Capitulo 46 - Você mudou de mim
Capítulo 46 – Você mudou de mim
Pov Lia
Liz a encarava com uma expressão nada amigável. Sentiu a espinha gelar. Ela já sabia sobre o intercâmbio e ao mesmo tempo que ficou com medo de sua reação, a raiva também lhe tomou. Pedro ia ser ver com ela, isso ia. Não bastava ele ter dado com a língua nos dentes para os pais e causado uma discussão enorme no dia anterior, agora tinha contado tudo para a namorada. A última coisa que queria era encher a cabeça de Liz com isso.
— Me fala, Lia! — exigiu mais uma vez em tom de repreensão.
A irritadinha deu de ombros e baixou os olhos não aguentando encarar o olhar aborrecido de sua rockeira. Totalmente sem jeito, vestiu a blusa que havia tirado há pouco tempo e criou coragem para falar, precisava ser sincera, não tinha mais como esconder.
— Como você soube?
— Não importa! — retrucou sem rodeios e impaciente. — Por que não me contou?
Lia esfregou as mãos na face e começou a rir em nervosismo.
— Eu não falei nada porque não tinha nada para falar — tentou dar uma de indiferente. Sentia um mal pressentimento com o que viria a seguir. — Eu passei e eles vieram me avisar em cima da hora. Eu não estou pronta para ir agora...
— Qual é, Lia! — Liz exclamou irônica. — Não me vem com essa!
— A decisão é minha, Liz. Eu já decidi! — respondeu em afronta para parecer segura do que dizia. — Agora não é hora para esse intercâmbio, infelizmente.
— Esse intercâmbio é o seu sonho e não existe isso de “em cima da hora”. Nós vamos dar um jeito. Até quando você pode dar a confirmação? — perguntou colocando as mãos na cintura de forma séria.
— Eu não vou dar confirmação nenhuma, Liz — começou a se aborrecer com a insistência. Primeiro os pais e agora ela. Estava farta de todo mundo lhe dizendo o que fazer. — Porr*! Eu já disse que não vou...
— Porr* digo eu, Lia! — Liz bateu as mãos nos quadris em um tique raiva e foi se aproximando. — Você está cometendo um erro e eu não quero ser responsável por isso. Você sabe que eu não concordo. Desde o começo te incentivei. Sempre deixei claro que não precisava esconder as coisas de mim, que podia sempre ser sincera. Não é isso que você vive me cobrando?
Lia se sentiu intimidada. Nunca achou que isso seria possível, mas Liz estava lhe tratando igual os seus pais, como se fosse uma criança que não sabia de nada.
— Eu não sou uma criança para você me dizer o que fazer! — replicou de forma atrevida.
— ENTÃO NÃO AJA FEITO UMA! — Liz explodiu, assustando-a.
— Não levante a voz para mim! — ameaçou-a com o dedo estendido na direção do peito dela.
— Você quer mesmo saber como eu descobri sobre isso? Eu vou dizer! — ela suspirou e continuou com o tom de voz frio. — O seu pai ligou ontem, me acusando de várias coisas. E eu feito uma idiota sem saber o que estava acontecendo. Ele ficou dizendo que eu estava te impedindo de fazer esse intercâmbio e praticamente ordenou que eu viesse o mais rápido possível para resolver isso.
Lia ficou estática ao ouvir aquilo. Por isso Liz estava tão puta. Não acreditava que o seu pai havia feito isso. Naquele momento seu sangue ferveu e teve vontade de quebrar alguma coisa, mas se conteve com muito esforço.
— Não acredito que ele fez isso! — sussurrou entre dentes. — Não era direito dele se meter nos meus assuntos.
Liz ficou consternada com o que ouviu e se aproximou de forma intimidadora.
— Você está louca, Liana? Que bom que seu pai veio falar, isso sim. Se não fosse por ele eu nunca saberia sobre isso.
— É tudo culpa do Pedro. Puta que pariu! — xingou para tentar extravasar um pouco a raiva que sentia. — Eu desabafei e olha o que ele fez.
— Deixa de ser egoísta, Lia. Tenho certeza que o Pedro fez isso, pensando no melhor para você
— Eu egoísta? — rebateu irônica e dessa vez a raiva lhe fez crescer mais uns dez centímetros. Estava se sentindo injustiçada já. — Eu sou tudo menos egoísta. Você não vê? Não entende?
— Não, Lia. Eu não entendo — Liz negou com veemência e bagunçou um pouco os cabelos com as mãos. — Pode explicar?
— Eu não quero te deixar sozinha num momento como esses. Será que é tão difícil de entender? — cuspiu enraivecida, mas falou a verdade. — É tão horrível assim querer dar apoio para a minha namorada?
