Helena espreguiçou sentindo o corpo do namorado colado ao seu, suspirou contrariada, pois na noite passada mais uma vez fugira dos seus carinhos, tinha certeza que dessa vez seria tudo diferente, e que o clima romântico de uma casa de praia ia deixa-la cheia de desejos, no entanto, mais uma vez declinara das investidas de Arthur, e dessa vez, de uma maneira não tão sutil ele avisara que estava cansado dessa situação.

       Com muito jeitinho levantou saindo dos braços do namorado e entrando debaixo do chuveiro. Enquanto a água descia no corpo levando os sentimentos ruins sorriu ao lembrar como sua vida estava caminhando da melhor forma possível, estava no segundo ano da faculdade de Direito, tinha a irmã e a melhor amiga sempre ao seu lado, e namorava Arthur, o rapaz mais bonito da escola desde o primeiro ano do ensino médio, a única coisa que a incomodava era que com ele o desejo de ter relações sexuais estava fora de cogitação, estranhava não sentir a menor vontade, no entanto, o que mais a afligia era se sentir uma estranha no ninho, todas as amigas já não eram mais virgens, e ela continuava assim, com a ppk novinha em folha, como se tivesse acabado de sair da maternidade, as amigas mais íntimas, inclusive Roberta, que por sua vez seguia namorando Felipe, um amigo de sala, tinha uma vida sexual bem ativa, e pelo que Robertinha dizia plenamente satisfatória, então, não conseguia entender o motivo de tanta protelação de sua parte, Arthur era um rapaz bonito, e não apenas isso, era inteligente, culto, educado, carinhoso e acima de tudo aceitava o seus inúmeros "não", quer dizer até aquele momento.

      Após o banho, arrumou as coisas e chamou o namorado para tomar um café da manhã e caminhar um pouco pela praia antes de partirem para Curitiba, deixando a Praia de Bombinhas em Santa Catarina para trás. O caminho até sua casa foi silencioso, Arthur se despediu com um beijo seco e chegou a tempo de pegar as mães e a irmã reunidas em torno de uma mesa cheia de delícias para o café da tarde.

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- Oi Helena, que bom que chegou filha, venha lanchar conosco!.

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      Helena se aproximou, beijando a cabeça da irmã e das mães, avisando que ia apenas guardar as coisas no quarto e voltaria para lanchar. Sophia percebeu que a filha estava chateada, mas, resolveu adiar a conversa, só após o lanche resolveu segui-la para conversar, enquanto Renée levava Heloísa a hípica para fazer equoterapia.

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- Então Helen, posso saber o que está acontecendo?.

- Nada não mãe, está tudo bem, não se preocupe.

- Filha, eu sei que não está nada bem, olha sua cara, mal lanchou, nem comeu um pedaço do bolo de pudim que tanto gosta.

- Não estava com fome.

- Helena...

- Ai mãe, será que tem algo errado comigo?.

- Como assim filha?.

- Eu não sinto desejo pelo Arthur, até o beijo tudo bem, mas, não quero nada além disso, eu sou virgem, e quero que minha primeira vez seja especial, sabe?, e não sei se a pessoa é ele...

- E ele aceita essa condição numa boa?.

- No começo sim, dizia que tudo tem seu tempo, mas, ontem ele ficou bravo, disse que estava cansado dessa situação, que era homem e tinha seus desejos, ai não sei como vamos ficar.

- Você o ama minha filha?.

- Ah, eu gosto dele mãe.

- Eu perguntei de amor, você ama ou não?.

- Amar?, amar...não mamãe.

- Então talvez seja isso.

- Mamãe, sei que mal cheguei em casa, mas, depois da faculdade eu vou dormir na casa da Robertinha, tudo bem?, os pais dela viajaram e ela não quer ficar sozinha, e o namorado dela está em um encontro da faculdade, então, sabe como é...acho que não me custa fazer companhia.

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      Helena falou de Roberta com os olhos tão brilhantes que Sophia sentiu uma dúvida em relação aos sentimentos da filha pela amiga de tantos anos, mas, essa ideia passou rapidamente em sua cabeça e achou melhor simplesmente deletar, achando ser uma impressão, mas, se fosse verdade não haveria problema algum, claro que seria melhor que fosse correspondida, mas, se não fosse daria todo apoio necessário para que a filha saísse dessa.

