Capitulo 68 - Quarentena
Manhã de sol, um belo dia nascendo do lado de fora, e Lívia abria os olhos á com um sorrriso faceiro, sentindo um arrepio em sua espinha, enquanto remexia levemente seu quadril conforme seu marido movimentava sua língua contra os lábios menores da vulva da futura dermatologista em uma forma peculiar de dizer bom dia.
“Continua, por favor...” Lívia pede, com a voz manhosa, quando seu esposo repentinamente cessa o movimento.
“Eu escutei a porta bater, acho que é serviço de quarto.” Dante coloca o roupão e vai atender.
“Felicitações ao casal!” Helena aparece.
“Amiga!” Lívia rapidamente se cobre. “O que está fazendo aqui?”
“Como assim o que estou fazendo aqui? Avisei vocês que passaria de manhã para entregar a segunda parte do presente de casamento!” A garota então olha para o lado, antes de entrar. “Venham, é por aqui!” Ela ordena e dois entregadores chegam com caixas.
“O que é isso?” Dante questiona.
“Bem, sei que o casamento de vocês será bem difícil no inicio com a distância e tudo mais. Por isso encomendei um sistema de realidade virtual para vocês dois, assim a distância diminui e videochamadas não serão mais como antigamente.” Helena ri.
“Amor, a gente vai poder trans*r em 3D!” Lívia se empolga e se envolve em seu cobertor para poder se aproximar da caixa.
“Nem acredito! Obrigado, Helena!” Dante abraça a amiga e para sempre veterana.
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A rotina no hotel corria bem, hóspedes fazendo check-in, outros fazendo check-out, apenas um pequeno problema no painel do elevador que estava em processo de conserto pelo pai de Isabel, funcionário exímio. O senhor arrumava tranquilamente quando foi surpreendido por sua filha logo pela manhã.
“Minha querida, o que está fazendo aqui?” O funcionário questiona.
“Hoje é seu aniversário, pai, e quando o senhor voltar do serviço eu ainda estarei no hospital, então queria comemorar...” Isabel oferece um cupcake com uma velinha.
“Minha filha, não precisava...” O pai limpa as mãos em uma flanela e recebe o singelo presente.
“E não é só isso... tomei a liberdade de comprar um novo carro para o senhor, ele já está no estacionamento do hotel!”
“Filha, eu fico até envergonhado de você me tratar assim...”
“Pai, a vida finalmente está nos pagando após todo seu esforço e o de mamãe. Apenas aceite.” Isabel sorri e dá um beijo na bochecha de seu querido pai.
A jovem residente caminhava feliz em direção a saída do prédio, com seu dia inteiramente planejado em sua mente, quando de repente uma equipe da vigilância sanitária apareceu com equipamentos de proteção individual e carros de polícia do lado de fora. Um dos uniformizados, parecendo um astronauta, começou a exclamar avisando a todos que ninguém poderia sair do local.
Assustada, Isabel retornou para perto do elevador, onde seu pai estava.
“Quem é todo aquele pessoal?” O pai da residente pergunta.
“Eu não sei, pai, mas algo me diz que a situação é grave.”
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Helena desceu pelo elevador secundário, uma vez que o principal estava fora de serviço, e chegou em um corredor no térreo que não dava acesso visível ao que estava acontecendo. Caminhando tranquilamente, tentou ligar para seu pai a fim de confirmar o café da manhã com ele e os meninos, mas só dava sinal de ocupado.
Finalmente, chegando no lobby, Helena se deu conta da situação. Um alvoroço, tumulto, pessoas desesperadas, e tudo que Helena conseguiu fazer foi alcançar o gerente para perguntar o que estava acontecendo.
“Acabei de sair do telefone com o seu pai para avisar da situação, Helena. Parece que a família de um executivo estrangeiro pagou algumas pessoas e voou de um jato privado lá da região do foco do vírus no oriente, desrespeitando a quarentena do local, e vieram para cá, em uma reunião. Hospedaram-se no nosso hotel ontem à noite e pela manhã um dos filhos do executivo foi parar no hospital com muita falta de ar. Ao serem notificados, a vigilância veio aqui para nos confinar até sabermos quem está ou não com o vírus.”