Liz olhou-a com sentimento, mas ficou calada. Lia percebeu que ela quis baixar a guarda, porém, depois de alguns segundos, pareceu mudar de ideia e seu olhar ficou gélido mais uma vez, assim como a sua voz.
— Se você está com medo de enfrentar isso, diga! Só não fica colocando esse peso para cima de mim.
— Como é que é? — perguntou sem entender o que ela queria dizer.
— Não coloque a culpa disso para cima de mim, Lia — Ela lhe deu as costas e sentou na cama parecendo nervosa. — Você se inscreveu, estudou, fez a prova e passou. Você fez tudo sozinha. Bastou que a gente tivesse a primeira discussão e se separasse para que tivesse coragem de se inscrever. Você sabe que é isso o que quer...
— Pelo visto você não sabe nada do que eu quero e não estou colocando a culpa em você, cacete!
— Está sim. Eu não quero que você desista por minha causa e lá na frente fique me culpando por ter perdido a oportunidade. Eu jamais me perdoaria.
— EU NÃO VOU COLOCAR A CULPA EM VOCÊ, PORRA! — gritou exasperada. Já não estava mais conseguindo controlar a raiva e o nervosismo. — Eu não estou fazendo isso por você, estou fazendo por nós...
— Não é desculpa, Lia — falou exasperada em uma tentativa de colocar a ideia em sua cabeça. — Você não vai abrir mão de nada aqui. É só aceitar e aproveitar. Só isso! Quando terminar o semestre você volta e continuamos de onde paramos. É simples!
Lia não podia acreditar no que ela estava falando. Não tinha nada de simples ali.
— Simples uma ova! Você sabe muito bem que a gente não consegue lidar bem com a distância.
Liz emudeceu e quebrou o olhar do dela, levantando-se e ficou de costas para ela, encarando a janela.
— Talvez a distância seja boa nesse momento — disse em não mais do que um sussurro.
— Como é? — repetiu para ver se tinha escutado direito.
— Você me ouviu!
Num impulso de raiva, foi até ela e virou-a para si abruptamente. Liz parecia quase à beira das lágrimas, mas se controlou.
— Que porr* você está falando?
— Talvez uma distância seja o melhor agora! — disse friamente.
A irritadinha sentiu um abalo no estômago e seu peito comprimiu de dor. O ar lhe faltou e o desespero apareceu de repente. Não era possível que aquilo estivesse mesmo acontecendo. Só poderia estar tendo um pesadelo horrível.
— O que você está querendo dizer com isso?
— Você me entendeu, Lia — Liz desviou o olhar das duas e foi sentar-se na cama mais uma vez. — Eu não faço bem a você. Nunca fiz! As coisas que o seu pai disse... ele tem razão.
— Foda-se o que ele disse, Liz — rapidamente sentou-se ao lado dela e as lágrimas começaram a se formar. — O que importa é o que a gente sente, só isso!
— Existem outras coisas nessa vida, Lia. Nem sempre a gente faz só o que quer. Escuta, nós temos tempo. Podemos recomeçar depois. Eu tenho esses problemas de família, a empresa e você precisa cuidar dos seus estudos. Temos outras prioridades agora.
— Para de falar essas besteiras, Liz! — respondeu já se sentindo assustada e uma lágrima correu por sua face. — Você sabe que a gente fez planos e você me disse que se eu passasse você iria comigo.
— Eu disse, mas agora eu não posso ir com você, Lia...
— Por que não? — exigiu saber. Se ela achava tudo tão fácil teria que lhe dar uma boa desculpa também, não iria facilitar nada. — O seu tio já foi preso, não foi? Luísa está se recuperando e está cada vez melhor. Vitória e Tomás estão com ela. Por que não pode vir comigo?
— Tem a empresa agora, Lia. Eu estou gostando de trabalhar lá e vamos passar por maus momentos com esse escândalo todo. Tia Luísa está se recuperando sim, mas o Tomás e a Vitória não se envolvem na empresa para poder ajudar...
— Ela tem o Artur — teimou com todos argumentos que tinha. — Ela sempre conseguiu se virar bem quando você vivia fugindo.
— Eu não sou mais aquela garota rebelde! — Liz virou-se para ela e franziu o cenho. Lia viu que os olhos dela também estavam marejados. — Não entende? Você foi a melhor parte da minha vida depois de um longo tempo no escuro, Lia.
— Eu fui? — perguntou se sentindo dolorida com a frase e mais uma lágrima rolou quente por sua bochecha. — Não sou mais?
— Não foi isso o que eu quis dizer — Liz fechou os olhos e esfregou as mãos na face. — Você sempre será importante para mim, mas tem que admitir que os nossos caminhos estão se separando agora. Não estamos ficando na mesma página.
— Eu estou fazendo de tudo para gente ficar na mesma página, mas você não está deixando...
— Porque é injusto! Olha só tudo o que eu já te causei?
