Luiza

Eu quase engolia a garrafa de água de tanta raiva que eu estava. Aline tanajura se esfregava na minha Ju sempre que podia e todos presentes no Camp Nou, estádio do Barcelona, deliravam. Julietta estava ao meu lado no camarote vip, bem próximo ao palco, e não parava de falar o quanto estava impressionada com AnaLu e com a performance da DJ. A minha vontade era mandar a manager calar a boca. Por que eu fui convidá-la? Ah, claro... ela que se convidou!

— Realmente eu não sabia desse outro lado da Ana Luiza! Mas também eu deveria imaginar! Neta do Dr. Carlos Eduardo Machado!!! Sem dúvida deveria ser uma pessoa excelente! – “Julietta, cala a boca!” – E talentosa ainda por cima! Você deve ter muito orgulho dela.

— Aham... – fecha essa matraca! Eu nem olhava pra ela e nem ao menos prestava atenção no que falava até que uma palavra me fez ficar em alerta.

— ... e quem melhor que a madrinha pra ensinar a afilhada como se fode direito - oi?

— Não entendi. – fiquei paralisada, sem saber o que falar.

— Tá na cara que você come a menina, Luiza. Ou é ao contrário?

— Eu não sei o que você tá falando, Julietta.

— Luiza, Luiza! – ela se aproxima e me abraça colando seu corpo nas minhas costas. – Eu não nasci ontem. Agora a gente vai negociar e ver o que essa informação vale a você. – ela fala ao meu ouvido e ch*pa o lóbulo da minha orelha me causando nojo. Sinto os olhos da AnaLu em nós. Sua expressão era de raiva. “Puta Que Los Pariu!”

— Sai de perto de mim! – fiz um movimento e Jake apareceu ao meu lado e ela me soltou.

— Amanhã você vai receber a minha oferta para... como direi... ficar quieta... – a mulher virou as costas e saiu como se nada tivesse acontecido. Me apoei em Jake transtornada. No palco AnaLu falava com Aline e eu via que me olhava preocupada.

— Madame Luiza, a senhora quer que eu de um corretivo naquela lá? – Jake pergunta me abraçando sem jeito. Era um fofo. Um ursão.

— Não, Jake. Eu vou ter que ver o que fazer.

— Eu sei que não é da minha conta, mas acho que já passou da hora de contar do namoro com a pestinha. – Jake chamava AnaLu de pestinha carinhosamente desde sempre. Ela pregava peça nele quando criança e os dois eram bons amigos.

— Ai, Jake... eu sei... mas tenho medo!

AnaLu

— Até quando você vai fingir que não aconteceu nada no show, Lu? – minha namorada estava calada desde que voltamos do estádio. Sai antes do show terminar e fui até a Luiza e a trouxe para o hotel. Ela não quis falar nada e aquilo estava me matando. – Eu vi aquela lá te agarrando e depois Jake aparecendo.

— Ela sabe de nós, Ju...

— E?

— Ela quer alguma coisa para não nos expor para todos.

— O que? Dinheiro?

— Ela não disse. Eu não deixei.

— Lu, não cara... – me aproximei pegando seu rosto e trazendo para junto ao meu. – Não cede. A gente enfrenta qualquer coisa juntas... por favor...

— Eu não quero ficar longe de você, Ju.

— Então me assume!

— É complicado!

— Descomplica!

— As coisas não são assim no mundo adulto, AnaLu.

— Ah sério, Lu? Sério que você vai falar desse jeito comigo? – sai de perto dela.

— Desculpe, desculpe.... – ela me abraçou colocando o rosto no meu pescoço. – eu não quero te perder. Eu tenho medo.

— Quando eu a vi te abraçando hoje me deu vontade de pular daquele palco e encher aquela vadia de porr*da. – falei a apertando mais contra meu corpo.

— É? – ela falou me dando um beijo no pescoço.

— Uhum... – falei já ficando excitada.

— Ju?

— Oi?

— Me dá banho?

— Com uma condição.

— Qual?