“Vão nos testar agora? E em quanto tempo sai esse resultado?!”
“Um dos agentes disse que isso vai durar no máximo três dias, mas dependendo do andamento e dos procedimentos poderemos ir embora antes disso.”
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“Por que será que tem carro de polícia lá embaixo?” Dante pergunta, olhando pela janela.
“Polícia? Aqui no hotel?” Lívia estranha e vai bisbilhotar também.
“Sim... e tem um outro carro ali que parece ser do governo.” Dante aponta.
“Parece ser da vigilância epidemiológica... melhor dizendo, acho que é da vigilância sanitária. Será que deu algum problema no restaurante do hotel?” Lívia deduz.
“Não sei... melhor tomarmos café da manhã na padaria então.” Dante conclui e pega sua mala para escolher uma roupa.
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Helena então se juntou ao gerente para conversar com o agente responsável pela ordem de confinamento.
“Bom dia, eu sou a filha do dono desse hotel. Ele não está aqui, portanto eu estou no comando. O senhor poderia me informar como será esse procedimento?”
“Bem, como eu já havia comunicado ao gerente, vamos testar todos os hóspedes desse complexo, e aqueles que derem como primeiro resultado e contraprova negativos estarão liberados.
“Mas nós temos seiscentos quartos, pelo menos mil hóspedes, e muitos deles ainda mal acordaram para começar o dia!”
“Estamos esterilizando e preparando uma equipe de mais sete pessoas para realizarem os testes. Eu sei que não é muito, mas é o que conseguimos para esse caso emergencial.”
“Caramba...” Helena coloca a mão na testa e tenta ligar para o seu pai mais uma vez.
“Helena, filha, não posso falar agora, está ocorrendo uma crise em um dos meus hotéis e-”
“Pai, eu sei, eu estou nesse hotel!” Helena sai do meio do tumulto para falar melhor com Heveraldo.
“Como assim? O que está fazendo aí, filha?!”
“Eu vim entregar pessoalmente um presente para os meus amigos recém casados e estava lhe esperando para um café da manhã!”
“Mas eu achei que você queria tomar o café da manhã perto do hospital! Até me programei para chegar mais cedo!”
“Então o senhor e os meninos estão bem?”
“Sim, estamos, mas agora fico preocupado com você, minha filha!”
“Não se preocupe, pai, vou tentar assumir aqui o que puder em seu nome, e o gerente vai me ajudar.” Helena afirma.
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“Isabel, ligue para sua mãe.” O progenitor da residente em questão aconselha. “Logo isso vai parar na televisão. Se vamos ficar algum tempo, peça para ela acalmar o Rafael também.”
“Eu esqueci de carregar o celular ontem, pai. O senhor fique aqui, vou ver se alguém tem um carregador para emprestar e ligo para a mamãe.”
Isabel foi até o meio do tumulto para ver se algum hóspede tinha um carregador para emprestar, e se deparou com Lívia e Dante completamente perdidos, tentando entender o que aconteceu.
“O que estão fazendo aqui?” Isabel interroga, curiosa.
“Era para ser uma noite de núpcias, mas acho que estamos em quarentena agora.” Dante explica.
“Vocês se casaram?”
“Sim.” Lívia responde brevemente, querendo encerrar o papo.
“Estão hospedados aqui?” Isabel continua.
“Parece meio óbvio, não?” Lívia perde a paciência.
“Eu só perguntei para saber se as coisas de vocês estão aí e se tinha algum carregador para emprestar!” Isabel responde, também irritada.
“Veja ali no balcão da recepção, eles geralmente têm alguns de reserva.” Dante avisa.
Isabel caminhou mais um pouco e trombou em sua colega de trabalho, que acabara de finalizar outra ligação, dessa vez com sua preceptora da residência.
“Isabel? Por que você não está no hospital?” Helena pergunta, assustada.