— Você fala como se fossem apenas coisas ruins.
— Eu fiz você quase sair de casa, brigar com seus pais e nem estou conseguindo dar a devida atenção — enumerou cada coisa com a voz dolorida. — Essa é a verdade. Estamos distantes já, longe uma da outra e eu não estou com cabeça para isso agora. Esse intercâmbio veio na hora certa, sabe?
Parecia que uma fraqueza tomava conta do seu corpo. Seu coração batia já angustiado com todas as palavras que ela estava proferindo naquele momento. De todas as coisas difíceis que imaginava passar ao lado dela, um término era a última delas. Ainda mais assim prematuro.
Será que era assim tão ingênua? É claro que estava ciente de que não existiria apenas bons momentos no relacionamento, mas estava mais do que disposta a enfrentar todos os obstáculos ao lado dela. Não imaginava que Liz estivesse tão afetada assim. Não havia percebido nenhuma mudança recente que a levasse a agir daquela forma.
— Você só pode estar brincando comigo! — disse entre lágrimas e com a voz embargada. — Eu não podia imaginar isso acontecendo. De onde está vindo tudo isso?
— Eu estava suportando da melhor forma possível, mas depois dessa... talvez seja o melhor agora e depois a gente vê no que vai dar.
— No que vai dar? — repetiu irônica. — Eu sei muito bem no que vai dar. Vamos brigar muito e acabar terminando de todo jeito, é isso!
— Você fala como se não fosse voltar desse intercâmbio nunca mais. São só seis meses, Lia. Será que dá para não complicar? — Liz olhou-a de lado e parecia extremamente cansada.
— Por que quer tanto que eu vá? Seja sincera! — ordenou. Não era possível que ela estivesse daquele jeito todo somente por ter escondido isso.
— Eu já disse, Lia — Liz alterou-se e virou para si novamente. — Você não acredita em mim, nunca. Puta que pariu!
— Será que eu sou tão boba assim?
— O que quer dizer? — A rockeira perguntou confusa.
— E eu achando que você sentia o mesmo. Eu tinha certeza. E olha como você está me despachando tão fácil. O que está acontecendo?
— Não quero que perca a oportunidade por minha culpa — voltou a dizer com raiva. — Eu não estou despachando você.
— Você está terminando comigo, porr*! — Lia ficou de pé e dessa vez as lágrimas vieram ainda mais sem permissão, já não conseguia mais controlar.
— Eu não estou terminando. Você que está! — Liz foi até ela e segurou a sua face com as mãos. — Olha para mim, por favor!
Lia olhou-a, mas a visão estava embaçada. A rockeira enxugou suas lágrimas delicadamente.
— Eu não estou terminando. Estou apenas pedindo que aproveite a oportunidade e me dê um tempo para organizar mais a minha vida, é só isso. Por que é tão difícil?
— É difícil ficar longe de você, Liz — soluçou sem disfarçar. — Você não sente minha falta?
— Sinto, Lia — ela respondeu parecendo triste e com os olhos cheios de pesar. — Mas eu me sinto esgotada no momento. Estou me virando em várias para processar tudo. Eu quero estar com você cem por cento.
— Eu ia aceitar o seu pedido — falou em uma tentativa vã de fazê-la mudar de ideia. — Eu disse para os meus pais que iria morar com você. Não quero mais ficar na casa deles. Eu ia aceitar para gente poder ficar mais perto. Era isso o que eu queria falar com você.
Liz ficou apenas calada e acenou tristemente com a cabeça.
— Foi até bom você não ter aceitado — respondeu simplesmente. Lia tinha certeza que ela ficaria balançada com aquilo, mas estava errada. — Você estava certa e o seu pai também. Teria sido um erro!
Seu coração não aguentou ouvir aquilo e mais uma vez, as lágrimas e o soluço tomaram conta do momento. Liz a abraçou cheia de culpa, mas empurrou-a para longe. A última coisa que queria dela era pena
— Vai se fuder, Liz! Como eu pude me entregar tanto? Bem que todos me disseram para eu ir devagar com você, mas eu ignorei. Me joguei nisso de cabeça, fiquei sempre do seu lado. Te ajudei. E o que eu ganho agora?
— Não é bem assim, Lia... — Liz tentou se defender e parecia assustada. — Eu reconheço todo o bem que você fez por mim.
— Estou vendo mesmo. Diz que reconhece, mas me pede tempo e espaço porque não está mais me aguentando.
— Não foi isso o que eu quis dizer! — A morena tentou se aproximar, mas a irritadinha lhe empurrou novamente.
— Mas foi isso o que você disse!
