A Italiana por Sam King
Capítulo 8 - As Conversas
Amélia acorda com cheiro de jasmim invadindo suas narinas, fica de olhos fechados mais alguns instantes inalando aquele aroma reconfortante. Até que as lembranças da noite anterior lhe tira essa ilusão de paz, levanta-se sobressaltada. Na mesma hora a porta do quarto se abre e Clarisse aparece com uma bandeja trazendo o café da manhã, encabulada Amélia começa a se levantar, mas Clarisse pede carinhosa:
- não se levante , por favor.
- mas io que devo servir signorina.
E antes que Amélia pudesse protestar mais, Clarisse senta-se a lado dela na cama e coloca a bandeja sobre o colo da italiana , ignorando o comentário pergunta:
- quer leite no café?
E espera a resposta de Amélia, Clarisse não entende como poderia sentir tanto carinho por alguém que mal conhecia, nota os ferimentos no rosto dela e decide que deve ser a situação que a encontrara que despertou esse lado fraternal.
Por seu lado, Amélia vê naquela singela moça que tinha tudo para ser soberba, um anjo e como tal não deveria ter pensamentos digamos um tanto pecaminoso, como por exemplo, aquela boca de lábios cheios, o debaixo um pouco mais e desejar saber que gosto teriam. Não, daquele momento em diante Amélia só olharia Clarisse com devoção e gratidão, e acima de tudo faria tudo o que ela pedisse:
- prego ( por favor), pode colocar.
Clarisse faz o que é pedido, Amélia agradece e começa tomar o café sob o olhar atento dela, que pergunta um pouco sem jeito:
- tu estais bem? Se quiseres podemos chamar o doutor.
Amélia sente um bolo se formando na garganta e deposita o pão que levara a boca de volta a bandeja, Clarisse sente-se uma estupida:
- desculpa Amélia, esquece isso, coma sim.
Amélia encara os olhos castanho com tanta dor, que Clarisse sente reverberar em si e diz resoluta:
- nunca hei de dimenticare ( esquecer), questo que aconteceu com io, vivera para sempre em mio cuore( coração).
E lágrimas escorrem preguiçosas pela face da italiana, Clarisse em um reflexo começa seca-las, depois acarinha a maça do rosto de Amélia:
- sinto muito por isso ter acontecido, mas saiba que terá em mim uma amiga eterna Amélia.
E segurando a mão em seu rosto, Amélia diz fervorosa:
- grazie , sono( estou) em debito com a signorina, e pode star( estar) certa disso, non existe o que lo non faro( faço) pela signorina.
- se assim, pode receber a Chica?
Amélia solta a mão de Clarisse e a encara sem ter certeza do que fazer, não queria ver Chica nunca mais, mas também não queria contrariar o anjo. Então apenas assente e Clarisse diz meiga:
- não sei porque estas com raiva dela, mas diante do que houve, não crê ser bom ter amigos por perto?
- si.
Amélia diz apenas para não contradizer Clarisse, que se levanta e deixa uma ansiosa Chica entrar.
- bom vou deixa-las a sós. E Amélia depois que conversar com a Chica, pode colocar esse vestido e me encontrar na saleta por favor. Temos muito que conversar.
Amélia olha o vestido que está repousado ao lado da cama e diz:
- si signorina.
Clarisse sorri e pede:
- me chame apenas pelo meu nome.
Amélia assente e Clarisse deixa o aposento, e uma tensão tão grande se forma que poderia ser cortada com uma faca. Amélia começa a se levantar e Chica insinua ajuda-la, mas antes que possa encostar na italiana, ela a encara com uma cólera calada. Chica se afasta imediatamente ainda sem entender porque sua prenda agia assim.
Depois que quase capara Aurélio, voltou para o quarto e sua revolta arrefeceu dando lugar a uma desolação sem fim, chorou praticamente a noite toda, e ainda não conseguia acreditar que aquilo acontecera justamente com Amélia, uma guria tão doce e inocente.