— Se eu puder te comer bem gostoso no chuveiro.

Luiza

Julietta me ligou no outro dia. O que ela queria era algo inimaginável. Ela não queria dinheiro. Ela queria o status de ser a senhora Luiza Nadge e ela me deu um mês para pensar. O mês que eu teria com a Ju em Los Angeles. Talvez o nosso último mês juntas.      A minha cabeça era uma bagunça. Eu não pensava apenas em mim. Eu pensava na minha Ju. Iriam crucifica-la. A mídia é muito cruel. Iriam julgá-la sem saber do nosso amor. Podem até mesmo inventar que estávamos juntas enquanto a Alex era viva. Eu não consigo imaginar o que irá acontecer. No quanto a minha menina pode sofrer.

Olhava para a menina nua na minha cama dormindo serena enquanto ouvia as ondas quebrarem na praia logo em frente. Estávamos na minha casa em Malibu já há 15 dias. Era impressionante como AnaLu estava adorando fazer parte desse mundo de trilhas e composições para cinema e o produtor até mesmo aceitou duas músicas dela para fazerem parte do filme. E uma delas seria interpretada pela Rihanna. Eu morria de orgulho.

Meu telefone dá sinal de vida e vejo uma mensagem da Julietta. 15 dias. “Puta que los pariu! Virou Samara Morgan agora?”. Eu ainda não sabia o que fazer. Não contei para AnaLu, mas ela desconfiava de que algo não estava certo. Falei que Julietta queria dinheiro e mesmo contra a sua vontade eu disse que eu cedi. Em um rompante vou até meu closet e faço uma pequena mala, troco de roupa, sento na cama... olho para minha Ju... minha menina... minha mulher...

AnaLu

— AnaLu? Tá dormindo? Perdeu a vez de entrar de novo garota! – Summer falou irritada.

— Desculpe, pessoal, mas não to com cabeça pra ensaiar.

— Poxa, morena, e quando você vai tá? O aniversário do João é nesse final de semana. – Jorge chega do meu lado e me abraça forte. – O que tá acontecendo com você? Desde que você voltou de viagem tá assim.

— Deixa ela, neguinho. – AnaBea fala. – Chegou de ensaio, galera. Bora pra piscina! Vão na frente que a gente vai depois.

Sabia que AnaBea iria me dar sermão. Desde que eu voltei de Los Angeles ela não para de fazer outra coisa. Come, AnaLu, parece um palito de dente! Toma banho, AnaLu, tá fedendo! Você quer que as mamães percebam e perguntem o porquê você está assim? Sai do quarto, AnaLu!

Flashback on

Ainda de olhos fechados sinto a falta do corpo quente ao meu lado. Abro os olhos e me deparo com Luiza vestida elegantemente.

— Lulu, vai sair? – sentei na cama sem me importar com a minha nudez.

— AnaLu se cobre por favor. – ela disse sem me olhar e foi ai que notei que algo estava errado.

— O que foi, Lu? – levantei com o lençol me cobrindo e me aproximei dela que virou de costas e ficou olhando as ondas quebrarem na beira-mar.

— Vem cá... senta. – ela me levou até o grande sofá em frente a janela e se sentou ao meu lado. – AnaLu, quero te dizer que esses meses foram lindos. Eu me senti com 18 anos de novo.

— Pra mim também foram maravilhosos Lu...

— Deixa eu falar... por favor... – ela estava séria – Ana Luiza eu me encantei com você. Eu me encantei com a sua vitalidade. Eu me senti viva. Você me trouxe de volta a vida. O jeito que você me cortejou, me amou...

— Eu não tô entendendo, Lu.

— Eu entendi tudo errado, AnaLu. – ela chorava. – Eu projetei um sentimento em você, um amor que não deveria ser para você... que não era para você... – enfim eu entendi o que ela disse. Eu me levantei e vou até o closet e coloco um camisetão. – Desculpe AnaLu, a adulta sou eu... eu deveria ter sido mais madura... não ter me deixado levar pela semelhança...