— O problema não é só com você, mas sim com tudo o que está acontecendo. A soma de tudo — Liz disse frustrada e deu um longo suspiro. — Por favor, não faz isso ser mais difícil ainda. Se você aceitar ir para o intercâmbio, eu vou te esperar. Vamos nos falar todos os dias e eu posso até te visitar durante os seis meses. Isso vai ser bom para nós duas.
Era claro que Liz estava tentando se livrar dela. Liz sabia que essa distância seria o fim das duas e estava usando isso para terminar com ela indiretamente. Não achava que ela estava fazendo tudo aquilo apenas para que ela aceitasse ir. Já estava sentindo-a distante há um bom tempo e sua mente enciumada entrou em ação.
— Você cansou de mim? É isso?
— Claro que não é isso — Ela pôs as mãos na cintura e negou veemente.
— Fala a verdade! — Lia se aproximou com a raiva. — Está querendo sua liberdade de novo, não é? Eu sempre achei que você tinha largado a farra muito rápido e agora sozinha naquela cidade cheia de mulheres bonitas dando em cima de você...
— Cala a boca, Lia! — revidou aborrecida. — Você não sabe de nada!
— Você ficou com aquela tal de Amanda, não foi?
Naquele momento Liz olhou-a estupefata, porém, apenas bufou com impaciência. Lia estava odiando o modo como ela estava se comportando. Toda indiferente, como se não visse a hora da conversa acabar.
— Eu não fiquei com ela, mas quer saber de uma coisa?
— O quê? — disse olhando-a bem e já prevendo que o que viria a seguir iria lhe machucar mais ainda.
— Ela bem que tenta, mas eu não dei trela para as investidas.
— Eu sabia! — lágrima rolaram por sua face quando as suspeitas se confirmaram. Apenas pelo tom de voz dela naquele dia, sabia que aquela tal Amanda tinha segundas intenções com sua namorada.
— Eu nunca fiquei com ela, nem com qualquer outra — Liz voltou a se defender. — Eu jamais iria te trair assim.
— Mas você quer?
— Quero o quê?
— Você quer ficar com ela? — perguntou com o coração na mão. — É por isso que está pedindo esse tempo?
Liz apenas olhou-a com pesar e ficou calada. Ela parecia pensar no que dizer. Depois de alguns poucos segundos, apenas declarou:
— Eu não quero te magoar, mas eu preciso mesmo disso. Só me diz que vai aceitar a proposta. É o certo a se fazer, Lia.
— Você sabe que a gente não vai resistir a essa distância, então por que não termina logo tudo? — foi para cima dela, ficando cara a cara. As duas estavam a milímetros de distância.
— Eu vou pedir novamente, Lia. Não faz isso ser mais difícil do que já é...
— Se põe no meu lugar, porr*! — explodiu de forma acusatória mesmo apesar das lágrimas. — Você aparece na minha vida, faz eu me apaixonar, vive me fazendo promessas, dizendo que me ama, pedindo para eu ir morar com você e de repente vem dizer que não quer mais nada. Que porr* você está fazendo?
— Eu não quero que você desista do intercâmbio por mim — Liz respondeu exasperada. — Será que não é óbvio?
— Quem decide isso sou eu, já falei. O que você está escondendo?
Liz bufou e afastou-se dela mais uma vez.
— Foi você que escondeu as coisas dessa vez! — declarou tristemente.
— Não faz isso com a gente, Liz, por favor!
Lia não se controlou e abraçou-a apertado por trás. Seu peito doía de agonia, paixão, tristeza, mas também de muitas saudades. Queria que ela parasse e abandonasse aquela ideia estúpida de uma vez por todas. Não era possível que ela acabasse com tudo entre as duas assim tão fácil. Tinha certeza que ela a amava.
Sentiu quando ela afagou as costas de suas mãos suavemente e levou-as até a boca, lhe dando um beijo casto.
— Eu já disse que quando você voltar eu vou estar aqui.
— Você sabe que a gente não consegue funcionar bem com a distância — sussurrou no ouvido dela com todo o sentimento que pôde. — Não me pede para ficar longe de você.
Liz virou-se para ela e parecia irritada, novamente.
— O que você sente não é forte o suficiente para resistir a um semestre?
— O problema não sou eu — retrucou de forma decidida e Liz franziu o cenho em confusão.
— E qual o problema exatamente? — perguntou sarcástica. — Acha que eu vou te trair, é isso?
Lia tinha certeza que Liz não resistiria a seis meses sozinha naquela cidade, ainda mais ela sendo tão simpática e linda com as pessoas. As meninas eram doidas por ela onde quer que fosse e isso lhe tirava do sério. Tinha certeza de que não suportaria uma traição, por isso, preferia terminar logo do que ser enganada se é que Liz já não fizera nada.
— Relacionamento à distante não dá certo...
