Capítulo 51
...Adele...
Neste momento estava me sentindo estranha, como se flutuasse, como se... como se não estivesse em meu próprio corpo. Eu tentava me mover, mas em momento doeu absurdamente, e no outro, eu não conseguia mais sentir meus membros. Esforcei-me para abrir os olhos, mas nada em meu corpo obedecia os meus comandos.
Minha mente foi invadida por lembranças de momentos que vivi, alguns bem antigos e outros bem recentes. Um rosto estava presente. Ana Beatriz aparecia em quase todas as minhas lembranças recentes. O nosso primeiro beijo, o momento em que pedi uma chance a ela, a primeira vez que fizemos amor, o pedido de namoro e por fim, o pedido de casamento.
Revivi cada lembrança daquela com uma nitidez absurda, me trazendo de volta todas as sensações que vivi no dia, como se estivesse realmente vivendo-a outra vez, sentindo tudo outra vez.
Novamente tentei abrir os olhos ou me mover, e mesmo me esforçando, tudo o que eu consegui sentir foi uma pontada na cabeça. O rosto de Ana Beatriz de algum jeito me acalmou. O seu cheiro, aquele cheiro que eu tanto amava, me embalou e me trouxe uma paz...
Não sei qual era a sensação da morte, obviamente. Nunca vivi nada parecido com o que estou vivendo agora. Mas aquele instante se encaixava perfeitamente com todas as descrições que as pessoas à beira da morte davam em livros, filmes e novelas... Será que eu estava morrendo?
Eu não queria morrer, não agora! No fundo eu sempre achei que não tinha medo de morrer, afinal, era algo natural do ciclo da vida, todos vínhamos com a certeza de que um dia partiríamos, então a morte nunca me assustou. Mas agora era diferente, eu não queria partir sem viver todos os planos, não queria partir e deixar a minha pequena...
Nós tínhamos tanta coisa pra viver ainda! Não podia ser possível que eu estivesse partindo agora, justo agora que eu consigo descrever e significar o que é o amor! Nunca amei alguém, quer dizer, já achei que amava uma vez, mas eu estava errada. Só Ana Beatriz foi capaz de me mostrar o que era realmente o amor.
Clichê, eu sei. É uma frase que e a gente sempre ouve e lê em um romance produzido para angariar lucros, mas era a realidade. No início foi muito assustador pra mim, porque para uma pessoa inexperiente como eu, era difícil entender, e eu não conseguia compreender como era possível amar uma pessoa tão rápido e de uma forma tão intensa. Aos poucos desisti de compreender, e passei apenas a sentir.
E como é bom sentir...
Meu Deus, como eu amo essa mulher! Tudo o que eu mais quero na vida e ter uma família ao lado dela. Ah Deus, se você me deixar sair dessa...
-- Adele? Ei! Acorda... – senti um toque em meu ombro – Acorda Adele!
Ainda senti meu corpo ser sacudido suavemente por algum tempo. Eu até que tentava abrir os olhos, mas eles pesavam e a minha cabeça doía.
-- Adele? Acorda! Você precisa acordar. A Beatriz deve estar preocupada. Por favor...
A menção do nome de Beatriz e do fato de ela estar preocupada, me deu uma pontada no peito, mais intensa e mais dolorida do que aquela que eu sentia na cabeça. Reuni toda a força que meu corpo ainda parecia ter e tentei abrir os olhos.Quando consegui, minha visão foi atingida por uma escuridão, mas ainda assim, consegui enxergar Zara diante de mim.
-- Zara? O que...
-- Calma, ok? Agora não é o momento de você me demitir. – ela disse com um meio sorriso enfeitando os lábios.
-- O que aconteceu? – perguntei forçando a visão para enxergar algum palmo a minha frente, mas estava praticamente impossível – Onde é que estamos?
-- O prédio foi implodido. – disse em um tom sério.
-- Implodido?
**********
- Flashback On -
Eu poderia dizer que foi bom voltar à Londres, afinal, é a minha cidade natal, mas estaria mentindo. Foi péssimo! Primeiro por estar morrendo de saudades da Bia – isso desde o instante que nos despedimos ainda no aeroporto, e foi aumentando conforme o tempo ia passando - e segundo porque minha mãe fez questão de me infernizar desde que coloquei os pés na cidade.
