TEMPO DE DESPERTAR
CAPÍTULO 163 – Janeiro e o Que Veio com Ele
--Ai, mamãe, foi tudo tão maravilhoso... -- Clarice narrava abraçada com a almofada -- O resort, os passeios, a noite de réveillon, as amigas... -- suspirou -- minha caipirinha...
--A lambição, a dança do acasalamento... -- Leda complementou bem humorada
--Mamãe! -- endireitou-se envergonhada -- Eu falava da viagem, nem pensava nessas coisas... -- soltou a almofada
--Humpf! -- fez um bico -- E eu não nasci ontem e sei que teve lambição e acasalamento pra dar e vender nesse resort, porque se no meio do mato vocês já não têm descanso, imagino como foi a coisa no conforto de um hotel! -- gesticulou despreocupada -- Se bobear, tua curnicha até saiu do lugar certo! -- apontou
--Eu hein! -- ralhou, mas acabou rindo -- A senhora me diz cada coisa... -- olhava para a mãe
--E tua irmã, como é que tá? -- queria saber -- Essa aí é outra que deve acasalar dia e noite, noite e dia. A menos que o cabra não dê conta daquela sanha assassina!
Achou graça. -- Vai bem, graças a Deus. E agora ela parece que tá mais habituada com a cidade. -- pausou brevemente -- Também me pareceu que o relacionamento dela com Adamastor tá dando certo.
--E que continue certo, se Deus quiser! -- postou as mãos brevemente -- Eu rezo muito pra que Cecília se aquiete e seja feliz. -- olhava para a filha -- Também fico mais tranquila em saber que Ritinha e Zezé moram perto dela e são fiéis informantes da minha rede. -- comentava -- Qualquer movimento suspeito eu vou saber!
--Fiéis informantes da sua rede... -- achava graça
--Raquel finalmente se livrou daquele cigano pornô e Getúlio parece que tá tomando jeito de gente. -- continuava falando -- Se for pro bem deles, vão ficar juntos e resolver a vida também.
--Quem diria, hein? -- cruzou os braços sorridente -- A senhora fazendo gosto de Raquel com o ogro! -- brincou -- Ex ogro, quer dizer.
--Fazendo gosto, não! -- corrigiu -- Eu disse que se for pro bem deles que fiquem juntos, mas não falei que fazia gosto. -- esclareceu -- Ainda acho que sua irmã não tem tino pra escolher macho.
--Sei... -- achava graça -- "Ela não dá o braço a torcer pra admitir que agora gosta de Getúlio.” -- pensou divertida
--E você finalmente saiu da fase do chororô e das angústias e parece que tá se acertando de vez com aquela caipira doida. -- balançou a cabeça satisfeita -- Já estava na hora!
--Ai, mamãe, nem me fale! -- sorriu embevecida -- Mal posso esperar que fevereiro chegue! -- olhava para o nada -- Zinara vai ficar na cidade por um ano! -- afirmou empolgada -- Ai, que máximo!!!! -- bateu palminhas
--E quando ela chega? Que dia? -- perguntou interessada
--Depois do carnaval. -- respondeu de pronto -- Tô contando os dias nos dedos!!
--Ah, é? -- não sabia -- Então tem que arrumar a casa logo pra receber, porque um ano é muito tempo! -- gesticulou -- Nada de dormir em barraca de camping no quintal, viu, menina? -- advertiu
--Ah, mas ela não vai ficar aqui. -- olhou novamente para a mãe -- É muito tempo e ela não quer incomodar. -- contou com jeito -- Do que conheço de minha caipirinha, com certeza ela não vai mudar de opinião.
Leda se surpreendeu com a notícia. -- Mas ela vai morar aonde? -- perguntou curiosa -- Pelo menos vai ter que passar uns tempos aqui em casa pra poder achar onde ficar.
--Zinara conhece muita gente, mamãe. Procurou daqui e dali, reencontrou uma colega e arrumou um apartamento pra alugar. Vai ficar morando em São Cristóbal, bem pertinho de nós! -- sorriu animada
A idosa sentiu-se um estorvo na vida de Clarice. “Não fosse por mim, Zinara viria pra cá...” -- pensou entristecida mas tentava disfarçar -- E... quando você vai morar com ela? -- buscou ser natural
--Eu não vou, mamãe. -- respondeu gentilmente -- Zinara só vai ficar mais perto de mim, mas eu continuo aqui. -- levantou-se e beijou a testa da idosa -- Ai, deixa eu tomar um banho porque esse calor tá demais! -- seguiu para seu quarto
"Como eu atrapalho minha menina...” -- pensou de cabeça baixa -- "Se não fosse por mim, Clarice teria a mesma liberdade das irmãs pra casar, se amigar ou fazer o que bem entendesse...” -- levantou-se também e caminhou para o quarto da filha -- Você já visitou o tal asilo que Zinara frequenta? -- perguntou interessada
A paleoceanógrafa entrou no banheiro da suíte sem fechar a porta. -- Mais de uma vez, por que? -- não entendia a pergunta
--É que todo mundo fala tanto nesse asilo... fiquei curiosa. -- sentou-se na cama da filha -- É bom mesmo como dizem?
--É uma gracinha, mamãe! -- falava de dentro do banheiro -- Tudo limpinho, arrumado, cheiroso... O casal de irmãos que dirigem a casa são pessoas ótimas e os idosos são muito bem tratados! Eu adoro!
“Esse asilo bem que podia ser uma opção pra mim...” -- Leda pensou -- Tinha vontade de conhecer.
--Ah, eu nem falei, né? Zinara convidou a gente pra passar o carnaval lá em Cidade Restinga. -- contava -- Aí, se a gente fosse, já voltava pra cá junto com ela! -- movimentava-se no banheiro -- Vamos? A senhora se anima?
--É, a gente podia ir... -- considerava -- "E eu podia nem voltar...” -- pensava no que fazer
***
--Esse fim de ano foi dos bons, hein, fia? -- Cláudia brincava com a amiga -- Tá com uma carinha ótima! -- piscou para ela
--Ah, mas foi bom demais da conta, sô! -- concordou -- Ficar com minha Sahar é sempre maravilhoso! -- sorria -- Ya aghla habib... (Meu queridíssimo amor...) -- suspirou
--E depois do carnaval a senhora vai-se embora pra São Sebastião, né? -- bebeu um gole da água de coco -- Vai mesmo, mulher, você mais que merece ser feliz!
--Chukran, doktuur! (Obrigada, doutora!) -- agradeceu e bebeu um gole de sua água também -- Todos os filhos de Allah merecem a felicidade. Por que não eu? -- brincou
Zinara e Cláudia bebiam água de coco na praia. As duas estavam sentadas nos banquinhos de um quiosque.
--Eu vou sentir sua falta, -- comentava -- mas é bom saber que vai ter uma casa em São Sebastião me esperando se eu quiser fazer uns passeios por lá. -- brincou novamente -- É ano de olimpíada, e eu até posso cismar de assistir alguma coisa! -- deu-lhe um tapinha no braço
--Sabe que isso nem me passou pela cabeça? -- parou para pensar no assunto -- Acontece tanta coisa nessa minha vida de caipira que nem me lembrei disso de olimpíada... -- afirmou pensativa
--Ah, mas acontece mesmo! Nunca conheci alguém como você! -- concordou enfática -- Acho que nem Rainha Margoreth ou a cantora Bionsi têm uma vida tão da gota como tu!
Achou graça. -- Isso eu não sei, mas com certeza elas não têm o destino tão bonito quanto o meu... -- sorriu pensando em Clarice -- Ya ahla naseeb... (Meu mais belo destino...)
--Eita, mas é muito amor, viu? -- acabou com o coco -- Essa água tava tão doce!
--Ô! -- concordou com tudo
--É... Oi! Zinara? -- uma mulher abordou a astrônoma -- Tudo bem?
--Leonor?! -- levou um susto -- "Que deu nela que veio falar comigo? Nunca gostou de mim!” -- pensava -- Tudo bem e você? -- perguntou desconfiada
--Tudo ótimo! -- respondeu sorridente -- Oi! -- deu um tchauzinho para a médica
Cláudia reconheceu a jovem e se limitou a cumprimentar com a cabeça.
--Eu não sei se você sabe, mas minha irmã tá pra se mudar pra São Sebastião. -- foi logo anunciando -- Ela vai casar com aquela geofísica politizada super famosa que tem aí: -- analisava o rosto de Zinara -- Cátia Magalhães.
“Jamila e Cátia?! Smallah!” -- ficou surpresa -- "Ezzai? (Como pode?) Nem sabia que se conheciam!” -- pensava boquiaberta -- Fico feliz em saber disso. -- respondeu com sinceridade -- Inshallah (Se Deus quiser) será um casamento muito feliz!
“Não me diga que é a mesma Cátia que namorava Clarice?!” -- a médica pensava surpreendida -- "Esse mundo lésbico é um troca troca da porr*!” -- estava besta
--Já é um casamento maravilhoso, meu bem! -- Leonor afirmou toda metida -- Finalmente minha irmã encontrou alguém do nível dela. -- deu uma flexadinha na ex cunhada
--Finalmente, né? -- Cláudia se met*u na conversa -- Só assim pra ela parar de viver correndo atrás de você, Zinara! -- dirigiu-se à amiga -- Eu já não aguentava mais aquela fuleiragem de Jamila sempre me procurando pra ter notícias suas! -- olhou para Leonor -- Tô super feliz por ela, visse? Desejo tudo de bom! -- falava com cinismo -- Tomara que depois de tudo que se passou ela finalmente tenha tomado vergonha e dessa vez seja uma companheira de fato! -- sorria -- Vamos torcer pra que dessa vez tome atitudes condizentes com a idade que tem! -- cruzou os dedos -- Pensamento positivo, gente!
A jovem não gostou do que ouviu e decidiu que já era hora de ir. -- Só queria que você soubesse. -- olhou rapidamente para a caipira -- Até mais! -- foi embora
-- Macasalaama! (Até logo!) -- respondeu por educação
--Vai, bicha, some daqui! -- Cláudia resmungou de cara feia -- Eu hein, vai perturbar o diacho, peste bandida!
A professora achou graça. -- Você deu-lhe uma alfinetada tão certeira que até eu senti a dor! -- olhava para a amiga
--Claro! -- respondeu indignada -- A rapariguinha vem aqui pra te afrontar e você não diz nada! Alguém tinha que fazer alguma coisa! -- gesticulou -- Fuleiragem da porr*! -- reclamou -- Que interessa que Jamila vai casar com Cátia? Por mim, ela pode se casar até com a mulher do Tinhoso! -- continuava gesticulando -- E que vá morar nas profundas dos infernos!
--Eita, doktuur... -- continuava se divertindo com a revolta da outra -- Quem mandou mexer com quem tá quieta, né?
--E o pior de tudo é que Jamila vai morar na mesma cidade que você! -- revirou os olhos -- Não tem jeito! Aquilo lá é teu carma!
Zinara se limitou a rir. “Não adianta que ela não engole a pobre da Jamila...” -- pensava divertida -- "E eu que achava que era birra superada...”
***
Ahmed estava deitado na rede. Sentia-se cansado após uma semana inteira de trabalho pesado.
--Amô, -- Catiúcia se aproxima com o filho -- fica di oio im Ahmed Mateus qui eu vô nu armazém modi comprá uns trem qui tão fartando, num sabi? -- colocou o menino sentado na barriga do pai -- Vortu num istalá di dedu. -- garantiu
--Tá bão. -- sorriu para o filho, que lhe sorriu também -- Nóis fica aqui.
--Inté! -- reclinou-se para beijá-lo nos lábios -- Vortu num instanti! -- saiu
--Agora é nóis, hein, Mateus! -- deitou o filho a seu lado na rede -- Fica aqui quétinhu cum teu baba. -- beijou a cabeça dele -- Vamu durmi. -- queria descanso
Depois de uns poucos minutos o menino começou a se agoniar com aquela pasmaceira. --Baba! -- agitava-se na rede -- Qué bincá! -- pediu -- Ua, ua!
--Qué í pra rua, meninu? -- achou engraçado -- Ô, qui num dá pra tê sussegu... -- lamentou
--Qué bincá, baba! -- insistia -- Ua!
--Mininu novu nunca qui si aquéta. -- respirou fundo e levantou com o garoto no colo -- Simbora!
--Oba!! -- Mateus comemorou
Ahmed pegou uma bola e foi com o filho para a rua. Ninguém estava lá àquela hora por causa do sol forte, de modo que o homem caminhou um pouco mais e parou com o garoto perto de um terreno arborizado.
--Brinca na sombra, meu fio. -- recomendou e deu um chute na bola -- Corri pra ponhá.
--Eu pegu! -- saiu correndo no seu passinho de criança pequena
Ahmed continuou brincando com Mateus até que percebeu que uma bela jovem se aproximava com uma sombrinha. Parecia procurar o endereço de alguém.
“Eita, qui tem carni nova nu pedaçu...” -- pensou malicioso -- Vai ponhá, mininu! -- chutou a bola com força e o filho correu atrás -- "Agora dêxi vê o qui ela qué.” -- ajeitou-se todo e se encaminhou na direção dela -- Oi, moça. Bastardi. -- cumprimentou mesureiro -- Será qui eu pudia lhi ajudá? -- sorria
A moça olhou para ele e sorriu. -- Bastardi. -- cumprimentou -- Eu sô di São Miguel, arribei agora. Tô procurandu impregu di babá e sôbi qui tem muié aqui cum pricisão di uma. -- estendeu uma folha de papel -- Vim aqui modi mi apresentá pra dona Kedima. Ói o indereçu.
--Ah, mas nem tem pricisão di mi mostrá purque eu sei ondi qui ela mora, num sabi? -- respondeu solícito -- Si a moça quisé, possu lhi levá inté lá. -- ofereceu -- Num dá nem um minutu di caminhada.
--Baba! -- Mateus voltava correndo com a bola -- Ói! -- sorria
Recebeu a bola e sorriu para o menino. -- Queru vê ocê pegá agora! -- deu o chute mais forte que pôde -- Corri, fio! -- bateu palmas e ele foi
--Seu fio é lindin. -- elogiou -- Mais ocê divia di tê cuidadu qui eli podi si machucá correndu nessi matu. -- advertiu -- É tão novinhu, num sabi?
Ficou um pouco sem graça, mas disfarçou. -- Oxi, qui nada! Eli é ispertu qui nem o baba deli e é custumadu a andá nessis matu aí tudo. -- gesticulou -- Só há di tê mais sorti qui eu quandu fô homi feitu, purqui tô mi separandu, num sabi? -- mentiu -- Num é fácir criá mininu sozinhu... -- fez tipo de vítima -- Ô, si num é!
--Ah, coitadu! -- teve pena -- Sintu pur issu! -- lamentou também -- "Essas muié são doida! Largá um homi bunitu dessi...” -- pensou
--Mais a vida é assim, num sabi? A genti cai e si alenvanta. -- ofereceu o braço a ela -- Vem mais eu qui vô lhi levá pra casa qui ocê qué í.
--E o mininu? -- olhou na direção de Ahmed Mateus -- Vai ficá sozinhu aqui?? -- preocupou-se
--Faiz medu não, ói comu vai longi! -- olhou também -- Dá tempu di nóis í, eu vortá e eli num tê aparicidu aqui ainda.
--Intão... -- concordou e deu o braço a ele -- Tá intão. -- sorriu
***
Cátia abriu a porta do apartamento ansiosamente e deu de cara com Jamila. Ao lado dela haviam três malas grandes. Não esperava que a namorada chegasse naquele momento e absolutamente não sabia o que dizer; o coração batia forte e uma sensação de alegria tomava seu corpo por inteiro.