Assim que acordou, preparou o café dela e iria leva-lo, mas Clarisse aparecera e achou melhor Chica ainda não confronta-la, que esperasse um pouco do lado de fora, que tentaria convencer a italiana. E agora estava ali sem saber porque Amélia a estava destratando, mas chica nunca foi mulher de fugir de confronto e pergunta :
- "pur" favor Amélia, porque estas a me tratar assim?
Amélia a fita com animosidade e responde com desprezo:
- e como queres ser tratatti? Depois que a vi com aquela ragazza?
E se aproximando de Chica com passo firme e mesmo sendo mais baixa que a cozinheira, Amélia pareceu se agigantar diante perplexidade de Chica. E cravando um punhal no coração da cozinheira completa com aversão:
- Mio cuore se quebrou tanto que io esqueci dove (onde) estava, e culpa tua que...
E a garganta fechou e Amélia apenas desvia o olhar , porque Chica havia traído o que tinham? Achava que estava sendo correspondida nos novos sentimentos, seus pensamentos foram interrompidos por um gemido vindo de Chica. Amélia a encara surpresa, a cozinheira negava com a cabeça e chorava copiosamente. Falava em sussurros como se tivesse brigando com si mesma:
- "num" era "pra" ser assim...sou uma patife, uma chucra que não consegue segurar as saias no lugar.
Então Chica a encara tão devastada, que Amélia sente a culpa revirar no estomago vazio e a cozinheira cai aos seus pés de joelhos e implora:
- perdoa pelo meu desatino Amélia, "prumeto" que nunca mais farei tu sofrer.
E antes de qualquer resposta, a cozinheira se põe em pé e sai em disparada, Amélia até tenta correr atrás dela, mas as dores no seu corpo a impede. Então desaba na cadeira que há ali, colocando as mãos no rosto e chora, não sabia que a vida podia doer tanto.
- pode entrar.
Clarisse diz após uma batida suave na porta , é Amélia tímida e de olhos baixos, fica parada na entrada.
- vem aqui Amélia.
Ela faz o que é pedido e senta-se ao lado de Clarisse, que ergue seu queixo e diz preocupada após ver os olhos vermelhos e inchados dela:
- chorando de novo, tu estás com alguma dor Amélia?
- a dor que tenho, nenhum dottore vai guarire ( curar).
Clarisse faz uma expressão de compreensão e teria que ter paciência para esperar aquela moça alegre e com um sorriso fácil do dia anterior estar de volta, e se dependesse de Clarisse isso aconteceria. Coloca as mãos de Amélia entre as suas e diz animada:
- tenho uma proposta para tu, acho que vai te animar um pouco.
- proposta?
- sim, sabes o que significada dama de companhia?
- piou a meno ( mais ou menos)... e uma signora que acompanha a dama de uma casa?
- e isso, então queres ser a minha?
- como?
Clarisse respira fundo, teria que contar o porquê da proposta, aperta as mãos de Amélia tentando passar conforto:
- meu pai não vai mandar embora o capataz Amélia...
Amélia solta-se de Clarisse e perturbada diz:
- non , tenho que ir sabbene( embora)... ele vai me attacare ( atacar) de novo.
E Amélia levanta-se parecendo que sairia correndo da fazenda naquele instante, Clarisse a acompanha segurando pelos ombros e diz feroz:
- nunca mais Amélia, juro por nosso senhor , pelas minhas uvas queridas , pelos meus pais que nunca mais aquele homem vai chegar perto de tu.
Amélia sente os olhos arderem novamente, mas desta vez ficou comovida com a proteção que existia nas palavras de Clarisse, e ousada a abraça forte e mais uma vez agradece o anjo da sua vida.
Depois de se acalmarem, voltam-se a se sentar e mais uma vez Clarisse fala:
- então, que ser minha dama de companhia?
- io non sei se me sinto preparato ( preparada) para um cargo tão importante signorina.
- mas pode ficar, e assim que vai acontecer...
E Clarisse explicou tudo o que tinha combinados com os pais, e Amélia mesmo sentindo que deveria ir para bem longe , sabe que a partir daquele dia só poderia deixar Clarisse se ela pedisse, sentia-se ligada a ela de forma totalmente irracional. E sua resposta só poderia ser uma:
- si, acetto.
