Capítulo 13
NO HOTEL...
Nosso suor indicava o tremendo esforço de orgasmos seguidos. Dyorgia me mantinha presa nos braços e pernas ao longo de meu corpo. Não dormíamos, cada uma com seus pensamentos a estender a noite.
-- Dy? -- ela respondeu com um resmungo meloso. -- Você confia em mim?
Ela ergueu o rosto para encarar o meu com uma interrogação que a pequena ruga que se formou em sua testa demonstrava.
-- Claro que sim, dear. Por que essa pergunta agora?
Tentava achar uma maneira de entrar no assunto delicado.
-- Sabe que o que mais quero é poder me entregar pra você de corpo e alma, não sabe? -- ela afirmou com uma carícia leve em meu queixo. -- Mas sabe também que, para que isso aconteça, tenho que espantar um fantasma antigo. Preciso encontrá-la, Dy. Preciso saber de tudo o que aconteceu para poder te entregar o que não consegui até agora.
Ela largou meu corpo e levantou-se devagar. Abriu o frigobar e retirou de lá a garrafinha de uísque. Não usou o copo, entornando o líquido garganta abaixo e isso me dizia o quanto ficara nervosa com a declaração. A luz da lua iluminava suas costas nuas enquanto ela olhava, pela varanda, a escuridão do mar adiante.
-- Tenho que ir à Tokyo amanhã. Espero você lá. -- baixou a cabeça e segurou o rosto com as mãos.
Rapidamente alcancei-lhe num abraço apertado e beijando-lhe os lábios sentindo o sabor da bebida. Aquilo me excitava e eu queria mostrar-lhe que nada mudaria entre nós, dando-lhe tanto prazer quanto possível. Nos amamos muito, antes de, pela manhã, ela partir para o aeroporto. Naquele mesmo dia ainda tive que aturar algumas reuniões exaustivas que me custaram muitas horas de aborrecimento.
No dia seguinte, Amanda me passou o telefone de Lílian. Não liguei de imediato. Era o mesmo número. Eu sabia o que estava fazendo, mas não sabia se teria controle emocional para ficar sabendo dos detalhes do que realmente tinha acontecido entre nós. Ainda sentada na cama, fixei em meu olhar o papel onde anotara o telefone e o aparelho que jazia adormecido no criado mudo. Uma angústia estava prestes a me invadir, mas, antes que acontecesse, disquei os benditos números e aguardei numa mistura de medo e dor.
-- Alô... -- eu não conseguia respirar e a voz delicada e macia insistiu. -- Alô...
-- Lílian... -- a palavra saiu com dificuldade demasiada.
-- Gui... -- ela não conseguiu evitar o choro.
-- Preciso conversar com você. Preciso saber, Lílian... Para poder amar minha esposa como ela merece. Preciso que me liberte.
xxxx
Preferi encontrá-la num local público. Ainda não estava certa de que suportaria tal proximidade. Marcamos o encontro num bar com mesas externas. Muita gente conversando e bebendo num clima descontraído, enquanto meu estômago dava voltas de ansiedade. Finalmente avistei-a vindo em minha direção. Meu coração quis saltar pela boca. Como estava linda. O vestido florido em tons de azul e verde ficava perfeito em seu corpo miúdo, mas bem feito. Os cabelos estavam mais curtos e a cor tinha clareado mais um pouco. Estes detalhes eram devorados por meus olhos que a conheciam bem. Mas era no olhar triste que eu me perdia de verdade. Aquele âmbar... Aquele rio... Aquela promessa...
Quando ela estava bem perto, levantei-me arrastando uma cadeira para que sentasse. Que tragédia, o perfume inconfundível quase me aprisiona em seus braços, me fazendo sentar rápido a ponto de balançar a mesa e deixar respingar um pouco do suco que eu tomava. Ela e eu... Tanta coisa para se dizer e nenhuma palavra. Ela sorriu entendendo a situação. Aquele sorriso.
-- Então Guilhermina “Stone heart” (coração de pedra) Soares e Silva? Aposto que não é tão calada quando trata de seus negócios milionários.
Eu recostei na cadeira e apoiei a cabeça em uma das mãos numa expressão irônica que me acostumei a usar quando se tratava de vencer a “guerra”.
-- Viemos para tratar de negócios, professora?
O tratamento dado por mim retirou o sorriso de seu rosto e me apresentou um semblante de extremo cansaço.
-- Guilhermina eu...
O garçom apareceu interrompendo o discurso para anotar os pedidos. Ela pediu um café e eu outro suco. Assim que ele se afastou eu iniciei a conversa difícil.
-- Apenas me diga... Por quê?
Coloquei no olhar toda a angústia sofrida durante estes anos todos e ela compreendeu. Perdemo-nos ainda naquele contato visual que queria dizer tanto quando, de repente ouvi um barulho de moto muito próximo e uma gritaria começar com o anúncio de assalto. Vi a moto subir a calçada em nossa direção e um homem de capacete alcançar a bolsa de Lílian derrubando-a com a truculência usada para tanto. Enquanto eu tentava ajudá-la outro homem que dirigia um carro fez um disparo e saiu a toda velocidade pela rua abaixo.