— Ok... eu entendi. – eu não conseguia chorar. Luiza soluçava alto e pedia desculpas. Ela estava desesperada. Ela dizia para eu ficar na casa que ela iria para New York mas eu não conseguiria ficar ali. Ela me abraçou e eu a acalmei. Eu sei que ela me ama. Não quero acreditar que esse amor seja uma transferência. Ela soluçava alto. Ela estava mais transtornada do que quando tia Alex morreu. Acho que a minha aparente serenidade estava fazendo ela em frangalhos. Coloquei ela na cama e dei um calmante. Liguei para o Papy vir cuidar dela, enquanto esperava ele chegar fiquei velando seu sono.

— Filha, o que houve?

— Papy, ela vai precisar de você. – falei beijando-o. – Mas eu não consigo falar agora. Eu preciso ficar sozinha.

 Dei um beijo cálido na testa de uma Lu adormecida e fui para um hotel com meu coração em pedaços. Aconteceu o que eu mais temia quando iniciei essa relação: não era eu que ela via e sim mainha.

Flashback off

Os dias em Los Angeles passaram para mim como se eu estivesse no piloto automático. Eu trabalhava normalmente. Me alimentava normalmente. Para quem olhava de fora eu era a mesma pessoa. Por dentro eu estava morta. AnaBea veio do Brasil para ficar comigo e eu chorava todas as noites no seu colo até dormir. Apenas desabei quando voltei para casa.

Luiza tentou falar comigo várias vezes, mas eu a ignorei. Preciso de um tempo. Preciso me confirmar que tudo que vivemos foi apenas uma “crise de meia-idade”. A única coisa boa de tudo isso é que eu tenho duas pastas repletas de músicas novas. E meu produtor nos Estados Unidos já vendeu várias para alguns artistas de renome. Jorge me perguntou por que eu não posto mais nada no canal e não vou mais gravar nada. Não quero fama. Quero viver minha vida com a minha arte e as coisas que a natureza nos dá like Milena do Enem.

A melhor coisa que aconteceu na minha vida foi as mamães não terem deixado a tia Alex ter me agenciado quando eu tinha 15 anos. A minha vida não seria a mesma. Eu não iria querer aquela vida de exposição. Esses meses junto a Lu eu senti na pele o que ela passa. É foda não poder sair descabelada pra dar um role na esquina.

Olho meu telefone e vejo notificação de uma rede social. Uma foto da Lu com uma mulher ruiva. Luiza andava saindo com uma ex namorada, uma tal de Cris. Minhas mães estavam felizes com isso. AnaBea me olhava com pena. Eu fingia que não via.

Luiza

Dois meses, 15 dias e 8 horas. É exatamente o tempo que faz a última vez que eu a vi. AnaLu foge de mim. Se ela sabe que eu estou na cidade ela dá um jeito de viajar com algum amigo. Nunca mais atendeu as minhas ligações ou respondeu as minhas mensagens. “Mas também, Luiza! O que você quer? Você quase disse pra menina que comia ela pensando na mãe!”.

Julietta aceitou me dar um prazo de três meses por uma polpuda quantia. Fernando não fala mais comigo. Só fala o necessário. Ele diz que só vai voltar a falar quando: “Eu voltar a ter juízo nesse meu cú e falar tudo para Nanda e Clarinha e pedir desculpas para AnaLu”.

Mas sempre vão existir Juliettas. Sempre irão existir gente cruel que vai querer machucar a minha Ju. Eu preciso protege-la. Eu via o quanto AnaLu ficava incomodada com os paparazzi, com o assédio...

— Tá pronta, Lu? – Cris me pergunta da porta do quarto. Nesse último mês ela tem sido uma boa amiga. Ela me houve, enxuga as minhas lágrimas, me apoia. Eu sei que ela tem esperanças em reatar o nosso breve affair que tivemos. Cris sempre foi apaixonada por mim desde a adolescência. Mas ela sabe que eu amo loucamente a Ana Luiza! Contei tudo a ela. Contei para Cris o dia que descobri que o que eu sentia pela Nanda virou apenas amizade. Quando eu percebi que a primeira coisa que eu pensava ao acordar era em como AnaLu estava, e que isso também era a última coisa que pensava antes de dormir. AnaLu. Ju. Minha menina.