E o sorriso de Clarisse foi tão lindo, que Amélia sentiu algo bem no amago da sua alma mudar, só não soube o que ainda.
Daniel praticamente conta os últimos minutos para encerrar o trabalho, depois corre com se sua vida dependesse disso para o casarão.
Depois de levar Aurélio para casa, chamou o curandeiro da vila para cuidar do meio capado, que prometeu discrição e deu um jeito na hemorragia. Aurélio chiou por ser tratado por um negro, mas quando Daniel ameaçou deixa-lo sangrar até a morte, acabou aceitando. Depois do trabalho feito, deu umas moedas para o homem e mais uma vez retificou com Aurélio que ficasse de boca calada sobre tudo o que aconteceu ele grunhiu uma resposta positiva, mas Daniel ficaria de olho nele pelos próximos dias.
Quando chega a porta de trás, Chica sai de cabeça baixa e acaba trombando nele que a ampara e pergunta preocupado quando nota que a cozinheira parecia desacorçoada:
- o que há?
Ela o encara angustiada e diz:
- foi minha culpa que Amélia foi violada, a machuquei tanto que a deixei indefesa.
- do que falas Chica?
- nada Daniel - e se afastando diz triste - tu vais ser muito melhor para ela, cuida dela... cuida dela.
E segurando as saias corre em direção a ala dos empregados, Daniel fica entre ir atrás de Chica ou ir até Amélia, escolhe a última opção, depois conversaria com Chica, agora tinha que ver sua irmã de coração.
Ele pede para um dos pias que havia ali em volta para chamar Amélia, sabia que ela estava no casarão desde o acontecido. Aliás todos da colonia estavam muito preocupados com ela, alguns minutos depois, sua amiga aparece na porta da cozinha e quando o vê abre um sorriso triste e corre para seus braços e Daniel está pronto para lhe abraçar.
Os dois andam até para debaixo de uma paineira rosa, uma árvore típica do sul, com 30 metros de altura e folhas com pintas rosas e borda brancas, sentam-se aos pés dela:
- como estas?
- io non sei direito Daniel, tutto questo me parece ainda um incubo( pesadelo).
Daniel a fita com compaixão e beija docemente sua testa e a abraça tentando passar conforto. Os dois ficam assim por um tempo, até que Daniel questiona:
- porque a Chica está tão perturbada Amélia? E por causa do que aconteceu?
Amélia se afasta dele e olha para longe, com a voz chorosa conta:
- io a vi com outra donna ( mulher), estavam ... nuas , al cama.
- mas que merd*.
- si.
- ela está se culpando Amélia.
Daniel havia dito aquilo com uma reprimenda, Amélia o encara com vergonha, havia pensado muito sobre as palavras dita a Chica, e sentia que havia errado totalmente com ela. Daniel a fita sério e conclui:
- tem que conversar com ela.
- si, fui injusta com ela, mas é que ainda está dolorante ( doloroso) o que ela fez e depois...
E não precisava acabar o resto, Daniel sabia.
- ela está no quarto, vai lá Amélia, não tens ideia do que ela fez por ti.
- cosa? ( o que)
E Daniel se xinga mentalmente por ter a boca aberta, mas já tinha começado:
- ontem ela ficou de tocaia esperando Aurélio e cortou, sabe...
E faz o movimento de corte sobre o próprio membro, Amélia abre a boca assombrada e diz no mesmo tom:
- ela cortou fora o pene dele?
- bom quase, deixou um pedaço.
E Amélia não sabia o que pensar, Chica havia se arriscado por ela e a culpa de antes , volta redobrada.
- como lo sai?( como você sabe)
- e...bem estava com ela,foi meio sem querer, mas foi ela que fez tudo.
- ela me vingou?
- sim, e ainda o ameaçou que se chegasse perto de tu, capava o resto.
- dio santo...
- ela não merece levar a culpa que foi apenas daquele patife Amélia, por mais que a tenha magoado.
