o escritório emplacou de vez e consiga vender o apartamento de Cidade Restinga, pego o avião e vou mimbora! -- contou seus planos

 

--É preciso coragem pra mudar assim! -- Lídia falou para Leonor -- Torço com sinceridade pra seus planos darem certo! Se seu coração realmente deseja, que assim seja!

 

--Assim como os desejos do coração de cada uma de nós! -- Cátia desejou erguendo brevemente a xícara de café -- Vocês duas vão conseguir tudo que desejam, se Deus quiser! E Jamila e eu vamos conseguir adotar nossa pequena Júlia, o escritório de advocacia vai bombar e meu mandato sindical vai terminar muito bem em janeiro! -- olhava para as outras mulheres

 

--Vocês fizeram grandes mudanças naquele Sindicato, amor! -- a advogada fez um carinho no braço da outra -- A próxima gestão vai receber um tesouro ao invés da bomba que vocês herdaram! -- enfatizou -- Sem contar que vocês fizeram um trabalho político muito bom, diante do que se podia fazer no contexto em que vivemos!

 

--As duas, né? -- Lídia comentou bem humorada -- Virava e mexia, eu via notícias de uma, de outra ou das duas na TV ou na internet! -- bebeu um gole de café

 

--Nós duas ainda tamos muito atrás delas, mas tem potencial aqui! -- Leonor brincou com Lídia -- Vamos fazer um brinde cafeinado a esse quarteto de mulheres fodásticas reunidas aqui debaixo desse teto! -- levantou a xícara

 

--Timtim! -- as demais repetiram o gesto

 

***

 

Aisha entrevistava Úrsula para uma oportunidade de emprego na fazenda.

 

--Então quer dizer que você trabalhou aqui na época do hotel do Amestista? -- perguntou interessada

 

--Trabalhei, sim senhora! -- respondeu educadamente

 

--Por favor, me chame de você. -- pediu gentilmente -- Não sou muito dessa formalidade toda! -- fez um gesto despreocupado

 

--Como queira! -- balançou a cabeça -- Considero importante lhe assegurar que fui a funcionária mais longeva e conheço cada cantinho deste lugar! -- sorria como assistente de mágico -- É bem verdade que sua família tem feito algumas reformas e ajustes, mas ainda assim reitero que conheço muito bem o lugar. -- cruzou as pernas -- Inclusive até mesmo o Parque Nacional que fica tão perto da propriedade. -- suas maneiras eram impecáveis -- Praticamente no vosso quintal!

 

“Que mulher estranha!” -- Aisha pensava -- "Parece até que todos os gestos são friamente calculados!” -- reparava -- Você sabe que a nossa proposta hoje é bem diferente daquela do Ametista, não? -- debruçou-se sobre a mesa -- Nós pretendemos manter a hotelaria, mas com foco nos eco turistas, sem aquela coisa de luxo, e também voltaremos a nos dedicar ao plantio, aos poucos introduzindo a criação de animais... -- prestava atenção nas reações da outra -- Mais importante de tudo é que teremos toda a área leste voltada à moradia dos refugiados que pretendemos abrigar aqui. -- contava -- Hoje estimamos ter capacidade de receber no máximo umas 70, 80 pessoas, mas com o tempo, talvez esse número cresça. -- pausou brevemente -- Mamii pensa em comprar as terras improdutivas que um latifundiário mantém aqui do lado, mas isso é coisa pro futuro.

 

--Estou a par, sim, e sou completamente fascinada por essa proposta! -- falava com sinceridade -- Amo este lugar e voltar a trabalhar nessa fazenda é tudo que meu coração deseja! -- continuava sorrindo mecanicamente

 

--Você viu que nossa proposta salarial é modesta. -- foi direto ao ponto -- Não por ganância, mas porque por ora não temos condição de oferecer algo melhor.

 

--Eu recebia muito menos nos outros postos de trabalho que ocupei desde que fui demitida daqui. -- informou com franqueza -- "E nos tempos do Ametista não recebia todos os benefícios que vocês tão oferecendo!” -- pensou

 

--Eu tô muito propensa a te contratar, Úrsula, mas quero te fazer uma pergunta que considero importante. -- pausou brevemente -- Talvez nem devesse, porque certos assuntos não devem se misturar com trabalho, mas... -- continuava reparando na mulher -- Você tem algum tipo de... restrição com pessoas LGBT?

 

--Restrição?! -- levou um susto -- Ora, claro que não! -- exibia quase todos os dentes em seu sorriso forçado -- "Se ela soubesse o quanto gosto de uma boa bucet* não me perguntava um trem desse!” -- pensou com vontade de rir

 

--Ótimo! -- respondeu animada -- Agora só mais uma última coisinha pra eu te contratar com chave de ouro? -- pediu 

 

--Pois não. -- ajeitou-se na cadeira -- "Me contrata, me contrata, me contrata!” -- pedia mentalmente

 

--Será que você poderia se comportar só um pouquinho mais... natural? Tipo assim, você mesma? -- gesticulou -- Que seja educada, trabalhadeira e tals, mas esse modus operandi de assistente de mágico não dá, né, fi?

 

--Puta que pariu, primeiro lugar de trabalho onde eu posso ser eu mesma! Uhu! -- deu um soco na mesa e gritou ao se levantar -- Aí, patroa, -- olhou para a outra -- pode acreditar que eu sou trabalhadeira, pego o caralh* a quatro pra fazer e dou conta das porr* toda! -- gesticulava -- E além de tudo, o lugar é gay friendly, que foda! -- sorria e dançava -- Confia em mim, que é nóis! -- deu um soquinho no ar -- Botar pra fuder e fazer dessa fazenda um lugar do cara... -- soltou um arroto -- Ih! -- cobriu os lábios com as mãos -- Foi mal... -- pediu envergonhada

 

Aisha estava impressionada com tamanha mudança. -- Seja você mesma, só que... -- acabou rindo brevemente -- se puder ser menos... escandalosa do que isso, até que vai bem, viu, fi? De preferência sem arrotar! -- brincou

 

A mulher apenas confirmou balançando a cabeça timidamente.

 

--Agora vamos resolver a parte burocrática da tua contratação! -- levantou-se da mesa -- Simbora, maluca! -- chamou

 

“Eu não acredito que voltei, caralh*!” -- pensava animada -- "E a patroa até que não é de se jogar fora, aí!” -- reparava em Aisha

 

***

 

--Minha Dona, acho que você não poderia ter escolhido um lugar melhor pra instalar isso aí! -- Marco falava para sua esposa -- Será quase que um emblema da fazenda! -- sorria

 

--A ideia é essa, meu amor! -- abraçou-o pela cintura -- Quero que todos que um dia ponham os pés nessa fazenda vejam o resumo de nossa história como um verdadeiro cartão postal! -- beijou-o

 

--E por que ainda não tiramos esse pano daí e expomos pra todo mundo ver? -- beijou-a também

 

--Porque ainda não é a hora, seu apressadinho! -- respondeu brincalhona -- No momento certo, vamos fazer a inauguração devida! -- sorriu -- Agora venha, meu bem, temos muito trabalho pela frente e eu quero que quando usritina (nossa família) chegar aqui em dezembro, esteja tudo perfeito!

 

--Tudo com você é perfeito! -- respondeu sedutor

 

--Ai, meu negão... -- beijou-o

 

***

 

--Minina, vai sê uma viaji pra ninguém butá defeitu! Mais nóis vai! -- Amina conversava ao telefone com a filha -- Najla mi falô qui dá inté gostu di vê comu qui Marco, Aisha, Nagibe, Cid e as muié delis labuta, num sabi?

 

--camma Najla quer deixar a fazenda perfeita pro final de ano, maama. Além do que, ela quer garantir que quando os refugiados chegarem, eles encontrem o verdadeiro paraíso na terra. -- contava -- Exatamente como encontramos no passado! -- lembrava das palavras de Youssef

 

--Inda é setembru e teu pai tá qui num si aguenta! -- comentou bem humorada -- Khadija e Cidmara também tão doida pra í!

 

--E ya sayyida (a senhora)? Sentindo muitas saudades? -- perguntou preocupada

 

A mulher pensou um pouco antes de responder. -- Eu sintu farta di Najla. Mi acustumei cum ela aqui mais nóis todu dia. Sintu sardadi dus meu fio também e das muié delis, comu sintu sardadi di Chede e Yasirah e vô sintí di Khadija e Cidmara. -- admitiu -- Mais nóis devi di querê qui as pessoa qui nóis ama seji livri pra buscá seus caminhu ondi quisé! -- falava com sinceridade -- Ocês tudu tão sempri dentru du meu coração! Num importa ondi vá vivê!

 

Zinara sorriu. -- Al2a nafsy b2ol lenafsy b7b feeky kteer 7agat, maama... (Eu descubro a mim mesma dizendo que amo muitas coisas na senhora, maama...) -- respondeu com ternura -- Seu coração é o mais belo abaixo de Deus!

 

Amina ficou toda prosa com o que ouviu. -- Uai, minina, qui é issu? -- sorriu emocionada

 

--E baba? Ele reage como a ya sayyida ou sofre mais?

 

--Eli disfarça mais sofri. -- olhava para o marido sem que ele percebesse -- Mais é o tempu. Vai si acustumá!

 

--Falando em se acostumar... -- começou a andar de um lado a outro da sala -- Ya sayyida acha que...?

 

--Fia! -- não a deixou concluir a frase -- Ocê dicidiu fazê o qui teu coração mandô, num foi? -- perguntou com carinho

 

--Aywah, maama! (Sim, mãe!) -- respondeu com a verdade -- Inteiramente!

 

--Intão num si amufini pensandu im nada mais! -- aconselhou -- A vida é tua! E ocê num tá fazendu mar a ninguém! -- falava sua opinião -- Eu façu muitu gosto! Fiz desdi o cumeçu, num sabi?

 

--Chukran, maama... (Obrigada, mãe...) -- ficou feliz com o que ouviu -- De verdade!

 

--Ocê é minha fia! Ti vê filiz é o qui mi faiz filiz!

 

Zinara não tinha palavras e sentia-se cada vez mais convicta de suas decisões.