Dona Marjorie tratou de dificultar ao máximo a minha vida, e o que eu achei que seriam apenas alguns dias, acabaram se estendendo e se tornou uma semana. Nossa, uma semana me parecia muita coisa.
Depois desse tempo em que fui praticamente obrigada a ficar longe, eu não conseguia conter a minha ansiedade, eu estava louca para poder abraçar e beijar aquela pequena. A saudade estava tão grande que os suspiros exasperados eram inevitáveis. Estava inquieta e não conseguia sequer ficar parada na mesma posição por muito tempo.Não via a hora de chegar em casa e de beijar aqueles lábios.
Quando o avião começou a taxiar no aeroporto de Fortaleza – finalmente! - fiquei estranhamente enjoada, com um friozinho na barriga e as mãos trêmulas. Nem precisava pensar muito para saber o motivo desses “sintomas” tão peculiares, até porque foi Ana Beatriz que me apresentou cada um deles. Eram os sintomas da paixão e do amor, somados a saudade.
Não esperei nem pegar a minha bagagem, resgatei o celular de dentro do bolso e liguei imediatamente o número de Bia para saber se ela já havia chegado ao aeroporto. Mas, para minha decepção minha noiva me mandou uma mensagem informando sobre a mudança de planos. Eu teria que esperar um pouco mais para então poder matar a minha saudade.
É claro que eu entendia que ela estava trabalhando e que reuniões faziam parte do ofício, mas, não dava pra evitar a pontada de desapontamento.Eu tinha tanta vontade de protagonizar aquele velho clichê de filme americano onde um corre para os braços do outro.
Já que não tinha o que fazer, o jeito era ir pra casa, tomar um banho, relaxar e esperar a chegada dela.Dei sinal para o primeiro taxi que passou à minha frente, e fechei os olhos, relaxando contra o banco do carro. Sorri ao sentir aquele calor tão comum em terras nordestinas. É, aqui era definitivamente a minha casa.
Estávamos praticamente no meio do trajeto quando o meu celular tocou. Encarei o número estampado na tela e rapidamente fiquei cismada, na verdade, fiquei vem preocupada. O número era um institucional de um dos canteiros de obra da minha empresa. O mesmo canteiro de obra que me acarretou um problema gigantesco e uma multa bem gorda devido a irresponsabilidade do Bruno, filho de meu sócio.
Atendi e senti o meu corpo vibrar ao ouvir o que o homem afobado me dizia! Uma mistura de raiva e preocupação se instalou, e eu consegui prever que problemas estavam chegando. Era inacreditável!Eu mesma estava à frente daquela obra, e sinceramente, não conseguia enxergar nenhum problema, nada que me fizesse ser vistoriada mais uma vez.
-- Moço, eu vou ter que mudar o meu destino final. Preciso ir a este endereço – o taxista me encarou pelo retrovisor e pude notar o descontentamento em seus olhos quando passei o endereço da obra que ficava praticamente no sentido contrário do que estávamos indo.
-- A corrida vai ficar cara.
-- Não se preocupe com isso!
Mandei uma mensagem para Bia informando que ao invés de ir para casa eu estava indo para o canteiro, e não resiste ao declarar o meu amor por ela, sem deixar de dizer o quanto eu estava com saudades dela. Às vezes eu sentia vontade de dizer tudo, sempre! Tinha vontade de não perder momento algum do lado dela.
Puxei o ar com força e busquei dentro de mim discernimento e paciência para terminar bem este dia que se desenrolava de uma maneira totalmente diferente da que eu cogitei e esperei. Nem bem havia chegado, e já havia sido contemplada com uma dose de aborrecimento que eu tenho certeza, aumentaria gradualmente.
Acho que hoje não é o meu dia. – pensei.
Apesar do cansaço e da fome, deixei tudo para o lado e fui de uma vez para o canteiro de obras. Quando cheguei, paguei o taxista que se mantinha descontente e com um olhar que se fosse possível, me mataria. Era só o que me faltava mesmo.