LÍLIAN...
O celular vibrava enquanto eu dirigia. Àquela hora da manhã não sabia quem poderia ser. O número era desconhecido por mim. Estacionei e atendi prontamente.
-- Alô... -- a falta de resposta foi estranha, mas meu coração por instinto sabia que era importante... Insisti. -- Alô...
E aquele som tão amado invadiu meus ouvidos como um sonho bom...
-- Lílian...
Ela... Meu único amor... A razão de ainda continuar viva... A vida dela. As lágrimas vieram imediatamente e não as disfarcei respondendo com toda a força de minha alma.
-- Gui...
As palavras que ela disse depois foram como ter sido jogada na prisão mais uma vez. Minha realidade triste. Ouvi-la dizer que queria amar a esposa sem ressentimentos me fez a mais pobre das criaturas. Por um momento esqueci o que tinha a feito sofrer. Por um momento não me enxerguei como a causadora de meu próprio sofrimento. Pediu-me liberdade e eu estava pronta para deixá-la ir, mas não sem lhe dizer a verdade. Minha verdade. Entendi quando escolheu o local aberto. Muita gente em volta. Ainda era minha criança com medo dos próprios sentimentos. Não questionei. Marcamos a hora. A voz era tensa, controlada. Sabia a emoção que se escondia ali. Minha doce Guilhermina... Não a fria mulher de negócios... Apenas minha menina querendo dar uma de forte. E ela era mais forte que eu mil vezes. Não era hora de me culpar pela covardia necessária. Tinha uma missão a cumprir, custasse o que custasse.
Na hora exata, encontrei-a sentada numa mesa. O suco, provavelmente o mesmo que sempre tomava, estava sobre a mesa. Vi a ansiedade naquele azul... O meu lugar... Meu azul onde me sentia a mulher mais feliz do mundo. Mais alta... Mais linda... Mais mulher que nunca. A mulher que machuquei sem nem mesmo lhe dar uma razão. E a tristeza me alcançou em cheio.
Ela, ao me ver chegar perto, se adiantou me puxando uma cadeira de maneira nervosa, quase derrubando seu suco ao voltar a seu lugar de antes. E isso facilitou muito a minha vida, já que o perfume, mais que gostoso, que vinha dela quase me fez perder a compostura e agarrá-la ali mesmo na frente de todos.
Nos vimos encurraladas em nosso próprio olhar e pela própria ansiedade. Tentei descontrair o momento com uma observação oportuna.
-- Então, Guilhermina “Stoneheart” Soares e Silva? Aposto como não é tão calada quando trata de seus negócios milionários.
E foi aí que percebi o quanto tinha perdido da vida dela. Numa posição de quase fera prestes a atacar me encarou com toda a ironia que pôde antes de dizer...
-- Estamos tratando de negócios, professora?
A palavra final atormentou-me ao máximo. Então a máscara de “tudo bem” foi arrancada de mim, mostrando-lhe o real de meu estado. Eu estava cansada... De tudo e preparada para falar-lhe a verdade.
-- Guilhermina, eu...
O bendito garçom chegou até nós, querendo ganhar sua comissão diária. Anotou o pedido enquanto eu me via mais uma vez me acovardando ante a presença dela. Dessa vez a atitude partiu dela.
-- Apenas me diga... Por quê?
Quando meu coração estava prestes a declarar a ela tudo o que tinha nos acontecido, ouvi o motor da moto e os gritos de pavor. Um assalto! Justo agora?! Pior... Vi o motoqueiro avançar e o carona alcançar minha bolsa, me jogando ao chão ao conseguir o intento. Caída na calçada, senti quando minha amada quis me proteger, vindo na minha direção. Cobriu meu corpo e ouvi o disparo perto demais.
Queria me mexer e a chamava pedindo que se levantasse. O peso descomunal sobre mim me avisou de sua inércia. Ela não se movia e o sangue abundante já me marcava o vestido. O horror que senti na hora não conseguiu ser maior que minha vontade de ajudá-la. Agarrava-lhe o corpo pronunciando a palavra “não” tantas vezes quantas fossem necessárias. As sirenes da ambulância se fizeram ouvir quase que instantaneamente. A rapidez se fez estranha por um momento, mas agradeci a todos os deuses por isso.
Fim do capítulo
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rhina
Em: 31/03/2019
Ambas feridas com mágoas. ....resultantes de atitudes feitas e tanto quanto não feitas....o ressentimento presente. ...e por liberdade clama.....
Liberdade que não se encontra na esquina pois no momento de perder seu único amor....ficou claro que a liberdade tanto desejada é uma ilusão. ....agora admitir já é outra atitude
Rhina
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