Quando vislumbrou o rosto da geofísica, Jamila, por sua vez, subitamente se deu conta do que estavam prestes a fazer. Sentiu vontade de chorar, de jogar-se nos braços da amada, porém se conteve. Prendeu-se naquele olhar que parecia dar uma festa ao vê-la ali, chegando inesperadamente.
--SabaaH il-kheer! (Bom dia!) -- cumprimentou meio desajeitada -- O porteiro me ajudou com as bagagens... -- afirmou sorrindo -- Trouxe o que julguei necessário e... -- não sabia o que fazer com as mãos -- Tem algumas coisas pesadas que ainda virão, mas são poucas... -- pausou brevemente -- O resto doei tudo pros pobres e... foi por isso que só agora eu vim... Tinha que cuidar direitinho de tudo, né? -- passou a mão nos cabelos -- Você disse que não precisava de nada de minha casa...
--Eu só preciso de você! -- respondeu de imediato -- Nossa! -- riu brevemente, por estar nervosa e emocionada -- Deixa eu olhar pra você! -- derramou uma lágrima -- Porque eu quero gravar pra sempre na minha mente a imagem da felicidade parada aqui, diante da minha porta! -- a voz alterava-se pela emoção -- Deixa eu olhar... -- sorria
Jamila derramou uma lágrima também e sorriu. -- Eu também quero me lembrar desse momento pra sempre... -- mantinha-se presa no olhar da amante -- Kunti fin, habibi? (Onde você esteve por toda a minha vida, querida?)
--E ainda falando desse jeito é pra me matar! -- puxou-a pela cintura e beijou-a apaixonadamente
Jamila jogou a bolsa no chão e envolveu o pescoço da loura com os braços, retribuindo o beijo com intensidade.
--Ah! -- gem*u quando o beijo se encerrou -- Eu nem sei te dizer o quanto fico feliz com você aqui, minha gostosa! -- sorria para ela
--Nem eu! -- riram juntas -- Mudei tudo por tua causa, galega. -- segurou o rosto dela -- Não me deixa me arrepender, visse?
--Não deixarei, tem minha palavra. -- beijou-a novamente -- Tudo que eu queria era isso: você em definitivo na minha vida! -- desvencilhou-se dela delicadamente -- Mas agora é preciso te deixar chegar, né? -- olhou para as bagagens da outra -- Entra, meu bem, eu carrego suas coisas pra você. -- segurou as alças de duas malas e começou a puxar
--Oxe, eu carrego também. -- pegou a bolsa que largou no chão e a outra mala que sobrava -- Afinal de contas, não te quero arriada. -- entrava na casa seguindo a loura -- Se for pra te arriar, que seja na cama e não empurrando mala. -- afirmou maliciosamente
--Ah, mas eu quero comemorar o dia todo, a noite toda, por horas e horas! -- respondeu resoluta -- E não vou me incomodar de ficar arriada depois de tanto fazer amor com você. -- piscou para a outra e fechou a porta da sala -- Vou levar as malas pro quarto e a gente já começa arrumando tudo. -- olhava para a advogada -- Alguma objeção, doutora? -- perguntou bem humorada
--Protesto! -- respondeu sensualmente -- Que se inverta a ordem dos fatores! -- soltou mala e bolsa -- Primeiro a gente comemora, -- abria lentamente os botões da blusa -- depois arruma as coisas... -- sorria
--E quem sou eu pra contestar autoridade? -- despia-se rapidamente
--Bicha descarada... -- achava graça da empolgação
--Isso e muito mais! -- empurrou a amante contra a parede e a imprensou -- Se prepara, que eu vou te dar muita canseira! -- começou a desabotoar o jeans da outra
--Pois eu quero mais é isso! -- beijou-a repetidas vezes -- Ai! Tacaalii! (Vem!) -- sentiu que lábios sedentos percorreram seu pescoço até tomarem-lhe um seio -- Ah! -- gem*u
“Preciso de mais o que?” -- pensava enquanto seguia beijando e mordendo o corpo de Jamila -- "A deusa do gozo é minha mulher!” -- puxava as calças dela para baixo -- "Aleluia!” -- invadiu-lhe o sex* com a boca faminta
--Ai, amor, isso, vem! -- fechou os olhos extasiada -- "A mulher mais sacana do mundo é toda minha!” -- pensava -- "Era tudo que eu queria...” -- derretia-se sob os toques da loura
***
Najla continuava pesquisando na internet sobre os refugiados e emocionou-se fortemente ao ver um menino de aproximadamente cinco anos, deficiente físico, no meio de outras crianças, segurando um papelão onde se podia ler em saxão: Help me! (Salve me!).
--Oh, Aba! (Oh, meu Pai!) -- seus olhos marejaram -- Eu preciso fazer alguma coisa, por favor, Aba, eu imploro, me ajude a recuperar a fazenda e a descobrir uma forma de receber essas criaturas! -- suplicava em voz alta
--Minha dona, olha o que o carteiro acabou de me entregar? -- entrava no quarto animado -- A comunidade dos descendentes de Cedro e Suriyyah sediada em Paulicéia te mandou uma encomenda... -- reparou que a mulher chorava e interrompeu o que dizia -- Ah, minha amada, chorando? -- perguntou condoído -- O que foi? -- deixou o pacote sobre a mesa
--Ai, meu negão... -- levantou-se rapidamente e abraçou-se com ele -- Essa imagem... -- apontou sem olhar para a tela do computador -- Esse menino me emocionou tanto... -- não aguentou e chorou com mais emoção -- Preciso fazer alguma coisa!
--Minha querida... -- abraçou a mulher com carinho -- Fique calma, você vai conseguir o que quer. -- falava com ternura -- Tenha fé porque vai dar tudo certo... -- deslizava as mãos pelas costas dela -- As doações pra fazenda têm ido de vento em popa. É só uma questão de tempo. -- beijou a cabeça dela -- Daqui a pouco você recupera o que é seu, consegue uma entrevista com a pessoa que Jamila indicou e quando menos esperar, seus conterrâneos estarão aqui em Guaiás, vivendo com a gente.
A ex fazendeira fechou os olhos e desejou com muita esperança que as palavras de Marco fossem promessas que a vida cumpriria.
Enquanto isso, a 10 mil quilômetros de distância, dois jovens de Suriyyah acabavam de se casar em meio aos escombros do último bombardeio das forças estrangeiras na cidade de Al-Bukamal.
--Eu não sei se deveríamos comemorar estas bodas ou nos preparar para a morte... -- Emir cochichava com sua esposa -- É bom que Yahia tenha se casado com uma moça do clã de sadikii (meu amigo) Adail, mas com a falta de perspectiva que temos, não sei até que ponto é justo deixar os jovens sonharem dessa forma, como se ainda valesse a pena viver nesse país... -- falava com amargura -- Achcur bi-tacb... (Sinto-me cansado...) -- suspirou -- Nada mais me anima...
-- Ma hatha, zogii? (O que é isso, meu marido?) -- Kira ralhou gentilmente com ele -- Desde que awlaadina (nosso filho) se foi, você deixou que a vida morresse diante de seus olhos! -- olhou na direção do neto -- Ainda temos Kalil e ele será muito feliz, creio em Allah! -- postou as mãos -- É um menino inteligente e a foto dele pedindo socorro por nós já correu o mundo! Algo de bom vai acontecer, eu sei! -- falava esperançosa -- Inshallah! (Se Deus quiser!)
--Um menino aleijado e cheio de traumas... Um refugiado em seu próprio país! -- observou com tristeza -- Que felicidade pode-se esperar para ele? Diz isso apenas por causa de uma foto na internet? -- olhou para a esposa -- Que felicidade pode-se esperar para qualquer um de nós? -- perguntou magoado -- Todos querem apenas o nosso petróleo e a geografia de Suriyyah, por isso clamam pela cabeça do presidente numa bandeja! -- estava desgostoso -- Não há diferença entre o Estado Radical, os exércitos religiosos e as tropas estrangeiras que os combatem! São todos um bando de mercenários malditos! -- falava entre dentes -- E nós, um povo composto por mendigos desgraçados! -- pausou brevemente -- As misérias e horrores que tenho visto nos últimos tempos... Abadan mosh hansaha! (Eu nunca irei esquecer!)
Kira deu um suspiro profundo e nada respondeu. Mentalmente pediu que Deus não os deixasse morrer na alma e implorou forças para o marido e o neto. A sofrida e esperançosa mulher não sabia que do Alto recebia em bênçãos de luz os fluídos revigorantes dos quais precisavam.
--Smallah! -- Adail sorria emocionado -- Awlaadii! (Minha criança!) -- mirava o bebê nos braços da filha -- Em meio ao terror que o Estado Radical nos impõe, Allah envia um anjo para tornar nossos dias mais felizes! -- sentia-se radiante -- Que maravilha, que ventura bendita! No mesmo dia, uma binti (filha) se casa com um jovem do clã de Emir e você me dá uma neta! -- sorriu para a jovem -- Meu coração explode de felicidade!
--Oh, baba... -- sorria também -- Ana mabsoutah (Estou feliz), mas ao mesmo tempo tenho muito medo! -- confessou -- O que vai ser desta menina? -- Sara perguntava preocupada -- Temos vivido como cães em nosso próprio país e os ataques das forças estrangeiras destroem tudo, menos as bases de poder dos terroristas...
--Tenha fé, bintii (minha filha), sei que nossa vida tem sido amarga, mas ana elly tool omry baqool el hob omro taweel (eu sou aquele que sempre disse que o amor vive para sempre). O amor de Allah nos salvará! -- tocou o rosto dela -- Sonhei que migraríamos para outro país e que minha neta seria uma grande mulher! -- olhou novamente para a garotinha -- Algo de bom vai acontecer, eu sei que vai!
Sara se surpreendeu ao ouvir aquilo. -- Juro que sonhei com uma viagem para um destino bem longe daqui. -- sentiu uma ponta de esperança -- Será que teremos uma chance de viver uma vida digna?
--Por que não? -- impôs uma das mãos gentilmente sobre a cabeça do bebê -- E esta menina terá um destino iluminado! Desejo que seu nome seja Safia, que significa A Escolhida! -- sentia algo especial naquela garotinha
--Se ya said (o senhor) assim decidiu, assim será. -- olhou para a filha -- Safia, ghafwan! (Safia, seja bem vinda!) -- sorria
Alegremente, Espíritos de Luz abençoavam o renascimento de Zahirah e o casamento que traria Selima de volta à vida material.
***
Amina e Leda conversavam no LivrodasFuça.
Donabord: E então? Como vão as coisas? E o menino?
Donabord: Alguma novidade?
Siriema: Infilizmenti tá tudu iguar
Siriema: Ahmed Mateus tá inté agora muitu mar naqueli hospitar no Gyn...
DonaBord: Ah, minha amiga, eu sinto tanto... Imagino que vocês estejam arrasados!
DonaBord: Especialmente Ahmed e Catiúcia
Siriema: Ô!
Siriema: Num istalá di dedu meu fio já perdeu bem uns deiz quilu, nem sei. E a muié deli tá qui é só o quimba
Siriema: Us dois tão im casa di Aisha e Janaína, mais Ahmed tá pra vortá
Siriema: Tem qui trabaiá...
DonaBord: Nós aqui continuamos rezando pelo menino! Levamos o nome dele pro centro e tudo. Também estamos orando pela família toda
Siriema: Agradicida! Nóis pricisemu é dissu
Siriema: Di reza!
DonaBord: Mas vocês estão precisando de mais alguma coisa? Se eu puder ajudar...
Siriema: Reza pur nóis, é só o qui peçu
Siriema: Num há mais o qui si possa fazê
DonaBord: Mas, desculpa perguntar, vocês não estão precisando de dinheiro?
DonaBord: Sei que essas coisas consomem e Zinara ainda não se recuperou de todo
Siriema: Nóis tem dadu nossu jeitu e Najla disenterô o dinheru da fazenda modi ajudá
Siriema: Num careci dissu di dinheru, só di reza
DonaBord: Tem minha palavra que terá minhas mais dedicadas orações!
Siriema: Eu sei e cunfiu! Já intreguei meu netu nas mão di Deus e da Virgi!
DonaBord: Vai dar tudo certo, se Deus quiser!
Siriema: Ah, vai, tenhu é fé!
DonaBord: É isso aí!
Siriema: E pensá qui o bichinhu bateu a cabeça purque caiu num buracu qui o matu tapô...
Siriema: Certas coisa quandu tem di acunticê... fazê o que?
Siriema: Agora eu vô saí daqui purque num tenhu muita dispusição, num sabi?
Siriema: Quarqué coisa, mi iscrevi no QQOV? pur favô
DonaBord: Tudo bem, minha amiga! Vai com Deus
DonaBord: E mantém a gente informada, tá?
Siriema: Podexá!
Siriema: Inté!
DonaBord: Até logo
Leda saiu do computador e foi para a sala. Clarice acabava de desligar o telefone.
--Zinara tá feito doida, mamãe. -- olhou para a idosa -- Ahmed Mateus tá de coma induzido... -- lamentou
--Amina também tá arrasada. Disse que Ahmed já perdeu uns dez quilos e que Catiúcia tá acabada. -- pausou brevemente -- Quer dizer, foi o que eu entendi daquela história da mulher tá só o quimba. -- repetia a fala da amiga
--Que coisa, né? -- cruzou os braços -- O menino brincava com o pai e sofreu esse acidente horrível... -- balançou a cabeça negativamente -- Ah, mas quando eu tiver filho vou prestar atenção em tudo! Deus me livre de passar por uma coisa dessas!
--Já tá pensando em ter filho, é? -- sentou-se no sofá -- Zinara sabe disso? -- perguntou curiosa
--Conversamos a respeito mas não chegamos a definir nada. -- passou a mão nos cabelos -- Eu sei que ela gostaria de ter uma criancinha comigo. -- sorriu e se sentou
--Mas isso vai ser como? Vão adotar ou uma das duas vai arrumar um macho pra ajudar na confecção? -- queria saber -- Olha lá, hein? Tem muito maluco por aí! -- advertiu
--Eu hein, mamãe, que é isso? -- revoltou-se com a ideia -- A gente vai adotar, nada disso de macho no meio! -- ajeitou-se no sofá -- Eu jamais aceitaria isso! Tampouco Zinara!
--Sei lá. -- fez um gesto -- É cada coisa que eu vejo...
--Quando Zinara se assentar de vez por aqui a gente vê isso com calma, mas com certeza vai ser adoção. -- explicou -- E ninguém tá com pressa, vamos fazer tudo como deve ser.
--É... -- balançou a cabeça concordando -- Eu bem queria mais uns netinhos, só que essa produtividade de vocês é muito baixa! -- afirmou desaprovando -- Adota mesmo, que isso pode empolgar suas irmãs. -- olhava para a filha -- Raquel podia ter mais um filho e Cecília também podia começar a pensar em ser mãe.
--Pois eu digo pra senhora que ela já pensa. -- contava a novidade -- E Adamastor tá empolgado com a ideia de adotar.
--São boas notícias... -- considerava -- Juntando tudo isso, é só Ahmed Mateus ficar bom que eu já posso me retirar em paz! -- pensou em voz alta
--Se retirar pra onde? -- não entendeu
--Pra onde? -- percebeu que deixou escapar o que não deveria -- Pra terra dos pés juntos, pra onde mais? -- levantou-se e foi indo para a cozinha -- Tô velha, menina, meu destino é me juntar com aquela bicha da capa preta.
--Cruz credo! -- acompanhava a mãe com o olhar -- Conversa mórbida!
--Você é muito bobinha. Tem medo de tudo. -- entrou na cozinha -- Vou comer que tô faminta!
--Mamãe anda tão esquisita... -- resmungou consigo mesma -- O que será que anda passando naquela cabecinha branca, hein? -- questionava-se
***
Zinara terminava de mostrar as conclusões do trabalho que vinha fazendo a Werneck.