O taxista retirou minha bagagem do porta malas e eu as arrumei em meus braços da melhor maneira que pude. Com uma mochila, uma mala e uma sacola de presentes, caminhei até a guarita do vigilante daquele turno.
Quase perdi a paciência com o homem que encontrei mexendo no celular. Ele nem mesmo percebeu a minha aproximação. Realmente, hoje era o meu dia de sorte, porque tudo estava colaborando para piorar o meu humor, que já estava bem crítico.
Tentando manter a educação e a cordialidade, cumprimentei o homem que tinha cara de sono e perguntei o que estava acontecendo por ali. Ele levou a mão à boca tentando esconder um bocejo, e disse que Arruda, o chefe de obras pediu para que eu fosse até o quarto andar, assim que chegasse. Com urgência!
Pedi então para que ele guardasse a minha bagagem e me encaminhei até a salinha onde ficavam os matérias de proteção individual, e só então fui até o elevador de carga.
No momento que o elevador começou a subir, senti uma sensação estranha, como se algo estivesse errado, fora do lugar. E agora, pensando bem, percebi um detalhe. Haviam me chamado até ali por causa de uma vistoria, no entanto, durante todo o percurso, não encontrei nenhum agente e nem mesmo um carro caracterizado.
Levei a mão à nuca e apertei ali. Comecei a ficar tensa, e um lado meu me pedia para dar meia volta e seguir para casa. Parei o elevador no quarto andar, e ainda de dentro dele, olhei a minha volta. Haviam pouquíssimas pessoas trabalhando naquele horário, e isso definitivamente não era normal.
Ajeitei o capacete e puxei o ar com força. Sai do elevador tentando manter uma postura firme, quando na verdade tinha algo me incomodando profundamente. Soltei o ar e chamei por Arruda uma vez. Não obtive resposta e chamei mais uma vez, e novamente, não houve resposta. No entanto um barulho no final do corredor que eu estava me chamou a atenção, e mesmo incerta, caminhei até lá.
Caminhei chamando o homem e olhando para os lados. Nunca senti calafrios e aquela tensão no ar ao entrar em uma obra. Mas não sei, estava meio estranho, meio sombrio. Aquilo ali nunca foi tão deserto e tão silencioso como agora.
Outro barulho, dessa vez no sentido contrário ao qual eu estava caminhando me fez parar ali mesmo. E foi nesse instante que eu senti alguém as minhas costas. Tentei me virar, mas braços passaram ao meu redor e me impediram de me movimentar. Algo foi colocado em meu rosto, e depois disso, bem, depois disso, eu não lembro de mais nada.
- Flashback Off -
**********
-- Eu apaguei, não me lembro de nada. – falei quase em um sussurro.
-- Alguém queria ter a certeza de que você não teria chances de sair com vida deste lugar. Quando eu te encontrei, você estava caída, desmaiada. Tentei te carregar e te tirar daqui, mas eu não fui ágil o suficiente. – ela riu e depois continuou –Você não é tão leve quanto eu imaginei.
-- Você me encontrou?
-- Sim. Quer dizer, eu estava atrás de você o tempo inteiro, mas me mantive afastada para que você não percebesse a minha presença. Tive um pouquinho de dificuldade de te acompanhar quando você pegou o elevador, o treco parou no quarto andar e não desceu por nada. Talvez eu tenha feito algo errado. – ela disse como se falasse consigo mesma - Com toda a certeza, andar sem um segurança não era a melhor opção Adele.
-- Mas...
-- Sei que contrariei as suas ordens, mas o meus instintos estavam certos. Você era o alvo, e não a Ana Beatriz. E sinceramente, não sei o que poderia ter acontecido se eu não tivesse feito o que fiz.
Parei por um instante e divaguei. Se Zara não estivesse no meu encalço, talvez eu não estivesse aqui nesse momento.
-- Onde estamos? – perguntei.
-- Em um galpão que havia atrás da obra.
-- O galpão de armazenamento de materiais.Vamos sair daqui!
-- Não dá. A parte da frente do galpão também foi atingida durante a implosão e cedeu parcialmente. Além disso deve ter toneladas de entulho barrando a entrada. A notícia boa é que pelo menos não estamos debaixo de toneladas de concreto. E a notícia ruim é que não podemos ficar aqui por muito tempo, ainda pode ceder.
