ENTRANDO NOS EIXOS
CAPÍTULO 154 – Novidades do Mês de Junho
Zinara conversava com seu colega John Peterson via QQOV?, um aplicativo de celular. Falavam a língua dos saxões.
--These are the bad news, my friend... (Estas são as más notícias, minha amiga...) -- falava desanimado -- For the first time since we’ve started to work together, our technical meeting won’t happen… (Pela primeira vez desde que nós começamos a trabalhar juntos, nosso encontro técnico não acontecerá...) -- lamentou -- Our conference was cancelled! (Nossa conferência foi cancelada!)
Estava pasma. -- Primeiro o evento foi adiado para junho e agora é isso?? -- não aceitava -- Cancelado?? -- riu pelo absurdo -- E qual seria a justificativa?
--Como você sabe, nosso grupo é custeado pelo Fundo Internacional Global, que por sua vez depende de centros de pesquisa governamentais e universidades do Estado. -- respondia prontamente -- O Fundo alega que a crise em Urubba, Godwetrust e outros países o deixou descapitalizado. -- pausou -- Em suma, there would be no budget (não haveria verba).
--Ah, então o motivo seria falta de verba? -- desacreditava -- But they have money to sponsor the CAP21 in Gália. (Mas eles têm dinheiro para patrocinar o CAP21 na Gália.) -- retrucou ironicamente
--Eu pensei a mesma coisa! -- concordava com ela -- E não é difícil entender o porquê de tudo isso: os membros do CAP21 farão o alarde de sempre, para no final dizer o que os Governos poderosos querem ouvir. Nós não!
--This is disgusting! (Isso é revoltante!) -- desabafou -- E novamente veremos a celebração daqueles acordos mundiais que resultam em nada! -- balançou a cabeça negativamente
--Temos outro problema também. Alguns pesquisadores desistiram do grupo temendo essa falta de verba. -- informou -- Mackulloch, Tseyoshi, Tanja Van Heimer... não sei se haverão outros que seguirão pelo mesmo caminho. -- não desejava que acontecesse -- Você sabe que sem o apoio do Fundo fica difícil manter as pesquisas que fazemos em nossos respectivos órgãos de trabalho.
--Isso é ruim, eu diria que péssimo, mas não vamos parar por causa de falta de verba ou desistências de alguns colegas! Somos pesquisadores e nós podemos enfrentar dificuldades piores! -- retrucou -- Existe internet e uma série de recursos que podem ser usados para nos permitir a comunicação e a troca de dados. -- argumentava -- Os que desejarem permanecer no trabalho podem manter as atividades que executam, mesmo que em outro ritmo. Parar é que não tem sentido!
--Exatamente! -- animou-se -- Vamos continuar o trabalho e trocar informações! Não importa a velocidade, o importante é a direção! -- concordava com a morena mais uma vez -- Criarei um fórum e nos reuniremos deste jeito!-- propôs -- Faremos um congresso virtual!
--Perfect! (Perfeito!) -- sorriu animada -- E ao final, mais um relatório consistente que divulgaremos de uma forma ou de outra!
--Nem que as revistas não publiquem! -- complementou -- Nós iremos apresentar os frutos de nossas pesquisas livres de viés político! -- afirmou decidido
--Sempre! -- respondeu enfática -- Ficamos assim, meu amigo. Tão logo você crie o fórum, os trabalhos se iniciarão! Conte comigo para contatar os demais! -- ofereceu
--Eu sempre conto com você! -- respondeu de pronto -- Take care, Zinara! Bye! (Cuide-se, Zinara! Tchau!) -- despediu-se
--Take care! Have a nice week! (Cuide-se! Tenha uma boa semana!) -- desligou o telefone -- Vou conversar com Sahar, envolver os colegas do departamento e vamos trabalhar com raça! -- sorriu empolgada -- Não vai ser por uma pretensa falta de verba que a gente vai deixar de trabalhar! -- decidiu -- Querem nos anular? -- falava consigo mesma -- Warana ay? ( Que mais se pode fazer?) Vamos pra luta!
***
Amina e Leda conversavam no LivrodasFuça.
Siriema: Eu vi as postági da sinhora falandu das violença contra os professô e mais os rôbu nu futibor! Curti tudu, num sabi? Pôca vergonha pió num há!
DonaBord: É isso aí, minha filha, eu só posto coisa pra infernizar a vida dos safados!
