Este capítulo não é recomendando para Érika fãs.
Mas leiam mesmo assim, por favor kkkkkk
Capitulo 22: Vapor sabor morango
Quando Audrey voltou à mesa para uma nova tentativa de convencer Catarina a dançar, tomou um susto com a ausência da amiga. A banda já estava ensaiando um encerramento e seria, em breve, substituída por um ex-aluno que trabalhava como DJ. Pedro Henrique estava fora de seu corpo, precisou ser chacoalhado duas vezes para responder à pergunta que ela fazia:
- Pedrinho? Acorda!
- Hã? O que houve?
- Cadê a Cate? Você disse que ela estava aqui.
- Sim, a Cate é muito legal, né?
- Cara, o que está rolando contigo? Anda, vamos procurá-la, não acredito que tenha ido pra casa, precisa passar na minha antes para pegar o Bruce.
- Então vou procurar no banheiro e você procura pela pista...
- Acho que quem tem que procurar no banheiro sou eu, né? Ai, ai, você tá no mundo da lua hoje. Vamos logo, tô preocupada, ela não atende!
- Tá, tem razão, já voltei pra realidade. Vou andando em direção à saída, quem achar primeiro liga para o outro!
Alheia à preocupação dos amigos, Catarina continuava compartilhando a noite estrelada com a presença inusitada de Raga. Não atendia ao celular porque nem olhava para ele. Há algum tempo nenhuma das duas falava coisa alguma, o silêncio, no entanto, não era nem um pouco constrangedor. Seus corpos estavam tão próximos que os braços se encostavam. Cate percebeu que Raga sentara daquela forma de propósito, havia espaço de sobra naquele lugar, porém, não protestou. Nem mesmo quando a garota dos cabelos coloridos encostou a mão na dela, sem motivo algum, e falou:
- Sua mão está quente.
- E a sua tá muito fria. Mas acho que quem está fugindo do normal aqui sou eu. Estamos na beira da piscina, a céu aberto. - Disse Cate, sem retirar a mão de Raga da sua.
- Se você soubesse... nunca fugi tanto do normal como nos últimos dias.
- Acho que estar aqui comigo é fugir do seu normal, não é?
- Não, isso parece terrivelmente certo pra mim. - Sorriu - Mas pra você, não sei. Seus amigos já teriam te puxado pra bem longe da "Raga, a revoltada", muito provavelmente...
- Nunca tinha visto isso também...
- O quê?
- Seu sorriso. É muito bonito, profundo que nem...o seu olhar...
- Hmmm, tá dando em cima de mim?
- Quê? Não! Só reparei! Você nunca sorri na sala, parece estar sempre séria!
- Esta escola não dá muitos motivos pra sorrir, vamos combinar.
- Você também não gosta daqui, né?
- Só quem gosta da Gagnon é quem tá disposto a ser hipócrita igual à gestão dela. Você ouviu o discurso do Júnior? "Aqui, na Artur Gagnon, somos todos parte de uma grande família", ah, vá à merd*! Uma família que esconde o bullying que Richardson e os outros amiguinhos dele praticam, além da homofobia, do racismo e de outros preconceitos...
- Ouvi e concordo com o que você disse sobre o diretor, mas não acho que todos fazem parte dessa corja, a Elizete, por exemplo, eu vejo que se dedica.
- Você não sabe de muita coisa, pelo visto.
- Que quer dizer?
- Sabe quem é a Elizete? Minha tia. E sabe de quem mais ela é tia?
- Não.
- Do Richardson!
- Então você e ele são...
- Somos primos. Não que eu me orgulhe disso. Meu pai, a mãe do Richardson e a Elizete são irmãos. Ele era o mais velho.
- Não brinca!
- Tô falando sério. E tem coisa pior do que isso. Nunca se perguntou por que eu vivo "suspensa" enquanto o Richardson apronta todas e ganha, no máximo, uma advertência?
- Em algumas vezes, sim. Mas achei que fosse por conta do futebol, dos prêmios que eles ganham nessas competições estaduais. Pensei que o diretor Júnior pedisse pra Elizete só ameaçar, pra não ficar tão aparente a bajulação...
-- O Júnior não precisa pedir nada, a Elizete passa panos quentes por ela mesma, porque o Richardson é o padrão ideal de jovem que nossa família deseja.
- Como ele pode ser o padrão ideal? É escroto no mais alto nível que alguém pode ser!