-- Você teve tempo pra avaliar e saber de tudo isso? Por quanto tempo eu apaguei?
-- Não sei. Eu também apaguei, acordei faz pouco tempo. Você está machucada? – ela perguntou e senti ela se afastando.
Devido à falta de luz naquele espaço, era óbvio que visualmente não dava pra saber se eu estava machucada. Nem eu mesma sabia. Só sentia dores. Eu ouvia a voz de Zara e via o seu rosto próximo ao meu, mas não era com clareza. Também não sabia em que estado ela estava.
-- Minha cabeça e a minhas costas doem.
-- O que mais?
-- Não consigo mover minha perna direita, dói muito. Muito mesmo. – completei gem*ndo – Mas e você, você está bem?
-- Na medida do possível.
-- Sua resposta não foi muito convincente.
Ela deu um risinho.
-- Eu sei.
-- Como vamos fazer pra sair daqui?
Ela suspirou e em seguida deu um gemido que claramente ela tentou disfarçar.
-- Você está com o seu celular?
Meti as mãos nos bolsos em busca do aparelho, mas tudo o que eu encontrei foram papeis. Provavelmente algumas cédulas de dinheiro e o cupom fiscal da garrafinha de água que eu comprei no aeroporto.
-- Não. – respondi.
-- No meio da correria eu perdi o ponto de comunicação que me mantinha em contato com o resto da equipe, e não sei porquê cargas d’água, mas deixei o meu celular dentro do carro.
-- Há quanto tempo estamos aqui?
-- Não sei ao certo, mas provavelmente, muito tempo. Olha pra cima – eu fiz, e pela claraboia vi que era noite, uma noite sem estrelas – já é noite, mas não dá pra saber que horas.
-- Deus! – exclamei começando a me dar conta realmente das coisas. – O que vamos fazer?
-- Estou pensando. – a voz dela soou fraca – Tente pensar comigo...
O galpão era metálico e pré-moldado, com algumas estruturas de alvenaria em seu interior – como a sala que as vezes eu ocupava. Não ficava longe do prédio, ficava há alguns metros apenas. Neste espaço nos mantínhamos materiais que necessitavam de um cuidado maior durante a armazenagem, e que não podiam ficar expostos ao sol e à chuva e uma parte da administração.
Não era um galpão grande, mas o seu teto elevado nos fazia ter a impressão de que éramos pequeninos quando estávamos dentro dele.Sempre havia um eco enorme ali dentro. Não era um ambiente composto por janelas, havia apenas a grande porta que ficava a frente e a claraboia de ventilação/iluminação natural.
Comecei a fazer mentalmente uma lista do que podia conter ali dentro, qualquer coisa que pudesse nos ajudar a sair, ou que conseguíssemos usar para chamar ajuda. Forcei a mente até que lembrei que na minha sala sempre tinha rádios de comunicação, e claro, o celular institucional que eu usava e ficava na terceira gaveta da minha mesa.
Só precisava conseguir saber para que lado a minha sala ficava e rezar para que ela estivesse intacta.
-- Zara? Eu já sei! Na minha sala tem rádios comunicadores, e deve ter um celular lá. Só precisamos nos orientar e saber para que lado está a minha sala.
Eu falei a frase com a maior empolgação do mundo, e esperei qualquer reação vinda de Zara, exceto, o silêncio. Do lado de fora, se eu me concentrasse um pouco conseguia ouvir o burburinho e o que provavelmente seriam máquinas e carros, mas ali dentro, eu só conseguia ouvir o som da minha respiração.
Essa constatação me assustou, me assustou de verdade, porque eu não devia estar ouvindo apenas a minha respiração, tinha que estar ouvindo a de Zara, qualquer sinal, qualquer mínimo movimento, mas tudo era silêncio. Ai meu Deus!
-- Zara? Zara! Por favor, fala comigo! – movi o corpo para frente na tentativa de tocá-la e isso fez com a que minha perna doesse, uma sensação horrível se espalhou por meu corpo e eu pressionei os lábios para não gritar de dor – Zara! Fala comigo! – gritei.