--Ave Maria, mulher, que me dá até medo! -- exclamou olhando para ela -- Já não bastasse aquele relatório bombástico que aquele teu grupo internacional lançou, agora você me vem com mais essa?
--Isso é real, esse planeta se aproxima de nós e seus efeitos já se fazem sentir! -- alertou -- É o que explica esses fatos que a ciência não tem sabido prever e nem justificar! -- ajeitou-se na cadeira -- E os resultados de todas as pesquisas que todos os colegas fizeram e eu pude analisar com calma, apenas corroboram por outros caminhos o que te apresentei aqui. -- pausou brevemente -- Ana a’arfa (Eu sei), eu sinto! -- gesticulou -- Não é de hoje que falo da verticalização do eixo planetário por conta da aproximação desse planeta de órbita extremamente longa! Calculo em cerca de 10 a 20 mil anos para uma rotação completa dele em torno do sol.
--Mas e então, mulher, me diga! -- levantou-se nervosamente -- A gente faz o que? -- sentia o coração acelerar -- Com tanta poluição, guerras, misérias, doenças e corrupções nesse mundo, ainda vem aí um planeta esquisito pra desestruturar tudo! -- andava em círculos -- A gente faz o que, me diz? -- perguntou quase em desespero -- O que nos espera é a morte, seja lá pela desgraça que impere!
--Kulle muskila wa-liiha Hall. (Todo problema tem uma solução.) -- afirmou calmamente -- Todas estas coisas haviam sido previstas e anunciadas pelos mais antigos profetas. -- olhava para o amigo -- Mas nunca houve fatalismos irremediáveis. A humanidade pode mudar seu destino se assumir uma outra forma de comportamento.
--Zinara, acorda, isso não vai acontecer! -- retrucou em voz mais alta e se calou imediatamente
--Laa (Não), não tenho tanta certeza disso. -- discordou -- Quando o calo apertar mais forte, vamos ver se todo mundo vai continuar na mesma.
--Aí será tarde demais! -- retrucou fatalista
--Será mesmo? Laa acrif... (Eu não sei...) -- olhava para ele -- E aconteça o que for, a população do planeta não será dizimada! Será um novo céu, uma nova terra e um novo ser humano!
Não insistiu nas argumentações. -- E você vai ter coragem de publicar um artigo com esse conteúdo e ainda dizer que o futuro da humanidade depende da mudança de padrão mental e comportamental do povo todo?
--Eu já enviei o texto pra publicação e aguardo a resposta, mas foi um texto extremamente técnico. -- explicava -- Agora tô escrevendo o outro, que vai focar no aspecto consciencial da coisa. Quando acabar, tento publicar nem que seja num site perdido na internet.
Riu de nervoso. -- Vai decretar o fim de sua carreira, mulher! -- advertiu
--Tô disposta a pagar o preço. -- respondeu conscientemente -- Tenho orado e pedido orientação a Allah há tempos. -- levantou-se também -- Não há mais dúvidas em mim; se é que algum dia houve.
--Você é que sabe. -- queria acabar com aquela conversa -- Mas pense bem, que você tá indo pra São Sebastião e os cabra de lá não vão te dar apoio nisso. -- aproximou-se da porta e deu uma batidinha no portal -- Vou cuidar da vida. -- anunciou antes de partir -- Até mais. -- retirou-se
Zinara respirou fundo e caminhou até a janela da sala. Embora tivesse conversado com o colega sobre assuntos importantíssimos, não conseguia esquecer de sua maior preocupação no momento: seu afilhado, Ahmed Mateus.
“Oh, Aba, eu lhe suplico, protege awlaadii (minha criança). Conforte Ahmed, Catiúcia e toda usritii (minha família), para que tenham forças de modo a superar mais essa dificuldade...” -- fechou os olhos -- Rahimaka Allah, Mateus! (Deus te abençoe, Mateus!) -- sussurrou
***
--Gente, não creio! Tô passada! -- Magali estava lendo uma carta que havia acabado de receber -- Já vi que esse ano vai abalar!
--O que foi, amor? -- Lúcia perguntou curiosa -- Nossa, que carta grande! -- reparou
--Olha só o que a gente recebeu! -- mostrou o papel para a esposa
A bombeira se aproximou para ler e chocou. -- Jura??? -- acabou rindo
--Cátia vai casar, meu bem! -- afirmou achando graça -- A maior cafajeste da história desse país vai casar! -- guardou o convite no envelope -- E simplesmente com a advogada gostosona mais famosa de Terra de Santa Cruz. -- levou um tapa no braço -- Ai, amor... -- esfregou a pele dolorida -- Eu disse gostosona com todo respeito...
--Te conheço, Magali, te conheço! -- respondeu de cara feia -- Fica se assanhando aí pra você ver! Te boto de castigo! -- seguiu para a cozinha
--Não, amor, que é isso? -- correu atrás preocupada -- Foi só um comentário inocente, nada mais. -- garantiu
--Sei... -- fez um bico -- E não enrola, porque tá na hora do lanche. -- anunciou -- Vem preparar as coisas comigo. -- abriu a geladeira
--Agora! -- abriu o armário -- Vou colocar a mesa. -- pegava pratos e talheres
--Você pensa em ir nesse casamento? -- perguntou curiosa -- Data mal escolhida, logo no sábado depois do carnaval! -- comentou enquanto cortava o queijo
--Ah... -- pegou o jogo de mesa -- Por que não? Festa é sempre bom, né? -- começou a arrumar as coisas -- E de mais a mais a gente vai passar o carnaval na cidade mesmo... dá pra ir.
--Mas você nunca mais teve conversa com Cátia. -- preparava os sanduíches -- Ao que eu saiba, ficou muito chateada com ela.
--Isso já tem tempo. -- pegou o suco -- E por uma boa fofoca, eu sou capaz de qualquer coisa! -- sorriu para a esposa -- Quero ver como vai ser isso aí! -- parou para pensar -- Ih, será que elas convidaram Clarice e Zinara? -- perguntou com os olhos arregalados -- Gente, o babado dessa festa vai ser fortíssimo!!!
Acabou rindo. -- Ai, Magali, como você é safada, viu? Por mulher e fofoca faz qualquer coisa! -- colocou os sanduíches para esquentar -- Eu não tenho nada contra Cátia e também gosto de uma festa. -- olhava para a mulher -- Se quiser ir, vou sem problema nenhum.
--Então formou, porque tô mais que dentro. -- colocou a garrafa de suco na mesa e se aproximou da bombeira -- Sabe que eu adoro uma bagunça... -- beijou-a
--Masssss... -- mordeu o lábio inferior da outra -- qualquer assanhamento pro lado da tal advogada gostosona... -- segurou-a pela blusa -- e fica de castigo! -- advertiu -- Por meses a fio! -- ameaçou
--Deus que me livre! -- benzeu-se -- Nada de castigo! -- abraçou-a pela cintura -- Não posso ficar sem minha bombeira pra apagar meu fogo! -- beijou-a novamente -- Minha bombeira, que é a gostosa mais gostosa de todas! -- elogiou sensualmente
--Hum, sua doida! -- desvencilhou-se fazendo dengo -- Vai queimar os sanduíches! -- riu brevemente e virou de costas para a outra
--Comigo tudo queima! -- abraçou-a por trás e mordeu o pescoço dela
--Ui! -- gem*u e se arrepiou -- "Se queima!” -- pensou excitada
***
Mãe Agda cuidava de seu terreiro quando recebe uma visita inesperada. Mirou o homem que a procurava e afirmou mansamente: -- Teus óio são di puru sufrimentu... -- reparava nele
--Eu pricisu muitu di prosiá cum a sinhora... -- pediu humildemente -- Num guentu mais guardá pra mim o segredu mais miserávi qui um homi podi tê... -- seus olhos marejaram -- Pur favô! -- pediu mais uma vez
--Entra e te assenta aqui. -- indicou um lugar -- Se ocê pricisa falá eu tô aqui modi oví. -- sentou-se também
Ahmed fez o que lhe foi pedido e não tardou a começar a falar: -- A sinhora sabi qui meu Mateus tá di coma nu hospitar... -- controlava-se para não chorar -- minha muié tá deprimida, minha famia toda tá cunsumida pur causu dissu... -- passou a mão nos olhos -- Minha camma Najla tirô inté um tantu du dinheru da fazenda modi ajudá purque ninguém tava dandu conta di pagá us trem... -- não conseguiu continuar e soluçou
Agda apenas ouvia em silêncio.
--Zinara dissi qui vem nessa sexta e ela também deu o tantinhu qui pudia dá... -- continuava chorando -- Catiúcia tá inté agora na casa di Aisha e Janaína... -- soluçava -- E pensá qui nu passadu nóis falemu tanta bestagi sobri elas...
--Famia é issu, meu fio. É uma ligação di amô, di amizadi. -- respondeu com ternura
--Eu mi sintu tão mar... -- chorava mais -- Já pensei inté im mi matá mais nem pra issu tivi coragi...
--E quem dissi qui si matá é corajosu? -- olhava para ele -- É a maió bestagi qui si possa fazê!
--Eu num guentu mais guardá segredu! -- tentava se conter em seu choro -- Ninguém sabi, mais essa disgracêra toda é curpa minha! -- confessou com muita dor -- Meu fio tá morrendu e minha famia toda sofri pur causa deu! -- falou mais alto -- Eu sempri fiz tudu erradu, sempri fui um homi porcu, nojentu... -- sentia raiva de si mesmo -- Pur causu di um rabu di saia larguei meu mininu sozinhu e óia o qui acunticeu... -- chorava com muita dor -- Óia o qui acunticeu...
Agda deu um suspiro profundo e permaneceu calada.
--A muié qui eu fui atráis foi-si imbora, eu num fiz nada mais ela, só qui meu fio... -- deu um soco no peito -- meu fio vai morrê e a curpa dissu é toda minha... -- soluçava
--Ele não vai morrer, akhuuya (meu irmão)... -- Agda respondeu convictamente -- Nós e os médicos de Gyn estamos cuidando dele.
Ahmed emocionou-se ainda mais e se pôs de joelhos. -- Youssef?? -- buscava a resposta nos olhos de Agda -- Eu sei qui é ocê! -- postou as mãos em súplica -- Eu sei qui ocê curava as pessoa quandu era vivu, o povu todu fala isso, eu me alembru! -- abaixou a cabeça e pôs as mãos no peito -- Ocê tem miricimentu pra si dirigí a Deus, intão diz, eu ti suplicu, diz qui eu dô a minha vida pela du meu mininu! -- falava com verdade -- Diz qui sô um homi disgraçadu, mais qui meu fio num mereci morrê pur causa deu! -- estava desesperado
--Deus não quer a morte do pecador, só do pecado. -- citou uma passagem bíblica -- Se quer dar a vida pela de Ahmed Mateus, faça de outra forma. -- aconselhou -- Seja um homem melhor e isso bastará! -- afirmou com gentil firmeza -- Macleech (Não se preocupe), seu filho ficará bem, Deus não está fazendo barganha com você. -- levantou o rosto dele tocando-lhe o queixo e em seguida segurou-lhe as mãos -- Mas já está na hora de amadurecer! -- olhava nos olhos -- Você não está vivo à toa, akhuuya (meu irmão), e já perdeu chances demais! É tempo de despertar!
Ahmed sentiu o corpo arrepiar com aquelas palavras.
--Você tem muito trabalho pela frente. Dah mistagcil! (É urgente!) -- anunciou com seriedade -- Mãe Agda e este centro esperam por você e por tudo que será capaz de fazer. -- percebia que suas palavras mexiam com o outro homem -- Venha e eu te guiarei em tudo que precisar. -- prometeu -- O sofrimento te tocou e você finalmente saiu da capa do egoísmo. Agora é hora de cumprir o que lhe cabe!
O coração batia acelerado ao mesmo tempo em que sentia o espírito progressivamente envolto por uma estranha paz. Ahmed nunca havia se sentido daquele jeito e imediatamente desejou que por todo sempre pudesse experimentar algo tão nobre. -- Eu prometu a ocê, -- falava com voz embargada de emoção -- dô minha palavra abaixu di Deus e di nossus ancestrá, qui di hoji im dianti Ahmed Raed vai sê um homi diferenti pur dimais da conta! -- estava sendo honesto -- Eu vô assumí o meu erru e vô fazê di tudu modi cunsertá eli!
--Confio em você! Eu confio! -- soltou as mãos do irmão -- Salaam! (Paz!) -- despediu-se com um sorriso -- Smalla'Alik! (Deus proteja você!)
Ahmed encostou a testa no chão e agradeceu por aquele momento.
CAPÍTULO 164 – Fofocas de Carnaval
Clarice e Leda passavam o feriado de carnaval em Cidade Restinga com Zinara. Viajaram na sexta à noite e foram recebidas com um jantar na casa da morena, contando com a companhia de Ritinha, Zezé, Cecília e Adamastor. O grupo conversou até tarde e todos se despediram por volta da meia noite.
Era madrugada e as amantes estavam abraçadas e deitadas na cama.
--Mamãe caiu no sono tão logo se deitou. -- Clarice comentava -- Ela nem me chamou no canto pra dar a conhecida recomendação de morder a fronha pra não gem*r alto! -- as duas riram
--Ya Leda teve um dia cheio. -- acariciava as costas da paleoceanógrafa -- Arrumou mala, viajou, fez uma social até tarde... a pobrezinha deve tá cansada. -- beijou a cabeça da mulher
--Ao contrário de uma certa caipira incansável... -- levantou a cabeça e beijou-a nos lábios -- Não tem ideia de como contei os dias nos dedos esperando esse carnaval chegar. -- sorria -- Sentiu minha falta? -- perguntou fazendo dengo
--Mahma tekoon baeed any, le alby areeb… (Não importa o quão longe você esteja, estará perto do meu coração...) -- sussurrou -- Ya omry el gai wel hader... (Meu presente, meu futuro...) -- beijou-a com ternura
--Ai... -- gem*u embevecida
--Al Sitol Nisaa! (A Rainha das Mulheres!) -- beijou-a novamente
--Ai, Zinara, pára... -- ralhou manhosa -- Você é toda cheia de regras pra não fazer amor quando mamãe estiver perto, mas olha o que fica me falando... -- mordeu-lhe o queixo -- Caipira safada!
--Uai! -- acariciou o rosto dela -- Você que fica me provocando! -- fingiu inocência -- Tava quietinha deitada e vem você só... -- beijou-a -- Me deixa toda querendo... bousa ala shafayef (beijo nos lábios)!
--Como se você não vivesse querendo a minha bousa! -- deitou novamente a cabeça no ombro da namorada
--Uai?! -- não entendeu a frase
--Vamos falar de coisas mais inocentes, como por exemplo... a notícia maravilhosa que você me deu no início desse mês. -- mudava de assunto -- Você não sabe quanta gente rezava por seu sobrinho em São Sebastião! Graças a Deus nossas preces foram atendidas!
--Também tinha um grupo bom aqui em Cidade Restinga e eu só tenho a agradecer a todo mundo por isso! -- respondeu satisfeita -- Lembro que quando maama me disse que Ahmed Mateus já tava com Catiúcia na casa de Aisha e Janaína, eu quase me danei de alegria! -- contava -- Foi tudo tão rápido que parece até mentira! -- riu brevemente -- Ave Maria, tamintanii (que alívio)!
--Fiquei muito feliz, meu amor! -- afirmou com sinceridade -- Mesmo quando o menino ainda não tinha recebido alta e você voltou da roça bem impressionada com Ahmed, eu já tava achando o máximo a mudança que tinha se passado com seu irmão. -- comentava -- E fiquei feliz em saber disso!
