A onda de casamentos parecia pegar a todos, dado que Helena e Thaísa, agora noivas, compareceriam ao matrimônio de seus melhores amigos, iniciando por Anna Júlia e Núbia e logo após, Lívia e Dante.

Alguns dias antes do casamento das advogadas, Helena recebeu um aviso de que a festa teve que ser cancelada porque Núbia fora convocada pelo comitê de uma das ONGs para resolver uma emergência, tendo que ficar no norte do país por algumas semanas. As jovens, então, decidiram se casar rapidamente no civil na presença de cinco ou seis pessoas próximas e deixar a nobre militante cumprir o seu dever. Helena, uma vez que não pôde participar da cerimônia, comprou o presente online da lista virtual e lhes desejou toda a felicidade do mundo.

Na semana seguinte, o tão aguardado dia do casamento da residente em Dermatologia e do Internista do 6º ano chegou. Dante chegou logo de manhã, vindo do interior, tendo dormido apenas duas horas pois passara a noite de sua despedida de solteiro em uma casa de festas à beira da rodovia junto com dois colegas de classe que se tornaram seus melhores amigos, com quem também partilhou o resto da viagem até São Paulo. Seus pais haviam chegado de Porto Alegre algumas horas antes, e ficaram em um dos hotéis do pai de Helena, cortesia da madrinha de casamento.

Bento Henrique, irmão de Lívia, ficou encarregado, junto ao planejador do casamento, em cuidar dos horários e de que todos estivessem prontos. No almoço que antecedeu a cerimônia do fim da tarde, reuniu-se o pai, a mãe e o irmão de Lívia, e também os pais de Dante.

Em um dos salões do templo, Dante arrumava seu tuxedo prateado, todo pomposo.

“Nervoso?” Dr. Simmel aparece logo atrás, ajustando levemente o próprio cabelo.

“Um pouco, confesso.” Dante engole seco. “Pai, a Ingrid mandou mensagem agora há pouco, disse que ela, o Vicente e o Caio Fernando conseguiram chegar. Eu só queria dizer que-”

“Nós estamos bem, filho. Não se preocupe, não haverá brigas.”

“Estão? Desde quando?”

“Há algum tempo já. Não nos falamos com frequência e nem temos uma amizade, porém ela mandou uma mensagem dizendo que me perdoa.”

“Ela não me falou nada...”

“Talvez pensou que eu fosse contar. De qualquer modo, não há mais rancores.”

“Fico feliz!” Dante sorri para o espelho e ajusta o smoking mais uma vez.

“Esqueci de lhe falar. Sei que você ainda tem que terminar a faculdade e não dá para tirar férias agora, mas comprei passagens para daqui a alguns meses vocês curtirem a lua de mel no Caribe.” Dr. Simmel tira do bolso duas passagens aéreas.

“Sério, pai? Obrigado!” Dante abraça seu progenitor. “Mal posso esperar para contar para a Lívia! Se eu pudesse, contaria agora mesmo, mas no momento ela deve estar preocupada com os retoques finais...”

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“Esse vestido está errado! Essa costura não era para estar assim! Olha meu olho, Helena, OLHA MEU OLHO ESSA MAQUIAGEM ESTÁ TORTA!” Lívia surta com as madrinhas.

“Lívia, sua mãe quer entrar aqui.” Duda, a outra madrinha, avisa.

“Não! Não deixa ninguém da minha família entrar e ver a calamidade que eu estou! Eu sabia que ia dar tudo errado, eu sabia!” Lívia começa a chorar.

“Ela tem sorte da maquiagem ser a prova d’água...” Thaísa sussurra para Helena.

“Mas sua mãe e o Bento estão aqui fora, eles ouviram sua gritaria...” Duda continua.

“Eu já disse! Não quero ninguém da minha família aqui!” Lívia continua aos prantos, até que Bento invade de qualquer maneira.

“Veja bem, Liv, você me alertou que isso iria acontecer e me disse para agir da seguinte forma:” Bento segura a irmã pelos ombros e olha no fundo dos olhos dela. “Você está casando com o homem da sua vida! Sabe o quão difícil é achar um rapaz tão perfeito como o que você achou?! Pois você o encontrou e hoje é um dos dias mais marcantes de sua vida! Daqui 30, 40 anos você vai olhar para trás e ainda vai ter memórias desse dia! Seu vestido está perfeito, não tem problema nenhum na sua maquiagem, você é a noiva mais bonita que eu já vi na minha vida e eu já fui em casamento de atriz de novela das oito!” O irmão a solta, aguardando alguma reação.