-- Estou...aqui...
-- Meu Deus! Cadê você? – eu não conseguia mais vê-la - O que aconteceu?
-- Não vou aguentar muito tempo. Minha consciência está quase me deixando. – ela falava baixinho e isso estava me deixando desesperada.
-- Me diz, onde você está?
-- Na sua frente. Talvez...um pouco mais de um metro...à sua frente. – ela falava e parava suspirando, buscando ar.
Algo sério havia acontecido com ela, isso estava claro pra mim. Zara era apenas uma sombra à minha frente, não dava mais para vê-la. Sua respiração era quase inaudível e ela tinha dificuldades até para falar. Nós precisávamos de ajuda porque eu não sei como podia ajudar ela, não sei.
Levei às mãos à cabeça e isso me causou dor. Fechei os olhos e os apertei. Aquilo era uma como uma rua sem saída e eu realmente não sabia o que fazer. Não conseguia nem mesmo me mover, a dor lancinante na minha perna me incapacitava disso.
Eu poderia gritar, fazer barulho, mas isso provavelmente não seria o suficiente e tudo o que eu conseguiria seria me desgastar ainda mais, eles não me ouviriam. Meus olhos começaram a arder e eu não me julguei nesse momento porque eu estava com medo, medo por mim, e medo por Zara. Estava me sentindo impotente e como uma inútil.
-- Zara? – chamei e ela não respondeu – Fica aqui comigo, conversa... – pedi chorosa.
Nesse momento eu me entreguei de vez ao pranto. Aquela mulher fez tanto por mim e eu não conseguia fazer o mesmo por ela. Não conseguia retribuir nem mesmo uma fração. Se não fosse por ela, provavelmente eu estaria morta.
Puxei o ar com força e engoli o choro. Eu não ia cruzar os braços e esperar que o pior acontecesse com Zara. Além disso, não dava pra ficar aqui esperando pela sorte, isso aqui podia desabar. Ana Beatriz provavelmente estava preocupada comigo, talvez pensando que o pior tinha acontecido.
Eu precisava de forças, precisava de coragem e mais uma vez, muita força. Nem aqui e nem agora seria o meu fim, muito menos o de Zara. Eu queria abraçar a minha pequena, queria encontrá-la e beijá-la até não aguentar mais. Queria dizer o quanto eu amava, e juro, eu não perderia mais nem um instante.
Comecei a repassar em minha mente a localização de tudo ali dentro. Mirei o teto e contei as claraboias que eram quatro, porque me lembrei que a última claraboia ficava praticamente sobre a minha sala.
Certo, de toda forma eu ainda teria duas direções para ir: a minha direita, ou a minha esquerda. Porém, havia um detalhe, um detalhe muito importante. O vidro da claraboia que ficava acima da minha sala estava quebrado desde a semana passada, e desde então eu vinha pedindo para alguém dar um jeito nisso. Até o dia da minha viagem o vidro permanecia do mesmo jeito, e sendo assim, eu já tinha a direção para onde eu deveria ir: direita!
Graças a Deus que não o concertaram!
-- Zara? – chamei mais uma vez e nada – Ok! Espere um pouquinho que eu vou dar um jeito nessa encrenca que nos meti.
Inspirei e expirei algumas vezes. Tentei me concentrar. Encolhi a perna esquerda e ok, ela estava em perfeitas condições. Tentei fazer o mesmo com a outra perna e não consegui evitar o palavrão que saiu de minha boca.
-- Se concentra Adele, você tem que fazer alguma coisa! – puxei o ar mais uma vez e decidi o que tinha que fazer.
Me apoiei com as duas mãos espalmadas no chão, uma de cada lado e impulsionei o corpo para cima. Instantaneamente lágrimas brotaram em meus olhos. O movimento apesar de lento, fez com que todo o meu corpo doesse. Suor minava de cada poro de meu corpo.
Com muita dificuldade tentei me colocar de pé, mas não aguentei. Balancei a cabeça sentindo meu corpo esmorecer. Já que não podia me mover de pé, não tinha problema, eu iria de outro jeito. Deitei de bruços no chão e me arrastei. Senti como se minha perna estivesse sendo arrancada de mim.