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- Mãe, te fiz uma pergunta, posso ir?.

- Claro filha, sei que Robertinha é sua melhor amiga desde criança, vai levar Heloísa com você?.

- Dessa vez não, quero ter uma conversa com a Robertinha e com a Helô lá não vai dar, entende?.

- Tem razão minha filha, pode deixar que vou inventar uma sessão de filmes com sua irmã, assim ela não vai se sentir excluída.

- Obrigada mãe, Robertinha vem já me buscar, só vai resolver umas coisas com a Tia Virna.

- Então, quer dizer que estava tudo decidido?.

- Desculpa mãe, na verdade estava, mas, queria que tivesse a impressão que decidiu...Hahahahah.

- Danadinha, vai se arrumar, sua amiga sempre é bem pontual.

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      Quando Rafaella chegou em casa Virna a esperava no sofá com uma taça de vinho. Rafa estava evitando a conversa que estava prestes a acontecer há dias, mas, sabia que dessa vez não tinha mais como adiar, levantou a mão fazendo o símbolo do Spock, que consiste em exibir a palma para o interlocutor, separando o dedo médio do anelar e dizendo: "Vida longa e próspera", esse famoso personagem de Star Trek era o preferido de ambas e faziam frequentemente o gesto nos bons tempos da relação, Virna sorriu tristemente e repetiu o símbolo, mas, dizendo uma frase bem diferente ao baixar a mão.

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- Oi Rafa, estava esperando você, vamos conversar?.

- Virna, eu sei que tenho vacilado, mas...

- Por favor, sem desculpas e subterfúgios, eu não sou burra Rafa, sei que não me ama mais, na verdade nunca me amou...não o suficiente, já não importa, apenas te esperei para dizer que estou indo embora, hoje durmo em um hotel, até já arrumei minhas roupas, ou parte delas, e é isso, It must have been love, but it's over now, acabamos aqui, mas, espero sinceramente que seja feliz...e eu também vou ser. Você é uma boa pessoa, não te resumo a uma traição, tenho total consciência que não mandamos no nosso coração, não é verdade?, ou já tinha tirado você do meu há anos...

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      Rafaella deixou que lágrimas queimassem seu rosto, se sentiu muito culpada pela primeira vez, desde que começara a ter um casinho com uma das alunas da faculdade que ensinava há quase cinco anos. Sabia que o casamento vinha desmoronando como uma torre de cartas desde que Virna tinha de aposentado como delegada, passando a cuidar de uma loja onde produzia e vendia seu próprio artesanato, sem interesses e assuntos em comum aos poucos se afastaram, assim, o pouco sentimento que tinha havia sido corroído pelo tempo, levado como cinzas queimadas em uma fogueira. No momento doía muito mais ver que Virna não lhe guardava mágoas, falou da traição como a constatação que algo já esperado.

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- Virna, o que sinto pela...por minha aluna não é nada sério, é só sex*.

- Não precisa me falar nada Rafa, se é só sex* tenha certeza...isso me deixa ainda mais triste e decepcionada, pensei que tivesse sido traída por ter enfim descoberto o verdadeiro amor, mas, se é algo só de pele, isso realmente me deixa sem chão.

- Quer que te deixe no hotel?, sei que não está podendo dirigir, aliás, não prefere que eu saia desse apartamento, você pagou a maior parte dele, lembra?.

- De jeito algum, eu tenho um apartamento gostoso no Jardim Social, só precisa de uma ajeitada, fique aqui e aproveite sua vida, dizem que a grande virada acontece com cinquenta anos, quem sabe é verdade?, te desejo o melhor Rafa, obrigada por todos esses anos, e não se sinta culpada, apenas seguimos caminhos diferentes.

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      O interfone tocou e Rafaella seguiu para atender.

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- Virna, é Robertinha, ela está dizendo que veio te buscar, quer que ela suba?.

- Claro, por favor, pedi que Roberta me ajudasse, você se importa?.

- De jeito algum, ela sempre será a minha sobrinha.

- Fico feliz que pense assim!.