“E-eu estou bonita mesmo?” Lívia pergunta, enquanto engole o choro.

“Está!” Todas as pessoas ao redor da noiva exclamam.

“Agora você vai respirar fundo, tomar um copo de água daquela jarra ali do canto,  aguardar o Dante, os padrinhos e madrinhas entrarem, depois você vai segurar no braço do papai, ele vai olhar para você e fingir que não está morrendo de vontade de chorar até chegarem ao altar!”

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Templo lotado de colegas de hospital e amigos do casal que também se mudaram para São Paulo ao longo do tempo. As mãos do pobre noivo suavam enquanto ele via a mulher mais linda de sua existência se aproximar ao lado de seu sogro. Se o jovem Dante pudesse escolher um momento dentre os trilhares de frames de sua vida, com certeza escolheria aquele segundo em que trocou olhares com a noiva após o sogro deixá-la no altar. Aquele mínimo instante, caracterizado pelo sorriso da noiva que, dentre muitas coisas, significava a confirmação de que aquele átimo seria a lembrança que faria Dante e Lívia se amarem na tristeza ou na alegria, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza.

“E eu vos declaro marido e mulher.” O ministro proclama, e prontamente Dante beija a noiva.

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A recepção da festa foi feita em um famoso salão de festas da Vila Olímpia, com direito a apresentação de uma das bandas locais favoritas de Lívia. A tradicional visita dos noivos à mesa de cada convidado foi feita para as fotos, até finalmente chegarem à mesa de Helena e Thaísa.

“E esse anelzão aí na mão direita?” Dante brinca, apontando para a mão de uma das garotas.

“Pois é, finalmente o pedido de casamento saiu...” Helena comenta.

“E quando vai ser?” A recém casada pergunta.

“Calma, já foi uma baita escalada chegar até esse ponto, escolher a data vai ser outra procissão!” Helena ri.

“Pessoal, estarei ali na mesa principal se precisarem de mim, tudo bem?” Lívia avisa.

“Eu ainda vou voltar ali na mesa do meu pai porque ele já tomou champanhe demais e agora quer conversar sobre a tal epidemia que está acontecendo lá na China.” Dante comenta.

“Daquele vírus novo que mutacionou?” Helena pergunta, antes do casal sair.

“Sim, esse mesmo.” Dante responde.

“Papo de tiozão bêbado...” Lívia brinca. “Creio que está controlado lá naquela região. Não há nenhum caso ainda na Europa ou outros continentes, pelo que sei.”

“Na verdade, já tem alguns casos na Europa sim...” Thaísa responde.

“Essa aqui acho que vai ser infectologista, quis saber tudo sobre esse novo vírus do outro lado do mundo.” Helena comenta.

“É importante estarmos preparados.” Thaísa dá de ombros.

“Agora eu que vou me preparar para ouvir assunto de médico bêbado. Vejo vocês na pista de dança mais tarde!” Dante ri.

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Do meio para o final da recepção, um convidado extremamente especial apareceu de terno e gravata, com o cabelo penteado para trás e a barba bem aparada.

“Ah, você só pode estar brincando...” Helena se levanta e um sorriso instantâneo se instaura. “Otávio!!” A garota corre para abraçar o antigo amigo.

“Vocês acham que eu ia perder o casamento dessa princesa?” O rapaz abraça a amiga, enquanto Lívia, a estrela da festa se aproxima.

“Eu sabia que você faria de tudo para aparecer aqui!” Quase aos prantos, é a vez de Lívia abraçar o amigo.

“Consegui sair um pouco mais cedo do plantão, ainda bem!” Otávio termina de cumprimentar a todos.

“Estás fazendo residência de quê?” Dante, ao lado da noiva, pergunta.

“Clínica médica.” Otávio responde. “Mas eu faço em Osasco.”

“Eu vi sua postagem quando você passou, há algumas semanas, fiquei tão feliz!!” Lívia não se contém e abraça novamente o amigo.

“Era para eu estar adiantado como você se não tivesse precisado fazer novamente o segundo semestre em outra faculdade...” Otávio reclama.

“Mas o importante é que deu tudo certo!” Helena exclama, também muito contente.

A conversa entre os velhos conhecidos se prolongava, até o irmão de Lívia aparecer.

“Noivinha, o papai está pedindo para tocar aqueles clássicos antigos porque ele quer dançar com você novament- oi! Convidado novo? Não vi você por aqui...” Bento prontamente cumprimenta o rapaz.

“Esse aqui é o Otávio, que estudou comigo por um tempo na faculdade, Bento.”