Segurei as lágrimas e olhei para o alto, me orientando por aquele pequeno detalhe no teto gigante. Minha perna parecia queimar, e minha cabeça latej*v*. Mais uma vez meu corpo esmoreceu, dessa vez, junto com a minha mente. Parei e olhei para o alto.
-- Está quase, só mais um pouquinho...
Bati em algumas coisas. Objetos me machucavam e outros me assustavam, mas aos poucos a distância foi diminuindo, e quando eu já estava debaixo da claraboia podia ver claramente os pequenos degraus e o corrimão que levavam a minha sala. Um barulho metálico e algo estalando fez com que eu me apressasse.
Parei junto aos degraus e agarrei o corrimão impulsionando o corpo mais uma vez para que eu pudesse ficar de pé.
-- Santo Deus! Como isso dói!
Gritei, gritei sem pudor e sem vergonha quando me ergui e o meu pé direito tocou o chão. Tinha certeza de que minha perna estava quebrada, e eu devia estar aumentando o estrago nela.
Demorei séculos tentando vencer aqueles míseros degraus, brigando contra o limite de meu corpo e de minha mente para então chegar dentro daquela sala. Esbarrei em um móvel e quase caí. Tentei ligar a luz, mas era óbvio que não daria certo, eles já tinham cortado a energia de todo o lugar.
Dei a volta na mesa e esbarrei na cadeira caindo sentada sobre ela. Rapidamente abri a gaveta e com as mãos tremendo alcancei o celular no fundo da gaveta. Fechei os olhos pedindo a Deus para que o aparelho tivesse o mínimo de carga. Apertei o botão do lado e ele ascendeu.
-- Graças a Deus!
No primeiro instante tive ímpetos de ligar para ela, para Ana Beatriz, mas tive medo de não sei, assustá-la, ou de lhe causar pânico. E por isso, liguei para alguém que eu sabia ser a pessoa certa para esse momento, e também porque foi o único número que me veio à mente. Disquei e não esperei mais do que dois toques.
-- Alô?
**********
... Ana Beatriz ...
-- Você precisa comer alguma coisa, Bia. Desde que chegou aqui que não come nada.
Tony estava ao meu lado. Estávamos sentados naquela mesa dentro da barraca e eu não conseguia despregar os olhos dos bombeiros que trabalhavam mais à frente. Ele havia saído por alguns instantes e quando retornou, me trouxe algo para comer. Apesar de sua insistência, eu não conseguia nem pensar em comer. Nada desceria.
Ele insistia para que eu comesse, para que eu descansasse e fosse pra casa me garantindo que me manteria informada de tudo, mas não dava. Tony estava sendo um amor comigo, mas eu ignorava tudo o que ele dizia, e não era por maldade, era porque parecia que eu não estava ali. O automático havia se ligado e eu permanecia sentada do mesmo jeito de horas atrás, encarando o mesmo ponto.
Desde que aquele homem fora encontrado, mais dois corpos foram retirados debaixo dos escombros. E como uma renovação de esperança e fé, um quarto homem foi retirado do meio daqueles entulhos ainda com vida. Bastante ferido, mas consciente, com vida.
E era assim que meu coração acreditava que Adele seria encontrada.
Jack havia saído a pouco para conter os ânimos dos repórteres que caíram em cima de nós, usando de algo que considero nojento. A mídia agora colocava em cheque a credibilidade de Adele e de seu escritório de engenharia, acusando-a de estar vinculada à coisas escusas, e este ser um dos motivos pelo qual o prédio veio abaixo. Estavam jogando baixo, associando o seu nome à algo que eu tenho certeza, ela jamais seria capaz. Sensacionalismo!
Queriam sujar a imagem dela, e com os boatos certos, não demorou para que especulassem realmente a índole de Adele. Até eu entrei no meio das especulações. Por que era tão difícil respeitarem o próximo? Será que ninguém via o quanto todos nós estávamos abalados com tudo isso? Não respeitavam mais a dor de um semelhante.
-- Se eu contar um segredo, você jura que nunca vai dizer a ela que eu te contei? – Tony falou sorridente, chamando a minha atenção.