 

***

 

--Você tem um bom currículo, Raquel! -- Leonor reparava admirada -- Só mesmo a fuleiragem que anda nesse país pra explicar porque ainda tá desempregada! -- olhou para a mulher

 

--Obrigada! -- agradeceu sorridente -- É uma realidade nova pra mim, mas tenho me esforçado pra mudar isso. -- respondeu com a verdade -- Nunca trabalhei num escritório de advocacia mas os princípios básicos de uma boa gestão são os mesmos sempre!

 

--Concordo! -- cruzou os braços e recostou na cadeira -- Eu tenho trabalhado aqui desde que minha irmã efetivamente montou o escritório, o que não faz muito tempo, mas te digo que muita coisa já aconteceu. Tenho sido o braço direito dela até então.

 

Raquel prestava atenção no que ouvia.

 

--Mas meus planos são passar uma temporada fora do país, de repente nem voltar, e pra isso tenho que encontrar alguém que tenha seriedade e competência suficientes pra deixar no meu lugar. Não quero de forma alguma largar minha irmã no aperreio!

 

--Claro que não! -- concordava com a outra

 

--Vamos fazer o seguinte então: -- ajeitou-se na cadeira e debruçou-se sobre a mesa -- você fica conosco por três meses! -- olhava para Raquel -- Se seu desempenho for bom, eu peço minha demissão e você assume o meu lugar!

 

Raquel engoliu em seco. -- Eu... -- estava nervosa -- Olha, pode acreditar que não vou decepcionar! -- garantiu gesticulando contidamente -- Tem minha palavra! -- sorriu

 

Balançou a cabeça sem nada dizer. -- Muito bom! -- estendeu a mão direita para a outra -- Você começa amanhã!

 

--Nossa! -- apertou a mão de Leonor -- Muito obrigada! Amanhã chego no primeiro horário! -- estava feliz -- "Ah, mas eu vou pedir pra Getúlio comprar dois galetos e um bolo de chocolate pra comemorar meu novo emprego!” -- pensou animada -- "É melhor comprar três galetos e dois bolos! Afinal de contas, eles vão querer comer também!” -- reconsiderou

 

***

 

A fazenda estava em festa. Após um período extenuante de pequenas obras e reparos por toda propriedade, o local se encontrava radiante da mesma forma como um dia se apresentou.

 

De forma atípica, os ipês roxos, amarelos e brancos ainda mantinham-se floridos. Caliandras vermelhas adornavam quase todos os lugares e o chuveirinho do serrado se mostrava belo perto do caminho para a cachoeira. Pássaros voavam despreocupados e o calor de dezembro se fazia agradável e convidativo para banhos de rio.

 

Janaína já havia chegado no começo do mês com Ahmed João e Hassan. Dias depois vieram, Amina e Raed com Khadija e Cidmara. Viajaram junto com Georgina, Catiúcia, Ahmed e os demais filhos dele.

 

No dia 21, Cecília e Raquel vieram com suas respectivas famílias. Ritinha e Zezé seguiram junto.

 

--Gentem, que lugar é esse?? -- Cecília rodava e olhava para todos os lados

 

--Ave Maria! -- o homem arregalou os olhos -- Nunca vi buniteza igual!

 

--Brincar, mamãe! Brincar! -- Davi e Salomão pulavam excitados

 

--Calma, criança! -- Rosa também olhava boquiaberta -- Que lindo!

 

--Mas que maravilha! -- Najla os recebia sorridente -- Vejo que chegaram muito bem!

 

--Eu ajudo com as malas! -- Marco sempre solícito -- Vem, Hassan, vem João! -- chamou e os rapazes obedeceram

 

--Cadê Khadija, tio? -- Deodoro perguntou de imediato

 

--Ói, eu! -- a menina se apresentou saindo de trás de uma árvore

 

--Oba! -- o menino correu para abraçá-la

 

--Brincar, mamãe! -- Isabel também pedia

 

--Aí, Princesa, que lugar responsa! -- Getúlio reparava -- A gatinha do moleque veio morar um bocado bem!

 

--E deve ter tanta comida boa por aqui! -- o estômago de Raquel roncava

 

--E Zinara, cadê? -- Georgina chegava perguntando curiosa -- Clarice, dona Leda...

 

--Elas têm umas coisas pra resolver. -- Ritinha respondeu reparando em tudo -- Mas eu acho que Zinara chega amanhã. -- olhou para Zezé -- Esse lugar é o paraíso, valei-me Nossa Senhora!

 

--Sorte nossa de poder vir! -- Zezé concordava com a amiga

 

--Todo mundo entrando e se acomodando! -- Najla convidou orgulhosa -- Preparem-se que vocês ainda vão ver muito mais!

 

--Criançada! Depois eu vou levar todo mundo pra tomar banho de cachoeira! -- Aisha apareceu fazendo farra -- Agita aí! -- batia palmas

 

--Oba!!! -- os pequenos gritaram

 

***

 

--GK, eu acho que teu pessoal tá todo aí! -- Aisha deu um tapinha no braço da prima -- Ouve e diz se faltou alguém: -- pegou uma lista -- vou poupar de ler os nominhos de usritina (nossa família) porque cê sabe que tá incluso, né? -- gesticulou -- Também não vou ler o nome do pessoal da tua prof fashion, porque considero usritina do mesmo jeito. -- pausou brevemente -- Se bem que ela e a mãe ainda não chegaram... Dona Ritinha e Zezé são usritina também, né?

 

--Ave Maria, lê, criatura! -- a caipira pediu agoniada

 

Achou graça. -- Vamos lá: mãe Agda, Rebeca e os pais, doutora Cláudia, marido e filha, dona Akemi... -- interrompeu a leitura -- Menina, essa mulher andou fazendo umas massagens aí que nem te conto! Janaína voltou pro quarto ontem que parecia uma walking dead!

 

--Quer continuar a ler, criatura? -- novamente se agoniou -- AHHa! -- acabou achando graça

 

--Eita, bicha apressada! -- riu brevemente -- Vamos ver, cadê? Ah, professor Werneck e esposa, professora Bernadete, Leonor, Cátia, Jamila e Júlia, Magali e Lúcia, Paula e Graziela... -- parou de ler e cochichou com a prima -- O brejo lacrou, hein, fi? -- brincou

 

--Aisha! -- reclamou de novo -- Dah JaHiim! (É um inferno!) -- cruzou os braços contrariada

 

A mulher riu e continuou. -- Fred e Gilson. -- concluiu -- Faltou alguém?

 

--Até faltou, mas elas não deram certeza mesmo. -- olhou para o irmão -- Ahmed, e os homens? -- perguntou esfregando as mãos -- Eles vêm amanhã mesmo?

 

--Elis mi garantiru, ocê podi ficá sussegada! -- afirmou com segurança

 

--camma Zina!! -- Ahmed Lucas gritava mais ao longe -- Óia! -- apontou para o céu -- Baba Noer! -- pulava

 

--Baba Noer! -- Cidmara gritou também

 

--AHHa e num é um licópteru? -- Ahmed perguntou intrigado

 

--Gentem, que babado é esse? -- Aisha ficou pasma -- E a criançada toda correndo pra ver, olha isso!

 

--Zinara, -- Najla veio galopando seu cavalo -- você sabe quem é que tá chegando nesse helicóptero? -- perguntou preocupada ao interromper o trote do animal -- Úrsula recebeu um comunicado do piloto mas não entendeu nada!

 

A astrônoma pensou um pouco e acabou dando uma gostosa risada. -- Macleech, camma! (Não se preocupe, tia!) -- olhava para a aeronave -- Acho que sei de quem se trata!

 

--Baba Noer, baba Noer! -- os pequenos pulavam e gritavam excitados

 

--Elis inda cridita im baba Noer! -- Ahmed Marcos comentou divertido -- Ispia! -- falava com Janaína

 

--Você não? -- a mulher perguntou provocando

 

--Oxe! -- franziu o cenho -- Issu é trem di criança, uai! Tô quasi adurtu! -- respondeu convicto -- Gostei foi dus licópteru! Massa!

 

Quando as hélices pararam de girar, piloto e co-piloto desceram e abriram as demais portas da aeronave.

 

--Opa, olha a criançada aí! -- Regina falou sorridente -- Jonas, Jorginho, queridos, descarreguem os presentinhos delas antes de nossas malas, por favor. -- pediu gentilmente

 

--Sim senhora! -- responderam juntos

 

--Você tem certeza que trouxemos presentes pra todas, amor? -- Sarita perguntou preocupada -- Olha quanta criança vem correndo aí!

 

--Eu sondei Zinara e peguei o nome de todo mundo! Crianças, semi crianças e adolescentes! -- piscou para a esposa -- Vamos entregar e fazer uma algazarra!

 

--Mastô, Rosinha, vem ver isso! -- Cecília apontou para a aeronave -- Veio até gente de helicóptero!

 

--Quer ir ver! -- Davi agarrou numa perna de Adamastor

 

--Quer ir! -- Salomão fez o mesmo

 

--Simbora, criança! -- o homem seguiu com os dois se divertindo

 

Rosa olhou para Cecília com olhos infantis.

 

--Vamo também, bobinha! -- a mulher decidiu -- Aprende comigo: nunca se perde uma boa fofoca! -- as duas foram

 

--Oxe, qui as muié troxeru foi um tantão di presenti! -- Ahmed estava boquiaberto

 

“Por isso que elas vieram num Super Puma!” -- Zinara pensou boquiaberta -- "Helicóptero de transporte de tropa!”

 

--Khadija! -- Sarita chamava -- Deodoro! -- lia os nomes -- Isabel!

 

--Ahmed Lucas... -- Regina também lia -- Ahmed Mateus...

 

--Vai lá, fio! -- Catiúcia estimulou

 

--Yasirah! -- Sarita continuava lendo -- Chede! Júlia!

 

--Davi, Salomão, Cidmara... -- Regina continuava lendo -- Corre, criança! Chegou o natal com duas mamãe Noel! -- riu gostosamente -- Eu já gosto dessa farra!

 

--Tua irmã num é fácir! -- Dora comentou para o marido admirada -- Inté mamãe Noer ela mi arruma! -- comentou divertida

 

--Foi essa as muié qui mi achô im Paulicéia, homi? -- Penha perguntou curiosa

 

--Devi di sê! -- Cid respondeu pensativo -- "Nunca vi as muié!”