DonaBord: E de mais a mais, minha menina é professora. Bate nela pra ver o que acontece!
Siriema: A minha também é, e se batê nela vai tê furdunçu, num sabi?
DonaBord: Que não se metam com nossas filhas!
Siriema: É bão! É muitu bão! :(
DonaBord: E no mais? Quais as novidades?
Siriema: Tem umas tanta. Deixa eu contá
Siriema: Mãe Agda falô lá nu centru qui nessi anu vai tê um acidenti muitu sériu nessi país e qui a presidenta Vilma vai torcê as oreia e num vai saí sangui!
DonaBord: É, minha amiga, a coisa tá feia pro lado dela...
Siriema: Também falô qui vem aí uma fasi difícir pur dimais da conta, mais qui issu também vai passá
Siriema: Tem qui tê fé!
DonaBord: Só assim mesmo! Mas eu confio em Deus e entrego nas mãos dEle!
Siriema: E eu! Entregu nas mão dEli e da Virgi!
Siriema: Ói, ôtra nutiça ruim
Siriema: Ya Rafi morreu... Foi coração...
Leda levou um susto. -- E foi mais cedo do que eu imaginava! -- falava sozinha -- Também pudera! Foi inventar moda, olha no que deu?
DonaBord: Sinto muito por isso, mas já esperava que fosse acontecer.
DonaBord: Ele foi se pegar com mulher fogosa e nova
DonaBord: Deu no que deu: o coração não aguentou!
Siriema: Devi di sê...
Siriema: As festa di finar di anu e mais as junina num vão sê as mesma sem eli... Ya Rafi era só aligria nessas data...
DonaBord: É verdade! Vai fazer falta
Siriema: Mais falandu im coisa fogosa...
Siriema: Eu andu cabrêra cum Raed, num sabi?
--Ué? -- surpreendeu-se -- Não me diga que Raed resolveu ficar saliente também? -- questionou-se
DonaBord: Por que?? Ele tá aprontando alguma?
Siriema: Não.
Siriema: Na verdade, eu achu qui ele tá é pra morrê também
DonaBord: Ave Maria!
DonaBord: Por que????????
Siriema: Purque o homi tá numas fosquinha que só vendu!
Siriema: É mi trazendu flô...
Siriema: Fazendu um monti di misura, mi dandu us trem qui eu gostu...
Siriema: Até o CD novu di Catitta eli mi deu!
DonaBord: kkkkkkkkkkkk
DonaBord: E o que isso tem a ver com morte, mulher?
Siriema: Uai
Siriema: O homi nunca foi dessas coisa, quandu é fé mi vem cum essa
Siriema: Sinar di qui tá oiandu a bicha nus óiu!
DonaBord: Que bicha??
Siriema: A morti, uai!
DonaBord: kkkkkk Que nada!
DonaBord: Ele tá querendo é ser romântico e recuperar o tempo perdido
DonaBord: Ele quer é lambição mesmo. Mas lambição pra valer! Do tipo da que Najla e Marco têm
--Uai? -- Amina estranhou aquilo -- Será? -- coçou a cabeça -- Nessa fundura di campionatu? -- achava improvável
Siriema: Si a senhora acha issu meis, eu vô mi atiná di prestá atenção nessis trem tudu
Siriema: E tê cuidado
Siriema: Raed num tem lá essas saúdi, num sabi?
Siriema: Vai qui termina si danandu comu ya Rafi?
Leda riu gostosamente. -- Ah, minha filha, não tenha medo! -- achava graça -- Se morrer assim, vai satisfeito! -- balançou a cabeça -- Com certeza o perna fraca morreu feliz. -- olhou para cima -- Que Deus o tenha!
***
Zinara e Clarice acabavam de chegar ao local da primeira festa de casamento de Regina e Sarita. Estavam encantadas.
--Senhoras, boa noite. -- um educado recepcionista abordou as duas, as quais o cumprimentaram sorrindo -- A quem tenho a honra de recepcionar? -- sorria cortês
--Ana ismii Zinara Raed. (Meu nome é Zinara Raed.) -- respondeu educadamente -- E esta é Clarice Lima Verrier! -- apresentou-a com orgulho -- Al Sitol Nisaa! (A Rainha das Mulheres!) -- anunciou solenemente
O homem não entendeu o comentário, mas procurou os nomes na listagem. -- Ah, aqui está! -- constatou -- As senhoras são convidadas VIP! -- olhou para elas -- Por favor, me acompanhem. -- indicou o caminho e elas seguiram atrás dele
--VIP? -- olhou surpresa para Zinara -- Nossa! -- sorriu -- Que gentileza a delas!