--Foi incrível, Sahar! -- pensava no irmão -- Ahmed assumiu a responsabilidade dele no que aconteceu com o menino e mudou de postura de uma forma surpreendente! -- lembrava-se dos acontecimentos -- E agora já está até trabalhando no centro de mãe Agda! -- pausou brevemente -- Mesh ma’a ءool! (Inacreditável!)
--Há males que vêm pra bem. -- acariciava o braço da morena -- Acho que aquele Ahmed que vivia louco atrás de mulheres finalmente amadureceu.
--Inshallah! (Se Deus quiser!) -- desejou -- Já era tempo! -- concordava -- Interessante foi que o exemplo dele de assumir o erro, fez com que Cid assumisse que traiu Penha com uma forasteira que apareceu por lá.
--Gente! -- levou um susto e olhou para Zinara -- Você não tinha me contado isso! -- observou -- Só falou de uma confusão entre ele e a esposa.
--Eu não tinha entrado em detalhe, mas a porca torceu o rab*, Sahar! -- revirou os olhos -- Cid chorou, Penha gritou e chorou, Dora chorou e gritou, Nagibe ficou desesperado e mexia a boca sem sair som... sorte que Georgina saiu levando a criançada toda pra brincar lá fora.
--E seus pais? -- ficou curiosa -- Que fizeram? -- sentou-se sobre a namorada
--Falaram foi muito! -- respondeu enfática -- E começaram a bater nele, os dois juntos! -- complementou -- Maama de chinelo e baba de cinta.
--Nossa, mas e aí? -- queria saber -- Seu irmão até hoje ainda não tá cem por cento por causa do acidente que sofreu. -- lembrava-se do ocorrido -- E uma pessoa dessas levando surra?
--Não chegou a ser uma surra braba porque me meti no meio, e camma Najla também, e daí conseguimos acalmar os ânimos. -- contava -- Antes disso, quando Ahmed confessou seu erro, foi um fuzuê do mesmo tipo, com a diferença que Catiúcia não tava lá pra chorar e gritar. -- narrou os detalhes que não havia dito por telefone -- Aí me meti na confusão também e salvei a pele dele. -- sentou-se também e abraçou a mulher pela cintura -- camma Najla tava na casa de ya Marco na ocasião, então arrisquei minha vida sozinha. -- brincou -- Ahmed e Cid me devem uma, viu? -- acabou achando graça -- Usritii (Minha família) é doida! -- riu
--Tô passada com isso! -- não sabia o que dizer -- E você conseguiu convencer seus pais numa boa? Quer dizer, foi muito difícil aplacar aquela fúria? -- envolveu o pescoço da astrônoma com os braços
--Digamos que corri um sério risco de não estar aqui agora... -- brincou e beijou-a rapidamente -- Aamal aeh? (O que eu deveria fazer?) Tenho que zelar pela paz no seio de usritii (minha família).
Clarice continuava pasma com aquilo tudo. -- Eu sei que Ahmed e Catiúcia tão bem, mas e quanto a Cid e Penha? -- mantinha-se curiosa -- Como ficaram depois dessa?
--Quando eu saí da roça os dois tavam num clima péssimo! Ela pegou as coisas dele, jogou no meio da rua, foi aquela coisa! -- narrava -- Maama e baba não quiseram recebê-lo e Dora proibiu Nagibe de abrir as portas pra akhuuya (meu irmão). No final, ele ficou na casa de Ahmed.
--Gente, eu imagino a confusão que foi isso! -- pensava em voz alta -- "E a gritaria! Esse povo de Cedro é tão passional...” -- não verbalizou estes pensamentos
--Mas, como as coisas mudam, -- continuava falando -- quando Ahmed Mateus levou alta, sabe Deus o que passou pela cabeça de Penha, que ela decidiu perdoar a traição. -- balançou a cabeça positivamente -- Então Cid voltou pra casa, mas tá de castigo. E não me pergunte no que consiste o castigo porque não sei e nem quero saber. -- acabou rindo -- Cenas de novela!
--E depois de toda essa confusão, seu Raed não vai dar uma festa com os dissidentes do clube Cedro-Suriyyah? -- estranhava não haver comemorações -- Afinal de contas, tudo terminou muito bem!
--E quem disse que não vai ter festa? -- piscou para a outra -- Sempre tem! Dayman! (Sempre!) -- sorria -- Apesar de todo dinheiro que se gastou, baba disse que faria uma festinha simples pra comemorar a vida, no que tá mais que certo! -- concordava com ele -- Vai ser exatamente amanhã. Maama deve ter dito pra ya Leda.
--Você não quis ir...? -- beijou-a languidamente
--Hum, não podia... -- mordeu-lhe o lábio inferior bem de leve -- Tinha que ficar e me preparar pra receber al Sitol Nisaa (a Rainha das Mulheres) e a maama dela! -- beijou-a -- E tinha que cuidar da vida porque vou me mudar pra ficar perto dela... -- abraçou-a com mais força e a beijou com mais paixão
--Pára, safada... -- reclamou dengosamente -- Daqui a pouco vai querer tirar minha camisola... -- deu-lhe um tapinha no braço
--Howa dh elli ana batmanah... (Isso é o que estou desejando...) -- respondeu sussurrando --Mas tô lutando pra resistir a essa tentação...
--Tem certeza de que quer continuar lutando...? -- perguntou provocante
--Ah, Sahar, não provoca a caipira! -- falava com os olhos cheios de desejo
--Ou então você vai fazer o que? -- puxou uma alça da camisola para baixo -- Hein? -- fingia inocência
--Tacaalii! (Vem!) -- puxou-a de encontro a si e deitou-se sobre ela beijando-a com desejo -- Sahar...
--Ai, amor, vem, vem... -- tentava tirar a blusa da outra
--Morde a fronha com força que eu não quero escutar nada!! -- Leda gritou do outro quarto -- Olha essa lambição aí!
Zinara e Clarice levaram um susto e interromperam o que faziam. Acabaram rindo com a situação.
--Não tem jeito... -- sorria para a amante -- Ya Leda tá sempre ligada, mesmo quando cansa...
--Essa minha velhinha... -- revirou os olhos bem humorada
***
No auge de uma crise política que a televisão cultivava dia a dia, boa parte do povo de Terra de Santa Cruz esquecia do fuzuê assistindo ao desfile dos sambas de escola de São Sebastião.
--Ai, meu Pai, olha lá, olha lá, Maria Betsaida, minha rainhaaaaa!!!!!!!!!! AHAHAH!!! -- Aisha tietava inquieta -- AHAHAHAHAHAH!!!! -- gritou novamente
--Esse desfile tá muito massa, amor! -- a esposa comentava animada -- Olha como a escola tá linda! -- sorria -- Vai lá, Betsaida!!! -- gritou -- Uhu!!
--Gente, esse desfile tá têúdêô: TU-DÔ! -- batia palmas -- Tomara que ganhe, tomara que ganhe!! -- desejava
--Ah, mas já ganhou! Eu sei! -- Janaína afirmou convicta -- E o bando de facista radical vai ter engolir mais essa! -- deu um soco na mão -- Tem sapinha reinando na avenida!!
--Amor, me diz se esse desfile não tá o máximo? -- Lúcia perguntou para Magali -- Betsaida não é garotona, não é gostosona, mas tem moral pra levantar a avenida mais que qualquer musa nua que possa aparecer por aí! -- gesticulou -- Rainhaaa!!! -- gritou
Achava graça da tietagem. -- Já pensou se a Goiabeira ganhar o carnaval com esse enredo? -- analisava a situação -- Trazendo umbanda e uma cantora sabidamente lésbica no mesmo pacote? -- achava graça -- Ai, mas nesses tempos de facismo político e religioso eu vou rir muito!! -- Magali comemorava
--Na tela da TV no meio dessa gente, Goiaba vai ganhar, se sente! -- Cátia sambava e cantava na sala -- Enquanto umas maluca gasta enormemente, a deusa não passou, nem pente!! -- rebol*va -- Tum, Tum, Tum, Tum! -- imitava a bateria
Jamila se divertia rindo. -- Mulher, que música é essa? -- achava graça -- E eu que nem sabia que você sambava, visse?
--Ah, meu amor, eu nunca me liguei em samba, mas sabendo que a minha deusa musical é homenageada a coisa muda! -- respondeu empolgada -- Betsaidaaa!!! -- gritou -- Detona, Goiabeira!!! -- torcia -- Detona!!!
E a advogada só fazia rir.
--Essa escola tá um escândalo! -- Fred comentava com seu marido -- Tudo lindo, tudo perfeito, até do samba eu tô gostando!
--Eu acho que eles levam, viu, fi? -- Gilson olhou para o amado -- Olha só como que o povo no carnavódromo tá embalado! -- reparou -- É bonito de ver!
--Só acho que ela podia ter passado um gomex nos cabelinhos! -- comentou reparando -- Toda musa, emocionando na avenida e com aquele eterno look arrepiado? -- reclamou afetado -- Tudo bem que em diva tudo se perdoa, mas convenhamos: uma penteada na juba de vez em quando não faz mal a ninguém!
Gilson achou graça e respondeu: -- Mas aí não seria ela, amor! Betsaida quebra essa mesmice exatamente por isso: ela é o que é, não importa o que desejam que ela seja!
--A escola tá tão linda, olha que maravilha!! -- Clarice comentava animada -- Nunca torci pela Goiabeira, mas nesse ano não dá pra negar que eles estão demais!! -- olhou para Zinara -- Né, amor?
--É, aywah (sim) ... -- respondeu sem animação alguma -- "Eu acho essas escolas tudo parecidas...” -- pensava intrigada
--Tá linda mesmo! Fazia tempo que a Goiabeira não vinha com um desfile assim! -- Leda comentou admirada -- Tomara que ganhem porque tão merecendo!
--A Goiabeira vai ganhar, mamãe, eu sei! -- Clarice respondeu de pronto -- Betsaida tá linda, olha só a luz que irradia do rosto dela! -- olhou novamente para a namorada -- Né, meu bem?
-- É, aywah (sim)... -- respondeu sem ênfase -- "Mas ela não tá com a mesma cara de sempre, uai?” -- pensava sem entender
--Betsaidaaaa!!!!!!!!! -- a paleoceanógrafa gritou de repente -- Que emoção, que emoção!!! -- seus olhos marejaram -- Dá até vontade de chorar!
--Tá linda, linda, linda mesmo! -- Leda concordou -- Mas daí a chorar... não é pra tanto! -- gesticulou divertida
--Não é uma emoção absurda, amor? -- olhou para Zinara -- Você não acha, você não sente?
--É, aywah (sim)... -- não sabia o que dizer -- "E por que será que eu não sinto é nada?”
--O mestre sala e a porta bandeira tão dando um show à parte! -- Clarice destacou -- Isso é arte, expressão cultural, história, criatividade! -- gesticulava -- Não à toa chamam de maior espetáculo do planeta Água!
“Vou morrer sem entender porque o povo de Terra de Santa Cruz gosta tanto desses trem de samba de escola...” -- continuava matutando -- "Por mim, se acabasse eu nem sentia falta!”
--E a madrinha da bateria, gente, isso tá perfeito!! -- quase pulava -- Olha, mamãe, olha, amor!
--Hum... -- reparou brevemente -- “Nunca entendi porque bateria tem madrinha... E sempre com a curnicha quase de fora!” -- a astrônoma coçou a cabeça pensativa
A idosa examinou o rosto da caipira e perguntou divertida: -- Você não é acostumada a ver desfile, não, né, menina?
--Uai... -- não sabia o que dizer -- É que eu não entendo de samba de escola... wana amil eh? (fazer o que?) -- ficou sem graça -- "E tampouco suporto esses trem!” -- pensou com vergonha de falar
--Deixa ela, mamãe, Zinara não tem hábito de ver, mas com certeza o desfile da Goiabeira tá emocionando ela do mesmo jeito que me toca... -- fungou -- Deixa eu pegar um lenço porque tá demais! -- abriu a bolsa -- Betsaidaaa!!! -- gritou de novo -- Ai, coração, aguenta!
--Ah, é, Zinara tá numa emoção que só abunda... -- Leda resmungou para si mesma, zombando
E de repente, uma gritaria escandalosa se fez ouvir pelo prédio: -- AHAHAHAH!!!!!!!!! QUEIMA!!!!!!! SOLTA AS SETE PRAGAS!! -- a voz da síndica da astrônoma se destacava -- Samba do Bicho Ruim, enredo da perdição!!! -- parecia louca -- Goiabeira podre, cheia de bicho, bicha e mulher macho! Repreende, meu Pai, lambe com a língua de fogo!
--Cruzes, quem é essa que tá gritando? -- Leda perguntou intrigada
--A síndica... -- Zinara respondeu com um suspiro de tédio -- Dah mumill... (Isso é um saco...)
--Ela não é tão religiosa, por que tá vendo o desfile? -- Clarice ficou revoltada -- Devia estar em algum retiro fazendo alguma coisa útil!
--Ya Julieta não é do tipo de fazer coisa útil, Sahar...
--Meu Rabi humilha o Bicho Ruim!!! Humilha!!! -- continuava gritando -- Vem comigo, povo santo, vamos repreender pra essa Goiabeira podre ser arrancada pela raiz!! -- convocava ninguém -- Vai perder, vai ser rebaixada, cala-te, oh, samba do Mal! Desafio a quem contigo celebrar vitória!!
--GOIABEIRAAA!!! BETSAIDAAA!!! -- Zinara começou a gritar do nada -- VAI GANHAR OS TREM TUDO!! AHAHAHAH!!! -- levantou-se pulando -- GANHA OS TREM DO CARNAVAL!!! -- torcia sem entender de nada -- AIAIAIAIAI!!!
--Eu não disse, mamãe? -- a professora sorria emocionada para a idosa -- Eu não disse que ela tava tão tocada e emocionada quanto eu? É que Zinara se controla muito, mas agora não conseguiu mais segurar e explodiu assim, de repente!
--Ah, é... De repente, nem se sabe como... -- a idosa respondeu totalmente descrente -- "Essa menina é tão bobinha, não vê um palmo diante do nariz. Não sei a quem puxou...” -- pensava
E a caipira cantava errado, torcia alto e sambava sem noção para contrariar a síndica.
***
Nas cinzas do carnaval, Raquel e Getúlio faziam amor como nunca haviam feito até então. Estavam verdadeiramente dispostos a recomeçar e se entregavam de corpo e alma a um relacionamento que já começava lhes fazendo um enorme bem. Deodoro dormia tranquilo em outro quarto, sem saber que seus pais reatavam.
Naquele exato momento, preparavam-se as condições para o nascimento de Farida através daquele casal.
Bem longe dali, Nagibe e Dora se reconciliavam na cama após o fim das birras da mulher, recentemente desconfiada que o marido a tivesse enganado como Cid fez com Penha. Tampouco os dois sabiam que seriam os futuros pais de Chede.
Na Capital, uma mulher recebia com tristeza o resultado de um exame. “Não acredito! Dois meses de gravidez...” -- pensava decepcionada -- "É por isso que a menstruação tá essa loucura...” -- passou a mão nos cabelos -- "Como posso ter engravidado? Logo eu que tomo tanto cuidado?” -- não se conformava -- "E agora? Não tem espaço pra criança na minha vida!” -- andava de um lado a outro sem destino certo -- "Que azar, que acaso maldito!” -- não sabia o que fazer -- "Tenho medo de abortar. Fico pensando naquela colega que foi fazer isso e morreu...” -- deu um suspiro profundo -- "E não seria certo, né? Afinal de contas tem uma vida aqui dentro...” -- olhou para o próprio ventre
Espíritos iluminados inspiravam àquela mulher para que deixasse Sanya renascer. Enquanto isso, Ibrahim e Adel, outrora seu esposo e filho, preparavam-se para nascer na cidade de Arapiçava, há alguns quilômetros de Cidade Restinga.