 

--Ahmed Marcos! -- Sarita chamou

 

--Eu?? -- o jovem arregalou os olhos -- Tô indu! -- saiu correndo -- Maama Noer, maama Noer! -- gritou excitado

 

--Ó o quase adurtu aí... -- Janaína comentou divertida

 

--Ahmed João! Hassan! -- Regina chamava -- Rebeca!

 

Os jovens se entreolharam e saíram correndo animados.

 

--Ispia comu vão ligêru! -- Georgina comentou divertida

 

--Vocês sabiam que ia ter isso? -- Judite estava pasma -- "Meu Deus, esse pessoal é incrível!” -- pensou

 

--Bruna! -- Regina chamou

 

--Mãe, até eu! -- olhou para Cláudia -- Me dei bem! -- saiu correndo

 

A médica riu divertida.

 

--Rosa! -- Sarita gritou

 

--Sou eu, sou eu!! -- a jovem ficou pulando

 

--Vai lá, menina! -- Ritinha incentivou

 

--Como pode, né, amor? -- Adamastor comentou com a esposa -- Apesar de tudo, ela ainda guarda uma menina dentro de si. -- reparava na jovem correndo até o helicóptero

 

--Roubaram a infância dela, meu bem. -- abraçou-o pelos ombros -- Vamos tentar recuperar o que sobrou. -- deu um beijo no rosto dele

 

***

 

--Mamãe, olha isso! -- Clarice deslumbrou-se ao descer do carro -- Que lugar maravilhoso! -- reparava -- Olha quantas flores, meu Deus! -- sorriu -- Não me admira que eles quisessem tanto recuperar essa fazenda de volta!

 

--É linda mesmo! -- Leda concordava -- Benza-te, Deus! -- balançou a cabeça

 

--Ya Leda! Clarice! -- Najla veio recebê-las com um belo sorriso -- Só faltavam vocês! -- abraçou uma de cada vez

 

--Olha quem chegou! -- Aisha vinha com Janaína e Marco -- Pronto, agora a lista completou! -- falava animada

 

--Que saudade! -- a professora cumprimentou a todos -- E Zinara? -- estranhou não vê-la chegar -- Cadê todo mundo?

 

--A correria tá grande, comadre! -- Janaína pegava a mala de Leda -- Tá todo mundo no batente pra organizar a festa de natal! -- sorria

 

--É isso mesmo, habibi! -- Najla deu o braço a Leda -- Daqui a pouco você reencontra o seu amor. -- cochichou com a professora

 

--Eu tenho muita fofoca pra botar em dia contigo e Amina! -- a idosa comentou para Najla -- O caminho pra chegar aqui é bonito! Uma estrada limpinha e quase sem carro nenhum!

 

--Deixa que eu levo suas bagagens. -- Marco ajudou a paleoceanógrafa

 

“Essa fazenda deve ser mesmo muito especial...” -- Clarice pensou um tanto decepcionada -- "Pra Zinara nem vir me receber...” -- seguia acompanhando os outros

 

***

 

--Aqui é um verdadeiro hotel! -- Leda comentou enquanto apreciava a paisagem da varanda -- Coisa linda! -- sorria -- Olha lá as crianças se acabando de brincar! -- apontou -- Meu Deus, vem ver isso! Sua irmã tá comendo uma bacia inteira daquela fruta, como chama? É cagaita? -- não lembrava -- Eu acho que aquilo dá piriri!

 

Clarice aproximou-se da mãe e observou a paisagem junto com ela sem se importar muito com o que dizia. -- Tá tudo lindo, tudo maravilhoso, mas Zinara tá tão estranha... Ela mal me deu cinco minutos de atenção... -- abaixou a cabeça

 

--Mas você é cismada, hein? -- deu um tapinha no braço da filha -- Já reparou em quanta gente tem aqui? -- virou-se de frente para a filha -- Até agora ainda não me dei conta de todo mundo que tá nessa fazenda!

 

--E o que isso tem a ver com a atitude dela? -- perguntou sem entender

 

--O que tem a ver? Como assim o que tem a ver, menina? -- cruzou os braços contrariada -- Ela é da família, tem que ajudar a receber, a dar atenção... E é a primeira vez que a fazenda recebe esse povaréu todo desde que a família recuperou ela. -- pegou o pulso da filha e viu as horas no relógio dela -- Trate de ir pro seu quarto, tomar banho e se arrumar muito da bem arrumada porque tá na hora!

 

Não entendeu. -- Hora de que, mamãe? -- olhou espantada para ela -- Hoje não é véspera de natal, é dia 23!

 

--Mas você já reparou que tudo aqui tá chique, né? -- pegou a filha pela mão e foi puxando -- Então não vá me fazer passar vergonha e trate de ir se arrumar! -- seguia para a porta do quarto -- Eu vou pegar o celular e dar um carão em Raquel que em vez de encher a cara de cagaita tinha era que se aprontar também! -- reclamou – "E essas crianças também têm que se preparar!” -- pensou

 

--Eu não tô entendendo a senhora!

 

Abriu a porta do quarto e colocou Clarice para fora. -- Tem que entender nada! Ainda sou sua mãe e quem manda aqui sou eu! -- apontou a direção do quarto da filha -- Vá se aprontar e não me desobedeça! Quero te ver o mais linda possível! -- ordenou -- Ai, ai, ai!

 

--Eu hein... -- seguiu para o seu quarto contrariada -- Parece que depois que chega aqui, todo mundo endoida! -- resmungou consigo mesma

 

***

 

Às oito da noite, Leda e Clarice seguiam para uma área aberta da fazenda, ao final da vila de casas, onde muitas lonas brancas foram esticadas para formar uma cobertura. A decoração era simples mas de muito bom gosto. Luzes de cor rosa e lilás refletiam nas lonas de forma alternada, promovendo uma bela visão sob o céu limpo e estrelado que se apresentava. Flores de tipos e cores diversas adornavam o local. Um conjunto de mesas foi montado no formato de uma letra U, em cujo centro carpetes e almofadas de cor vermelho carmim ornavam harmoniosamente. Iguarias de Cedro, Guaiás e Cidade Restinga recém postas nas mesas aguardavam pelos convidados.

 

A paleoceanógrafa reparou que homens que ela não conhecia afinavam seus instrumentos musicais ao lado de caixas de som. Ocupavam um pequeno espaço do lado direito, a curta distância das mesas.

 

--Nossa! -- olhou surpreendida para Leda -- Que lindo! Vai ter festa de que hoje? -- não tinha ideia -- Olha só, Ahmed vai tocar com aqueles homens!

 

--Não sei. Deve ser uma festa de boas vindas que Najla vai dar pra gente!

 

Clarice então reparou que toda a família que considerava sua se apresentava bem arrumada e parecia aguardá-la. Estavam sentandos em cadeiras posicionadas em fileiras próximas às mesas e de frente para um pequeno púlpito, onde Agda arrumava pequenas flores brancas. Com surpresa também percebeu a presença de Akemi, Werneck e a esposa, Bernadete, Paula, Graziela, Fred e Gilson, bem como suas amigas Magali e Lúcia.

 

--Meu Deus, até Cátia, Jamila... -- arregalou os olhos -- Regina e Sarita, é isso mesmo? -- olhou para a mãe -- Mas o que...?

 

Nisso, Ahmed falou em voz alta: -- Simbora, cambada!

 

E a música começou.

 

--Eeeu... te vi e já te quis, -- Zinara surge cantando -- me vi, tão feliz...

 

--Um amor que pra mim era sonho... -- Ahmed e os músicos faziam corinho

 

--Surpreendente provar, do que eu só ouvi falar e você, resolveu me mostrar... -- a astrônoma cantava com emoção

 

--Mamãe... -- Clarice olhou para a idosa com lágrimas nos olhos

 

--A festa é pra você, meu amor! -- Leda respondeu carinhosa

 

--Logo eu que nem pensava, eu não imaginava, te merecer... -- Zinara se aproximava lentamente do amor de sua vida -- E agora sou a dona desse amor, -- olhava nos olhos -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viveeer... -- estendeu a mão para ela -- o resto dessa vida com você... -- sorria

 

--Ai... -- segurou a mão da astrônoma -- Minha caipirinha... -- suspirou

 

--Eu nunca qui discunfiei qui minha cunhada era muié qui nem Aisha e Janaína, mas qué sabê? Ligu não... Ela é muitu boa pra nóis! -- Dora comentava com Penha e Catiúcia -- E a muié qui ela isculheu também é boa genti, num sabi?

 

As outras concordavam.

 

--Cá pra nós, fico feliz em saber que vocês são tolerantes. -- Judite cochichava com Georgina -- Minha irmã caçula é lésbica e cansei de brigar com os outros na adolescência por causa dela.

 

--Já vi qui ocê é das minha! -- Georgina respondeu satisfeita

 

--Te vi e já te quis, me vi tão feliz, -- Zinara continuava cantando e dançava com sua amada -- um amor que pra mim era sonho...

 

--Ai... -- a paleoceanógrafa suspirava como que enfeitiçada

 

--Eu achava qui tudu era só coisa di muié... -- Raed comentou com a esposa -- Mais agora qui eu sei...

 

--Faiz diferença? -- Amina perguntou de súbito

 

--Anêim... -- balançou a cabeça negativamente -- Hoji num faiz mais...

 

--Logo eu que nem pensava, eu não imaginava, te merecer... -- Zinara e Clarice dançavam juntas


--E agora sou a dona desse amor, -- o corinho cantava -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver...

 

--Como pode isso, Ceci? -- Rosa perguntou surpreendida -- Duas mulheres se amar esse tanto...

 

--O amor não tem regras, meu bem! -- a mulher respondeu sorridente -- Não nos cabe julgar.

 

--Amor, tô boba! -- Magali comentou surpreendida -- A caipira teve peito e atitude!

 

--Se teve! -- Lúcia concordou

 

--O resto dessa vida com você... -- Zinara cantava para sua amada -- Com voocê, iêiêê...

 

--Eu não sabia que ela cantava! -- Cátia comentou com Júlia no colo -- E canta bem! -- admirou-se

 

--Canta... Inclusive pra mulherada, querendo tchu! -- Jamila se lembrou do episódio

 

Cátia ficou sem entender.

 

--E agora sou a dona desse amor, -- o corinho continuava cantando -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver...