— Você não confia em mim, não é? — Liz abriu os braços e balançou a cabeça como se tudo fosse um grande absurdo. — Esse é o problema! Acha que eu posso te trair sem mais nem menos. Pois eu confio em você e vou estar aqui esperando quando o intercâmbio terminar. Você não precisa dificultar as coisas.
Lia queria tanto acreditar naquelas coisas que ela dizia, mas se sentia contrariada. Por que era tão difícil para todos aceitarem a sua decisão? Jamais se arrependeria de ficar ao lado de Liz e poderia muito bem conseguir a chance do seu intercâmbio como sempre planejara. Não sentia o mínimo de vontade de ir e não sabia explicar. Só de pensar em fazer essa viagem, sentia uma aflição. Aquele não era o momento.
— Eu não quero esse intercâmbio agora, já disse!
— Você só quer as coisas do seu jeito — Liz colocou as mãos na cintura e negou com a cabeça. — Vai se arrepender de desistir do seu sonho e eu não vou ser a responsável por isso. Saiba que você indo ou não, mesmo assim, eu quero um tempo.
Lia não poderia crer no que estava ouvindo. Pensava que estava conseguindo mudar o rumo da conversa, mas não. Não queria acreditar que Liz quisesse mesmo terminar tudo. Era impensável, mas era mesmo verdade.
— Vai se fuder, Liz!
Empurrou-a com força e saiu do quarto às pressas. Não estava mais aguentando ouvir aqueles disparates e ficar argumentando. Liz a queria longe e isso acabou com sua autoestima e confiança. Bateu a porta dela com força e saiu quase correndo pelo corredor. Sentiu os passos dela apressados atrás de si.
— Calma, Lia! — A rockeira lhe puxou pelo braço. Ela tinha uma expressão triste e culpada na face, além de algumas lágrimas. — Eu não quero que as coisas fiquem assim entre nós, por favor!
— Você quer que eu fique como, porr*? — deu uma forte sacudida no braço, livrando-se da mão dela. — Você fica bem e eu como?
Não entendia as lágrimas dela e isso apenas lhe deu mais raiva. Não suportava a ideia de não se verem mais.
— Eu não estou bem. Você é importante para mim.
— Estou vendo mesmo — rebateu irônica e mais lágrimas rolaram. — Eu vou te dar o seu tempo e agora me deixa em paz, Liz. Me esquece!
— Eu não vou deixar você sair assim sozinha.
— Você não é mais nada minha, não precisa se preocupar.
Lia saiu desabalada da pousada e caminhou à esmo por vários minutos. Estava sentindo desespero misturado ao vazio. Parecia que estava em um pesadelo e não via a hora de acordar. Um término com Liz era a última coisa que ela pensava que aconteceria quando recebera a ligação dela mais cedo.
Como ela pôde ser capaz disso? Como ela teve coragem de deixá-la depois de tudo o que fizera por ela? Lia se doara tanto ao relacionamento que agora estava perdida. Tinha certeza que iria sair da casa dos pais e virar dona da própria vida, porém ali estava ela, mais perdida do que nunca.
Ainda não estava acreditando e apesar do desespero, bem lá no fundo, esperava que ela fosse reconsiderar tudo e voltar atrás na decisão. Simplesmente não conseguia mais imaginar sua vida sem Liz. O que iria fazer de agora em diante? E tudo por culpa de Pedro. O ódio lhe atingiu com força e ao menos a raiva momentânea lhe deu um rumo.
Seus olhos estavam embaçados devido às lágrimas, mas enxugou-as e aumentou a velocidade dos passos até em casa com certa obstinação. Antes de entrar, respirou fundo e foi logo atrás de Pedro. Ele estava trancado no quarto. Sem pensar, Lia bateu na porta com força e brutalidade. Logo o irmão apareceu, parecendo assustado com a zoada.
— Lia! O que aconteceu? — O irmão perguntou ao ver sua face avermelhada pelo choro.
— Você está satisfeito agora? — empurrou-o com força no peito e ele quase caiu no chão. — Se arrependimento matasse eu estaria morta. Morta por ter confiado em você.
— Calma, mana! — Ele levantou as mãos em rendição e olhou-a com pesar. — O que foi dessa vez?
— A Liz terminou tudo comigo! — disse segurando o choro e com a voz embargada. — O pai acusou ela de um monte de coisas e agora ela terminou comigo!
Falou tudo em um folego sofrido e pôs-se a chorar. Pedro pareceu estarrecido com a notícia e ficou calado por muito tempo. Tinha vontade de dar um soco bem dado na cara dele.
— Lia... — Pedro tentou se aproximar, mas ela afastou-se.
— Vai se fuder, Pedro! — disse com raiva e saiu do quarto antes que sucumbisse ainda mais à raiva.
O irmão não satisfeito, pegou-a pelo braço e lhe fez encará-lo.
— Eu só quis te ajudar, mana! Eu não fazia ideia de que a Liz poderia terminar com você por isso...