- e vero. ( e verdade)
Amélia olha em a direção do quarto de Chica e Daniel se levanta e oferece a mão para ela dizendo:
- vem, te acompanho até lá.
E Amélia segura firme a mão dele.
Amélia abre a porta devagarinho, a mente dela ainda a traía com que tinha visto na noite anterior. Mas a cena de agora não poderia ser mais distinta, Chica está deitada de costa para a porta, e está tão encolhida que parece querer sumir. Amélia nota que os ombros dela estão chacoalhando e um choro baixinho ressoa pelo quarto, e seu coração se compadece por ela,com a voz mansa chama:
- Chica.
A cozinheira toma um susto, pois fica estática mais não se vira para a italiana, com sua voz mais grossa por conta do choro, diz ainda fitando a parede:
- o que tu quer Amélia?
- que me olhe, prego ( por favor)?
Chica respira audivelmente e começa a se virar lentamente sentando-se na cama, mas não encara Amélia, a italiana senta-se ao seu lado fitando o chão também:
- non foi tua culpa, apenas culpo aquele crapullence ( crápula)!
- não Amélia, se não tivesse feito aquela merd*... sou uma puttana, como dizes na sua língua.
Amélia segura a mão de Chica e compassiva fala:
- non é, mas anche( também) non consigo entender perché ( porque)?
As duas finalmente se encaram, nos olhos negros há arrependimento e nos azuis magoa e confusão. Chica levemente ergue a mão e coloca sobre o rosto de Amélia, que fecha os olhos sentindo a ternura do gesto, e com pesar pergunta:
- io non te satisfiz? Io sono( sou) pouco para ti Chica?
E quando abre os olhos, há tanta aflição neles que Chica se odeia, encosta a testa na dela e diz consternada:
- tu é perfeita Amélia.
- e peché?
- por isso mesmo, por que é tão perfeita, tive medo. Nenhuma mulher com tu ficaria como alguém como eu, prenda.
E com o apelido carinhoso, Amélia a abraça e derrama suas lágrimas no pescoço de Chica, e a cozinheira a aperta tão forte como se não quisesse que ela fosse embora nunca mais. Beijando Amélia onde podia diz atormentada:
- sinto muito Amélia, "pur" tudo, mas principalmente porque antes daquele porco te machucar, te magoei. Me perdoa...me perdoa.
- perdoo. Io ti voglio bene.( eu te quero bem)
Amélia se separa de Chica e delicadamente seca as lágrimas dela, acarinha aquele rosto que tanto gostava e diz pesarosa:
- io podia ter te amado Chica, ma e tropo tardi.( mas e tarde demais)
E Amélia lhe dá um beijo casto na boca, sentindo o gosto de sal e Chica pela última vez, sai deixando-a com sua dor e solidão, arcando com as consequências da sua insegurança e seu pouco amor próprio.
Fim do capítulo
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perolams
Em: 20/07/2018
Passagem triste da história, mas como diz no final, são as consequências da escolhas e inseguranças de Chica. Mãe sempre sabe das coisas né?
Resposta do autor:
Olá,
Verdade..mas foi um amadurecimento para elas!
mãe são terríveis.. . A minha dizia que praticamente lia a minha mente
Hahaha
Grande Abraço!
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Endless
Em: 14/07/2018
Eita! Foi lindo ver sentimentos tão aflorados e a compreensão de que os erros existem e são feitos para nos proporcionar o crescimento ou não. Acredito que Chica vai sobreviver, porque o coração de Amélia é grande para perdoar e sábio para saber quando o sentimento romântico acabou. Acredito, também, que elas serão grandes amigas e lutarão juntas por um futuro melhor! Agora é esperar para ver se Clarisse vai fazer parte dessa luta.
Boa sorte, autora!
P.S.: "O que não é para ser, jamais será".
Resposta do autor:
Ola,
Moça autora confesso que espero seus comentários.. neles vc sempre me emociona ;)
E que falar mais depois do q vc ja disse? Só muito obrigada :)
Grande Abraço
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