Ciente de todas estas coisas, Khaled conversava com o irmão na pátria espiritual. Falavam a língua de Cedro.
--Me explica, akhuuya (meu irmão), sa'ban ‘alay... (é difícil para mim...), não entendo. -- olhava para Youssef -- Da última vez que visitamos a colônia espiritual de Zahirah, ela ainda se preparava para voltar à carne e agora que finalmente voltou, os outros já estão prontos para renascer também. -- achava estranho -- Por que com ela o processo de preparação pareceu demorar mais? -- queria compreender -- E como giddu Raja ainda vai nascer antes da gidda? Ezzai? (Como pode?) Ela começou a se preparar antes, segundo as notícias que recebemos!
--Zahirah e gidda Selima são espíritos de muita luz, irradiando um campo energético muito forte. A chamada aura delas tem metros de extensão. -- explicava calmamente -- Leva-se mais tempo para reduzir tamanha força a formas tão reduzidas quanto as que um pequeno embrião necessita. Por isso o processo com elas é mais demorado. -- olhava para Khaled -- Os Instrutores do Alto dizem que para o Rabi nascer no planeta Água, consumiram-se séculos nesta preparação porque a aura dele tem uma extensão tão grande quanto a de todo sistema solar. -- construía imagens no ar para facilitar o entendimento do outro
--Smallah! -- exclamou surpreendido com o que aprendia
--Todo nascimento é uma dádiva bendita que mobiliza um grande número de irmãos envolvidos para que tudo dê certo. Donde se conclui que ninguém nasce por acaso! -- sorria -- Haljamaal mish maa’ool! (Essa beleza é inacreditável!) -- exclamou -- E é maravilhoso ver que muitos de ursitina (nossa família) retornam à vida na matéria praticamente juntos!
Khaled abaixou a cabeça. -- E eu aqui adiando o que já havia decidido, tudo por medo de voltar... Oh, a’akli a’aar... (Oh, minha alma se envergonha...)
--Laa... (Não...) -- fez com que levantasse a cabeça -- Não há motivos para vergonha. -- agia e falava delicadamente -- Hassan será seu baba, ommak (sua mãe) será uma mulher muito amorosa e nisto só existe motivo de felicidade! -- tentava deixá-lo feliz -- Você voltará no momento certo, no seu momento!
--Não sei se conseguirei me sair bem... -- sentia-se inseguro -- Como vai ser? -- abraçou-se consigo mesmo -- Ya Gerard, doktuur Viegas... será que saberei olhar para cada um deles e dizer: akhuuya (meu irmão)?
--Vocês saberão consertar os erros do passado. -- falava com confiança -- Os três! Tendo Hassan e sua amada zoga (esposa) para criá-los no bem!
As palavras de Youssef trouxeram esperança ao coração do sofrido Khaled.
***
Zinara e Clarice rodavam desesperadas por Cidade Restinga à procura de Leda. Estavam no carro de Werneck, o qual dirigia angustiado. Em outro canto da cidade, Cecília e Adamastor procuravam sem sucesso.
--Mas me conta como que essa dona sumiu sem ninguém ver? -- Werneck perguntava estupefato -- Como pode isso, gente?
--Foi tudo muito rápido, não sei nem ordenar as ideias. -- Clarice respondeu olhando para as ruas -- Zinara foi comprar coisas pra fazer um lanche, eu fui lavar o cabelo e quando saí do banheiro, cadê mamãe? -- relembrava do ocorrido -- Desapareceu!
--Oxe! -- o homem resmungou franzindo o cenho
--E eu ainda peguei uma fila enorme no mercadinho... -- a astrônoma lamentava -- Quando cheguei encontrei Sahar circulando sem rumo certo na portaria do prédio.
--Eu rodei aquele prédio inteiro e nada! Fui pra rua, andei até a esquina, voltei... -- passou a mão nos cabelos -- Ah, mamãe, onde a senhora se met*u? -- perguntava-se aflita
Clarice estava sentada no banco do carona e Zinara ia atrás. A morena já havia ligado para todos os amigos e conhecidos em busca de alguma notícia.
--Ela saiu de mão vazia ou levou alguma coisa? -- o professor continuava perguntando
--Levou todos os trem que trouxe pra cá na viagem. E vou te contar, era um malão! -- Zinara respondeu prestando atenção na rua -- Ya Leda já tava pensando em ir embora, não sabe? Por isso que trouxe aquela mala grande e foi tão ligeira apesar disso... -- concluía -- Quando viu a oportunidade, juntou sua trouxa e foi! Só não sei porque... -- pausou brevemente -- Ya wail... (Que pena...)
De repente, algumas lembranças recentes vieram à mente da paleoceanógrafa.
“--São boas notícias... -- Leda considerava -- Juntando tudo isso, é só Ahmed Mateus ficar bom que eu já posso me retirar em paz! -- pensou em voz alta
--Se retirar pra onde? -- não entendeu
--Pra onde? -- percebeu que deixou escapar o que não deveria -- Pra terra dos pés juntos, pra onde mais? -- levantou-se e foi indo para a cozinha -- Tô velha, menina, meu destino é me juntar com aquela bicha da capa preta.”
--Hum... -- Clarice balançava a cabeça pensativa
“--Você já visitou o tal asilo que Zinara frequenta? -- Leda perguntou interessada
A paleoceanógrafa entrou no banheiro da suíte sem fechar a porta. -- Mais de uma vez, por que? -- não entendia a pergunta
--É que todo mundo fala tanto nesse asilo... fiquei curiosa. -- sentou-se na cama da filha -- É bom mesmo como dizem?”
--Werneck, dá meia volta! -- ordenou subitamente -- Já sei pra onde mamãe foi! -- deduziu tudo
--Uai?! -- a morena se surpreendeu -- E pra onde? -- queria saber
Olhou para trás e respondeu de pronto: -- Rua Caminho da Fé, número 25. -- pôs a mão no ombro de Werneck e olhou para ele -- Sabe onde é? Bairro Tempo Bom?
--Se não souber a gente descobre. -- guiou o carro para fazer o retorno -- Quero dona Leda dormindo em casa hoje! -- afirmou decidido
Zinara tinha pontos de interrogação na cabeça. “Ya Leda foi pro asilo de Paula e ela não me fala nada?? Mesmo sabendo que a gente tá feito doida procurando?” -- questionava-se incrédula -- "E por que ya Leda teria ido pra lá?” -- não entendia -- "Não consigo imaginá-la em asilo...”
***
--Francamente, Paula, eu não esperava isso de você, não, viu, fi? -- Zinara reclamava de cara feia enquanto seguiam pelo corredor do asilo -- Sabendo que a gente tava que nem lançadeira de máquina procurando por ya Leda e nem pra me dizer que ela veio pra cá! -- olhou rapidamente para a outra -- Karaahiyya! (Que ódio!)
--Eu também não esperava por isso, tá, Paula? -- Clarice reclamou da mesma forma -- Prepare-se pra ouvir quando Cecília chegar!
--Meninas, não briguem comigo, tentem me entender. -- justificava-se -- Dona Leda me pediu pra prometer que eu não contaria nada...
--Humpf! -- Werneck fez um bico -- Zinara se muda pra São Sebastião depois de amanhã, como que ia viajar sem dona Leda? -- reclamava também -- Fuleiragem!
Paula não respondeu e parou de andar apontando para uma pessoa sentada em um banquinho no quintal. -- Ela tá ali. -- olhou para os demais -- Fiz o que achei ser o meu papel. -- pausou brevemente -- Agora cabe a vocês conversarem com ela pra entender o porquê de tudo isso. -- fez um gesto com a cabeça -- Fiquem à vontade. Zinara já é da casa e conhece tudo aqui, mas se precisarem de alguma coisa é só chamar. -- retirou-se
--Eu acho melhor deixar vocês a sós, visse? -- Werneck decidiu -- Afinal de contas, dona Leda mal me conhece... -- considerou -- Vou esperar ali. -- indicou um local onde um idoso descansava -- Puxar uma conversa com aquele velhinho. Ele lembra meu paínho, não sabe? -- sorriu e se afastou
--Se quiser conversar com sua maama em particular, Sahar... -- Zinara começou a falar
--Queria que viesse comigo, amor. -- pediu olhando para ela -- Por favor...
Sorriu ternamente e segurou a mão da amada. -- Ana laka, ya habibi... (Eu estou aqui para você, querida...) -- olhou na direção da idosa -- Vamos levar nossa velhinha de volta pra casa.
--Vamos. -- seguiram na direção de Leda
***
--Eu não quero voltar! -- Leda afirmou resoluta -- Já me decidi e é isso. -- olhava para as duas mulheres -- Vocês duas vão pra São Sebastião e eu fico aqui.
--Mas, mamãe, que loucura é essa?! -- Clarice não se conformava -- Eu nunca tratei mal a senhora, nunca pensei em lhe jogar em asilo, como pode ter cismado com essa ideia de vir morar aqui?! -- queria entender -- Por que decidiu isso assim, do nada?
--E quem disse que foi do nada? -- retrucou -- Venho cuidando de achar um canto pra ficar não é de hoje! -- gesticulou -- E esse aqui foi o único lugar com que eu simpatizei. -- olhou ao redor -- É limpo, bem tratado e o pessoal é simpático. -- pausou brevemente -- Embora a velharia daqui seja muito bola murcha, diga-se de passagem... A maioria já se danou toda e não aguenta uma gata pelo rab*! -- comentou
Zinara achou graça e nada respondeu. Apenas ouvia o diálogo entre mãe e filha.
--Então... quando a senhora sumia sem mais sem menos era procurando um asilo pra ficar? -- concluiu -- Era isso?
--Era isso... -- olhava nos olhos da filha -- E agora me decidi e não vou voltar atrás. De hoje em diante meu novo lar é esse aqui. -- afirmou em tom de despedida
--Não! -- Clarice respondeu quase chorando -- Eu não aceito, eu não vou deixar a senhora aqui! -- não se conformava -- Pode ser um bom asilo mas o lugar da senhora é lá em casa, comigo! Não é aqui!
--Ô, menina, deixe de ser teimosa! -- levantou-se -- Vá cuidar de sua vida que é o melhor que você faz! -- ficou de costas para as duas -- Já arrumaram tudo pra viajar?
--Sem a senhora eu não vou! -- cruzou os braços revoltada -- Nem pensar!
Zinara concordou com a namorada e balançou a cabeça negativamente. Também não pretendia partir sem a idosa.
--Ora essa, mas que diacho!! -- virou-se de frente para as duas -- Que bobeira, hein? -- pôs as mãos na cintura -- Tá tudo bem comigo e vocês aí procurando chifre em cabeça de égua! -- protestou -- Cecília não mora nessa cidade? E não tem Zezé, não tem Ritinha? -- gesticulou -- Eu não vou ficar num quarto escuro mascando a própria língua e nem me abaixando pra cuspir, não, gente! -- fazia cara feia -- Vão cuidar da vida e me deixem aqui! -- enxotou as duas -- Aquela casa em São Sebastião é grande o suficiente inclusive pras crianças que vocês quiserem adotar!
--Já disse que sem a senhora eu não vou! -- levantou-se também -- E não tem discussão! -- afirmou resoluta
--MAS EU NÃO VOU VOLTAR! -- respondeu em voz mais alta e se calou -- Não insista! -- afastou-se um pouco -- E vão embora porque daqui a pouco vai ficar perigoso. Já tá muito escuro! -- advertiu
Clarice derramou uma lágrima sentida. -- Por que está me abandonando, mamãe? -- perguntou com tristeza -- Justo a mim que nunca lhe abandonei...
A idosa sentiu uma dor no peito ao ouvir aquilo. -- Eu não tô abandonando você, menina... -- olhou para ela -- Tô apenas te deixando ser feliz...
--Me deixando ser feliz, mamãe? -- não concordava -- E desde quando minha felicidade depende da permissão de alguém? -- argumentava -- A senhora tá é me abandonando! E eu não esperava isso...
--Você é minha melhor filha! -- respondeu com emoção -- Sempre foi! -- derramou uma lágrima também -- Não quero ser um peso morto na sua vida!
--Mas a senhora não é... -- estava emocionada
--Vá pra casa e viva do lado da pessoa que seu coração escolheu. -- pediu -- Eu vou ficar bem. -- garantiu -- Há um momento em que os pais têm que deixar os filhos partirem. -- derramou outra lágrima -- Acho que já prendi você demais...
--A senhora nunca me prendeu! -- aproximou-se da mãe -- Eu fiquei porque quis!
--Ya Leda, eu não deveria me met*r nessa conversa... -- Zinara se levantou também -- Mas nem sempre um filho quer partir. -- falava pensando em si mesma -- Às vezes a gente vai só porque precisa, porque a vida impõe, e ainda se pergunta se fez a melhor escolha... -- aproximou-se também -- Amor não pede pra abandonar, amor pede renúncia. Abandono não é sinônimo de renúncia. -- olhava para ela -- Meu amor por Sahar nunca pediu que ela abrisse mão de ya sayyida (a senhora).
--Zinara e a senhora não competem no meu coração! -- segurou uma das mãos da mãe -- Vocês são os grandes amores da minha vida, cada uma a sua maneira! -- falava com verdade -- Ela e eu já havíamos conversado e não havia trauma algum no fato de que eu não pensava e nunca pensei em deixar a senhora! Jamais!
--É verdade, ya Leda, wallahi (eu juro)! -- complementou a fala da outra -- Por enquanto fico morando de aluguel, mas Sahar e eu vamos procurando com calma um canto perto de sua casa pra morar de vez. -- contava sobre os planos -- Aí a gente podia viver juntas e não deixar ya sayyida desamparada!
--Mas que trabalheira! -- protestou inconformada -- Se não fosse por mim você nem precisava disso de ficar morando de aluguel... -- lamentou -- Todo mundo que quer casar, quer viver junto logo e montar uma família... -- a idosa retrucou -- Vocês não são diferentes...
--E o que é Il-cela (a família) além de pessoas unidas por laços de amor? -- a astrônoma interrompeu gentilmente -- Não tem modelo pra isso, não precisa estar na mesma casa, não precisa seguir um roteiro... -- segurou a outra mão de Leda
--Nós queremos uma família, sim, mas com a senhora fazendo parte dela! -- Clarice chorava contidamente -- Quem vai brigar comigo me chamando de boba? Quem vai dizer que andei cheirando uns miúdos ou que tarei o urso de pelúcia? -- as duas riram brevemente -- Além do mais sempre soube que a senhora queria mais netos!
--E quero... -- sorriu com os olhos úmidos
--Ya Leda é uma de nossas luzes! -- Zinara afirmou com verdade -- Não se apague, min fadlik (por favor)! -- pediu -- Sem ya sayyida não tem graça!
--Agora vejam só, virei palhaça de caipira! -- não sabia o que dizer e fazia-se de durona -- Eu aqui dando a chance de vocês se livrarem de uma velha resmungona e olha o que as duas fazem? Ficam me falando essas coisas...
--Pois eu quero minha velhinha do meu lado até o fim! -- respondeu de pronto -- Por favor, mamãe, volte pra casa com a gente! -- suplicou
--Volte, ya Leda? -- pediu também
--Eu amo a senhora, mamãe! -- chorava -- Não me abandona, não me deixa! Eu não quero ficar sem mãe...
--Ah, meu bebê, não chora... -- não resistiu e abraçou a filha
--Não deixa a gente, ya Leda... -- continuava insistindo -- Ninguém quer ficar sem maama... -- fungou
--Vem cá você também! -- puxou Zinara para abraçá-las -- Bando de mulher chorona! -- lutava para não chorar junto com elas
--Eu acho que elas se entenderam! -- Werneck falava para o idoso com o qual conversava -- Graças a Deus!