--VIPérrimas por demais da conta! -- brincou com a namorada -- Eu não esperava menos, uma vez que acompanho Al Sitol Nisaa (A Rainha das Mulheres)!
Ficou toda prosa. -- Boba! -- deu-lhe um tapinha no braço
--Senhoras... -- o homem indicou a mesa -- Oh não, por favor, esperem! -- pediu consternado -- Por gentileza. -- chamou duas faxineiras, que se aproximaram -- O cobre manchas está marcado, por favor, substituam. -- pediu educadamente
As namoradas se entreolharam, enquanto as mulheres rapidamente ajeitaram a mesa conforme solicitado.
--Agora sim. -- sorriu olhando para as convidadas -- Por favor, fiquem à vontade. -- fez com que sentassem, cumprimentou com um gesto discreto e se retirou
--Meu Deus! -- a paleoceanógrafa olhava discretamente para todos os lados -- Ai, amor, vamos embora! -- pediu aos cochichos -- Isso aqui é muito chique!!!! -- estava pasma -- As faxineiras tão mais bem vestidas do que nós! -- constatou -- Você viu? Seremos as mendigas da festa!
--Vixi, Sahar, agora é tarde. -- cochichou de volta -- Ajoelhou tem que rezar!
--Eu nunca fui numa festa assim! -- comentou surpreendida
--Pois é... -- reparava no ambiente -- Nem no casório da filha de brofeseer Subramanyan vi tanto luxo! -- comentou boquiaberta -- E olha que em Ganarājya eles investem verdadeiras fortunas nos casamentos... -- balançou a cabeça pensativa -- É Regina... Mabrook! (Está de parabéns!)
--Será que elas vão reparar nossos presentes? -- perguntou preocupada -- Eu imagino o que esse pessoal aqui trouxe pra elas!
--Regina e Sarita são mulheres simples, Sahar. A riqueza nunca virou a cabeça delas... -- tranquilizou-a -- Senão a gente não tava nem aqui! -- concluiu -- Quem dá trela pra professora? Só aluno querendo passar por média! -- brincou
Achou graça. -- E cadê as noivas, falando nisso? -- perguntou curiosa
Após olhar para todos os lados, Zinara falou: -- Ali. -- indicou discretamente
As duas mulheres estavam impecavelmente vestidas e maquiadas. Cumprimentavam os convidados passando de mesa em mesa.
--Elas ainda vão cumprimentar esse povo todo aí, Sahar, e tirar um tanto de foto! A gente fica esperando elas chegarem aqui. -- aconselhou -- E se não chegarem, quando estiverem menos assediadas a gente vai lá.
--Nossa, mas aquela ali não é...? E aquela outra não seria...? -- arregalou os olhos -- Zinara, a seleção feminina de vôlei veio em peso! -- estava pasma -- Acho que as maiores feras do esporte estão aqui! -- segurou o braço da amada
--E mais a seleção de Bizâncio! -- notava -- Eita, boi, smallah! -- olhou para a outra -- O tanto de gente famosa que tem aqui não é brincadeira!
--Senhoras. -- dois garçons chegaram com bandejas cheias de iguarias -- Por favor, deliciem-se com nosso menu degustação. -- colocaram vários pratos sobre a mesa
--Como podemos servi-las da melhor maneira? -- outros dois garçons chegaram com bebidas
Clarice estava perdida em meio a tanta finesse. -- Bem, eu... aceitaria uma taça de tinto suave. -- respondeu timidamente
--Se me permite a sugestão... -- o homem começou a servir -- creio que apreciará este. -- sorria
--E eu gostaria de... -- a astrônoma respondia
--Doutora Zinara Raed? -- o garçom deduziu pelo número da mesa -- Desculpe interrompê-la mas madame Regina selecionou um suco de uva maravilhoso especialmente para a senhora. -- serviu -- Bom proveito!
Todos os garçons cumprimentaram e foram embora.