“Vim por causa do meu pai...” Isabel explica sucintamente.
“Certo, agora me dá licença que eu preciso dispersar essa multidão porque o que eu menos preciso agora é que esse vírus se espalhe por aqui.” Helena avisa, enquanto a equipe que chega com os equipamentos de proteção começa a distribuir máscaras e luvas e organizar para distanciar as pessoas.
“Helena!” Isabel insiste, enquanto a colega coloca a máscara. “Helena, eu preciso de um carregador de celular.”
“Veja isso mais tarde. Eu ainda tenho que realocar alguns funcionários e colocá-los nos quartos restantes.” Helena avisa e então entrega duas máscaras para a outra. “Dê uma para o seu pai. E não se esqueça de avisar a Dra. Camila que você está aqui também.”
“Mas como eu vou avisar se meu celular está sem bateria?!” Isabel retruca, enquanto posiciona a máscara.
“Certo...” Helena suspira, sentindo o ar quente na máscara. “Vá atrás do balcão da recepção que temos carregadores reserva. Depois retorne porque temos que ajudar a distribuir as proteções.”
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Tanto Helena como Lívia, Isabel e mais dois outros médicos que lá estavam hospedados auxiliaram na triagem para os exames, realizando primeiro nos sintomáticos. Dante, como um interno, também ajudou da maneira que pôde.
De hora em hora, o pai de Helena ligava para saber a situação atual do isolamento, enquanto repórteres do lado de fora tentavam fazer alguma cobertura, mas eram barrados pela Polícia Militar.
A divisão de quartos foi bem sucedida, tentando manter os hóspedes do modo mais isolado possível. O almoço foi entregue de modo a manter o menor contato físico possível entre os integrantes da cozinha.
Os únicos que transitavam livremente eram os da equipe da vigilância e os médicos que ficaram presos naquele hotel. Por mais que Helena detestasse, mais uma vez estava presa à Isabel.
“Seu celular não para de tocar...” Isabel avisa, enquanto as duas trocam de máscara mais uma vez no lobby do hotel.
“Acho que é Thaísa. Ela está preocupada.” Helena informa.
“Falando nela, como ela está? Digo, desde a época que vazou o tal vídeo que você havia me contado a respeito...”
“Como assim como ela está? Você a vê no hospital quase todos os dias, Isabel! Eu hein.” Helena ri. “Mudando de assunto, eu esqueci de falar, o Mário está a fim de você.” Helena comenta.
“Mário?” Isabel ri. “O mesmo Mário que ontem postou uma música romântica e marcou a chefe do departamento de enfermagem psiquiátrica?”
“Ah, eu nem tinha visto isso...” Helena fica sem graça.
“Você não vai atender?” Isabel aponta para o telefone da outra. “Está tocando novamente.”
“Ah!” Helena olha o visor. “Agora é minha mãe. Ela me ligou há pouco, não sei o motivo do desespero.”
“Não sabe? Talvez seja porque um vírus com potencial pandêmico chegou no hotel que a filha dela estava, e agora ela está com medo de perder quem ama?”
“Faz sentido... e o Rafa, está bem?”
“Minha mãe fez questão de buscá-lo mais cedo da escola porque ela não queria ficar sozinha em casa, de tão apavorada que ficou.”
“Eu imagino...”
“Não é possível, deve ter algum propósito para isso tudo.” Isabel suspira.
“Você se lembra do Otávio? Ele- ah, quer saber? É bobagem.” Helena dá de ombros.
“O quê? Fala!”
“Nada não.”
“Você ia falar do Otávio, eu lembro sim. O que tem ele?”
“Está bem. Ele me disse que tem algumas pessoas que tem que cumprir algum propósito com outras. Você falou sobre propósito e eu me lembrei disso.”
“Então ele meio que estava prevendo sobre esse propósito maior de estarmos aqui para ajudarmos todas essas outras vidas no hotel?” Isabel questiona.