- Por ser o principal jogador do time de futebol da escola, o artilheiro, além de estar quase certo de ir treinar num time profissional assim que tiver a idade. Ele vai à igreja às quartas e aos domingos, é heterossexual. Ele trans* com as meninas no vestiário, no estacionamento, até nas salas de aula quando estão vazias e todo mundo sabe e acha certo. Eu fui suspensa duas semanas porque fui pega beijando a Beatriz, do terceiro D. E era só um selinho, nada mais.
-- Foi pega pela Elizete?
- Sim, estávamos escondidas atrás do carro do professor Valdir, mas ela me segue por todos os lados. Quer a mínima oportunidade para contar tudo que faço ao meu padrasto pastor. Não tá no meu pé agora porque tá ocupada com o professor de história.
- Então aquele papo de você arranhar o carro, de cuspir na cara de não sei quem, era tudo mentira?
- Sim, está decepcionada? Posso manter a má fama se quiser...
- Eu tô é indignada! Por que você aceita passar por isso?! Inventam essas coisas horríveis, você não fez nada demais!!
- Porque, por enquanto, a corda vai arrebentar pro lado mais fraco, que é justamente o meu. A convivência lá em casa não é das melhores desde que minha mãe casou de novo, meu padrasto é super conservador e muito amigo da Elizete. Além disso, ela parece ter um acordo com a minha outra tia, a mãe do Richardson, envolvendo muita grana. Era viciada em jogos de azar, não preciso dizer mais nada... Você já entendeu, né? É uma luta que travo sozinha.
- Entendi, então toda a família protege o garotão mimado e você sai como "ovelha negra". Mas, algumas vezes, me corrija se estiver errada, o Richardson recua um pouco quando está perto de ti... Por quê?
- Porque ele tem um ponto fraco. Dois, pensando bem. Um deles é que ele realmente usa essas paradas ilegais pra ganhar músculo e a família encobre o que pode com dinheiro. A outra, ridícula, é que ele tem uma anomalia no pau... Em outras palavras, um pinto minúsculo. Uma bobagem, mas pra quem liga tanto pra essas merd*s de status como ele...
- Eu sabia! Então é isso que a Audrey joga na cara dele... ela nunca falou abertamente...
- Sua amiga é muito corajosa, como ela conseguiu dormir com ele? Eu sei da anomalia porque fiquei com uma ex-namorada dele, mas as garotas morrem de medo de espalhar, por causa das ameaças que recebem depois!
- Ela odeia lembrar, mas aconteceu no primeiro ano, ninguém se conhecia direito...
É fascinante como os problemas dos outros fazem os nossos parecerem pulgas. Catarina começou a achar que uma rejeição amorosa e a provável separação dos pais não eram nada comparados a viver como Raga, que perdera uma pessoa importante para si e sofria julgamentos precipitados de todos, simplesmente por amar outras mulheres. Foi a segunda vez em menos de um mês que olhou para a dor das outras pessoas como se carregasse um microscópio. Primeiro, viu de frente o sofrimento de Érika com seu pobre pai, vítima de um acaso malicioso, por vezes inexplicável, como o câncer. Agora, via Raga, uma pessoa a quem foi negado o direito de amar, alguém que matava mais de um leão por dia, e sozinha.
Érika. Desde que começara a conversa com Raga, esquecera temporariamente o motivo que a levou até a caminhada para a beira na piscina. Se a companhia da outra garota tinha esse poder, desejava não encerrar mais aquela noite. E parecia que o desejo de prolongar aquele encontro era mútuo.
- Quer ver outro motivo pelo qual fui "suspensa"?
- Quero.
- Vamos sair daqui. Está mais pra dentro do mato, depois dessa grade. Consegue pular?
- Consigo. Vamos!
A primeira a pular foi Raga, que não sentiu muita força na alegação de Cate e amparou sua queda com os braços, cuidadosamente. Caminharam cerca de dez minutos após o pulo, chegando a uma cabaninha improvisada de papelão, madeira e jornais. Raga tirou da bolsa que carregava o vaporizador sabor morango e o acendia, enquanto Catarina conhecia quem eram os moradores daquele abrigo recém-descoberto por ela.
- Que gatinhos mais lindinhos! Você quem construiu esta casinha para eles?
- Aham. Um dia, encontrei a mãe deles no caminho para a escola. Infelizmente ela estava muito fraquinha, não resistiu ao parto. Daí, faltei aula por uns três dias para ficar cuidando.
- Uau, você quem fez o parto?
- Sim, não tive muita escolha, não deu tempo levá-la ao veterinário.
- Você deveria ser veterinária, já pensou?