 

Khadija e Deodoro se aproximaram de mãos dadas. -- camma? -- a menina estendeu uma caixinha para a tia

 

Zinara lentamente interrompeu a dança, parou de cantar e fez sinal para a banda continuar. Recebeu a caixinha das mãos da sobrinha e soprou um beijo para as crianças, que se afastaram correndo.

 

--Você sabia de Zinara e Clarice? -- Bernadete cochichou com Werneck -- Nunca maldei...

 

--Sabia desde um lance que aconteceu no passado. -- lembrava-se do sumiço de Leda -- E preferi assim! Não queria que Zinara sofresse por se apaixonar por mim. Sou comprometido! -- considerou

 

--Oxe! -- a mulher exclamou revoltada -- "Bicho presunçuso!” -- pensou

 

--E agora sou a dona desse amor, -- o corinho cantava -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver, o resto dessa vida...

 

--Um dia, uma pessoa muito especial me perguntou: -- olhava nos olhos da amada -- Albik 3ayez eih? Bye7lam beh, 2oli? (O que o seu coração deseja? O que ele sonha, me diga?) Liberte-o! -- repetiu as palavras de Najla -- E aquelas palavras mudaram tudo pra mim! Elas me despertaram de vez! E sabe por que? -- desabafava -- Porque me dei conta que passei a vida inteira fingindo ser o que não sou! -- emocionou-se -- Passei a vida me escondendo! Primeiro das bombas e dos soldados, depois das críticas, do preconceito e de uma das coisas que eu mais tenho medo na vida: rejeição! -- confessou -- Passei a vida mentindo pra esconder cada vez que amei, que sofri por amor, que me iludi... E então veio você, que eu amo como nunca amei ninguém e que me aceitou do jeito como sou! Você, que me ensinou a amanhecer e a limpar o meu coração! Você que mudou tudo em mim e mudou tudo por mim... mas eu continuei escondida; até agora!

 

Clarice chorava. -- Eu também sempre vivi assim... me escondendo, fingindo... -- assumiu

 

--Essas meninas já sofreram demais... -- Zezé considerou comovida -- Deixa elas ser feliz do jeito delas, né? -- olhou para Ritinha

 

--Tá certo... -- a idosa concordou

 

--Ai, ai, meu Deus, é tudo tão emocionante, tão lindo! -- Grazi chorava e gritava -- É tudo culpa desse preconceito, dessa homofobia! -- lamentava -- AHAHAH! Ai, meu Deus, por que, por que? AHAHAH!!!

 

--Calma, meu bem! -- Paula pediu aflita

 

--Quer parar de me fazer passar vergonha, mulher? -- Cláudia beliscou a amiga -- Eu hein! -- fez cara feia

 

--E agora sou a dona desse amor, -- o corinho cantava -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver, o resto dessa vida com você...

 

--Você é tudo que meu coração deseja, Sahar! É tudo que me falta! -- abriu a caixinha e se ajoelhou

 

--Gentem, arrasou!!! -- Aisha bateu palmas excitada -- Uhu! -- gritou

 

--Foda, cara! -- Úrsula vibrava -- Eu fiquei aqui pensando, -- olhou para Aisha -- você, eu, não acha que... Ai! -- sentiu uma dor no pescoço

 

--Não acha muito, não, que eu acho também! -- Janaína apertava o pescoço da outra

 

--Já dividimos uma vida, moramos juntas, mas eu quero casar com você, Sahar! -- ofereceu as alianças

 

--Ai... -- Clarice sentia o coração a ponto de explodir

 

--E agora sou a dona desse amor, -- o corinho cantava -- eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver, o resto dessa vida...

 

--Moram junta? -- Getúlio se surpreendeu -- Aí, gata, -- olhou para a esposa -- eu bem que desconfiava... Essa amizade toda só podia ser...

 

--Ocê discunfiava mais e aí? -- Nagibe segurou-o por um dos ombros -- Qué dizê o que? -- estava sentado atrás de Getúlio -- Só pudia sê o que?

 

--O que? -- Cid segurou o outro ombro -- Ocê vai dizê qui é o que? -- fazia cara feia

 

--Aí, malandrage, a gente vive junto, -- apontou para si e para Raquel -- a gente se dá bem, não desejamos mal a quase ninguém, tá ligado? -- falava com medo -- A gente vai a luta e conhece a dor! Consideramos justa TODA forma de amor! -- olhava para trás com o canto dos olhos -- É o que eu ia dizer, cumpadi!

 

--Ah, intão tá intão! -- Nagibe deu-lhe um tapão no ombro

 

--Tá intão! -- Cid deu um tapão no outro ombro

 

--Porr* de caipira das mão pesada! -- reclamou sentindo dor

 

Raquel apenas revirou os olhos.

 

--E não me interessa o que digam, o que pensem, os julgamentos... Que nos critiquem ou rejeitem! -- falava com firmeza -- Quem nos ama, vai nos aceitar como somos! Não temos satisfações a dar a ninguém, somente à Deus por nossos atos! -- beijou uma das mãos dela -- Logo eu, que não pensava, eu não imaginava... -- recitou

 

--Te merecer... -- o corinho cantava

 

--Agora quero ser a DONA desse amor! -- continuava recitando -- Eu, nem quero saber porque, eu só preciso viver o resto dessa vida com você!

 

--Com você... êiê... -- cantavam

 

--Você aceita, Sahar? -- pediu humildemente

 

--Aceitei desde que ouvi sua voz pela primeira vez, meu amor! -- pegou a caixinha da mão da outra -- Sim, aywah, sí, ja, yes, oui... -- puxou-a para que se levantasse -- Em todas as línguas! -- chorava -- Eu não quero me esconder mais, digam o que disserem! -- tocou o rosto da astrônoma com uma das mãos -- Nunca mais! -- beijou-a apaixonadamente

 

--Aaai, arrasou!! -- Fred se levantou gritando -- Xiita, você merece tudo, sua maluca! -- olhou para todos -- Solta a franga, gente! É a comu LGBT na roça!! -- gesticulava

 

--Uhuu!! -- Gilson, Cátia, Jamila, Magali, Lúcia, Graziela, Paula, Aisha, Janaína, Úrsula, Sarita e Regina gritaram juntas

 

--Oxe! -- Adamastor arregalou os olhos

 

--Casamento diferente, né? -- a fisioterapeuta falava consigo mesma -- Gostou! -- sorriu -- Akemi simpatiza a causa!

 

--O resto dessa vida... com vocêê... -- o grupo encerrava a canção

 Jorge & Mateus - Logo Eu [a]

 

“Sim, Kitaabii, eu não queria mais viver daquele jeito, trancada dentro de mim, escondida, mentindo, fingindo e disfarçando meus sentimentos, minha identidade e meu amor por Sahar. Foram muitos anos chorando sem lágrimas, gritando sem palavras, mostrando aos outros somente a parte de mim que seria aceita segundo os padrões sociais. Chega! Eu não podia mais tolerar isso! Não era justo com Sahar, não era justo comigo!

 

Por tantos anos tive medo da rejeição de usritii (minha família), de meus amigos e colegas de trabalho. Tive medo da agressão, do deboche, das perdas... Mas se eu era agredida e desacreditada por minhas convicções científicas e espirituais e ainda assim estava viva e firme, por que então ter medo das consequências de ser eu mesma, sob todos os aspectos? Quando olhei para dentro de mim e entreguei o futuro nas mãos de Deus, encarei tudo e decidi propor Sahar em casamento diante de todos. Eu tinha o apoio de camma Najla, de maama, de ya Leda e acabei descobrindo ao final que tinha o apoio de todos aqueles que amo.

 

Ao fim, descobri que a rejeição que eu tanto temia vinha primeiramente de mim mesma. Quando definitivamente me aceitei e aprendi a me amar como sou, as correntes foram rompidas e pude finalmente sentir o gostinho da liberdade.

 

“Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!”, como disse a poetisa.

 

Amor e liberdade... eu agora tinha os dois, Kitaabii. Estava finalmente completa!”

 

***

 

--E agora, depois de ter celebrado um casamento maravilhoso, peço pra nossa querida mãe Agda inaugurar um símbolo muito importante pra usritina (nossa família). -- olhou para a mulher -- Por favor, querida! -- Najla pediu sorridente

 

--E qui Deus traga muita luiz pra essa famia! -- Agda puxou o pano -- Ora Yê Yê Ô, Oxum! -- saudou a mãe orixá cuja bênção invocava

 

--Ai, amor, olha!! -- Clarice apontou excitada -- Meu nome tá do lado do seu! -- sorria feliz

 

--Smallah! -- Zinara sorriu admirada

 

--Eu tô lá, olha amor! -- Janaína apontava também -- Que massa! -- pulava que nem criança

 

--Mamii, que ideia maravilhosa! -- Aisha bateu uma palma -- Ih, meu Deus, meu padrasto também aparece, olha só! -- brincou com Marco

 

--Minha Dona providenciou uma pequena atualização na árvore genealógica da família. -- respondeu orgulhoso -- E eu adorei! -- sorriu -- Muito melhor do que quando estava no Clube Cedro-Suriyyah!

 

--Um dia, meu nome vai tá lá do lado do seu nessa árvore! -- Deodoro segurou a mão de Khadija -- Wallahi! (Eu juro!)

 

--Qui lindu! -- a menina se emocionou -- Eli sabi! -- deu um beijinho no rosto dele

 

--Eu também quero ver teu nome do lado do meu, visse? -- Hassan olhou para Rebeca -- É só a gente se formar na faculdade!

 

--Hum, que fofo! -- a jovem o beijou nos lábios

 

--Ei, e ocês dois aí? -- Cid cruzou os braços bem humorado -- Qui chamegu é essi? -- reparou que Yasirah e Davi estavam de mãos dadas

 

--Maídu! -- a menina respondeu sorrindo

 

--Mulé! -- o menino confirmou animado

 

--E eu? -- Salomão perguntou procurando esposa -- Num tem!

 

--Oxe, espie pra isso! -- Adamastor comentou admirado -- Essas crianças... -- riu

 

--É... vejo que o destino da minha família é se unir com a família de Zinara! -- Cecília comentou sorridente -- De uma forma ou de outra...

 

 

CAPÍTULO 196 – Finalmente: A Paz

 

“Berytus. Disembi (Dezembro).