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      Roberta subiu, cumprimentou Rafa de uma forma fria, apenas um "rápido oi", queria deixar claro que sabia muito bem do relacionamento que Rafaella mantinha, na verdade estava feliz de ver tia Virna encerrar a situação, então, esperou que a tia se despedisse, virando o rosto quando Rafaella lhe puxou para um abraço, ali encerrava uma história, que poderia ter sido mais feliz. Depois que saíram Rafaella sentou no sofá e chorou, uma mistura de alívio com saudade, mas, acima de tudo chorou por não sentir amor por uma pessoa tão sensível e generosa como Virna, levantou e seguiu até o som, colocando "Sonds like a melody", música do Alphaville, banda que escutava bastante na adolescência, e passou a cantar junto balançando o corpo no batida da música. Ao seu lado Vanessa sorria dizendo "Eu te amo"

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- Nossa, que calafrio, estou ficando louca ou ouvi a voz de alguém dizendo "eu te amo"?, mas, que alma diria isso pra mim?. Hahahaha.

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      Vanessa vendo a tristeza de Rafa pelo término do casamento resolveu dar um passe energético e logo a amada se sentiu melhor. Rafaella pensou, passou a mão rapidamente no braço direito e tomou uma decisão, olhou no visor do celular o nome de Cindy, a aluna que mantinha um caso e ligou.

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- Oi Cindy, será que pode dar um pulinho aqui em casa, precisava conversar contigo.

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      Mal demorou e a loira exuberante estava batendo na porta da professora, entrou e em seguida jogou o capacete em cima do sofá puxando Rafaella para perto de si.

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- Oi gata.

-Olá... - Rafaella respondeu se esquivando do beijo.

- O que foi?.

- Precisamos conversar Cindy.

- Fala logo, que cara é essa?.

- Cindy, eu não posso mais manter nosso relacionamento.

- Porque, sua mulher descobriu foi?.

- Não, não foi nada disso, estou separada, aliás, terminamos hoje mesmo.

- Então, vamos aproveitar boba.

- Cindy, não, eu não quero uma relação passageira, movida apenas por sex*, preciso passar um tempo sozinha, entende?. 

- Tudo bem, você quem sabe. - Falou a loira pegando o capacete e batendo a porta do apartamento o mais forte que conseguiu.

- Desculpa.

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      Falou, mas, não deu tempo de Cindy escutar.

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- Nossa, parabéns Rafaella, você conseguiu magoar duas em apenas um dia, maravilha, hein?.

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      Rafaella pegou o resto da garrafa de vinho que Virna estava tomando, alguns petiscos e voltou para sala colocando o cd de Adriana Calcanhoto para tocar.

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Eu perco o chão

Eu não acho as palavras

Eu ando tão triste

Eu ando pela sala

Eu perco a hora

Eu chego no fim

Eu deixo a porta aberta

Eu não moro mais em mim

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      Em dado momento percebeu que o celular estava tocando dentro da bolsa, mas, encontrou a tempo de atender antes que a pessoa do outro lado desligasse.

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- Oi mana, tudo bem?.

- Oi Léo, quando vem me visitar?, estou precisando de ti...

- O que aconteceu?.

- Virna saiu de casa...

- Segura ai irmã, estou chegando...

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      Léo chegou no apartamento e abraçou Rafaella com força, depois chorou igual uma criança.

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- Calma irmã, estou bem....por favor, não precisa se preocupar tanto assim.

- Não é isso...eu senti o cheiro da Vanessa, juro que senti...ela deve estar aqui.

- Claro que não, o que ela viria fazer aqui?.

- Você várias vezes disse que tinham uma conexão...que ela era tua chama...chama gêmea, é isso?.

- Para Léo, nem a conheci, não força...

- Eu fico sem entender, como esqueceu o que falava com tanta convicção?.

- Para que isso me apavora, lembra que já fui desmemoriada?.

- Sim, por um trauma, mas, se não conheceu a Van, não teve trauma algum, e se conhecesse ia amar, ela era um anjo.

- Eu imagino.

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      Do outro lado da sala, o mentor espiritual tentava convencer Vanessa.

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- Não acha que ela precisa saber da verdade?.

Fim do capítulo