— Sinceramente eu nem sei se foi mesmo só por isso, mas foda-se. Estávamos bem. Ela está chateada por todas as coisas que o pai disse e tudo por sua culpa!
Pedro baixou a cabeça parecendo envergonhado.
— Não era a minha intenção... o pai pediu mesmo o número dela, mas ele me disse que ia apenas ter uma conversa com ela sobre... o que ele disse?
— O que você acha? Ele disse que era culpa dela eu não aceitar a vaga. Consigo imaginar o monte de barbaridades que ele deve ter dito para ela. Puta que pariu! — levou as mãos até a face em desespero e começou a chorar novamente. — Eu já tinha decidido tudo.
— Mana... — Pedro tentou abraçá-la, mas Lia não deixou, empurrando-o.
— Espero que esteja contente com isso, Pedro. E não me chama de mana.
— Lia... — Ele voltou a chamá-la, mas apenas ignorou e correu para o quarto se trancando.
Atirou-se na cama com peito doendo. Nunca sentira tanta dor antes, nem mesmo quando elas haviam terminado naquela primeira vez. Agora estava tudo muito mais intenso, mais real. Sua vida não era mais a mesma sem ela e ainda não conseguia processar o que havia acontecido. Não queria acreditar que Liz terminara com ela de modo tão frio.
Chorou tanto que sua cabeça começou a latejar de dor. Estava se sentindo tão cansada que acabou dormindo de roupa e tudo...
***
Pov Liz
Assim que Lia foi embora, Liz pediu que Greg a seguisse de longe apenas para que ela voltasse para casa em segurança. Sabia que ela tinha o guarda-costas disfarçado que a tia havia contratado para ela, mas mesmo assim, mandou-o atrás dela.
Voltou para o quarto, deitou-se na cama e colocou para fora todo o choro que havia segurado. A expressão de decepção e raiva na face de Lia nunca sairia de sua mente. Por que tudo tinha que ser tão difícil com ela? Seria tão mais fácil se ela apenas tivesse aceitado ir, mas Liz sabia que ela era teimosa e que não iria desistir de sua escolha. Terminar parecia ser a única solução, infelizmente.
Chorou por incontáveis minutos, até que Greg lhe ligou informando que ela havia chegado bem em casa.
Liz teve medo. Perguntava-se como conseguiria seguir sem Lia ao seu lado. Era impensável. Sabia que havia quebrado a confiança e o coração dela ao recusá-la com o fato de irem morar juntas. Tinha certeza que a irritadinha a estava odiando com todas as forças naquele momento.
Por muitas vezes durante a conversa, Liz considerou dizer toda a verdade a fim de que ela entendesse suas motivações e o perigo que ela poderia estar correndo apenas por ser sua namorada. No entanto, mentiu. Além de não querer preocupá-la, tinha medo de que ela apenas se recusasse ainda mais a sair de perto de si. O pior é que agora ela deveria estar tendo as ideias erradas, achando que Liz era apenas uma filha-da-puta e escrota.
Seus pensamentos destrutivos foram interrompidos pelo toque do seu celular. Pegou-o sem muito interesse e viu o nome de Pedro no visor. Seu coração acelerou e tentou disfarçar a voz de choro antes de atender a ligação. Com certeza ela havia chegado em casa “fumaçando pelas ventas”. Deus sabia o que ela seria capaz de fazer num momento de raiva.
— Alô! — atendeu incerta.
— Liz, que porr* aconteceu entre vocês? — as palavras dele lhe deram pontadas no peito. Imaginava o que ela poderia ter feito.
— A gente discutiu feio. Ela está bem? O que ela fez? — adiantou-se preocupada.
— Ela se trancou no quarto, mas está bem na medida do possível. Onde você está?
— Eu estou na pousada agora. Por quê?
— Será que eu posso ir conversar com você?
A perguntou lhe pegou de surpresa, mas jamais iria negar um pedido de seu ex-cunhado.
— Pode vir sim. Estou no quarto 7.
— Ok, eu chego já por aí.
— Ok.
Desligou e ficou sentada na cama, olhando para o nada e já totalmente arrependida por ter feito o que fez, mas era até bom Lia pensar que estava sendo uma escrota, assim seria mais fácil dela seguir e aceitar o término. Mesmo sabendo de todas as motivações que a levaram a fazer aquilo e saber que tudo era apenas pela proteção dela, ainda assim, a dor não diminuiu. Sabia que ao fazer aquilo poderia perdê-la de verdade.
Logo o telefone ao lado da cama tocou. Era a recepcionista avisando que Pedro havia chegado. Liberou a entrada dele e aguardou tensa até ouvir as batidas na porta. Foi até o banheiro rapidamente lavar o rosto e foi atendê-lo.