-- Juro! – falei mirando seus olhos que estavam brilhantes.
-- Eu quase dei em cima de você, quando te conheci!
-- Você?
-- Eu teria dado, se minha irmã já não tivesse me dito que estava caidinha por você.
-- Cafajeste. – falei brincando e empurrando seu ombro.
-- É sério! Quase dei em cima de você. Não sei como minha irmã conseguiu se conter, porque sinceramente, se não fosse por ela, eu tinha caído matando. – olhei pra ele recriminando e ele ergueu as mãos - O quê? Não tenho culpa se você chegou à minha boate pronta pra matar.
-- Não teria dado certo, eu gosto de mulheres.
-- Eu sei que não teria dado certo, mas não é pelo fato de você gostar de mulheres, é porque eu já sabia, sentia que você e Adele foram feitas uma para outra. A Adele estava alucinada por você, e olha que eu nunca a tinha visto daquela maneira. E você, não era indiferente, eu via seus olhares.
Senti minhas bochechas ruborizarem.
-- Demorei um pouquinho pra perceber o quanto sua irmã significava pra mim. Ela mexeu comigo desde a primeira vez que eu a vi, mas na hora eu não soube identificar.
-- O que importa é que agora vocês estão juntas, e há toda uma vida pela frente!
A frase dele fez meu coração apertar. Tempo! Era tudo o que eu queria, tempo para fazer uma vida inteira ao lado daquela mulher. Tempo para amá-la todos os dias, para fazê-la feliz. Tempo para nós.
Tony me encarou, estava pronto para dizer algo quando o seu celular começou a tocar dentro do bolso da calça. Ele retirou o aparelho do bolso e encarou rapidamente a tela com as sobrancelhas franzidas.
-- Alô?
Tony parou por uns segundos e então esbugalhou os olhos. Prontamente se colocou de pé enquanto passava os dedos entre os cabelos. Olhou em volta como se procurasse algo e sorriu de lado no mesmo instante que seus olhos foram tomados por lágrimas. Fiquei de pé a sua frente, de supetão. Mirava seus olhos sentindo meu coração apertar.
-- O que está acontecendo? – perguntei quando ele voltou a guardar o aparelho dentro do bolso da calça.
-- Por favor, Bia, fica aqui. Certo?
Ele não esperou a minha resposta, saiu correndo da barraca em direção a tenente Denise que estava há poucos metros dali. O ato despertou um reboliço em mim, e de maneira alguma eu ficaria parada, esperando para saber de algo. Fui até onde os dois estavam e ouvi parte da conversa que ainda travavam.
-- Você tem certeza Antony?
-- Tenho. Ela acabou de me ligar tenente, e ela está pedindo ajuda.
-- De quem vocês estão falando? – perguntei sentindo o coração bater em algum lugar dentro do peito. – É da Adele? Estão falando dela? Me digam!
-- Ela está bem Bia! – Tony disse exultante, me apertando contra o seu corpo – Não sei como, mas ela acabou de me ligar. Minha irmã está viva!
(N/A – Ouça: Zara Larsson – Uncover: https://www.youtube.com/watch?v=_CWk2Mvysls)
Enterrei meu rosto em seu peito e gritei, gritei de felicidade, de alívio. Não conseguia parar de chorar, mesmo sorrindo, eu chorava e sentia meu coração pular eufórico. Ainda estávamos agarrados um ao outro quando ouvi tenente Denise dar ordens para alguns dos homens de sua equipe.
Logo um contingente considerável de bombeiros se encaminharam para a parte de trás do prédio, para um galpão que estava parcialmente destruído. Contrariando as ordens de Denise, fiquei perto, não consegui me afastar ou conter a minha ansiedade. Apesar de termos notícias dela, mal podia esperar para colocar meus olhos sobre ela.
Homens paramentados surgiram e começaram a desobstruir a entrada do galpão. Tony me mantinha presa em seus braços, talvez garantindo que eu não fosse sair correndo dali e com minhas próprias mãos passasse a agilizar o trabalho.