A paleoceanógrafa não sabia nem por onde começar. -- Doutora Zinara, a fartura desse casamento só perde pras festas da roça! -- brincou e bebeu um gole do vinho -- Gente, que delícia! -- saboreava a bebida -- É muito bom ser namorada de pesquisadoras renomadas, sabia? -- brincou novamente -- Só tenho acesso a coisas maravilhosas e muito chiques! -- soprou um beijinho para a morena
--Namoro uma rainha, não posso levá-la a qualquer lugar. -- respondeu melosa -- Al Sitol Nisaa! Wa laysa lazi badilon... (A Rainha das Mulheres! E ninguém pode tomar o seu lugar...) -- falava apaixonadamente
--Ai... -- suspirou embevecida -- "Diz se tem alguma bousa que possa com isso?” -- pensava derretida
Preparou-se para comer. -- Agradeçamos a nossas amigas noivas, especialmente a Regina, que é muito mesmo madame! -- sorria
--Tô vendo. -- provou um pãozinho -- Hum... -- gostou -- Amor, depois dessa comilança vamos dançar? -- reparou nos DJs que se aprontavam para começar o show -- Eu adoro dançar e tenho certeza de que essa noite em Paulicéia promete! -- limpou os lábios com guardanapo -- Tô morrendo de vergonha desse chiquê todo, mas já que estamos aqui...
--Tafaragi hazal masaa raksil gameel! (Essa noite você me verá dançando maravilhosamente bem!) -- prometeu bem humorada -- É só dar um gole desse teu vinho pra caipira que ela fica beba e entrega pra Deus! -- brincou
--Boba! -- riu
***
Clarice conversava animadamente com Sarita, enquanto Zinara e Regina se abraçavam alegremente.
--Yehforol hob albik! (O amor cavou fundo em seu coração!) -- segurou as duas mãos da amiga -- E que esse amor permaneça para todo o sempre! -- desejou com sinceridade -- Tenho pelas duas o mais terno carinho e fico imensamente feliz em vê-las tão bem e radiantes!
--Amiga, eu nem sei descrever o que é isso que tô sentindo! -- sorria emocionada -- Eu não acreditava mais que pudesse acontecer, mas o amor chegou na minha vida e chegou pra ficar!
--Inshallah! (Se Deus quiser!) -- olhou brevemente para cima
--E você, casa quando afinal?? -- perguntou impaciente -- Que demora! -- reclamou bem humorada -- Eu não sabia que você era tão lerda! -- brincou
“Ô, meu Pai Santo, olha a pressão do povo sobre essa pobre caipira...” -- pensou -- Calma, menina, que pressa! -- ralhou divertida -- Confia, que a coisa vai!
Reparou nas duas mulheres conversando e comentou: -- Minha Sarita adorou a sua Sahar!
--Elas se parecem. -- concordou -- São dois docinhos! -- reparava em Clarice -- Ya helwa di... (Meu doce...) -- suspirou
--Mais um motivo pra vocês irem nas outras duas festas! -- insistiu -- Finalmente consegui resolver a problemática do casamento na Capital! -- revirou os olhos -- Acredita que tive de falar com a presidenta pessoalmente?
--Smallah! -- levou um susto -- Quem pode, pode, né, fi? -- ficou besta
--Vamos, Zinara, deixa de ser caipira, ow! -- ralhou bem humorada -- A Capital e as Ilhas esperam por vocês! Vamos aprontar todas! -- falava animada
--Realmente não vai dar, habibi. -- recusou educadamente -- A gente é professora, o buraco é bem mais embaixo... -- brincou -- Sabe do que eu tava me lembrando aqui? -- mudava de assunto -- Que a gente se conheceu numa situação tão adversa lá no hospital universitário do Saará e hoje em dia, graças a Allah, a vida tá muito melhor por demais da conta!
--Nem me fale! -- concordou -- Você doava um rim pro seu pai e eu lutava pra salvar a vida do meu! -- emocionou-se -- A dor nos uniu e hoje é a felicidade que nos mantém juntas!
--E lá se vão cinco anos... -- considerou -- Não falei isso pra te fazer chorar, mas pra gente pensar em quanta coisa boa aconteceu nesse tempo que passou! -- secou as lágrimas da amiga com os dedos -- Abuuik (Seu pai) abençoa esse casamento, onde quer que ele esteja. -- falou com carinho -- Ele sabe que é o melhor pra você, habibi...