“Não, ele quis dizer que... ele quis dizer que o fato de eu e você termos nos reencontrado mostra que temos algum tipo de propósito a cumprir, não sei se era necessariamente isso, parecia ser algo em esfera metafísica, independente do que já sentimos ou vivemos no passado.” Helena explica.
“E que propósito seria esse então?” Isabel questiona.
“Quando souber, avise-me.” Helena dá de ombros novamente e vai se encontrar com a equipe da vigilância para saber os próximos passos.
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Após terem o sangue colhido para testes, Dante e Lívia se recolheram na suíte executiva já no começo da noite. Deixaram seus telefones à disposição caso algo acontecesse com qualquer outro hóspede.
“Pelo menos vamos poder contar aos nossos filhos que os primeiros dias do nosso casamento foram marcados por uma quarentena...” Lívia brinca.
“Filhos?” Dante arqueia uma sobrancelha.
“Ué, por que não?”
“Tu me disseste uma vez que não pensa em engravidar, e também nem tem como eu te engravidar...”
“E quem disse que preciso engravidar? Eu penso em adotar um dia, quando nós dois já tivermos finalizado a residência.”
“Sobre a residência, tem algo que eu queria conversar contigo.” Dante se senta na beirada da cama.
“O que foi?”
“Bem... eu não vou fazer.”
“Por que não? Você não queria seguir os passos de seu pai?”
“Nesses últimos tempos eu tenho conversado bastante com o marido da Ingrid, e o Vicente tem me falado bastante sobre a carreira acadêmica.”
“Está bem, Dante, mas a maioria dos nossos professores também fizeram residência e além de exercer a especialidade, são professores!”
“Acontece que eu quero me especializar nisso. Uma das matérias que eu mais gostei na faculdade foi ética médica. Após me formar, quero fazer mestrado e doutorado nessa área. Não quero fazer uma residência qualquer e ficar fadado ao mercado. Quero estudar as implicações éticas e morais na nossa profissão pelo resto da vida, é isso que quero fazer!”
“Uau...” Lívia se senta ao lado do marido. “E por que está me contando isso só agora?”
“Eu ia esperar me formar para poder te contar. Estava com medo da tua reação.”
“Medo? Por que você ficou com medo, meu amor?”
“Não sei, tu poderias dizer que estou viajando, que não é a melhor decisão dado que meu pai já tem uma clínica e tudo estaria encaminhado, que estou sendo do contra...”
“Hey... eu sou sua esposa, lembra? Qualquer decisão que você tomar, vou fazer parte dela! Quero participar de tudo que é importante na sua vida, meu amor.” Lívia acaricia o rosto do amado, que sorri, sentindo-se agraciado pela mulher ao seu lado.
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Já passava da meia noite, e Helena não pregava os olhos. Com muito cuidado, abriu a porta de seu quarto provisório, escolhido para ser no térreo em caso de se fazer necessária para a equipe de plantão que cuidava da quarentena e, utilizando sua proteção, ficou no corredor e se segurou para não ter uma crise de choro.
“Não conseguiu dormir?” Coincidência ou não, Isabel aparece.
“O que está fazendo aqui? Não é para ninguém sair.” Helena resmunga, enxugando uma lágrima teimosa.
“Vim pedir uma garrafa de água, meu pai costuma sentir sede à noite.”
“Não tinha no frigobar?”
“Não tinha, acredito que não repuseram.”
“Tem lá na dispensa, só avisar o pessoal da vigilância que você está indo para lá.” Helena responde.
“Está se sentindo bem?” Isabel pergunta, percebendo a respiração de Helena se tornar mais curta.
“Eu só estou com um pouco de falta de ar, eu vou ficar bem.” Com certa dificuldade, Helena afirma.
“Você já teve isso antes? Está suando, suas mãos estão trêmulas...”
“Eu sei que isso é uma crise de pânico, Isabel, não precisa me diagnosticar.” Helena responde, irritada.
“Você não sabe se é isso, Helena, e os diagnósticos diferenciais são-”
“Eu sei quais são os diagnósticos diferenciais, Isabel.” Helena responde entre os dentes, tentando poupar ar.