 

Finalmente chegou o dia! Fomos transladados para Berytus e seguiremos rumo ao porto para embarcar com destino a Terra de Santa Cruz. Não sei explicar como me sinto; nos últimos anos, tudo em minha vida tem sido inexplicável.

 

A grande maioria de nós dissemos sim ao convite da Mãe Gentil. No entanto, cerca de 15 pessoas preferiram tentar a vida na Gália. A embarcação ainda assim será a mesma. E eu mal me aguento de ansiedade... Safia e as outras crianças sequer conseguiram dormir na véspera da viagem.

 

W gay a2olek bebtesama men albii: chukran, Terra de Santa Cruz, chukran! (E estou indo para dizer a você com um sorriso de meu coração: obrigado, Terra de Santa Cruz, obrigado!)”

 

--Esse navio está lotado! Dah JaHiim! (É um inferno!) -- Emir reclamava -- Imagine seguir daqui até Terra de Santa Cruz nestas condições! -- reparava no excesso de lotação do navio -- Se é que conseguiremos chegar vivos! Navio imundo!

 

--Não diga isso, zogii (meu marido)! -- Kira pediu -- Temos que ter fé! Tudo vai dar certo! -- desejou

 

--A maioria destes refugiados desembarcarão na Gália! -- Sara afirmou -- Somente cerca de 65 pessoas, e mais a tripulação do navio, seguiremos para Terra de Santa Cruz. -- olhava para os seus -- Eles preferem a Gália porque é mais perto de Suriyyah. Talvez pensam em retornar um dia... Wana amil eh? (Fazer o que?)

 

--Mas da onde veio toda essa gente? -- Kalil perguntou curioso -- No acampamento de Jasin não vi tantas pessoas! Multidões me agonizam! Ana xaafa! (Estou com medo!)

 

--Macleech, awlaad! (Não se preocupe, criança!) -- Hana tentava tranquilizá-lo -- Estas pessoas são refugiadas como nós, mas estavam abrigadas em acampamentos diversos ao redor de Cedro. -- explicou -- São nossas compatriotas! E logo desembarcarão quando o navio aportar na Gália, daqui a dois ou três dias.

 

--Eu me sinto tão feliz! -- Khalayla dizia excitada -- Abdullah e eu passamos a noite acordados fazendo planos, não é verdade, awlaadii (minha criança)?

 

--Aywah, maama! (Sim, mamãe!) -- o menino respondeu animado

 

--Ana mabsoutah, maama! (Estou feliz, mamãe!) -- Elissa falou para Hana, que a abraçou

 

--E você, Safia? -- Sara perguntou para sua filha -- Está feliz também? -- levantou-a no colo

 

--Ysma3 raby menk maama w ynawerny ana! (Deus deve ter lhe ouvido mamãe e me iluminou!) -- respondeu simplesmente -- Agora eu irei! -- sorriu para a mãe

 

Sara não entendeu aquela resposta.

 

“Minha filha estava sempre a me surpreender. Às vezes era tão criança como sua idade pede e em outras parecia ter vivido além dos anos. Sua confiança e serenidade com aquela viagem difícil e desconfortável para Terra de Santa Cruz era tamanha, que me fazia acreditar que depois de tanto tempo, finalmente encontraríamos a paz!”

 

--Youssef... -- Khaled olhou para o irmão -- Não sei como explicar, mas depois de tanto, tanto tempo eu acho que finalmente... -- emocionou-se -- Finalmente encontrei o que procuro desesperadamente... -- derramou uma lágrima de alegria -- Minha paz! -- sorriu -- Deus é grande, grande! Akbar, akbar! (Grande, grande!) -- louvava

 

Youssef sorriu satisfeito para o irmão. -- Guarda agora tua paz onde ela não pode ser perdida. Como disse o Rabi: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; eu vos dou a Paz de Deus que o mundo não pode dar. Não se turbe o vosso coração, nem se arreceie”. -- citou um versículo de João -- Creia que Zinara e eu sonhamos em vê-lo assim por todos estes anos! -- afirmou emocionado -- Entendo que deveríamos deixa-la saber...

 

***

 

Na véspera da virada do ano, uma parte dos presentes na fazenda tomava banho de rio, enquanto muitos providenciavam o que seria a festa de réveillon e os demais se dividiam em outras atividade prazerosas.

 

--camma Zina, qual é a pedra que paínho, camm Youssef e ya sayyida (senhora) pulavam pra cair nesse rio? -- Hassan perguntou curioso

 

--Aquela! -- a astrônoma apontou simplesmente -- E sabe quem nos ensinou a pular de lá? -- fez um suspense

 

--Euzinha! -- Aisha respondeu dançando na água -- Só que hoje em dia falta coragem, né gentem? -- gesticulou -- Afinal, a bichinha aqui é bem apanhada mas já passou dos quarenta e tantos, né? -- não revelou a idade

 

Janaína simplesmente arregalou os olhos.

 

--Meu Deus, mas é muito alto! -- Clarice chocou -- Sou aventureira mas não tenho coragem!

 

--Anêim eu! -- Khadija respondeu reparando

 

--E eu! -- Deodoro concordou com ela

 

--Ah, eu queria ir! -- Hassan pediu -- Pode, maínha? camma Zina vai! -- olhava para Georgina

 

--Ai, eu também quero! -- Rebeca respondeu excitada -- Tia Zinara vai com a gente!

 

--Uai, mas tua tia anêim dissi nada! -- Georgina retrucou

 

--Eu vou! -- a astrônoma respondeu empolgada -- A’jabani haqqan! (Eu gosto muito!)

 

--Zinara!! -- Clarice e Cláudia ralharam ao mesmo tempo

 

--Uai? -- Zinara levantou os braços se defendendo -- Os sobrinhos pedem, não se pode negar a eles esse prazer! -- respondeu fingindo inocência

 

--Eu também queru í! -- Ahmed Marcos decidiu -- Pode baba?

 

--E eu! -- Ahmed Lucas pediu

 

--Também! -- Ahmed João levantou a mão -- Baba!

 

--Eu, eu!! -- Ahmed Mateus pediu

 

--Avi Maria! -- Ahmed cruzou os braços contrariado -- Podi í, menus Ahmed Mateus, qui inda é muitu novu! -- decidiu -- E só vão si Zinara fô! -- olhou para a irmã -- "Eu qui num pulu dali!” -- pensou

 

--Ah, baba... -- Mateus reclamou

 

--Teu pai falô, mininu! -- Catiúcia ralhou -- Num vai e fim!

 

--Posso ir, Ceci? -- Rosa pediu animada -- Posso?

 

--E o exemplo pro teus meninos, garota? -- Adamastor respondeu contrariado com a ideia

 

--Eles não vai! -- a jovem proibiu olhando para os filhos -- Ai, ai, ai! -- fez sinal negativo com o dedo

 

--Ai, meus deuses! -- Cecília deu um mergulho rápido -- Vamos deixar ela ir, Mastô! -- pediu -- Uma vez e se Zinara for mesmo!

 

--Tá bom... -- o homem aceitou sem gostar muito

 

--Oba! -- Rosa pulava animada

 

--Bruna, você nem sonhe em me pedir! -- Cláudia advertiu de cara feia

 

A jovem nada respondeu.

 

--Eu queru í, camma! -- Cidmara pediu -- Queru í!

 

--Ó, vocês tão vendo que a demanda em cima da caipira tá elevada! -- Zinara brincou -- Não me resta opção senão ir pular daquela pedra orientando a criançada! -- sorria -- Aamal aeh? (O que eu deveria fazer?) É inevitável! -- brincou

 

--Cid e Penha não tão aqui pra responder por Cidmara, criatura! -- Clarice advertiu preocupada -- Nem os pais de Rebeca! -- observou

 

--E na ausência deles, quem decide sou eu como a irmã mais velha nesse clã! -- bateu uma palma -- Hassan, Rebeca, Rosa, Ahmed João, Ahmed Marcos, Ahmed Lucas e Cidmara! -- convocou -- Comigo! -- foi saindo da água -- E se preparem que temos uma caminhadinha! -- advertiu brincalhona

 

--Ah, na caminhadinha eu vou! -- Aisha se animou -- Vem, amor! Vem prof! -- chamou

 

--Eu vou mesmo pra garantir que não vai ter muita loucura, sabe? -- Clarice foi indo junto

 

--Eu... -- Janaína não sabia o que dizer -- Fico aqui pra observar se os pulo tão saindo como se deve! -- disfarçava seu medo de ser convencida a pular

 

--Vou te contar... -- Cláudia comentava com o marido -- O tempo passa e Zinara não deixa de fazer merd*! Ô, caipira doida! -- fez cara feia -- Se se machucar, também não atendo! -- deu um soco na mão

 

O homem riu.

 

--Quer ir, Mastô? -- Cecília perguntou enquanto brincava na água com seus meninos

 

--Deus que me livre! -- benzeu-se

 

***

 

--Meu Deus, a vista daqui de cima é linda, mas pra pular é uma coisa assustadora! -- Clarice comentou

 

--Que nada, habibi! -- Aisha comentou -- Tem que fazer igual eu fazia: fecha os olhos, entrega pra Deus e se joga! -- riu

 

--E então? Quem vai primeiro? -- Zinara perguntou empolgada

 

--Eu! -- Ahmed Marcos levantou a mão -- Vai nóis dois juntu! -- sorriu para ela

 

--É isso aí, garoto! -- cumprimentaram-se com um tapa na mão -- Anda um pouco pra trás, -- seguiu até a posição -- dá uma corridinha igual eu vou fazer e quando eu contar o três a gente pula, tá legal? -- combinou

 

--Simbora! -- concordou batendo palmas

 

--Então, Yaalah! (Vamos!) -- começou a correr -- Um, dois e...

 

--Três... -- os dois gritaram juntos ao pular

 

--AH!! -- Clarice gritou com medo olhando para baixo

 

--Avi Maria! -- Ahmed observava de dentro do rio com o coração na mão

 

“Aquela sensação, Kitaabii, já não me lembrava mais... Por quantas vezes Youssef, Khaled e eu pulamos daquela pedra e nos sentimos felizes, longe de todo mal e livres!