--Sim... -- concordou balançando a cabeça -- E eu devo essa felicidade toda a você, que me apresentou a essa mulher maravilhosa! -- olhou para Sarita e suspirou -- Te devo essa pelo resto da vida! -- olhou novamente para a astrônoma
--Sejam felizes! É isso que eu quero ver! -- respondeu com sinceridade
--Hum, esqueci de te contar uma coisa no meio de tanta felicidade e emoção. -- lembrou-se de um detalhe -- Sarita viu na internet o vídeo da sua tia com o namorado numa luta na Capital. -- contava -- Foi muita coincidência, sabe? -- achou graça -- Achei aquilo tudo muito lindo e em gratidão a você resolvi contribuir! -- informou -- Já deve ter caído na conta que sua prima abriu pra fazenda.
--Smallah! -- surpreendeu-se -- Não precisava, Regina, mas eu te agradeço imensamente em nome de toda usritii (minha família)! -- sorria -- Chukran, ya habibi! (Obrigada, querida!)
--Sei que sua tia precisa juntar quinhentos mil reales mas eu tive muitos gastos nos últimos tempos... -- justificou-se -- Crise, recessão e mais os gastos pras festas de casamento... Espero que compreenda.
--Por favor, você não é nem obrigada a contribuir! -- fez um gesto despreocupado -- Não precisa me dizer essas coisas, pelo amor de Deus! Quinhentos mil reales é dinheiro que chega dói!
--É... -- balançou a cabeça -- Menos mal que com a luta parece que eles ganharam duzentos mil, né? -- lembrava do que ouviu na reportagem -- Espero que os cem mil que depositei possam ajudar a completar o valor mais rápido.
--CHOO?? (O QUE??) -- arregalou os olhos
Zinara petrificou em estado de choque no meio do salão.
***
Jamila chegava na casa de Cátia em estado de euforia.
--Nossa, que alegria é essa? -- a loura perguntou curiosa -- Que aconteceu de tão bom hoje? -- beijaram-se
Jogou a bolsa na poltrona. -- Você não vai acreditar! Tenho a notícia mais massa do mês: a Suprema Corte de Godwetrust aprovou o casamento homossexu*l* em TODOS os estados do país! -- anunciou satisfeita
--Gente!!! -- sorriu animada -- Que coisa incrível! -- abriu os braços -- Vem e me abraça! Vamos comemorar isso em grande estilo! -- propôs
As duas se abraçaram com carinho e gastaram longos minutos se beijando sem pressa.
--E como será essa comemoração em grande estilo? -- perguntou dengosa -- O que esperar da minha loura? -- envolveu o pescoço dela com os braços
--Pensei assim: -- abraçava-a pela cintura -- a gente sai pra jantar, dança, romantiza e depois se hospeda em um hotel simpático e aconchegante pra fazer loucuras sob os lençóis! -- sorria -- Interessa? -- beijou-a
--A’jabani haqqan! (Eu gosto muito!) -- beijou-a, mordendo-lhe os lábios -- Mas cheguei a pensar que me convidaria pra fazer loucuras em algum hammaam (banheiro) perdido dessa cidade... -- brincou
Riu gostosamente. -- Aquilo foi louco mesmo, né? -- beijou-a -- Mais ainda quando a gente correu pra fugir da polícia depois de ouvir as sirenes tocando... -- beijou-a mais uma vez
--Pra só então descobrir que eles perseguiam um motoqueiro que bebeu demais. -- sorria -- E a nossa cara de inocentes? -- lembrava -- Impagável! -- beijou-a novamente
--Você é tudo que eu queria, habibi! -- a geofísica declarou olhando nos olhos -- Casa comigo? De verdade, de papel passado, com tudo que tem direito! -- propôs com o coração acelerado -- Não tô pedindo isso sem pensar, eu refleti bastante antes... -- salientou -- Liguei até pra minha terapeuta em Terra de Santa Cruz!
Ficou emocionada e segurou o rosto da loura. -- Não sabe o quanto fico feliz em ouvir isso, mas vamos vivendo a vida com calma. -- pediu com jeito -- Estamos longe de casa, cada uma vive em um canto do país... -- considerou -- A gente vai equacionar isso no devido momento! -- beijou-a
Cátia ficou um pouco decepcionada com a resposta. -- Então... -- abaixou a cabeça -- isso quer dizer que você não quer?