“De qualquer jeito, vamos ali no lobby para você ser atendida.” Isabel pega Helena pelo braço e o coloca em seu ombro.
“Isso é só uma crise, Isabel. Nós somos médicas, devemos ajudar, e não dar mais trabalho para a equipe de plantão.” Ainda com dificuldade, Helena argumenta.
“Médicos têm a péssima tendência de esquecer que podem ser pacientes também.” Isabel responde, enquanto leva a colega para a entrada do hotel.
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“Eu disse que era só um ataque de pânico, não disse? O resto está tudo certo!” Helena resmunga, após o resultado do exame de sangue de enzimas cardíacas e do eletrocardiograma terem saído, apontando resultado negativo para síndrome coronariana aguda, no mini-pronto-socorro que haviam montado no lobby do hotel do pai da médica.
“Você estava certa, porém vai ser bom descansar, a quantidade de benzodiazepínicos que lhe deram vai fazer você perder o dia.” Isabel responde, segurando a mão da colega deitada na maca, enquanto é levada para o quarto a fim de descansar.
“Aqui a senhora ficará bem mais confortável e livre de contato de possíveis contaminados.” Um dos socorristas comenta, enquanto ajuda Helena a se deitar.
“Você é bonitão...você malha?” Helena flerta, completamente letárgica, segurando o braço do socorrista.
“Isso é alguma espécie de efeito colateral?” O socorrista pergunta para Isabel.
“Essa daí quando está dopada fica engraçadinha.” Isabel responde.
“Hey!” Helena fecha a cara.
“Dorme aí, Helena, eu também quero ver se tiro um cochilo antes de ajudar o pessoal durante o dia.”
“Isabel!” Helena exclama.
“Oi?” Isabel se vira, antes de fechar a porta.
“Obrigada.” Helena sorri, e logo fecha os olhos...
Olhos abertos. Eu não estou em casa. Não estou no hospital. Eu conheço esse lugar. Já vim aqui... preciso me levantar. Que dor de cabeça! Certo. Já me levantei. Olho para baixo... eu nunca usei essa blusa, e esse não é o meu sutiã. Nem são meus peitos! Mas eu conheço esses peitos. Já os toquei já os...espera! Um espelho no banheiro. Esse rosto... esse é o rosto de Isabel! O que eu...mas eu não sou Isabel. Eu estou...dentro de Isabel? Mas sou eu, Helena... eu tenho acesso as memórias dela? Parece que não. Mas sinto como se tivesse total acesso...não sei. O pai dela está chamando... por que ele chora? Ele segura um papel...é com relação aquele ex de Isabel... mas o nome parece borrado. Minha memória deve estar atrapalhando. E agora estou sentindo medo... um medo que parece consumir minha alma. Nunca havia sentido esse medo antes. Medo da perseguição... medo de que ele possa fazer algum mal a mim ou a minha família... digo, para a família de Isabel. Por que tanto medo? Eu já passei por várias situações nessa vida, já quase morri em um acidente, mas esse medo parece me consumir mais do que qualquer outra coisa. Será que Isabel deve sentir isso? Parece não ir embora. Escuto a porta bater. Meu coração acelera. Isso é um sonho, só pode ser um sonho. Mas o sentimento é tão real, o medo é avassalador demais para ser mentira. O pai de Isabel abre a porta. Eu não consigo ver o rosto do indivíduo, mas ele parece bravo, ele parece irritado, ele empurrou o pai de Isabel e continua gritando... onde está o Rafa? Preciso protege-lo, mas acho que ele não está aqui... e a mãe de Isabel? Não vejo ninguém, apenas o indivíduo se aproximando, esse medo está se tornando algo muito próximo do pavor, eu não consigo me mexer, não consigo correr, e o terror, ao invés de me fornecer adrenalina, deixa-me paralisada, eu não consigo gritar, não consigo pedir ajuda, eu...
“Helena!” Uma mão a chacoalha com força.
“Hm? Oi?” A médica abre os olhos, assustada.