 

Pulei com todos os que haviam me pedido. Às vezes em duplas, como foi com Ahmed Marcos, e outras vezes em trio, como aconteceu com Lucas e Cidmara, Hassan e Rebeca e por fim, com as reticentes Aisha e Clarice, que saltaram de mãos dadas comigo. Que sensação maravilhosa! Nem senti cansaço por ter subido a pedra repetidamente para acompanhar meus amados.

 

Mas eu não sabia que o melhor ainda estava por vir...”

 

--Vamos saindo do rio, que é hora de começar a se arrumar pra festa da virada! -- Clarice convocou animada -- Simbora! -- bateu palmas -- Só nós ficamos aqui! -- colocou as mãos na cintura

 

--Ahmed Marcos, sai dessa água! -- Ahmed chamou o único filho que ainda estava com o grupo -- Ocê iscutô qui tá na hora!

 

--Pôxa... -- olhou esperançoso para a tia

 

--Tá na hora, rapaz, tem jeito, não! -- respondeu bem humorada ao se levantar -- Simbora! -- acenou para o jovem

 

--Ih, olha! -- Aisha apontou sorridente -- Um tucano! E que tucano lindo! -- admirou-se

 

--Choo? (O que?) -- Zinara sentiu a pele arrepiar --Awlaadii? (Minha criança?) -- perguntou emocionada olhando para todos os lados

 

A ave pousou em um galho de árvore, deixando todos maravilhados com sua beleza incomum.

 

--O que foi, amor? -- Clarice perguntou carinhosamente sem entender

 

A astrônoma imediatamente olhou para o alto da pedra e sentiu seu coração disparar. -- Preciso voltar! -- afirmou simplesmente

 

--O que?? -- Clarice e Aisha perguntaram ao mesmo tempo -- Vai pular daquela pedra de novo, bicha doida? -- a prima perguntou

 

--Eu preciso... -- olhou para a esposa com os olhos marejados -- Fouk ma yitsawar khayalik... (Mais do que você possa imaginar...)

 

--Eu vô juntu! -- Ahmed Marcos se empolgou

 

Ahmed olhou para a pedra e entendeu. -- Vá, minha irmã! -- sorriu emocionado -- Elis ti ispera! E só ocê vai! -- olhou para o filho seriamente

 

A paleoceanógrafa também entendeu, beijou-a na testa e simplesmente balançou com a cabeça dizendo sim. Zinara então seguiu novamente para subir.

 

Ninguém mais comentou coisa alguma, porém todos decidiram aguardá-la voltar. Ahmed Marcos voltou para esperar dentro da água.

 

“Eu não saberia jamais explicar, Kitaabii, mas a cada passo que me aproximava da pedra, sentia uma emoção crescente me tomando por inteira. E quando finalmente cheguei, parei e lá do alto observei meus amados que me olhavam. Minha pele novamente se arrepiou, respirei fundo, fechei os olhos e derramei lágrimas sem nem saber porque.

 

Nesse momento pude ver ou sentir, nem sei como explicar, que assim como no passado, Khaled e Youssef estavam junto de mim. Um de cada lado. Nada dissemos, apenas sorrimos com os rostos banhado por lágrimas.

 

Éramos nós, Kitaabii, mas em uma nova fase na vida. Um Youssef que podia ver, um Khaled que se sentia em paz e uma Zinara que era livre!

 

Eu me preparei para saltar e pulei com os olhos fechados. Eles foram junto comigo mas apenas eu caí na água. Ao emergir, dei um grito de felicidade que deve ter sido ouvido em várias partes da fazenda. O que pensaram? O que entenderam de tudo isso? Laa acrif... (Eu não sei...) Mas o que me interessava é que eu sabia porque.”

 

Fim do capítulo

Notas finais:

Músicas do Capítulo:

[a] Logo Eu. Intérprete: Jorge & Mateus. Compositores: Samuel Deolli / Filipe Labre. In: Os Anjos Cantam. Intérprete: Jorge & Mateus. Som Livre, 2015. 1 CD, faixa 9 (2min35)

 

Getúlio recita:

Toda Forma de Amor. Intérprete e Compositor: Lulu Santos.


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Comentários para 45 - ALBIK 3AYEZ EIH?:
Sem cadastro
Sem cadastro

Em: 29/10/2024

Oi Autora,

Boa madrugada!

Como prometido, passando pra dizer que é um prazer ler este conto. Sou fã de zinara!! Estava com saudades dela e dos outros personagens kkk. É de uma riqueza... já ri com a mesma intensidade que chorei rs. A evolução dela, depois de tudo, me encanta! Fico feliz, por saber que ela está livre pra ser feliz.

 


Solitudine

Solitudine Em: 31/10/2024 Autora da história
Olá querida!
Tudo bom?

E eu fico feliz por você ter vindo aqui para me dizer isso! rs Obrigada!

Mas me diga, e o final da história propriamente dito, ou seja, o desfecho no capítulo seguinte: o que achou?

Beijos,
Sol



Sem cadastro

Sem cadastro Em: 03/11/2024
A senhora deve ser uma mulher surpreendente!
Terminei de ler o capítulo final. Me sinto emocionada. Me sinto assim, desde que li o primeiro capítulo.
O quê eu achei? " danado de bom, uai!" rs
Já estou com saudades! Que bom que eu posso ler de novo, enquanto Deus permitir. Lerei suas outras obras, também.
Obrigada pela atenção e pelo aprendizado.
Obrigada por enriquecer a minha alma com uma obra tão linda!
Seria muito pedir que Zinara fosse minha amiga de porta?! brincadeira rs
Beijos!



Solitudine

Solitudine Em: 03/11/2024 Autora da história
Olá querida!
Tudo bom?

Eu diria que sou surpreendentemente caipira! kkk

Fico feliz em saber que sua percepção é esta. Muito obrigada!!

Zinara seria sua amiga com prazer. rs

"Vejo" você nos outros contos! ;)

Beijos,
Sol


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PaudaFome
PaudaFome

Em: 13/06/2024

Amei a reviravolta na vida das personagens a despedida de Najla o casamento o salto no rio.... é o capítulo mais lindo do mundo pau a pau com o último de Sob Encanto de Maya


Solitudine

Solitudine Em: 14/06/2024 Autora da história
Que bom que o capítulo te marcou tanto! Isso me deixa emocionada! E a menção à Maya...

Obrigada!!!!!

Beijos,
Sol


Responder

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PaudaFome
PaudaFome

Em: 13/06/2024

QUE CAPÍTULO LINDOOOO!!


Solitudine

Solitudine Em: 14/06/2024 Autora da história
É o meu preferido. Obrigada, querida!

Beijos,
Sol


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Femines666
Femines666

Em: 19/03/2023

Quando a gente pensa que ela já se superou se engana! Esse capítulo é genialmente LINDO!!!!


Solitudine

Solitudine Em: 19/03/2023 Autora da história
Obrigada!!!
Confesso que amo esse capítulo! rs
Beijos,
Sol


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Alexape
Alexape

Em: 06/01/2023

Sem palavras que capítulo maravilhoso!!! O mais lindo que você escreveu até agora! Essa história é sem igual!


Resposta do autor:

Veio repetido. Beijos!

Sol

Responder

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Alexape
Alexape

Em: 06/01/2023

Sem palavras que capítulo maravilhoso!!! O mais lindo que você escreveu até agora! Essa história é sem igual!


Resposta do autor:

É o meu preferido também! E o mais sonhado!

Obrigada pela gentileza!

Beijos,

Sol

Responder

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Seyyed
Seyyed

Em: 27/09/2022

Responda autora albik 3ayez eih? 

 

Agora finge que eu sou a Najla e salta da pedra e grita pra todo mundo ouvir. S


Resposta do autor:

Entendi o que quis dizer e fazer. Achei lindo!

Já respondi a esta pergunta. Agora só me falta o salto. Mas ainda não consigo.

Beijos,

Sol

Responder

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Seyyed
Seyyed

Em: 27/09/2022

Reli chorei ri gritei junto com a Zi... quando Najla fez a pergunta que é o título do capítulo eu arrepiei. O casamento que foda! A fazenda  todo mundo junto E o final... que final! EBT é a história mais linda que eu já li!! Tu merece muita gratidão nossa!


Resposta do autor:

Obrigada, querida! Fico muito feliz e lisonjeada com tudo que você veio me escrevendo o tempo todo. A forma como você sentiu o conto foi muito intensa e é lindo perceber isso!

Obrigada mesmo!

Beijos,

Sol

Responder

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Seyyed
Seyyed

Em: 27/09/2022

CARARRA! PUTISSIMA QUE SUPER POWER PARIU! VOU RELER!


Resposta do autor:

Veio repetido. 

Beijos,

Sol

Responder

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Seyyed
Seyyed

Em: 27/09/2022

CARARRA! PUTISSIMA QUE SUPER POWER PARIU! VOU RELER!


Resposta do autor:

kkkkkkkkk Vai lá, garota!

Beijos,

Sol

Responder

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Zaha
Zaha

Em: 28/04/2021

Oie, espero que esteja bem!;)

Muitas coisas positivas aconteceram nesse salto do tempo!

Cecília e Adamastor, a mae ter explicado o passado o ajudou a refletir e ser mais flexível, vê as coisas desde outra perspectiva. E cecília foi firme e tá empenhada, n devemos deixar de fazer algo que sentimos por outro, mesmo que a gente ame. Se fizermos algo e sentimos bem,esse é o nosso caminho.Se tá doendo, devemos deixar ir. E ela se respeitou tomando a decisao, mas que bom que resolveram as coisas. E Rosa teve uma nova oportunidade. 

Esse capítulo é de mudancas mesmo e como Jamile mudou, n canso de dizer,que transformacao,ainda lembro mt bem do primeiro capítulo! 

Muito linda a despedida de Najla, tudo que disse, a humildade é algo difícil de conquistar,às vezes temos que passar por muitas coisas pra aprender e ela mudou muito,é agradecida. Uma família que pôde se perdoar dos erros passados e serem melhores seres humanos, amando de verdade, aceitando.

Ai senhor, me aperta o estômago a despedida e tudo dito de Naj para Zinara. O que Zinara pensa dps..um capítulo de reflexao, de como às mudancas no coracao transformam nossas vidas.Só nós mesmo somos nossos próprios terapeutas,quem nos salvará! Saber e sentir unidos.