--Que não quero?? -- riu brevemente e fez com a loura mirasse em seus olhos -- Ana arfodo bil nar hoboki na astakilan! (Eu me recuso a desistir do fogo do seu amor!)
“Eu não entendo nada, mas quando ela fala desse jeito...” -- pensou excitada -- Vem cá, minha delícia do nordeste! -- guiou as duas para que caíssem sobre o sofá -- Eu fico doida quando você fala assim comigo! -- beijou-a com paixão
Sentiu a bolsa incomodando suas costas. -- Hum... -- interrompeu o beijo para jogar a bolsa no chão -- Agora sim! -- reverteu as posições e ficou sobre a amante -- Delícia! -- começava a despi-la -- Vem! -- beijou-a com desejo
--Gostosa! -- buscava despi-la também -- Ah... -- gem*u
As duas mulheres acabaram esquecendo de sair para comemorar... Precisava?
***
Jamila dormia e Cátia preparava o café. Estava distraída em seus afazeres quando ouve um toque breve do celular.
“Devo ter recebido algum e-mail.” -- concluiu -- "Quem me escreveria tão cedo?” -- foi até o telefone e deu uma olhada -- Lídia... -- sorriu imediatamente -- vamos ver o que ela diz. -- clicou para poder ler
“Querida Cátia,
Daqui a pouco faz um ano que você foi embora. Ontem me lembrei do nosso último encontro e senti uma saudade imensa... Espero de verdade que esteja tudo bem aí em Godwetrust.
Mamãe nunca mais teve boa saúde desde que se internou no ano passado e sofreu muito do coração ao longo dos meses. Sábado passado ela se despediu dessa terra, levando consigo amores e memórias em seu espírito imortal. Levou também um pouquinho de mim... Acho que me entende...
Mas estou serena, de consciência tranquila e não vou me perder nos meus objetivos. A vida continua, desejo alcançar meus sonhos com a mesma vontade de antes e sei que tenho uma família nos espaços para velar por mim. Meus olhos não perderam o brilho!
Ainda não aconteceu de surgir o alguém especial que ocupe o seu espaço no meu coração. No entanto, acredito que se a gente cuidar do jardim as borboletas virão. Cuido do meu aqui e desejo que o seu esteja muito florido aí.
E se a sua borboleta já chegou, não a deixe escapar! Faça com que ela perceba o quanto tem sorte!
Tudo de bom minha querida e obrigada pela ajuda de sempre!
Lídia”
--Own, minha lindinha... -- sentiu vontade de abraça-la -- Que Deus abençoe você e sua mãe! -- desejou de coração puro -- Que vontade de te dar um colinho... Sei exatamente o que você deve estar sentindo... -- olhava para a tela do celular -- E que a sua borboleta chegue logo! -- olhou na direção de Jamila -- A minha já veio e meu jardim nunca mais ficou sem cor... -- sorriu
CAPÍTULO 155 – Fatos e Fotos
Aisha estudava para uma prova quando Janaína veio lhe falar. Havia acabado de desligar o telefone.
--Amor, tava falando com Marco. -- olhava para a esposa -- Ele disse que na consulta de hoje, Ahmed João disse pra psicóloga que não tem mais medo e que se sente curado. -- Aisha olhou para ela-- Aí a mulher disse que se ele se sente assim, então é ótimo! Não precisa mais voltar. -- contava
--Ai, mas que notícia têúdêô: TU-DÔ! -- respondeu sorridente -- Graças a Deus o menino ganhou alta!
--Se isso é ganhar alta, eu não sei. Mas acho que a psicóloga respeitou o direito dele de se sentir curado. -- concluiu -- Deve ser isso. Esses são os fatos.