--Quisera eu que meus filhos viessem me pedir pra voltar... -- o idoso lamentou -- Se ela tem uma filha que se importa, devia aproveitar...
--MAMÃE, MAMÃE!!!!!!!!! -- Cecília chegou no portão aos berros -- Cadê a senhora, volte aqui!! -- procurava a campainha -- Vem alguém abrir essa porta! -- exigiu -- Ô, de casa! -- bateu palma -- MAMÃE!!!! MAMÃEEE!!!!!!! -- gritava -- AHAHAH!!!
--Ave Maria, mulher, não grita tanto! -- Adamastor pediu envergonhado -- Capaz até de algum idoso bater as botas no susto!
--Mas o que é isso?! -- Leda se desvencilhou das duas rapidamente -- O que diacho tua irmã tá fazendo aqui? -- olhou para Clarice
--A senhora sumiu, mamãe, tava todo mundo desesperado procurando! -- esclareceu -- Cecília é doida, mas também não quer ficar sem mãe!
--A gente teve que avisar a ela que a ya sayyida tava aqui, né? -- Zinara explicou -- Aí ela veio...
--MAMÃEE!!! -- continuava gritando -- Abram esse portão agora mesmo!! -- socava o portão -- AHAHAHAH!!!!
“Que garganta poderosa!” -- a astrônoma pensava -- "Nunca pensei que daqui do quintal pudesse ouvir alguém no portão!”
--É melhor eu tratar de arrumar minhas coisas logo antes que sua irmã faça desse asilo um inferno! -- Leda decidiu antes de se afastar
--Ai, que maravilha, a senhora vem com a gente!!! -- Clarice bateu palminhas e pulou -- Ah, graças a Deus!! -- olhou rapidamente para cima -- AHAHAH!!!! -- gritou de felicidade
--Não grita no asilo, menina, ai, ai, ai! -- ralhou -- Não criei vocês na base do escândalo! -- fez cara feia -- Sei lá a quem puxaram! -- foi andando para seu quarto -- E se mexe pra gente ir embora logo aproveitando que ainda nem tinha desarrumado a mala toda!
--Agora! -- correu atrás
--Mamãe, a senhora tá pensando o que? -- Cecília entrava no asilo como um foguete -- Enquanto Clarice for viva, tiver dinheiro e saúde a senhora não fica em asilo nenhum! -- caminhava gesticulando -- Que negócio é esse? Vou deixar meus futuros filhos com quem, quando eu quiser viajar pra São Sebastião ou pra fora do país? -- falava feito doida -- Babá custa os olhos da cara!
--Humpf! -- Zinara fez um bico revoltada -- Olha como que ela fala! -- resmungava consigo mesma -- Ô bicha folgada...
CAPÍTULO 165 – O Grande Encontro Lésbico
--E não é que veio gente nesse casamento? -- Magali reparava -- E eu que pensei que a data próxima do carnaval ia espantar o povo! -- pegou um salgadinho -- A música tá ótima e esses salgados... -- comeu -- Divinos! -- elogiou -- Nem sei como as duas tiveram tempo de organizar esse casamento nessa casa de festa!
--De repente o pessoal veio mais pela fofoca do que pelas noivas em si. -- Lúcia comentou -- Cátia nunca foi cheia dos amigos e essa Jamila nem morava aqui na cidade. -- considerou -- Deve ser por isso que bombou! -- pegou um salgado -- E concordo contigo: bom gosto elas têm. -- comeu também
--Acabou que não sei se Clarice e Zinara foram convidadas ou não. -- continuava conversando -- Da última vez que estive com Clarice, ela ainda não tinha recebido convite e depois não consegui mais falar com ela. -- limpou os lábios com guardanapo -- Continuo curiosa sem saber se elas vão aparecer!
--Você não disse que elas iam chegar na cidade ontem? -- lembrava -- E Zinara ainda vem de mudança, essas coisas dão trabalho... -- considerou -- Não acredito que venham. -- limpou os lábios também -- Além do mais que Zinara e Cátia não se bicam...
Nisso, a geofísica se aproxima da mesa das duas para cumprimentar.
--Boa noite, queridas! -- sorria simpática -- Fiquei muito feliz em vê-las aqui! -- falava com sinceridade -- Acho que depois desse tempo que se passou podemos finalmente dizer que estamos todas bem e com a vida nos eixos! -- olhava para as duas -- Por que não sermos amigas?
--Eu já superei o passado há tempos! -- a bombeira respondeu com verdade -- E desejo de coração que vocês sejam muito felizes! -- sorriu para a loura -- Amar e ser amada é a melhor coisa na vida!
--Pra mim também a fase da raiva já passou! -- Magali concordava com a esposa -- E da mesma forma, desejo tudo de bom pra vocês duas! -- olhou rapidamente na direção de Jamila -- Espero que você tenha realmente despertado pra realidade e não seja uma canalha mentirosa e salafrária com essa advogada. -- sorriu para a geofísica -- Até porque, sacanear uma advogada desse naipe deve dar uma dor de cabeça dos diabos!
A loura não gostou do que ouviu mas se conteve. -- Aquela Cátia que você conheceu não existe mais, meu bem. -- respondeu seriamente -- Agora que encontrei a mulher da minha vida tudo será diferente!
--Amém! -- gesticulou como se abençoasse a outra
--Com licença que vou continuar cumprimentando as pessoas. Daqui a pouco Jamila vem aqui falar com vocês. -- deu tchauzinho -- Aproveitem a festinha e até logo.
--A festa tá ótima! -- Lúcia deu tchauzinho também -- Fica à vontade pra dar atenção aos seus convidados.
--Vai lá! -- Magali acenou brevemente
A loura sorriu para a bombeira e se afastou.
--Mas você, hein? -- ralhou com a esposa -- Tinha que dizer aquilo pra ela?
--Não falei nada de mais! -- defendeu-se -- Cátia tem que ouvir umas verdades pra ficar esperta. Vai ela se met*r a besta com essa aí pra ver só!
Nesse momento, Zinara e Clarice chegam ao local e foram prontamente recebidas pela cerimonialista da casa de festas.
--Nossa, olha só quem chegou! -- Lúcia apontou para as amigas surpreendida -- E não é que elas vieram? -- olhou para Magali -- Está respondida a sua pergunta!
--Gente, mas que babado forte, esse casamento é o verdadeiro grande encontro do mundo lésbico! -- bateu palminhas excitada -- Será que rola um barraco, hein? -- perguntou animada -- Clarice disse que uma vez Zinara e Cátia quase caíram no pau por causa dela!
--Mas você, hein? -- achava graça -- Tem jeito não...
***
--Os meus trem tão tudo zoneado na casa nova que eu vou morar, mas não dava pra deixar de vir. -- olhava para a ex -- Tenho certeza que esse casamento vai ser um divisor de águas na sua vida e... de todo meu coração, desejo que seja muito feliz do lado da mulher que escolheu! -- sorria -- Wala lessa, habibi... (Eu juro que você ainda é minha querida...) -- falava com carinho -- Sem malícia, sem sensualidade... Mas uma amiga muito especial a quem eu desejo todo o bem sob as Luzes de Allah!
--Own, minha caipirinha, eu sei... -- sorria emocionada para a professora -- Também te desejo tudo bom, todas as maravilhas da vida nessa nova etapa que começa pra vocês duas! -- falava com sinceridade -- Seremos muito felizes, todas nós!
--Inshallah! (Se Deus quiser!) -- postou as mãos brevemente
--E você terá um lugar especial no meu coração pra sempre! -- pausou brevemente -- O que a gente viveu, nós duas... Abadan mosh hansaha... (Eu nunca poderei esquecer...)
--Nem eu! -- a caipira admitiu -- Você me deixou marcas muito positivas, Jamila. Mesmo com nossos desencontros.
--Você mudou tudo pra mim, Zinara... E me ensinou a amar. -- segurou as mãos dela -- Aprendi a viver plenamente e aproveitar cada oportunidade boa que a vida me traz. Não tenho mais reservas com meus sentimentos e nem pretendo me esconder de forma alguma. -- olhava para a ex -- Mas me diga, e quanto a você e Clarice? Até quando vão esconder que são um casal que se ama? -- queria fazê-la refletir -- Você mudou sua vida por causa dela e ainda assim vai continuar escondida? Bitichkii min eh? (Qual é o problema?) -- a caipira abaixou a cabeça -- Não é preciso sair gritando pro mundo que você é lésbica, mas também não precisa se esconder a vida inteira!
--Você tem razão, ana a’arfa (eu sei)... -- continuava de cabeça baixa -- Mas nós não temos coragem... eu não tenho coragem... -- admitiu envergonhada -- Sou uma caipira frouxa por demais da conta quanto o negócio diz respeito a me assumir...
--Ah, minha lindinha, vem cá! -- abraçou-a com carinho -- Todo mundo tem medo de alguma coisa, mas todo medo pode ser superado, habibi... -- falava com delicadeza
--Não tem ideia do quanto fico feliz por você, minha querida! -- Clarice conversava com Cátia -- Eu desejava de verdade que o amor brotasse no seu coração e vejo satisfeita que isso aconteceu! -- sorria -- Agora cuide dessa plantinha e viva a felicidade inigualável que o amor nos proporciona!
--Já tô vivendo, querida! Pode acreditar que sim! -- respondeu gentilmente -- Jamila é a mulher dos meus sonhos, não tenho dúvidas! Estou apaixonada e amando de verdade!
--Que bom que está tão firme nesse sentimento! -- acreditava na ex -- É bom vê-la desse jeito!
--Mas não posso negar que se o amor pôde brotar em mim, devo isso a você que preparou o terreno. -- segurou uma das mãos dela -- Você mudou minha vida, Clarice! E pra melhor; pra muito melhor!
--Você também foi muito importante pra mim, Cátia. -- respondeu com carinho -- Será sempre uma lembrança querida.
--Da mesma forma digo de você, Clarice! -- tocou o rosto dela antes de abraça-la
--Olha só o choro baixo de Clarice com Cátia e de Zinara com Jamila! -- Magali reparava atentamente -- É um tal de abraça dali e esfrega de cá. -- acompanhava tudo -- Qual delas será que vai dar um tapa no pé da orelha da outra primeiro, hein?
--Quer parar de desejar fuzuê no casamento dos outros? -- deu-lhe um tapinha no braço -- Coisa mais feia!
--Não é isso! -- ajeitou-se na cadeira -- Eu não gostaria de ver você abraçada com ex daquele jeito ali, ó! -- apontou discretamente
--Não tô vendo nada de mais. -- retrucou -- Elas se relacionaram no passado, tão em outra agora e se desejam felicidades, só isso.
--Espero que seja tão compreensiva quando me ver abraçada com alguma ex. -- olhou para a bombeira
--Acontece que a senhora não tem motivo algum pra se abraçar com ex! -- protestou -- Isso aqui é um casamento e elas tão se cumprimentando. A gente já casou e a fase dos cumprimentos já passou, viu, meu bem? -- reclinou-se para perto da outra -- Se eu ver você agarrada com ex, a coisa vai ficar feia!
--Pois é... -- discordava do argumento -- Comigo o bicho sempre pega... -- reclamou
--Acho que agora devo cumprimentar Cátia. -- Zinara comentou ao romper o abraço com a advogada -- Prometo que não aperto o pescoço dela dessa vez. -- brincou -- Macleech! (Não se preocupe!)
--Tome tento, viu, bicha? -- deu-lhe um tapinha divertida -- Não quero ficar viúva no dia do meu casamento!
--Então... -- Cátia começou a falar ao se desvencilhar de Clarice -- sua mulher vem vindo pra cá... Acho que ela não gostou de nos ver abraçadas. -- brincou -- De minha parte também não gostei de ver sua caipira agarrando minha deusa! -- piscou para a ex
Achou graça. -- Sem ciúmes daqui pra frente. -- brincou -- Na certa Zinara vem pra cumprimentar você. -- olhou rapidamente na direção da amada -- Assim como eu devo ir cumprimentar sua esposa.
--As-Salamu Alaikum! (Que a paz esteja convosco!) -- saudou ao se aproximar das outras duas mulheres -- Acho que devo cumprimentar as duas noivas. -- tentava ser simpática -- Já falei com Jamila, agora devo falar com você. -- olhava para a geofísica
--Com certeza! -- Clarice beijou o rosto da caipira -- E eu também devo falar com Jamila. -- sorriu para a amante -- Com licença. -- afastou-se
--É... -- a loura também tentava ser simpática -- Nós não tivemos um bom começo, mas isso já foi, né? -- sorriu -- Agora é bola pra frente!
--Minha cisma com você já passou. -- respondeu com sinceridade -- Jamila te ama, ela é minha amiga, você é amiga de Sahar, então nada impede que possamos nos entender bem. Nada impede que um dia até sejamos amigas... -- sorria -- Desejo de todo coração que esse casamento seja muito feliz e que vocês cresçam bastante juntas. -- pausou brevemente -- Smalla'Alik! (Deus proteja você!) Deus proteja as duas!
--Não há mais motivos pra cismas, você tá certa! -- concordava -- Também desejo que você e Clarice sejam muito felizes! -- falou com sinceridade -- Ela é muito justa, muito centrada e não te escolheria se não fosse uma pessoa de bom caráter. -- considerou -- Mas não fica enrolando muito, não, tá? -- advertiu -- Casa logo com ela!
“Mas até Cátia?!” -- pensou surpreendida -- Tudo bem, mas então... estamos em paz? -- a morena abriu os braços -- Mesmo? -- perguntou divertida -- Baseeta? (Sem problemas?)
--Eu já sei o que algumas coisas significam nessa língua de vocês, então posso dizer: baseeta! -- balançou a cabeça confirmando -- Estamos em paz! Salaam (Paz) total! -- brincou antes de se abraçarem -- Mas se me apertar o pescoço daquele jeito de novo, eu te mato! -- cochichou, fazendo Zinara rir
--Acho que nossas mulheres selaram um acordo de paz! -- Jamila observou bem humorada -- O que é muito bom, inclusive porque militamos todas pelo mesmo lado. -- olhou para Clarice -- Todas lutamos por esse país e em nome da verdade.
--Eu nunca fui sua inimiga, Jamila. -- respondeu educadamente -- E também acho que já é tempo de deixar as coisas ruins lá atrás.
--Quero ser sua amiga, Clarice. -- estava sendo sincera -- Não faz sentido ter ou alimentar qualquer peitica contigo.
--Sem peiticas, então! -- brincou -- Meus desejos pra você e Cátia são repletos de felicidade, amor, saúde, sucesso e tudo de bom que Deus lhes proporcione! -- abriu os braços -- Vocês têm tudo a ver e eu fiquei feliz de verdade em vê-las juntas e apaixonadas!
Abraçaram-se. -- Também acho que você e Zinara têm tudo a ver! São duas almas gêmeas! -- desvencilhou-se delicadamente -- Assim como Cátia e eu!
--E que assim continuemos a ser! -- deram-se as mãos
--Gente, mas eu não tô acreditando no que meus olhos vêem! -- Magali fofocava indócil -- Não bastava aquele agarramento impune entre as ex, agora é Zinara de gracinha com Cátia e Clarice de mãozinha dada com Jamila! -- estava pasma -- É tanto amor que me choca, sabia?
