A Italiana por Sam King
Capítulo 27 - Recomeço
Amélia ainda tentou retê-la mais um segundo em seus braços, mas Clarisse se afastou devagar. As duas se olham com amor e desejo, mas nos olhos castanhos há medo e dor. Por isso quando Clarisse sai da biblioteca sem falar nada, Amélia apenas deixa-a ir.
Sai cabisbaixa da biblioteca e não viu nem rastro de Clarisse, encaminhava-se novamente para a cozinha , quando a visão dele parado na porta a fez parar. Seu amigo Daniel estava com a expressão surpresa que entonou na sua voz quando fala:
- Amélia.
- meu amigo.
E Amélia achega-se próximo a ele, mas não faz menção de abraça-lo, estava ainda doída pela rejeição sofrida por Clarisse.
- mas como?
- e uma longa história.
Daniel levou apenas um segundo a mais para abraça-la, e com carinho diz:
- sabia que voltaria.
Amélia apenas abraça de volta seu velho amigo, que não mudara nada. Depois se juntam a eles Chica e Del, esta última diz :
- Amélia nossas coisas chegaram.
Daniel se solta do abraço e diz:
- sim, as trouxe. As vezes faço trabalhos de entregas para a estação.
Não precisou dizer que infelizmente praticamente trabalhava na fazenda pela moradia apenas. Chica pergunta curiosa:
- cadê Clarisse?
- não sei.
Responde Amélia entristecida, se Clarisse não a queria , nada poderia fazer, andou a esmo pela sala sob o olhar dos amigos. Até que Chica diz:
- não podes ir.
Amélia com os olhos brilhosos diz:
- não posso impor a minha presença Chica, se ela não me quer. - respirou fundo e tomou a decisão - Del faça o favor de pegar a minha pasta, mas não tire mais nada da carruagem. Só vou entregar a escritura para ela e iremos.
- Mas Amélia, lembre-se do que a Isa queria.
- por favor Del, não faça isso agora.
A francesa aquiesceu e foi atender o pedido da sua chefe, Chica sentou-se no sofá, e não falou mais nada. E Daniel apenas perguntou:
- tens certeza Amélia. Sei que não sou íntimo de Clarisse, mas até eu percebi o quanto sentia sua falta.
- mas o que posso fazer Daniel? Ela não me perdoa, vi em seus olhos.
- lute Amélia - diz Chica ríspida, algo que nunca fora visto pelos amigos - mais uma vez estais a fugir. Não sabes o que a Clarisse passou. E "craro" que ela está magoada, acreditou nas mentiras da mãe. Então prove o contrário!
E encarando furiosa Amélia sai pisando duro da sala, no exato instante que Del voltava com sua pasta. Amélia a pegou e saiu atrás de Clarisse, ainda com as palavras furiosas de Chica ressoando nos ouvidos.
Chica não conseguiu dessa vez reter as lágrimas que caiam molhando seu rosto, sentia vergonha por chorar, e por isso quase nunca o fazia. Mas naquele momento toda a tensão que viveu durante anos, sofrendo por Clarisse e por si mesma, as humilhações que aguentou de Rodolfo, a ameaça constante de Aurélio. A sua amada fazenda morrendo aos poucos e por fim elas quase passando fome. Porque nos últimos tempos tinha que fazer milagres para se alimentarem. Ouviu a voz suave em suas costas:
- estais bem?
Secou o rosto com pressa e da mesma posição responde:
- estou.
A francesa aproximou-se devagar e com carinho segurou o queixo de Chica a virando para si, com delicadeza seca uma lagrima solitária que caia naquele instante:
- sinto muito.
E Chica sentiu o coração apertado, encarou aqueles olhos esverdeados e havia entendimento ali. E para disfarçar o momento vulnerável, sorriu safadamente e solta:
- nada a sentir guapa. Mas se "quiser"...
- não faça isso.
A francesa deu um passo atrás dizendo contrariada. Chica suspira e contrariando sua natureza fica envergonhada de como agiu e diz:
- me "descurpe", me pegaste em um momento péssimo.
- está bem. Sei que passaste por coisas ruins também.
- e sabe como?
- tu era muito citada no relatório do homem que pedirmos para investigar, sei que era acossada pelo capataz. E vendo o carinho que tens por Clarisse imagino que sofreste muito pela situação dela.
- e certo.
Chica fala apenas isso, estava constrangida por aquela mulher saber tanto sobre sua situação, nunca fora de precisar de ninguém. Mas se viu estranhamente reconfortada pela compaixão que via em Delphine. Mas antes de dizer qualquer coisa, João aparece na cozinha com a expressão sonolenta:
- Chica estou com fominha.
Chica nesse momento transforma-se em manteiga derretida, amava aquela criança como se filho seu fosse. Levantou o menino o abraçando e dizendo carinhosa:
- está com fome bebê.