— Tô sim.

Fomos para a boate onde seria a festa de aniversário do meu afilhado e cumprimentei minhas amigas na chegada. A música alta não dava margens para conversas e eu agradeci aos céus por isso, pois sei que viriam cobranças porque eu estava mais reclusa e não aparecia mais nos almoços em família. João estava lindo! Tinha deixado a barba crescer! Um gato. AnaBea me deu um beijo e um forte abraço.

— Ela vai cantar com os garotos. – como se advinhasse AnaBea falou ao meu ouvido exatamente o que eu queria saber.

Fiquei bebericando um copo de uma bebida qualquer que tio Cadu me deu. Cris era estava toda sorridente e ria de algo que a Nanda contava. Seria tão mais fácil se eu me apaixonasse por ela. Tão menos complicado!

— Boa noite, gente, estamos aqui para animar a festinha de aniversário do meu irmãozinho. Então vamos começar com a música do Patati Patatá... brincadeira. João, caraca, mano... tu é o melhor irmão que alguém poderia ter. Tu e a AnaBea são meus melhores amigos. Tudo o que eu quero no mundo é que tu seja feliz! Então... a gente preparou uma setlist só com as tuas preferidas... – aquela voz rouca... AnaLu estava linda. Linda. Um vestido longo tomara que caia. Cabelos soltos. Mais magra. “Será que ela tá doente?”. Clarinha me contou que ela desistiu da carreira de cantora e agora vai apenas compor, o que ela faz lindamente. “Tudo o que ela faz... faz bem!”... segurei forte o copo e gemi baixinho lembrando da sua boca na minha pele, suas mãos nos meus seios, mãos que dedilhavam um violão com perfeição, mãos que dedilhavam meu sex* com maestria, voz rouca que cantava palavras de amor, voz rouca que sussurrava palavras de amor no meu ouvido...

Senti braços ao meu redor ao ritmo da música, mas não eram os braços que eu queria. Não quis ser grosseira e deixe me levar acompanhando a música meio a contra-gosto. AnaLu não tirava os olhos da gente.

— Joãozinho, quero pedir desculpas, mas vou cantar uma música fora do setlist. É dedicada a uma pessoa presente. – o pessoal da banda ficou sem saber o que fazer mas AnaLu falou algumas coisas e pegou o violão. Ela iria cantar sozinha.

Ela começa a cantar olhando fixamente para mim. (N/A: Ouça Demônio Colorido – Sandra de Sá https://www.youtube.com/watch?v=tMXaEFKumy0 )

♫ Seus olhos ao invés de verdes
Deveriam ser vermelhos incandescentes
Na mão ao invés de uma rosa
Você deveria ter um tridente
Sua voz é tão suave
Quando deveria ser mais arrogante

Ela sorri e eu sorrio de volta.

Vadiando na minha cabeça
Não me deixa um só instante

Mas eu vou lhe guardar
Com a força de uma camisa
Me despir do pavor
Lhe chamar de amiga
Vinte e quatro horas por dia
Tentando o meu juízo
Foi unanimemente eleita
Meu demônio colorido♫

             Ela canta as estrofes várias vezes e nós sabemos o que significa. Ela quer o que tínhamos antes. Ela precisa de mim. Eu sei bem o que é isso porque eu preciso desesperadamente dela. Desesperadamente. Quando ela termina eu não vejo mais nada e penso em ir até ela. Precisa abraça-la. Sentir seu calor. Seu perfume. Sentir a minha menina. Não dei dois passos quando estanco vendo AnaLu e Aline se beijando apaixonadamente.

— Sempre achei que os olhos da Aline eram azuis! Pra você ver como a gente se engana! – Nanda diz ao meu lado.

Fim do capítulo