— Oi, Pedro! — cumprimentou-o sem jeito e deixou o caminho livre para que ele pudesse passar.
— Oi, Liz! — cumprimentou-a de volta, educado como sempre. — A Lia disse que vocês terminaram. É verdade?
Liz estava nervosa, mas teve vontade de rir com o nervosismo. Pedro era tão direto quanto a irmã, sabia disso.
— É verdade, mas eu não tive escolha.
— Como assim, Liz? A Lia chegou arrasada em casa, chorando e me culpando por tudo.
— Culpando você? — perguntou sem entender. — Por quê?
— Ela está com raiva por eu ter contado ao pai e à mãe sobre o intercâmbio.
— Eu imagino como ela está agora, mas não leva em consideração. Sabe como ela é quando está com raiva. Você fez pensando no bem dela e que bom que contou tudo.
Pedro balançou a cabeça desolado e parecia culpado.
— Eu já não sei se fazer isso foi bom. Liz, ela está arrasada. O que aconteceu?
Ouvir aquelas palavras foi como facadas em seu coração. Automaticamente levou a não até o próprio peito como se aquilo servisse de algo.
— Tem muita coisa acontecendo agora, Pedro. Eu não estou sendo uma boa influência para Lia. Só consegui fazer ela brigar com os pais e nem consigo dar a atenção que ela merece. Eu estou tento problemas de família, as coisas estão incertas.
— É, ela me contou tudo e também passa sempre no jornal.
— Pois é. Talvez terminar seja o melhor mesmo. Ela me disse que não ia aceitar a vaga e eu não quero carregar a culpa disso. Seu pai tinha razão no final do tudo — refletiu se sentindo ainda mais culpada. — Eu estou distraindo a Lia dos sonhos e do futuro dela.
— A minha irmã é doida por você, Liz. Desculpe me meter assim, mas será que não tinha outro jeito?
— Eu disse a ela, Pedro — tentou se defender. É claro que levaria a culpa de tudo. — Pedi que ela aceitasse a vaga. Eu disse que a gente podia se relacionar à distância e que eu esperaria por ela. Que depois dos seis meses eu estaria aqui e que a gente ia continuar de onde parou, mas ela é teimosa. Puta que pariu! — exclamou frustrada.
— Eu sei bem como ela pode ser teimosa — respondeu compreensivo. — O que a gente vai fazer agora?
— Eu não sei.
Pedro sentou-se na cama e ficou calado. Liz então foi até ele, ficando lado a lado.
— Eu não estou mais no caminho como o seu pai disse — Liz engoliu em seco e a voz de Horácio ainda ecoava em sua mente. — Vocês precisam convencê-la a ir.
— Agora mesmo é que ela vai ficar puta, se recusando a ir.
— Talvez não, Pedro! Quando a Lia está com raiva de mim ela consegue sempre ver as coisas mais claramente. Infelizmente é a verdade.
— Ela nunca vai me perdoar por isso!
— Vai sim. Ela te ama. No fundo ela sabe que está errada e logo vai se dar conta disso, mesmo que não admita.
— Você está muito racional com tudo isso — ele disse com estranheza. — Ela acha que você terminou com ela por alguma outra coisa também.
— Eu já disse que tem muita coisa rolando agora, mas eu não quero magoá-la. Também está doendo em mim, acredite!
Pedro apenas concordou com a cabeça e ficou olhando para o nada até que Liz teve uma ideia. Era um pensamento bastante incômodo, mas tinha que encarar aquela realidade.
— Escuta, Pedro! Tem uma pessoa que pode ajudar com tudo isso do intercâmbio.
— Quem?
— A Vanessa — disse em um suspiro.
Só de pensar que Lia passaria um semestre juntinho de Vanessa já lhe dava voltas no estômago, mas infelizmente era o preço a ser pago. Se as duas estivessem mesmo destinadas a ficarem juntas, encontrariam o caminho de volta posteriormente.
— Ah, uma ruiva amiga dela?
— Essa mesma. Ela também passou nesse intercâmbio e até onde eu sei, ela já se organizou com muita coisa para ir. Tenho certeza que ela vai ajudar a Lia no que for preciso.
— Então é isso? — Pedro perguntou.
— O quê?
— Não tem chance nenhuma de vocês...?
— A Lia é difícil quando quer e eu só quero que ela faça a coisa certa.
Pedro parecia querer falar algo, mas acabou calando-se.
— Ok, não é da minha conta!
Ele apenas ficou de pé e foi em direção a porta. Liz o acompanhou, mas antes que ele pudesse ir, ela falou:
— Escuta, Pedro! Não fica pensando que eu sou uma escrota, é só que...
— Eu não estou pensando nada, Liz. Eu te entendi.