Não sei precisar quando tempo se passou, mas para meu coração, foi uma eternidade. Voltei a me debulhar em lágrimas quando retiraram uma maca ocupada por uma pessoa, de dentro daquele lugar. Apesar de estar longe, reconheci a cabeleira loira. Ah meu Deus, é ela! Não vi e nem esperei mais nada, me desprendi dos braços de Antony e sai correndo que nem uma louca na direção dela.
Cheguei junto dos homens que carregavam a maca, praticamente derrubando todo mundo. Talvez com medo de que eu causasse algum acidente, eles pararam e esperaram a minha aproximação. Puxei o ar sentindo os olhos arderem e as pernas ficarem bambas. O coração parecia que ia sair pela boca. Céus! Me aproximei incerta e quando a vi, ah, o meu mundo inteiro parou, de felicidade, de alegria.
-- Oi meu amor. – ela disse com um pequeno sorriso.
Continua...
Fim do capítulo
Oi amores! Tudo bem?
Espero não ter demorado tanto. Voltei o mais rápido que pude para não deixar vocês nessa ansiedade.
_______
Com o final desse capítulo, tem alguém ai aliviada? Levanta a mão ai que soltou um "Uffa" bem generoso!
Alguém suspeito que Zara não aceitaria as intruções de Adele? E por falar nessa segurança/anjo...fiquei com uma peninha dela. Mais alguém?
_______
Então é isso meninas, foi escrito com carinho e espero que vocês gostem, no entanto, estou aberta à críticas e sugstões, como sempre.
Beijos e até o próximo!
Comentar este capítulo:
LeticiaFed
Em: 17/05/2019
Um grande, enorme UFAAAA por Adele, um imenso parabéns para o profissionalismo e esperteza de Zara e um bocado de preocupação pela saúde dela. A autora? Ta desculpada por demorar mais do que 24 horas pela sequência. Agora pode descansar um ppuquinho que a gente deixa ;) Um bom final de semana, beijão!
Resposta do autor:
Olha, foi um enorme Ufaa mesmo! E convenhamos, Zara merece um prêmio por não ter obedecido as ordens da inglesa, e ao invés disso, seguir os seus extintos e intuições. Mas garanto uma coisa: Zara ainda vai ter muita coisa pra contar pra gente!
Ah meu Deus, mereço uma fofa como você? Obrigada pela folguinha, tá?
Uma ótima semana pra você amore [ATRASADA COMO SEMPRE, né?]
Beijão e até o próximo!
preguicella
Em: 16/05/2019
Aliviadas, sim ou com certeza?! hahaha
Tadinha de Zara, espero ter boas notícias sobre ela no próximo capítulo!
Vai rolar mesmo o spinoff com a história de Zara?!
Volta logo, quero ver nossas mocinhas juntas novamente!
Bjuuu
Resposta do autor:
Com certeza, né?! UFA!
Vamos ter um tiquinho de paciência com as notícias da Zara, porque quero inserir algumas coisas ainda nessa história a cerca de Zara. Vou inserir alguns detalhes, e algumas pontas soltas que serão usadas SIM na história dó dela, da nossa anjo da guarda: Zara! Então respondendo, VAI ROLAR UM POUCO MAIS DE ZARA SIM!
Ah, quem não quer ver as mocinhas juntas, não é mesmo?
Beijos amore, até o próximo!
[Faça o login para poder comentar]
cris05
Em: 15/05/2019
Ufaaaa...mas foi beeeemmm tenso.
Tadinha da Zara.
Arrasou, autora!
Resposta do autor:
Sério, quando cheguei na parte final do capítulo, deu um suspiro enorme. Me senti aliviada, sério. Apesar de tenso, as coisas começaram a se ajeitar.
Zara é demais, um verdadeiro anjo da guarda de Adele, e de outras pessoas aí [ALERTA DE SPOILER!].
Obrigada amore! Beijos e até o próximo!
[Faça o login para poder comentar]
marianamarques
Em: 15/05/2019
tenso muito tenso
essa seguranca e das minhas ve c nao demora muito
xoxo
Resposta do autor:
Beeeem tenso, né? Mas no final, deu uma aliviada no coraçãozinho, não deu não? A Zara é demais, anote isso aí!
Beijos amore, até o próximo!
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]