- Já, mas prestei pra engenharia civil na UNIFORTE... no exame ANUFEP vou tentar veterinária, com certeza.
- Ei, também fiz pra engenharia! Como não te vi no dia da prova?
- Eu te vi. Estava na sala ao lado da minha.
- Desculpa não ter notado...
- Não acho que teríamos nos falado no dia...
- É, eu estava com a cabeça em outro lugar. Foi o dia em que encontrei meu pai com a...
- Com a mulher por quem você está apaixonada?
- Infelizmente, sim. Mas tenho que desencanar, ela já deixou bem claro que não gosta de mim do mesmo jeito.
- É a primeira vez que gosta de uma mulher assim?
- É a primeira vez que gosto de alguém assim.
- Dói pra caralh*, né? Mais do que aquela bolada que você levou na quadra...
- Você viu aquele mico? Meu lábio ficou inchado por um tempão!
- Vi... inclusive nunca me contou se gostou do sorvete...
- Foi você quem deixou aquele cupom na enfermaria?!
- Pois é...
- Obrigada! Mas por que fez isso? Naquela mesma semana estava tirando onda com a minha cara, dizendo que eu parecia uma crente, ahahah.
- Vai saber o que se passa na minha cabeça, né? - Soltou um longo rastro de vapor pelas narinas e pela boca.
- Você gosta mesmo dessa coisa, viu?
- O vape? É gostoso. Não quer tentar mesmo?
- É que tenho medo de me engasgar e passar vergonha, ahahah.
- Podemos tentar um negócio pra evitar...
- O quê?
- Abre a boca, vi duas meninas fazerem isso num seriado uma vez. Era com um baseado, mas acho que dá certo com vape também.
Catarina não se importou em entender o que aconteceria se atendesse ao pedido de Raga. Naquele instante, tendo apenas a lua e os gatinhos órfãos como testemunhas, ela apenas confiou na outra menina.
Então, a garota de cabelos cor-de-rosa inalou parte do vapor, sem soltá-lo imediatamente. Pôs as mãos em posição de concha, chegou perto de Catarina, que já a esperava com os lábios entreabertos, e compartilhou o vapor boca a boca. Catarina sentiu o sabor morango, surpresa por ser verdadeiramente gostosa a sensação, tanto da inalação quanto da proximidade de Raga aos seus lábios. Sem tirar os olhos e nem se afastar do rosto dela, perguntou:
- É bom mesmo. Bem gostoso. O que aconteceu no seriado, depois disso?
- Depois disso elas se beijaram.
- Ba...bacana...
- Muito bacana. Desse jeito aqui.
E assim aconteceu, a primeira vez que Catarina sentiu os lábios de outra garota aos seus. E como eram diferentes, na textura, na vontade, na calma em que eram encaixados. A altura de ambas não era tão diferente, ninguém precisou se abaixar ou levantar a cabeça. Não precisava ficar na ponta dos pés, nem encarar clavículas tatuadas em latim. Não precisou tomar a iniciativa, dizer palavras bonitas ou pensar nas consequências. Abrir os olhos seria um desperdício de sinergia, as mãos passeavam por sua cintura como tinha que ser, as línguas pareciam dançar em conformidade uma com a outra, maciez com maciez, numa espécie de sincronia natural. Tinha gosto de morango.
Fim do capítulo
Dizem que Pedrinho e Audrey tão procurando Catarina até agora, será que encontram? kkkkkk
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malumoura
Em: 21/10/2020
Ai que fofura, mesmo que não fiquem juntas, é legal ver a Cat vivendo longe do ciclo Érika - Rodolfo, pelo menos pra mim. Sobre a família da Raga: meu Deus que povo nojento, ninguém sabe qual o mais ridículo. Eu ri com o pobre do Pedrinho Hahahah espero que ele e a Audrey não procurem muito.. vai ser difícil achar. Sobre o curso um conselho: corram!! tô até hoje sonhando com cálculo de fundações hahahahha gostei do capítulo :)
Resposta do autor:
Kkkkk pior que sei bem pouco desse universo das exatas, mas tudo nesta história tem um propósito
Vim avisar que daqui a pouco tem mais! Obrigada pelo apoio!
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cris05
Em: 21/10/2020
Na vibe em que a Cate está, acho difícil que Pedrinho e Audrey encontrem kkkkkk.
Eita que agora até gosto da Raga rsrsrs, mas ainda sou team Érika.
Resposta do autor:
Kkkkk obrigada pelos comentários!
Fico morrendo de medo de dar spoiler pra vocês, então digo só "aguarde, os próximos capítulos" kkkkk
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