- não sou bebê.
E contrariando a próprias palavras João faz manha. Chica o coloca sobre a cadeira e começa a procurar as bolachas que havia feito mais cedo, então olhou João comendo , enquanto os olhos de Del ficaram sob ela, e pela primeira vez sentiu algo diferente sob esse olhar, ainda que não conseguisse identificar.
Amélia já havia procurado nos aposentos de cima, mas nada de Clarisse, voltara até a biblioteca e por último abria a porta do escritório do senhor Oliveira. Para na entrada e observa a mulher que está sentada no sofá , aos mãos segurando a cabeça que encara o chão vazio. Amélia bate à porta chamando a atenção dela. Clarisse a encara e diz resoluta:
- tens que ir embora, apenas não podemos.
Amélia sente o choque das palavras, e mesmo sabendo que era isso que Clarisse queria, ainda lhe dói na alma. Mas antes de ir, retira da pasta as escrituras da fazenda e se aproxima de Clarisse as estendendo.
Um tanto assustada a brasileira pega os papeis e começa a ler e Amélia diz implorando:
- elas são suas - ajoelha-se na frente de Clarisse e segura em seus joelhos, as duas estremecem com contato, mas continua firme - quero que me deixe ajudar para reerguer a fazenda Clarisse, por favor deixe-me pelo menos fazer isso.
- eu não...
- me perdoa Clarisse, por ter ido embora, por não ter lutado por nós como prometi. Sei que deveria ter dito isso assim que pisei nesta casa novamente.
As duas se encaram por um longo tempo, mas como Clarisse não disse nada, se levanta derrotada. Encaminha-se para porta, quando com um fio de voz Clarisse diz finalmente:
- fique.
Amélia a encara esperançosa, mas Clarisse diz resoluta:
- mas não posso prometer nada Amélia, mas não serei orgulhosa, pela legado da minha família e pelo futuro do meu filho , aceito a oferta de ajuda, mas quero devolver o investimento.
- está bem.
Amélia achou melhor não discutir naquele instante, afinal tinha uma chance de reconquista-la.
Ela não conseguia dormir, sabendo que seu amor estava a algumas portas do aposento que lhe foi dedicado. Abriu e janela e observa a lua reinando no céu, nunca fora religiosa mesmo tendo sido criada em um orfanato católico, mas se viu rezando para seu anjo da guarda, ou melhor anja. Sentia muita falta de Isa, mas sabia que ela estaria feliz com a decisão que tomara. Não partiria sem ter lutado com todas suas forças por Clarisse. Já havia avisado a Del que voltasse o quanto antes para Porto alegre, a empresa tinha ficado com pessoas competentes é claro, mas sua vice -presidente era em quem mais confiava. Estranhamente a francesa pareceu entristecida com o pedido, apesar não ter contrariado as ordens. Sem conseguir dormir, restou apenas descer e tomar um leite morno, afinal a dispensa tinha sido reabastecida. Mas antes de conseguir descer as escadas, um grito gutural vem do quarto de Clarisse, sem pestanejar Amélia corre para os aposentos dela, abre a porta sem pedir licença com a vela na mão encara Clarisse transtornada na cama. Com quietude se aproxima e carinhosa acordada a mulher que parecia está tendo um pesadelo.
Amélia nota o semblante angustiado de Clarisse quando esta abre os olhos, que encara tudo ao redor ainda assustada:
- amore mio, acalma-te.
- onde ele está?
Amélia sente mais ódio daquele assassino, mas com carinho coloca a vela sob o criado mudo e segura Clarisse pelos ombros a acalmando:
- não tem ninguém aqui, apenas eu.
- Amélia?
- si.
Clarisse parece mais calma e deita-se novamente, Amélia fica fazendo carinho no rosto da sua amada, até parecer que ela estava pegando no sono novamente. E quando vai se levantar, tem a surpresa de ter sua mão agarrada e com um sussurro Clarisse pede:
- deite-se comigo.
Sem hesitar Amélia aconchega-se na cama e a trás para seus braços, Clarisse a abraça e deita sua cabeça em seu ombro, e Amélia começa a cantarolar baixinho:
- "Pois quando o amor se faz,
A gente não esquece mais
Nasci nos olhos dentre os suspiros
O bem-me-quer se desfolhou
Vai batendo o coração porque encontrei meu grande amor
Marquei o dia marquei a hora
No calendário que o amor fez
A estação da paixão e a minha primeira vez ...
- e a nossa música.
Amélia apenas apertou mais nos braços e enquanto terminava a canção, sentiu o sorriso de Clarisse no pescoço. Queria beija-la e ama-la a noite toda, mas no momento apenas espantou os monstros do sonhos dela.
Fim do capítulo
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