Todos estao encontrando seu caminho,né?! Nem sempre passa, mas que lindo aqui passar e dar esperanca a tanta gente. Pq viemos com uma programacao reencarnatória,mas a maiorira das vezes nós escolhemos caminhos equivocados, iludidos,n pensamos,n queremos ver o que sentimos pq se vissemos,saberíamos sempre que caminho tomar...o livre arbítrio mal usado, algo que veio com o uso da razao quando evoluímos. Quase sempre mal usado... Mas nossos guias sempre nos respeitam mesmo qndo n fazemos bem,mas nos inspiram a voltar!

Mudancas,novas oportunidades,perdao e liberdade!!

Me emocionei mt com Leda dando a casa pra Raquel...

Onde vc esteve que roubou meu amor".... vc que se perdeu na vida, mas se encontrou e ela tava te esperandooo! ;). Sempre lindinhas juntas!!

khalayla tb fala coisas bonitas!! E finalmente vao poder ter uma nova chance! Outra época,outras pessoas, nova cultura, mesmo caminho, n poderia falar do tempo pq a dor faz parecer uma eternidade assim como foi c a família de Zinara.

Chorei com Zinara falando com a mae...até lembrei da minha.. Mas tenho que ser sincera e parabenizar as palavras que Zinara diz,principalmente se é tao perto do meu coracao!

Zinara passou se escondendo toda a vida,mas um dia necessitamos libertar-nos das amarras do medo senao ele nos consome(chorando..) e mesmo tendo outras questoes na vida bem resolvidas, n poderemos viver bem , sempre terá um buraquinho, temos que acreditar no amor e tb nos amar,respeitar quem somos, mesmo que o outro n entenda quem somos. Temos que nos amar e respeitar a nós mesmo,mas é tao difícil fazer. Falar falar falr, saber saber,mas entre o saber e sentir ou falar e fazer existem distâncias,mas ás vezes temos grandes pessoas ao nosso lado que nos dao forca. Zinara encontrou essa forca. A mamaa dela já é uma grande forca. Só  pras pessoas essenciais em nossas vidas, já bastaria!! A caipira um dia tb vai conseguir,paciência, escolhemos a vida e dificuldades que necessitamos!!A forca vai chegar qndo menos esperar, vai tá pronta, pq eu rezo todos os dias pra isso.

Que inocência a sua achar que apenas esse capítulo tem tanto de vc,o tao todo é vc!! Cada sentimento seu tá plasmado,cada experiência vivida vc deixou de alguma forma aqui e estará eternizada junto com a energia maravilhosa do "Em Busca do Tao!

Eu sabiaaa que Zinara ia fazer isso nesse cap, ela chega tarde,mas sempre com estilo ,bombando,alto nível vemos aqui!!é isso aí,Zinara!! 

O pior é quando um se auto rejeita antes e sofre antes mesmo de saber o que passará pq o medo é tao grande de n nos amarem como somos, que quem amamos n nos queira,entao passamos a querer agradar e viver outra vida,segundo expectativas de outros,nos anulamos e somos apenas uma fracao. Mas a vida nos ensina outras realidades, que existem coisas mais importantes, podemos sim viver como somos e vao nos amar, mas temos que fazer isso antes com nós mesmos. Alguns vao nos deixar pra sempre,alguns vao por um tempo, mas o sentimento de ser livre e sentirmos bem com isso vale a pena! 

"Yo soy lo que soy

Mi propria creación

E mi destino

Quiero que me des

Tu aprobación o tú olvido

Este es mi mundo

Por qué no sentir orgullo de eso

Es mi mundo

Y no hay razón para ocultarlo

De qué sirve vivir

Si no puedes decir

Yo soy lo que soy

Soy lo que soy

No quiero piedad

No busco aplausos

Toco mi proprio tambor

Dicen que esta mal

Yo creo que es hermoso

Por qué tengo que mar

Según los otros dicen

Trata de entender

Las cosas de mi mundo

L verguenza real

Es no poder gritar

Yo soy lo que soy


Soy lo que soy

No tengo que dar

Excusas por eso

A nadie hago mal

El sol sale igual

Para mí, para todos

Tenemos una sola vida sin retorno

Por qué no vivir

Como de verdad somos

No quiero fingir

No voy a mentir

Yo soy lo que soy

Paren de censurar

Hoy quiero gritar

Yo soy lo que soy" 

música de Sandra Mihanovich

 

Khaled finalmente encontrou tb sua paz...

Muito lindo esse final,ME EMOCIONEI! Um capítulo cheio de beleza, amor, liberdade....um grito dps de cair na água sempre é libertador...ao menos me sinto assim, livre e me sentia assim qndo era pequena tb e íamos de barco pro meio do mar e pulávamos!! Me trouxe lembrancas boas, maravilhosas!

Só digo...capítulo fodástico!E sim,teria que ser seu favorito diante dos fatos...

"Nao importa o que os outros pensam de você e também de como te chamam, um é como é!" Shams

Ia mandar esse presentinho na minha despedida de ler por um tempo no último capítulo, mas achei bom mandar nesse. Fiz tem uns 2 anos,tive q mudar algo,...n espere grande coisa, é simples e infantil,,apenas veio e escrevi.Tinha medo de mandar... Já fiz pra Cris,Lali... Pra vc n achar besteira como já o fez... Acho q esse tranquila ou reservada n era bem a palavra...enfim.

Mas vergonha n posso passar, mas n importa mais, pq sou como sou! 

 

Sadiki é complexa e enigmática,

guarda segredos que tem medo de revelar,

Agora nao esta mais solitária, tem alguém pra amar


De temperamento tranquilo guarda seus sentimentos para nao se machucar


De natureza reservada, ela só quer um cantinho para estudar,tempo pras montanhas e pra ajudar,

mas na verdade tudo que ela queria mesmo é poder se libertar.


Tenho um imenso carinho por ela e esse sentimento é mais profundo que qualquer criacao fake dela.

 

Ela é divertida,

uma caipira retada.

 

É carinhosa e atenciosa,

Gosta de ensinar,

E também é educada.

 

Sabe fazer poema,

mas que mulher complicada

 

A chamam de sol, mas para mim ela é apenas Sadikii, uma pessoa fantástica!

 


Besote y una hermosa semana!!Felicidades por el capítulo! Hasta el próx! :)






 

 

 

 

 

 


Resposta do autor:

Smallah! Nossa! Meu Deus! Difícil responder como merecido, Lailinha!

Acho que este foi dos seus mais lindos e ricos comentários. Sem dúvida um dos mais emocionantes, senão o mais forte e intenso que já recebi. Sem desmerecer os demais seus ou das outras amigas.

Da análise que fez sobre as personagens e o capítulo como um todo eu  nem sei o que dizer! Ainda com mais uma postagem bonita para enriquecer e me emocionar. Aliás, creia que me emocionou muito na primeira vez que li e agora também. 

Quanto à definição que fez de mim e para mim: que coisa atenciosa e delicada! Generosa, com bondosos olhos de amizade que me viram bem maior (e melhor) do que sou. Linda! Guardei e ficará registrada aqui comigo como um belo presente.

Espero que goste do final. Que não é um fim, porque nunca termina!

Beijos de gratidão!

Sol

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Cristina
Cristina

Em: 03/05/2021

Olá Sol!!

Tudo bem com você? Espero que tudo esteja bem! :)

Que capítulo maravilhoso e lindo!

Como gosto do que você escreve e admiro seu trabalho! Você escreve com cuidado, carinho e empenho em nos ofertar uma boa leitura sempre! 

Percebo que cocê não foca apenas so casal de suas histórias, mas constrói toda uma  trama envolvendo um elenco diverso e real. 

Que bom que Zinara tomou coragem em assumir publicamente seu ralacionamento com Clarice! No fianl das contas todo mundo já sabia!! KKKK

Sabe eu entendo Zinara. Acho que o medo de decepcionar as pessoas que amamos, acreditando que podemos perdê-las, faz com que adiemos nossa verdade. Ainda bem que Clarisse soube entender!!

Lindas as palavras de Zinara! Me emocionei aqui. O TAO, para mim, é carregado de emoções do começo ao fim!

Meus pensamentos se atropelam diante de tanta coisa que gostaria de lhe dizer e não consigo.

Obrigada!!!

Um grande abraço!!! Bjs.

 


Resposta do autor:

Boa noite!

Tudo bem minha grande amiga? Comigo ótimo, especialmente depois dos comentários que me escreveram, os quais são emocionantes. 

Pode acreditar que escrevo com carinho e atenção. Leio, releio, penso em como vai repercutir em quem lê. É uma construção cuidadosa. Tenho dificuldade em só focar no casal principal porque vejo cada personagem como um ser especial e portanto merece um destino digno. Coisas de caipira...

Zinara e Clarice, de formas distintas, partilhavam os mesmos medos. E ambas se libertaram deles juntas.

Você pode não conseguir escrever mas deixa nas entrelinhas e eu percebo. Muito agradeço!! Vamos ver se gostará do último capítulo. Tomara que sim!

Beijos,

Sol

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Mille
Mille

Em: 29/04/2021

Que capítulo lindo 

Zinaria mandou bem e foi tão emocionante, dona Leda é cúmplice da caipira kkkk

Bjus e até o próximo 


Resposta do autor:

Mille!!!

Que bom que você gostou, querida! Foi o meu preferido! E que bom que tem comentado bastante. Obrigada!

Ya Leda é cúmplice!! A caipira é a genra preferida! rs

Beijos!!

Sol

 

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Gabi2020
Gabi2020

Em: 28/04/2021

Olá Solzinha tudo bem?


-  Festa na roça é sempre muito bom! Minha mãe que adora milho na brasa, eu como sou um nojo pra comer , não aprecio... Rsrsrs...


- Eu de verdade entendo os medos de Clarice e Zinara, mas no caso delas já está tudo quase às claras, é só oficializar de vez.


- Puxa vida Adamastor “deu as caras”, confesso que me surpreendeu a atitude dele e por mais que a situação não seja fácil, o forma como ele encarou foi cruel demais, ainda mais atacando a Cecília pelo fato dela não poder ter filhos (já passei por isso e por um tempo me afetou muito, mas depois me acostumei ao fato de não pode gerar filhos). Mas gostei da conversa de dona Ritinha, a forma carinhosa como ela abordou o assunto fez toda a diferença.