“Otávio... não me é estranho o nome...” Bento coça o queixo.

“Acho que a gente deve ter se conhecido em algum evento que eu deva ter ido com a Lívia...” Otávio comenta.

“Ah, meu querido, se eu tivesse lhe conhecido em me recordaria de você com certeza...” Bento dá uma piscadela.

“Escuta, Bento, porque você não leva o Otávio para a sua mesa enquanto eu danço com o papai?” Lívia aproveita a deixa.

“Seria um enorme prazer...” Otávio sorri, enquanto troca olhares com o irmão de sua amiga.

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Final de festa, a maior porcentagem dos convidados já havia ido embora. Otávio e Bento saíram do banheiro masculino ajustando as calças sociais, trocando sorrisos maliciosos. Dr. Simmel engajou em uma conversa sobre infectologia com Thaísa, falando dados tão entediantes que fez Helena sair de cena e voltar à pista de dança.

“Aceita uma dança pelos velhos tempos?!” Otávio aparece e puxa a amiga para uma balada cadenciada.

“Onde foi que aprendeu dança de salão?!” Helena estranha a habilidade do amigo.

“A vida me ensinou...” Otávio brinca. “Fiquei sabendo que está trabalhando com Isabel...”

“Nem me fale, prefiro esquecer.”

“Você não consegue negar que vocês duas tem uma conexão inexplicável.”

“Como assim? Otávio, eu vou casar com a Thaísa e você sabe disso, até já me parabenizou.”

“Não disse que você vai voltar com a Isabel, sua tonta!” Otávio ri. “Mas tem pessoas em nossas vidas que partilham uma conexão incontestável conosco, em qualquer nível de relacionamento, seja algum parente, amigo ou amor. Para buscar hobbies alternativos, comecei a entender mais sobre meditação e algumas filosofias de vida. Uma delas ensina que tem almas que entram em sua vida e você tem uma conexão intrínseca que não consegue se desvencilhar enquanto não cumprir seu propósito para com ela.”

“Está dizendo que a praga da Isabel na minha vida é alguma espécie de propósito maior?”

“Pode ser que sim, pode ser que não..., mas você pode tentar descobrir para poder finalmente se desvencilhar e ter paz.”

“Respeito as suas filosofias, mas acho que está viajando na maionese, meu amigo. Qualquer assunto que eu tivesse pendente com Isabel, já finalizei quando terminamos anos atrás.”

“Mas é como eu disse, vocês não precisam estar namorando para terem algum propósito a cumprir. É algo muito maior do que tudo isso.”

“Você realmente deu uma guinada de 180 graus na sua vida, hein! Nunca iria lhe imaginar um ser tão sábio assim.” Helena ri, enquanto o rapaz a gira em um movimento de dança.

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“Eu já estou cansadaço.” Dante comenta, tomando sua última taça de champanhe.

“Vamos enrolar por mais uns 15 minutos daí vamos para o hotel.” Lívia cochicha.

“Pensando seriamente em faltar a semana toda do internato só para curtir a vida de recém casados contigo...” Dante cochicha de volta.

“Não mesmo, teremos o resto de nossas vidas para curtir, amanhã a gente também vai poder aproveitar, mas depois de amanhã você tem responsabilidades, mocinho. E nem pense em dormir quando a gente chegar naquela suíte executiva.”

“Mas nem um chochilozinho?” Dante faz bico.

“Eu não vou me dar prazer sozinha!” Lívia franze a testa. “Quer dizer, eu até consigo fazer isso, mas eu quero você! Faz semanas que não trans*mos.”

“Foi tua ideia de nos resguardarmos para o casamento.” Dante dá de ombros. “Olha lá meu pai convencendo a noiva da Helena de que esse vírus vai se tornar pandêmico e destruir a economia.”

“De onde seu pai tira tantos dados?”

“Ele é um grande amigo de um médico chinês que foi intercambista no tempo que ele fazia faculdade. Eles sempre se falam, e parece que esse médico tem assustado um pouco falando sobre a situação.”

“E será que não deveríamos começar a acreditar nele?” Lívia indaga.

“Prefiro focar na suíte presidencial do hotel do pai de Helena, com a vista mais bonita da cidade.”

“Você pesquisou sobre a vista do hotel?” Lívia ri.

“Não, a vista mais bonita para mim é a do seu corpo embaixo do meu.” Dante pisca e Lívia cai na gargalhada, completamente envergonhada, mas por dentro apenas desejando que a festa acabasse logo para que aquela visão se tornasse realidade.

Fim do capítulo