— Por favor, fica sempre do lado dela. Não deixa ela perder essa oportunidade — pediu em um fiapo de voz. Estava se sentido fraca e desanimada.
— É isso que eu estou fazendo, não se preocupe.
— E mais uma coisa — disse incerta. Estava sem jeito de falar isso, mas precisava. — Se eu puder fazer algo para ajudar, mesmo que de longe, me avisa, por favor! Se ela precisar de dinheiro para se manter bem por lá...
— Pode parar por aí, Liz — Pedro levantou a mão e balançou negativamente a cabeça. — Eu não quero mais me meter entre vocês duas, tá? E meus pais não aceitariam nada seu. Ainda mais agora. É melhor eu ir.
— Desculpe!
— Espero que você consiga se resolver também com as suas coisas.
— Obrigada!
Pedro lhe deu as costas e foi-se embora acanhado.
Liz estava totalmente perdida e sem saber o que fazer a seguir. Não sabia em quem confiar, ou se Flávio era mesmo inocente. E agora nem tinha mais Lia para poder contar. Como conseguiria suportar tantas coisas de uma só vez?
***
Fim do capítulo
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kasvattaja Forty-Nine
Em: 09/11/2020
Olá! Tudo bem?
Sabemos que você, Autora, já tem tudo esquematizado para o final do seu conto, mas nós — do lado de cá, sempre ansiosas — não fazemos a mínima ideia.
Então, é confuso — e porque não dizer decepcionante —, para mim, depois de quase 50 capítulos, as duas separarem-se.
Enfim, parabéns pela sua escrita, você é muito boa.
É isso!
Post Scriptum:
''Decidir comprometer-se com resultados de longo prazo ao invés de reparos a curto prazo é tão importante quanto qualquer decisão que você fará em toda a sua vida.''
Anthony Robbins
Resposta do autor:
Olá kasvattaja Forty-Nine!
Eu estou bem sim e você???
O seu comentário chamou muito a minha atenção. Gostei dessa estrutura. S2
Olha que eu sou uma autora de primeira viagem. Essa foi a primeira estória longa que escrevi, então foi tudo meio que incerto para mim. Eu confesso que não planejei todos os passos cuidadosamente até aqui, mas acho que vem dando mais ou menos certo. Kkkkk fica a sabedoria se eu por acaso for escrever uma próxima, mas enfim...
Eu entendo totalmente o seu ponto de vista. Fiquei pensando se eu deveria deixar as duas se separarem ou não justamente devido ao estágio avançado que a estória se encontra, mas vamos ver se o que eu planejei vai dar certo. Eu estou com medo de arruinar tudo, acredite! Rsrsrs
Agora assim, creio que as motivações sobre tudo o que aconteceu tenha ficado claro para que a Liz tenha tomado essa decisão. Eu acho que no fundo a gente nunca iria querer sujeitar a outra pessoa a um risco desses, por isso, eu até entendo o lado da Liz
Obrigada pelo comentário, eu gostei muito muito mesmo. ?
Beijinhos e espero que continue nos acompanhando.
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Sonne
Em: 09/11/2020
Perdi o fôlego lendo esse capítulo. Senti a dor delas. Que história, senhoras! Por favor, não demore pra postar os próximos capítulos ????
Resposta do autor:
Olá Sonne
Eu perdi o fôlego também ao escrever esse capítulo. Mesmo sabendo o que iria acontecer, ainda assim, foi bem sofrido. Cada uma com suas dores e problemas... mas assim é a vida, não é? Nem sempre é justa!
Vou fazer de tudo para não demorar com o próximo. Já estamos nos capítulos finais e eu estou ansiosa para finalizar de vez essa estória. Rsrsrs
Eu fico muito feliz que tenha gostado mesmo das minhas meninas e que tenha nos acompanhado até aqui.
Obg pelo lindo comentário.
Beijinhos!
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Ester francisco
Em: 09/11/2020
Cara!!! Não acredito q elas terminaram!!!! Pqp!!!
Ok...pensando friamente até dá pra entender o ponto de vista de cada uma. Mas ve-las assim....separadas e sofrendo chega doer no coração.
Fiquei triste agora...muito triste...
Parabéns pelo capítulo. Arrasou!!!
Por favor....não demore a nos dar boas notícias ok? Rsrsrsrs
Beijoss
Resposta do autor:
Olá Ester!????
Acredite, foi tenso escrever esse capítulo. A Liz agiu de forma tão fria com a Lia, não sei mesmo como ela conseguiu, mas ela fez isso acreditando que fosse o melhor para sua irritadinha.
Eu temo pela Lia sempre irritada, impulsiva e vingativa. Quero ver o que ela vai fazer a seguir com toda a situação porque perder a sua rockeira vai mexer muito com a cabeça dela.
Fico feliz que tenha gostado do capítulo apesar de tudo.
Beijinhos!????
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