“Helena, você está dormindo a quase vinte horas. Os socorristas nos contaram que você teve que tomar benzodiazepínicos.” Lívia comenta.
“Caramba, mais algumas horas e eu quebraria meu recorde.” Helena dá uma risada sonolenta e tenta se levantar.
“Tu já dormiste por mais de vinte horas seguidas?!” Dante, ao lado de Lívia, questiona, assustado.
“Vinte e três. Foi uma outra vez, há muito tempo, também sob efeito de benzos.” Helena comenta, enquanto se encaminha ao banheiro. “E a Isabel, está bem?” Ela pergunta, instantaneamente se arrependendo.
“Isabel?” Lívia e Dante se entreolham. “Bem, acho que ela está ajudando a liberar o pessoal, alguns resultados já saíram. Mas... por que você perguntou da Isabel?” Lívia desconfia da amiga.
“Obrigada pelos avisos! Vou tomar um banho agora.” Helena exclama, rapidamente cortando a amiga e fechando a porta do banheiro atrás de si.
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Isabel trocava suas luvas no balcão da recepção, quando Helena, já descansada e de banho tomado, aproximou-se com um olhar diferente, condescendente, o que fez Isabel estranhar.
“O resultado do seu teste já saiu?” Helena questiona, tentando de algum modo mostrar que está sorrindo por trás da máscara.
“Não, e nem o seu saiu também.” Isabel responde. “Você está bem?”
“Estou sim, estou sim, eu descansei bastante. O remédio fez o efeito desejado. Está tudo certo. Ahm... a gente pode conversar um pouco?”
“Sim... pode falar!” Isabel tenta apressar a colega.
“Bem, aquele dia que você me contou sobre seu ex, e-”
“Meu ex...?” Isabel arqueia uma sobrancelha.
“Digo...” Helena coça a cabeça. “Isso vai soar bem aleatório...”
“Já está soando aleatório...”
“Eu nunca passei por uma situação como essa que você passou, Isabel. Essa situação com seu ex abusivo. Já passei por uma situação que envolvia em termos violência abusiva, portanto talvez eu faça a mínima ideia. Mas enfim, enquanto eu dormia, eu tive um sonho estranho, e envolvia especificamente a sua situação, e-”
“Helena...” Isabel suspira. “Você quer que eu acredite que você sonhou com algo que aconteceu na minha vida e que isso possa de algum modo ter a ver com o assunto que o Otávio mencionou?!”
“Calma, eu não sei, só senti que deveríamos conversar. Desculpa. Foi uma espécie de epifania. Depois de ter acordado pensei que poderia ser um sinal para ajudar alguma fundação que esteja nesse âmbito de prevenir a violência contra a mulher, achei que você pudesse me ajudar a encontrar alguma organização nesse sentido.”
“No meio de toda essa situação sua mente foi longe, hein...” Isabel ri. “E não sou Google, você pode pesquisar por si só essas tais ONGs.” Só de recordar o assunto, o comportamento de Isabel se modifica completamente, tornando-se irritada e impaciente. “Sinceramente, eu nem deveria ter lhe contado.”
“Desculpa por ter me intrometido, de verdade.”
“Eu que peço desculpas por ter estourado. Não queria ter lembrado do que aconteceu de ruim, até porque agora está tudo resolvido, ele me procurou esses dias, pediu perdão e tudo mais.”
“Depois de ter quebrado financeiramente sua família e ter estragado seu psicológico?”
“Nós conversamos, ele me deu um dinheiro para comprar um carro para o meu pai e prometeu que devolveria o dinheiro que nos tomou pouco a pouco...”
“Ele vai devolver o dinheiro que ele fez de tudo na Justiça para conseguir? Você vai realmente perdoar esse cara, Isabel? Você mesma confessou ter sido vítima dele!”
“Por que você se importa?!”
“Por que eu não me importaria? Nós trabalhamos juntas. Fato. Temos um passado. Fato. Temos uma potencial amizade. Fato. Por que tudo tem que ser oito ou oitenta com você?”