- E foi através de uma tragédia que digamos assim veio a redenção da Cátia.


- As passagens da Khalayla são sempre muito tocantes.


- Grandes perdas para Leonor e Jamila, ainda bem que Leonor pode contar com o apoio da advogada e tomara que dê tudo certo com a adoção da Júlia.


- Linda despedida de Najla, gratidão é algo que não tem preço!


- Me emocionei com o diálogo da Cecília e da Rosa, tudo isso sob as bênçãos de Khaled e Youssef... Lindo demais!


- É eita atrás de eita viu? Agora me pegou com dona Leda e Raquel, sacanagem viu caipira?


- Ah essa bousa da Clarice... Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk... Não aguento essa história!


- Olha a Úrsula voltou! Kkkkkkkkk....  Nem lembrava da quantidade de palavrões que ela falava por minuto.


- Ownnn  finalmente o casamento, que lindo!


Capítulo digno de aplausos, muitos aplausos... Lindo, sublime, perfeito!


Resposta do autor:

Gabinha!!!

Não gostas? Eu adoro milho! Na brasa ou cozido! 

É difícil "sair do armário", não? Meu grande desejo reprimido por mim.

Adamastor foi inseguro e por isso cruel. Mas nada como um bom exemplo e um ato de bondade!

Cátia cruzou um longo caminho. Mas ela conseguiu. 

Sabe que eu chorei quando ela foi embora com Aisha e ya  Marco? Sabe, eu me envolvo demais com as personagens. Tenho carinho por todas elas por isso não trato como meras figurantes.

Essa bousa segue firme e forte sempre!!!

Você é emotiva e linda, Gabinha! Não tem jeito!

Beijos,

Sol 

 

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Zaha
Zaha

Em: 28/04/2021

Oie, espero que esteja bem!;)

Muitas coisas positivas aconteceram nesse salto do tempo!

Cecília e Adamastor, a mae ter explicado o passado o ajudou a refletir e ser mais flexível, vê as coisas desde outra perspectiva. E cecília foi firme e tá empenhada, n devemos deixar de fazer algo que sentimos por outro, mesmo que a gente ame. Se fizermos algo e sentimos bem,esse é o nosso caminho.Se tá doendo, devemos deixar ir. E ela se respeitou tomando a decisao, mas que bom que resolveram as coisas. E Rosa teve uma nova oportunidade. 

Esse capítulo é de mudancas mesmo e como Jamile mudou, n canso de dizer,que transformacao,ainda lembro mt bem do primeiro capítulo! 

Muito linda a despedida de Najla, tudo que disse, a humildade é algo difícil de conquistar,às vezes temos que passar por muitas coisas pra aprender e ela mudou muito,é agradecida. Uma família que pôde se perdoar dos erros passados e serem melhores seres humanos, amando de verdade, aceitando.

Ai senhor, me aperta o estômago a despedida e tudo dito de Naj para Zinara. O que Zinara pensa dps..um capítulo de reflexao, de como às mudancas no coracao transformam nossas vidas.Só nós mesmo somos nossos próprios terapeutas,quem nos salvará! Saber e sentir unidos.

Todos estao encontrando seu caminho,né?! Nem sempre passa, mas que lindo aqui passar e dar esperanca a tanta gente. Pq viemos com uma programacao reencarnatória,mas a maiorira das vezes nós escolhemos caminhos equivocados, iludidos,n pensamos,n queremos ver o que sentimos pq se vissemos,saberíamos sempre que caminho tomar...o livre arbítrio mal usado, algo que veio com o uso da razao quando evoluímos. Quase sempre mal usado... Mas nossos guias sempre nos respeitam mesmo qndo n fazemos bem,mas nos inspiram a voltar!

Mudancas,novas oportunidades,perdao e liberdade!!

Me emocionei mt com Leda dando a casa pra Raquel...

Onde vc esteve que roubou meu amor".... vc que se perdeu na vida, mas se encontrou e ela tava te esperandooo! ;). Sempre lindinhas juntas!!

khalayla tb fala coisas bonitas!! E finalmente vao poder ter uma nova chance! Outra época,outras pessoas, nova cultura, mesmo caminho, n poderia falar do tempo pq a dor faz parecer uma eternidade assim como foi c a família de Zinara.

Chorei com Zinara falando com a mae...até lembrei da minha.. Mas tenho que ser sincera e parabenizar as palavras que Zinara diz,principalmente se é tao perto do meu coracao!

Zinara passou se escondendo toda a vida,mas um dia necessitamos libertar-nos das amarras do medo senao ele nos consome(chorando..) e mesmo tendo outras questoes na vida bem resolvidas, n poderemos viver bem , sempre terá um buraquinho, temos que acreditar no amor e tb nos amar,respeitar quem somos, mesmo que o outro n entenda quem somos. Temos que nos amar e respeitar a nós mesmo,mas é tao difícil fazer. Falar falar falr, saber saber,mas entre o saber e sentir ou falar e fazer existem distâncias,mas ás vezes temos grandes pessoas ao nosso lado que nos dao forca. Zinara encontrou essa forca. A mamaa dela já é uma grande forca. Só  pras pessoas essenciais em nossas vidas, já bastaria!! A caipira um dia tb vai conseguir,paciência, escolhemos a vida e dificuldades que necessitamos!!A forca vai chegar qndo menos esperar, vai tá pronta, pq eu rezo todos os dias pra isso.

Que inocência a sua achar que apenas esse capítulo tem tanto de vc,o tao todo é vc!! Cada sentimento seu tá plasmado,cada experiência vivida vc deixou de alguma forma aqui e estará eternizada junto com a energia maravilhosa do "Em Busca do Tao!

Eu sabiaaa que Zinara ia fazer isso nesse cap, ela chega tarde,mas sempre com estilo ,bombando,alto nível vemos aqui!!é isso aí,Zinara!! 

O pior é quando um se auto rejeita antes e sofre antes mesmo de saber o que passará pq o medo é tao grande de n nos amarem como somos, que quem amamos n nos queira,entao passamos a querer agradar e viver outra vida,segundo expectativas de outros,nos anulamos e somos apenas uma fracao. Mas a vida nos ensina outras realidades, que existem coisas mais importantes, podemos sim viver como somos e vao nos amar, mas temos que fazer isso antes com nós mesmos. Alguns vao nos deixar pra sempre,alguns vao por um tempo, mas o sentimento de ser livre e sentirmos bem com isso vale a pena! 

"Yo soy lo que soy

Mi propria creación

E mi destino

Quiero que me des

Tu aprobación o tú olvido

Este es mi mundo

Por qué no sentir orgullo de eso

Es mi mundo

Y no hay razón para ocultarlo

De qué sirve vivir

Si no puedes decir

Yo soy lo que soy

Soy lo que soy

No quiero piedad

No busco aplausos

Toco mi proprio tambor

Dicen que esta mal

Yo creo que es hermoso

Por qué tengo que mar

Según los otros dicen

Trata de entender

Las cosas de mi mundo

L verguenza real

Es no poder gritar

Yo soy lo que soy


Soy lo que soy

No tengo que dar

Excusas por eso

A nadie hago mal

El sol sale igual

Para mí, para todos

Tenemos una sola vida sin retorno

Por qué no vivir

Como de verdad somos

No quiero fingir

No voy a mentir

Yo soy lo que soy

Paren de censurar

Hoy quiero gritar

Yo soy lo que soy" 

música de Sandra Mihanovich

 

Khaled finalmente encontrou tb sua paz...

Muito lindo esse final,ME EMOCIONEI! Um capítulo cheio de beleza, amor, liberdade....um grito dps de cair na água sempre é libertador...ao menos me sinto assim, livre e me sentia assim qndo era pequena tb e íamos de barco pro meio do mar e pulávamos!! Me trouxe lembrancas boas, maravilhosas!

Só digo...capítulo fodástico!E sim,teria que ser seu favorito diante dos fatos...

"Nao importa o que os outros pensam de você e também de como te chamam, um é como é!" Shams

Ia mandar esse presentinho na minha despedida de ler por um tempo no último capítulo, mas achei bom mandar nesse. Fiz tem uns 2 anos,tive q mudar algo,...n espere grande coisa, é simples e infantil,,apenas veio e escrevi.Tinha medo de mandar... Já fiz pra Cris,Lali... Pra vc n achar besteira como já o fez... Acho q esse tranquila ou reservada n era bem a palavra...enfim.

Mas vergonha n posso passar, mas n importa mais, pq sou como sou! 

 

Sadiki é complexa e enigmática,

guarda segredos que tem medo de revelar,

Agora nao esta mais solitária, tem alguém pra amar


De temperamento tranquilo guarda seus sentimentos para nao se machucar


De natureza reservada, ela só quer um cantinho para estudar,tempo pras montanhas e pra ajudar,

mas na verdade tudo que ela queria mesmo é poder se libertar.


Tenho um imenso carinho por ela e esse sentimento é mais profundo que qualquer criacao fake dela.

 

Ela é divertida,

uma caipira retada.

 

É carinhosa e atenciosa,

Gosta de ensinar,

E também é educada.

 

Sabe fazer poema,

mas que mulher complicada

 

A chamam de sol, mas para mim ela é apenas Sadikii, uma pessoa fantástica!

 


Besote y una hermosa semana!!Felicidades por el capítulo! Hasta el próx! :)






 

 

 

 

 

 


Resposta do autor:

Smallah! Nossa! Meu Deus! Difícil responder como merecido, Lailinha!

Acho que este foi dos seus mais lindos e ricos comentários. Sem dúvida um dos mais emocionantes, senão o mais forte e intenso que já recebi. Sem desmerecer os demais seus ou das outras amigas.

Da análise que fez sobre as personagens e o capítulo como um todo eu  nem sei o que dizer! Ainda com mais uma postagem bonita para enriquecer e me emocionar. Aliás, creia que me emocionou muito na primeira vez que li e agora também. 

Quanto à definição que fez de mim e para mim: que coisa atenciosa e delicada! Generosa, com bondosos olhos de amizade que me viram bem maior (e melhor) do que sou. Linda! Guardei e ficará registrada aqui comigo como um belo presente.

Espero que goste do final. Que não é um fim, porque nunca termina!

Beijos de gratidão!

Sol

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