Lúcia achava graça. -- Ai, Magali, se você quis vir pra cá pra ver enxame, desiste! Essa história realmente acabou com um final feliz! -- gesticulou -- O que eu prefiro, porque de barraco, tô fora! Já me basta o barata voa que anda rolando por esse país por causa de política! -- revirou os olhos
--Então, já que não teve arranca rab*, -- levantou-se e estendeu a mão -- vem dançar, porque a música que tá tocando é show! -- convidou -- Fazia tempo que eu não ouvia uma lambada! -- sorria -- Meu corpo estremece e já não consegue parar! -- repetia uma frase da canção
--Até que enfim você me chamou pra dançar! -- aceitou o convite e se levantou -- Eh, ô, eh, ô... -- cantarolava -- me chama que eu vou... -- seguiram para a pista de dança
CAPÍTULO 166 – Como Vai Ser Agora?
--Sabe que eu gostei desse apartamento? -- Clarice reparava no ambiente -- Embora tenha sido alugado praticamente mobiliado, acho que acabou ficando com a sua cara! -- olhou para a amada
--Com a nossa cara, eu diria. -- abraçou a namorada pela cintura -- Não tem um cantinho dessa casa que não tenha recebido uma atenção decorativa de minha Sahar... -- beijou-a demoradamente
--Hum... -- envolveu o pescoço da outra com os braços -- Você quis que eu participasse de tudo... participei... -- beijou-a
--Claro que eu quis, ya bajat al-rouh (prazer da minha alma) ... -- beijou-a mais uma vez -- Esse lugar tinha que ficar impregnado de Sahar... -- sorria para ela -- E cada cômodo tinha que ser batizado com... -- sentiu a amada mordendo-lhe os lábios -- Ai! -- gem*u
--Deixa de ser safada, viu, Zinara Raed? -- ralhou dengosa -- Não é porque a senhora me seduziu em todos os cantos desse apartamento que tem que sair por aí falando! -- brincou -- Nem o pobre tanque escapou, sua tarada! -- mordeu-lhe o queixo
--O tanque daqui é forte! -- exclamou empolgada -- E eu também fiquei te segurando pra garantir. -- lembrava -- Agora a gente tem que estrear o colchão novo que chegou ontem! -- sorria -- É gostoso de deitar... -- beijou-a -- Por que a gente não vai pro quarto agora e começa com... bousa ala shafayef (beijo nos lábios)? -- beijou-a mais uma vez
“Meu Pai, mas ela já quer começar pela bousa?” -- pensou achando graça -- Deixe de fogo, viu, caipira saliente? -- desvencilhou-se com delicadeza e se sentou no sofá -- Eu estou naqueles dias e hoje não pode ter bousa. -- passou a mãos nos cabelos -- Além do mais tô cansada. Passei muita roupa ontem à noite.
“O que tem a ver estar naqueles dias com não poder ter bousa ala shafayef (beijo nos lábios)?” -- pensou intrigada -- "A gente não tava se beijando agora mesmo?” -- não entendia -- Então tudo bem. -- sentou-se do lado da amante -- A gente fica aqui juntinha conversando. -- sorriu
--Me conta como foi essa primeira semana no departamento? -- reclinou-se sobre Zinara, apoiando-se no ombro dela -- Como te receberam? Gostou deles? -- segurou uma das mãos dela
--Foi tudo bem, graças a Deus. -- entrelaçaram os dedos -- Conheci todos os colegas, o lugar onde vou ficar, a chefia do departamento... -- contava -- Dei uma passada no Observatório, revi uns conhecidos e fui apresentada ao novo diretor de lá... -- sorriu -- E o melhor você não sabe: os pesquisadores de Godwetrust tão concordando comigo! Agora já reconhecem as evidências que eu venho apontando faz tempo sobre o planeta de longo período orbital. Já tão até chamando ele de Planeta Nove!
(Nota da autora: Tenho falado sobre esse planeta há um bom tempo neste conto. Leiam em http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/01/160119_descoberta_nono_planeta_rb)
--Nossa! -- arregalou os olhos -- Zinara, que coisa maravilhosa! -- ajeitou-se na poltrona e sentou-se no colo da namorada -- E por que só me conta isso agora? Você sabe muito bem o peso que uma coisa dessas vai ter na sua carreira!
--Recebi a notícia anteontem à noite, por isso que não falei. Queria te contar pessoalmente. -- abraçou-a pela cintura -- Ontem fiquei acordada até de madrugada conversando com um dos colegas de Ganarājya sobre isso... Eles também já começam a me dar razão nessa questão. -- contava -- Mas o pé em que as coisas estão agora não significa que tudo está encaminhado. Ainda tô pensando num jeito de tratar a questão da verticalização do eixo planetário no contexto do meu pós doc. -- pausou brevemente -- O departamento daqui é bem refratário quanto a isso, mas vou dar meu jeito!
--Se alguém localizasse esse planeta, hein? -- acariciava o rosto da caipira -- Se fosse você essa pessoa, então... Seria têúdêô: TU-DÔ, como diz Aisha! -- sorriu
--Ele ainda tá muito longe e os sinais observáveis são muito fracos... -- esclareceu -- Não sabemos ao certo aonde se encontra, o que temos são probabilidades... -- suspirou -- Tenho algumas intuições, mas... laa acrif (eu não sei) ... Ainda há muito pra estudar...
--Confio na minha caipira! -- beijou-a -- E de quebra, tenho aqueles dados de variação de maré que podem te ajudar a fazer alguns cálculos. -- lembrava -- Depois que ganhamos o prêmio nesta última Conferência Internacional de Paleoceanografia, meu ex doutorando problemático tá numa empolgação só! O que se pedir pra ele pesquisar, ele pesquisa. -- riu brevemente
--Minha Sahar é uma verdadeira devoradora de prêmios! -- beijou-a -- Desde que a conheci já perdi as contas de quantos recebeu! -- beijou-a mais uma vez
--Olha quem fala... Se tem uma devoradora de prêmios aqui é você! -- mordeu-lhe os lábios -- De prêmios e de mulheres!
--Oxe?! -- surpreendeu-se -- De mulheres?! -- acabou achando graça -- Mas eu só tenho uma! -- beijou-a -- Al Sitol Nisaa! (A Rainha das Mulheres!) E maior dentre as melhores! -- beijou com mais intensidade
--Hum, se aquieta! -- segurou-a pelos ombros -- Já disse que hoje não dá pra gente fazer amor... -- advertiu dengosa -- Agora me fala daquela fofoca de que a fisioterapeuta da mão pesada vai alugar seu apartamento! -- pediu
Riu. -- Ela tem nome, viu, Sahar? Ya Akemi! -- achava graça
--Aquela dos dedos de aço que quase me matou! -- lembrou revirando os olhos -- Agora me diz, que conversa é essa?
--Eu te disse que ya Akemi me ligou na segunda e perguntou sobre o apartamento. -- contava -- Estamos acertando tudo e ela vai se mudar na sexta que vem. É a doktuur que tá me ajudando nessa. Deixei uma cópia das chaves com ela.
--Boas notícias, graças a Deus! -- voltou a envolver o pescoço da namorada com os braços -- Com o aluguel dela, você compensa o que vai pagar aqui.
--Esse dinheiro veio em boa hora, mesmo. -- concordou -- Mas, olha, temos outras coisas bem mais importantes pra conversar e não estamos nem tocando no assunto.
--Sobre nós...? -- perguntou reticente -- Esperei que você tocasse no assunto primeiro...
--Como vai ser, Sahar? -- olhava nos olhos -- Jamila me disse umas coisas no dia do casamento dela que me fizeram pensar... Mais do que já vinha pensando... -- lembrava -- Eu me mudei, tô aqui, a gente vai procurar um lugar pra morar juntas em definitivo, mas faltou discutir uma questão muito importante: -- pausou brevemente -- vamos passar o resto da vida disfarçando?
--Você tem coragem de assumir? -- perguntou à queima roupa -- Diante da família, dos amigos e de todo mundo?
--Laa... (Não...) -- respondeu quase num sussurro -- Aywah... (Sim...) -- reconsiderou -- Ave Maria, eu nem sei de mais nada! -- sentia-se confusa
--Não é só você que tem medos e limitações, meu bem. -- admitiu -- Eu também morro de medo de encarar o que é assumir a minha sexu*l*idade diante de todos. -- suspirou -- Eu não sei como reagiria diante das piadinhas, das provocações... nem sei se poderia pôr os pés na roça com você de novo... -- brincava com uma mecha do cabelo dela
--O que mais me apavora é a reação de usritii (minha família)... -- confessou -- No trabalho também é complicado, mas lá ninguém precisa saber, né? Seja em Cidade Restinga ou aqui. -- pausou brevemente -- Dah JaHiim! (É um inferno!)
--Acho que Werneck, se tinha alguma dúvida, agora tem certeza. -- comentou -- Não disfarçamos quase nada no dia em que mamãe aprontou aquela de sumir. -- sorriu
--O que a gente vai fazer, então, Sahar? -- perguntou com preocupação
--Agora sou eu quem digo: vamos esperar. -- beijou-a -- Você veio, tá aqui pertinho de mim e ainda vamos encontrar um cantinho nosso pra morar. -- considerava -- Até lá, vamos amadurecendo quanto ao que fazer e como agir. Você também tem que ver como vai ficar sua vida profissional.
--Você queria que a gente se casasse assim, fazendo festa, que nem foi com Magali e Lúcia, Jamila e Cátia...? Diga-me heek laa acrif (porque eu não sei)... -- queria saber -- Você tem vontade de...? -- foi silenciada com um beijo suave
--Calma, meu bem... -- respondeu com brandura -- Eu já me vi angustiada por causa de nossa situação mas não quero mais isso! -- falava com sinceridade -- Vamos vivendo um dia de cada vez porque assim deve ser. -- beijou-a -- Taalla gowa hodni we irtah... (Fique em meus braços e relaxe...)
--Ô, meu Pai, escuta o nível de minha Sahar falando a língua de Cedro! -- estava orgulhosa -- Eu sei que você tem suas restrições, mas não dá pra segurar, ya habibi! -- falava com paixão -- Hatee booseh! (Beije-me!) -- olhava nos olhos -- Ana cawza bousa ala shafayef! Alaan! (Eu quero beijo nos lábios! Agora!) -- apertou-a mais forte de encontro a si -- A noite toda! -- beijou-a intensamente com desejo
“Ai, gente, como segurar essa caipira quando ela vem assim, hein?” -- pensou excitada ao perceber que a amante deitava-a na poltrona enquanto se beijavam -- Ai, amor, não faz isso comigo logo hoje... -- lábios famintos devoravam-lhe o pescoço -- "Como é que vai ser com essa bousa do jeito que tá?” -- perguntava-se dividida entre desejo e receio
Zinara e Clarice passaram bons momentos em um gostoso amasso no sofá.
***
Najla conversava com um representante do Ministério de Relações Estrangeiras na Capital. Marco aguardava por ela na sala de espera.
--Eu agradeço muito por vossa excelência ter aceitado me conceder essa entrevista. -- falava com formalidade -- Não tem ideia do quanto tenho lutado pra recuperar minha fazenda e com isso poder receber o maior número possível de refugiados de Cedro e Suriyyah. -- contava -- Mas eu quero fazer tudo certo e preciso de ajuda!
--Por favor, não precisa me agradecer. -- respondeu educado -- E também não precisa ser tão formal comigo. -- sorriu mesureiro -- Pode me chamar simplesmente de Fernando. -- pediu -- Acho que temos a mesma idade, pois eu me lembro muito bem da beleza estonteante da miss Cedro 68 no auge dos meus dezoito anos. -- piscou para ela -- Devo dizer que pouca coisa mudou, aliás. -- elogiou
--Ah! -- ficou sem graça e corou -- Lembra de mim?! -- estava pasma -- Nossa, nem sei o que dizer... -- abaixou a cabeça e sorriu -- Ezzai? (Como pode?)
--Eu sou descendente do povo de Cedro. Meus pais foram imigrantes e chegaram aqui na década de 40, fugindo da Grande Guerra. -- esclareceu -- Quando Jamila me falou do seu caso logo me interessei, afinal de contas, descendo de refugiados. -- Najla olhou para ele -- E foi muita coincidência o fato de que a mulher interessada em receber estrangeiros era justamente você. -- complementou -- Por muitos anos houve um pôster seu no meu quarto. -- sorriu novamente -- Linda, ostentando a faixa e a coroa, e segurando um buquê de rosas vermelhas!
--Fico lisonjeada... -- continuava sem graça -- Mas... como posso agir pra trazê-los ao país de forma regular? O que tem que ser providenciado? -- queria ir direto ao assunto -- Quando usritii (minha família) chegou aqui na década de 80 as coisas eram muito diferentes e meu falecido marido tinha influências. Agora não tenho ideia de como é o protocolo.
--Tenho um grande amigo na Organização Internacional de Mudanças. -- respondeu de pronto -- E também temos a embaixada de Terra de Santa Cruz em Suriyyah. -- debruçou-se sobre a mesa -- Jamila contatou dois representantes de ONGs no país e eles podem ajudar na seleção das famílias. -- olhava fixamente para a ex fazendeira -- Precisamos regularizar a situação de sua fazenda, fazer um cadastro e correr com uma burocracia não muito complicada pra que seja legal a acomodação das pessoas. -- explicava -- A Presidenta é muito sensível a estas questões e simplificou bastante as coisas.
--Smallah, então tudo é bem melhor do que pensei! -- sorriu empolgada -- Para regularizar a situação da fazenda eu ainda tenho que pagar uma dívida, mas acho que algumas providências já poderiam ser tomadas enquanto isso, não é? Para ganhar tempo.... -- perguntou esperançosa -- Ainda me falta dinheiro, mas tenho fé! Esse recurso vai chegar! -- afirmou convictamente -- Tenho recebido apoio das comunidades dos descendentes de Cedro e Suriyyah do país inteiro!
--Sim, podemos começar a trabalhar. -- concordou -- E vai ser muito positiva pra imagem do Governo essa pró atividade em ajudar os necessitados da guerra. -- prestava atenção na mulher -- Dependendo de quanto dinheiro precise posso tentar lhe ajudar. -- ofereceu fazendo um charme -- Posso buscar algum apoio partidário e...
“Será que esse homem tá me cantando ou eu tô vendo coisas?” -- perguntava-se intrigada -- Peço que me perdoe, mas é melhor evitarmos vínculos partidários com essa questão. -- interrompeu-o educadamente -- A oposição pode trabalhar pra embarreirar o projeto com aqueles argumentos de propina, comunismo, terrorismo e coisas do gênero. -- explicava-se -- Além do que, acho que meu companheiro não ficaria muito satisfeito. -- deu um jeito de falar que não era solteira
--Companheiro?! -- ajeitou-se na cadeira -- Não sabia que era casada. -- respondeu surpreendido
--Sou sim, muito bem casada. -- cruzou as pernas -- Inclusive ele me espera lá fora. -- indicou -- É um tremendo homão! Ex lutador de boxe conhecido como Kid Marcão. -- afirmou orgulhosa
--Kid Marcão?! -- arregalou os olhos -- Sei quem é... -- estava pasmo -- Meu irmão era fã dele.
“Esse homem conhece todo mundo, minha Nossa Senhora!” -- pensou -- Ele inclusive, recentemente, desafiou e venceu um outro lutador famoso só pra levantar fundos para a causa da fazenda. Essa luta repercutiu enormemente e os vídeos estão aí na internet. -- falava toda prosa -- Se quiser que eu o apresente a ele... -- ofereceu
--Vai ficar pra uma outra oportunidade. -- desconsiderou -- E também acho que tem razão. Se a oposição soubesse que ajudamos no pagamento das dívidas da fazenda, poderiam dizer que é coisa de propina e ainda iriam atrapalhar a vinda dos refugiados com essa conversa de terrorismo. -- concordou -- Vá providenciando a solução desse problema por sua conta, que de minha parte acionarei as pessoas interessantes para viabilizar esse projeto. -- levantou-se -- Terá meu total apoio para ajudar nossos irmãos de Cedro e Suriyyah! -- estendeu a mão para ela e sorriu
--No que lhe agradecerei até o fim da vida! -- levantou-se também e apertou a mão dele -- Espero contar com sua presença no que dia em que recebermos o primeiro grupo de refugiados em Guaiás.