“O quê? Hã? Oito ou oitenta por quê? O que tem a ver?! Eu só perguntei porque você se imp-”
“Doutoras?” O socorrista se aproxima. “Saiu a última leva de resultados dos testes.” Ele mostra uma prancheta com uma lista de nomes com as palavras positivo ou negativo ao lado.
“Bem mais cedo do que o esperado.” Isabel se surpreende.
“Podemos ver?” Helena pega a prancheta e procura cuidadosamente seu nome, finalmente o encontrando.
Fim do capítulo
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rhina
Em: 10/09/2020
Lhe respondendo a sua pergunta.
Digamos quê é complexo. Digamos que talvez não teria palavras em uma frase suficiente de expressar o que deveria. E é algo intrínseco ao que sou e.....
Para finalizar, talvez e só talvez seja confuso de entender .
Rsrsrs.....acho que é isso e também uma despedida....se cuide Autora.
Rhina
Resposta do autor:
E vc se cuide tb querida rhina! <3

rhina
Em: 10/09/2020
Como a leitora acima disse. Eu também não via Helena sem Isabel, apesar das besteiras que ela cometeu. Mas e no mas a Autora direcionou as a rumos completamente diferentes...... E trabalhou com muito afinco e amor na história de Thaísa e Helena.
Rhina.
Digo para vc Autora não é fácil ler sua história. Tive que parar algumas vezes. Refletir. Dizer para mim mesma como um Mantra: é só uma história de ficção e repetia e repetia. Mas não é só isso. Não para mim, que pego a fundo....que vejo tudo por uma octica diferente. Que tudo que os personagens são e faz tem um peso peculiar em mim.
Rhina
Resposta do autor:
Acho q sem querer respondi no comentário errado! ahauhauahuhauahahu
era aqui que queria falar sobre isabel, q peguei pesado
por outro lado, na verdade não existem "vilões" na história, creio que existem pessoas tentando alcançar um objetivo, algumas vão um pouco mais alem do que outras!
Sobre esse peso peculiar, rhina, o q quis dizer? Aguardo sua resposta, beijão!!
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HelOliveira
Em: 02/05/2020
Não é segredo que sou fã da Isabel, sou muito mais Helena com ela..se as escolhas fossem minha e não da Helena deixaria as duas em uma quarentena bem leve para se conhecer melhor e descubrir que a relação delas não acabou e podem ter um novo começo.
Resposta do autor:
Bem, talvez não na quarentena, mas estou preparando outra oportunidade para elas trabalharem essa conexão que transcende as duas (não nesse capítulo, mas talvez nos próximos dois ou três)
Beijão amore, e se cuide ficando em casa!
<3
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Kelle Souza
Em: 01/05/2020
Eu na verdade nunca consegui enxerga Helena sem Isabel.
Isabel cometeu erros que são fáceis de julgar, mas onde fica a empatia? Claramente não houve um final para a estória das duas.
Ps: Autora, fiquei pensando em como vc iria desenvolver a estória no decorrer da pandemia, e tenho que dizer que vc me surpreende mais uma vez de forma positiva.
Se cuide direitinho viu bjosss
Resposta do autor:
ahahahhauhauha obrigada!
e realmente, faltou um "closure' pras duas...
vc tb se cuide, meu anjo! muito alcool em gel pra vc <3 hahaahuah
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nany cristina
Em: 27/04/2020
eu não quero a Isabel na vida da Helena a Isabel e passado Cadê A Thaisa que não apareceu nesse capítulo
autora não por favorðŸ™ðŸ™ðŸ™ beijo até o próximo
Resposta do autor:
A Thaísa apareceu nesse capítulo que acabei de postar, e não se preocupe que temos planos ainda pra elas ;)
beijão!
e fique em casa, hein?
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Marta Andrade dos Santos
Em: 27/04/2020
Eita e agora.
Resposta do autor:
Heheheheh agora só lendo o próximo capítulo que acabou de ser postado! beijão e se cuide nessa quarentena!
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