--Pode contar com isso! -- confirmou -- Farei o possível para estar lá! -- soltaram-se as mãos
--Novamente lhe digo: muito obrigado! -- fez uma saudação e preparou-se para sair -- Com licença. -- caminhou em direção à porta
--Najla! -- o homem chamou
--Sim? -- interrompeu a caminhada e olhou para ele
--No dia em que se desinteressar de boxe... -- ajeitou o paletó -- Eu já fui esgrimista, sabia? -- afirmou orgulhoso -- Sei fazer muita coisa com uma espada!
--Ah, tá... -- não sabia o que dizer -- Com licença. -- abriu a porta e se retirou rapidamente. Uma assessora lhe sorriu e seguiu pelo corredor a seu lado acompanhando -- "Depois de tantos anos nunca imaginei que o fato de ter sido miss me traria alguma vantagem.” -- pensava -- "Mas aquela cantada foi demais!” -- sorriu -- "Sei fazer muita coisa com uma espada...” -- achava graça -- "Se Marco soubesse disso quebrava a espadinha dele no meio!” -- riu sozinha
A assessora olhou desconfiada para a ex fazendeira.
CAPÍTULO 167 – Essas Nossas Meninas
--Aí elas falaram tanta coisa na minha cabeça que voltei atrás e vim pra casa. -- Leda conversava com Amina ao telefone -- Clarice e Zinara choraram igual duas bezerras desmamadas. -- disfarçava, mas havia ficado toda prosa com o fato -- São tão bobinhas essas nossas meninas! -- achou graça
--Oxi, bobinha nada! -- protestou -- Se Zinara dexassi a senhora ficá im asilo modi si casá com sua fia, Raed e eu dava uma surra nela que ia perdê inté o rebol*du!
--Que é isso, mulher? -- achou graça de novo -- Bater em sua filha por causa disso? Foi uma escolha minha, ela não me pediu nada. Nem ela, nem Clarice.
--Mais num pódi, ya Leda! Na nossa curtura num tem issu di dexá us ancião im asilu! Só si tem hoje, purque nu meu tempu tinha não! -- andava de um lado a outro na casa -- Fui vim a sabê qui existia asilu aqui im Terra de Santa Cruz.
--Acredito. Na sua tradição os idosos têm outro status.
Não entendeu o que a amiga quis dizer mas continuou. -- E a sinhora nunca mais qui me venha cum essas coisa di asilu, num sabi? Sinão eu meis vô lá e lhi buscu modi vivê aqui mais nóis!
Ficou toda prosa. -- Eu não sabia que era tão querida! -- sorriu -- Ritinha, Zezé, a médica de Zinara, todo mundo reclamou comigo por causa de minha decisão. -- comentava -- Cecília fez um escândalo!
--Claru, uai! Quem vai aceitá um trem dessi? -- perguntou indignada
--Mas agora isso é passado. Foi uma crise de terceira idade. -- fez um gesto despreocupado -- Quanto a sua menina, pode ficar despreocupada que já fiz uma visita no apartamento dela e é tudo direitinho lá. Tá bem acomodada.
--Graças a Deus e a Virgi! -- respondeu de pronto -- Eu cunfiu qui ela tá bem morandu aí pertu.
--Ela e Clarice vão procurar um canto em definitivo pra morar e quando acharem, aí não sei. Parece que vão casar. -- fofocou
--Mais Zinara num ia morá aí pur um anu só? -- não entendia
--Não, mulher! -- esclareceu -- Um ano é o tal do pós doc que ela arrumou. Mas nesse meio tempo vai procurar um jeito de ficar aqui em definitivo. Morando e trabalhando.
--Hum... -- entendia
--E aí vão casar. É o que eu tô percebendo. -- concluiu
--Será qui elas vai assumí, ya Leda? -- perguntou curiosa
--Acho que vão, né? Se tão procurando apartamento pra morar junta, é porque vão casar e assumir. Do contrário vão dizer o que? -- gesticulou -- Que são só amigas dividindo apartamento? Não cola!
--É meis!
--Então desde já vai rezando aí pra sua família aceitar e não criar problemas! -- aconselhou -- Nossa família é pequena e minhas outras meninas já sabem há muito tempo. Getúlio e Adamastor talvez não, mas qualquer coisa, me resolvo com eles e boto moral!
--Tá certa. -- concordou -- Vô pidí a Virgi modi amansá todu mundu. Mais ai di Raed qui venha di ignorança! Ai deli!
--E falando nele? -- sentou-se -- A lambição continua? -- perguntou divertida
--Ô! -- confirmou -- Cridita qui o homi tá pensandu inté im viajá di lua di mer? -- comentou animada
--Opa! -- achou graça -- E quando vai ser isso?
--Eli tá querendu vê pru nossu aniversáriu di casóriu, num sabi? Lá pra junhu. Ficô di pidí ajuda a Zinara e tudu. -- contava -- Ninguém aqui na roça intendi dessis trem di viaji, só nossa fia meis. O mais longi qui nóis vai é im casa di Aisha ô na Capital.
--Fico feliz em ouvir isso. -- estava sendo sincera -- Tenho certeza de que Zinara vai ajudar e com o maior prazer!
--Ya Leda, falandu im lambição e nessis trem tudu... -- aproveitava a deixa -- ya Zeferino dia dessis alembrô da sinhora e...
--Pois trate de mandar ele esquecer! -- interrompeu bruscamente -- Olha, o papo tava muito bom, mas tenho que cuidar da vida. Tudo de bom aí e fiquem com Deus. -- decidiu desligar
--A sinhora e a famia toda também... -- respondeu sem graça
--Tchau! -- desligou sem esperar ouvir resposta -- Que diacho, eu hein? -- reclamou -- Entra ano, sai ano e é sempre isso? Essa perseguição à minha curnicha? -- deixou o celular no braço da poltrona e seguiu caminhando para a cozinha -- Será possível que essa pobre coitada nunca vai ter paz? -- olhou para a virilha -- Fica com medo, não, minha filhinha! Por mais que esse povo saliente não desista, eu defendo seu direito à aposentadoria até a morte! -- gesticulou -- Ah, se defendo!
Fim do capítulo
Música do Capítulo:
Magali cantarola:
Me Chama Que Eu Vou. Intérprete: Sidney Magal. Compositores: Cláudio Rabello / Torquato Mariano
Cátia Faz Paródia com:
Globeleza. Intérprete: Neguinho da Beija-Flor. Compositor: Jorge Aragão e Jose Francisco Lattari.
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Samirao
Em: 15/10/2023
Eu gostei muito desse CAPS na época. O que não engoli até hoje foi Jamila casando com Cátia no way não me desce!
Solitudine
Em: 11/11/2023
Autora da história
kkkkkkkkkkkkkkk
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Femines666
Em: 18/03/2023
Eu acho o máximo que você explora várias personagens e não só o casal principal. É muito foda! Queria uma mãe ou sogra igual dona Leda.
Solitudine
Em: 19/03/2023
Autora da história
Olá querida!
Gosto assim! Escrever só sobre o casal me principal me parece muito sem graça. Com todo respeito a quem faz assim.
Quem não queria uma ya Ledars
Beijos,
Sol
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Seyyed
Em: 26/09/2022
Cararra quem ia deixar Leda no asilo? Foi lindo e divertido esse resgate! Cátia e Jamila aê o rebuceteio formo! Hahaha Sente a pressão Zi dá teu jeito hehehe Amed ferrou tudo puta merda. Será que agora ele tomar vergonha? Leonor tomou! Valeu doc toma totoma hahahahaha EBT é demais!
Resposta do autor:
Quem deixaria? Ninguém! Ya Leda é o nosso amorzinho!
Rebuceteio formou foi ótimo! kkkkkkk
E todo mundo pressiona a caipira! Coitadinha da bichinha!
Ahmed aprende com o sofrimento o verdadeiro valor de cada coisa nesta vida.
kkkk Gostou da cipoada que a doktuur deu em Leonor, não é? Ela mereceu!
Beijos,
Sol
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Zaha
Em: 24/01/2018
Esse é meu segundo capítulo preferido..tudo indo tão bem, fechando gestalt, amooo!!
Zinara finalmente vai criar raízes..a lindo elas juntinhas, tão orgulhosa delas! N vou falar" sei que é difícil" pq realmente não sei, já que sou assumida desde quase sempre kkkk. Então MT feliz, mas sei que qndo encontramos a indicada, a mulher de nossa vida, então fica mais fácil, tudo fica...pode demorar, mas gradualmente vão destruindo esse medo.
Amo essa estória, um dia vou contar pros meus sobrinhos netos.. Ah se vou!! Vai ficar eternizado no meu coração, assim como sua amizade, como disse uma vez, n importa o q passe, pra onde vc vá.. e espero que encontre uma Clarice já q vc a eparece c Zinara. Parece e n q seja..apenas algumas coisas... Rs.
Mas falarei isso no último capítulo. Tenho fé em vc!! Confio na caipira e certamente deve ter algo escrito, ainda q pouco e que falta revisar. Mas vai fazendo em parcela...mont de coisa acontecendo no país, aproveita e joga td aí..olha quantia inspiração kkkkk.
E olha, começou sem comentários e agora tem um pouco mais e n são as minhas, isso me deixa MT feliz! Vc merece, se dedica MT, bota seu coração aqui que é cheio de sentimentos bonitos. Sem falar q aqui vc trabalha seu emocional e nós TB.. n é terapia, mas é terapêutico !!!!
Vou - me pq eu me emociono MT falando dessa estória....nem sabe!! Td me lembra ela...tá impregnada em mim..
Como vê, continuo abestalhada, falando bobeira e me emocionando , sendo tão transparente q me dá medo....medo do q pensem, mas já foi....sou assim ou nesse momento estou assim!!
Enfim.. estou relendo os outros capítulos.. tô no 10, mas n vou comentar lá. Pq já passou, vc já escreveu, prefiro os últimos pq tenho um panorama geral, conheço as personalidades dos personagens.
É isso...louca pra ver as meninas casadas!
Cátia e Jamila( agora falei certo..Camille , Jamille, sempre troco rs). Orgulhosa das duas, mas falarei disso no último capítulo TB..
Fica bem, grande amiga!!! Beijão e um abraço desses q a gente corre e se joga!! Kkkk. Deixa eu ir... tô ansiosa e fico falando besteira, tava tão comportada...rs.
Resposta do autor:
Eu vi o quanto você releu rápido, a julgar pelo período dos comentários. E a cada comentário (verdadeiras análises) fiquei sem saber o que dizer. Não havia mais o que. Juro não ter sido preguiça!
Você não continua sendo abestalhada. Continua o que sempre foi: linda! Humana!
Beijos e fique com Deus!!!
Sol
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Gabi2020
Em: 30/05/2020
Olá Solzinha tudo bem? As-Salamu Alaikum!
As filhas de dona Leda parece que acharam seus rumos, agora ela precisa falar o que sente, Clarice não tem o dom de adivinhar o que a mãe pensa.
"Não me diga que é a mesma Cátia que namorava Clarice?!” -- a médica pensava surpreendida -- "Esse mundo lésbico é um troca troca da porra!” -- estava besta... Rebuceteio que fala? Kkkkkk...
Sempre fui fã da Claudia, que lapada ela deu no nojenta da Leonor, adorei! Kkkkkkkk....
Achei que Ahmaed tinha amadurecido... Filho da mãe!
Jamila a Cátia... Morando juntas, que façam valer a pena.
A irresponsabilidade de Ahmed causou o acidente do filho... Uns aprendem pelo amor e outros pela dor...
Youssef é um anjo... Que bom que Ahmed entenda e absorva tudo o que foi dito.
Casal mais fofo esse Zinara e Clarice.
"--Morde a fronha com força que eu não quero escutar nada!! -- Leda gritou do outro quarto -- Olha essa lambição aí!" Kkkkkkkkkkkk... Ouvido bom da dona Leda!!!
Ê dona Leda que susto!! Acho que nem ela esperava tanta mobilização.
Cátia e Jamila... Casadas... Muito bem, gostei do casamento, das palavras trocadas entre elas e Clarice e Zinara, foi emocionante.
Smalla'Alik!
Beijos querida!
Resposta do autor:
Olá Gabinha,
Estes anos que passaram, com tanto aprendizado, experiências e sofrimento, fizeram com que as pessoas conseguissem ir se acertando. Falhas acontecem, inclusive de comunicação, e mais problemas virão e com eles mais aprendizado e coisas boas que compõem o caráter cíclico e belo da vida.
Zinara é a personagem que busca o Tao conscientemente, mas todas as demais, cientes disso ou não, também seguem seu caminho e vão se encontrar, uma hora ou outra.
Esta é a maior beleza da vida!
Fico muito feliz com seus comentários e percepções.
Beijos,
Sol
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Sem cadastro
Em: 24/01/2018
Esse é meu segundo capítulo preferido..tudo indo tão bem, fechando gestalt, amooo!!
Zinara finalmente vai criar raízes..a lindo elas juntinhas, tão orgulhosa delas! N vou falar" sei que é difícil" pq realmente não sei, já que sou assumida desde quase sempre kkkk. Então MT feliz, mas sei que qndo encontramos a indicada, a mulher de nossa vida, então fica mais fácil, tudo fica...pode demorar, mas gradualmente vão destruindo esse medo.
Amo essa estória, um dia vou contar pros meus sobrinhos netos.. Ah se vou!! Vai ficar eternizado no meu coração, assim como sua amizade, como disse uma vez, n importa o q passe, pra onde vc vá.. e espero que encontre uma Clarice já q vc a eparece c Zinara. Parece e n q seja..apenas algumas coisas... Rs.
Mas falarei isso no último capítulo. Tenho fé em vc!! Confio na caipira e certamente deve ter algo escrito, ainda q pouco e que falta revisar. Mas vai fazendo em parcela...mont de coisa acontecendo no país, aproveita e joga td aí..olha quantia inspiração kkkkk.
E olha, começou sem comentários e agora tem um pouco mais e n são as minhas, isso me deixa MT feliz! Vc merece, se dedica MT, bota seu coração aqui que é cheio de sentimentos bonitos. Sem falar q aqui vc trabalha seu emocional e nós TB.. n é terapia, mas é terapêutico !!!!
Vou - me pq eu me emociono MT falando dessa estória....nem sabe!! Td me lembra ela...tá impregnada em mim..
Como vê, continuo abestalhada, falando bobeira e me emocionando , sendo tão transparente q me dá medo....medo do q pensem, mas já foi....sou assim ou nesse momento estou assim!!
Enfim.. estou relendo os outros capítulos.. tô no 10, mas n vou comentar lá. Pq já passou, vc já escreveu, prefiro os últimos pq tenho um panorama geral, conheço as personalidades dos personagens.
É isso...louca pra ver as meninas casadas!
Cátia e Jamila( agora falei certo..Camille , Jamille, sempre troco rs). Orgulhosa das duas, mas falarei disso no último capítulo TB..
Fica bem, grande amiga!!! Beijão e um abraço desses q a gente corre e se joga!! Kkkk. Deixa eu ir... tô ansiosa e fico falando besteira, tava tão comportada...rs.
Resposta do autor:
Eu vi o quanto você releu rápido, a julgar pelo período dos comentários. E a cada comentário (verdadeiras análises) fiquei sem saber o que dizer. Não havia mais o que. Juro não ter sido preguiça!
Você não continua sendo abestalhada. Continua o que sempre foi: linda! Humana!
Beijos e fique com Deus!!!
Sol
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Solitudine Em: 11/11/2023 Autora da história
Respondendo tudo! É que toma tempo, menina!