--Que seja, o importante é que tudo terminou bem! -- fez um gesto despreocupado -- Hum, deixa eu te contar: -- fez sinal para a outra se sentar e ela o fez -- tava aqui fazendo uma pesquisa pra faculdade quando me deu na telha de conferir o saldo da conta da fazenda: -- fez um suspense -- simplesmente trezentos e sessenta dois mil, cento e oitenta e nove reales e vinte e três centavos! -- anunciou satisfeita
--PUTA QUE PARIU!! -- exclamou em estado de choque -- Nunca vi tanto dinheiro na minha vida! -- sorria
--Cruza os dedos aí, amor! -- cruzou todos os dedos das mãos -- Agora só faltam cento e trinta e sete mil, oitocentos e dez reales e setenta e sete centavos! -- piscou -- Estes também são os fatos! -- brincou
--Ainda é muito dinheiro... -- suspirou -- Mas a gente já chegou até aqui, então não pode parar! -- levantou-se rapidamente -- Volta a estudar aí que eu vou na rua resolver uns negócio! -- foi para o quarto pegar a carteira
--Resolver o que num dia de domingo e a essa hora? -- olhou para o relógio
--Vou no caixa eletrônico fazer uma transferência de dez reales e setenta e sete centavos pra conta da fazenda! -- afirmou resoluta ao voltar para sala -- Se eu não tenho condições de completar o que falta, pelo menos arredondo o saldo! -- abriu a porta -- Detesto número quebrado! Sempre me dei mal nas provas de matemática por causa deles. -- acenou e soprou um beijo -- Fui! -- saiu para a rua
Aisha ficou rindo sozinha e voltou a estudar.
***
Zinara acabava de voltar de uma aula. Werneck entrou em sua sala correndo com um tablet na mão.
--Mulher, escuta que notícia da gota! -- olhava para ela -- Ouve essa: -- preparou-se para ler -- Depois de examinar os registos climáticos de 1153 estações met*orológicas de todo mundo, dados que remontam a 1881, o professor Friedrich-Karl Ewert fez uma descoberta interessante. Este geólogo aposentado e perito em computação de dados descobriu evidências de manipulação de dados climáticos entre 2010 e 2012 pelo instituto de pesquisas do clima da Agência Espacial de Godwetrust! -- aguardou a reação da morena
--Eu conheço este brofeseer! -- sorriu olhando para o colega -- Ele anunciou essa constatação na Conferência Climática de 2012! -- lembrava -- O mesmo evento onde apresentei meu artigo polêmico sobre a verticalização do eixo do planeta!
--Pois só agora essa informação chega ao conhecimento público, não sabe? -- sentou-se na beira da mesa da colega -- Mas duvido que o povo da seita climática dê atenção a isso!
--Humpf! -- fez um bico -- Deixe, macleech (não se preocupe)! -- desconsiderou -- Continue lendo, min fadlak (por favor). -- pediu
--Onde que eu tava? -- consultou o tablete -- Ah, achei! -- voltou a ler -- Quando os dados arquivados em 2010 foram comparados com os dados fornecidos pela Agência Espacial em 2012, verificou-se uma nítida diferença entre os dois conjuntos. A Agência alterou retroativamente registros passados para fazer parecer que o planeta está aquecendo, especialmente após o ano de 1950. -- balançou a cabeça contrariado -- Na realidade, os dados originais mostram que o planeta esfriou ao longo da segunda metade do século XX. Ao todo, dez diferentes métodos estatísticos foram utilizados para alterar a trajetória do clima de resfriamento para aquecimento.
--Uma vez torturados, os números dizem o que a gente quiser! -- a morena brincou -- Estatística também serve pra isso, já dizia um dos meus instrutores de Ganarājya! -- lembrava
--Os dados originais mostram quatro fases de resfriamento e três de aquecimento desde 1881. -- continuava lendo -- Uma vez que os ciclos de aquecimento ocorreram antes que houvesse qualquer subida significativa nos níveis de CO2, Ewert concluiu que "não se pode ver uma influência das nossas emissões de CO2 sobre as temperaturas". -- terminou de ler -- Eu gosto quando essas mentiras vêm à tona! -- afirmou satisfeito -- Tem que preservar a natureza, mas o que se vê são muitos interesses escusos que buscam fazer dessa necessidade uma fonte de renda! -- franziu o cenho -- Olha só as fotos dos gráficos alterados! -- mostrou para ela -- Engole essa, bando de cabra fuleiro! -- colocou o tablet sobre a mesa
(Nota da autora: baseado em http://resistir.info/climatologia/nasa_manipula_dados.html)
--Mentira desmentida com fatos e fotos! -- gostou de saber daquelas notícias -- Werneck, aproveitando que você veio, sente-se, min fadlak (por favor). -- apontou a cadeira -- Queria conversar com você sobre meus planos prum pós doc.
--Pós doc?! -- levou um susto -- Oxi, mulher, você mal esquentou lugar no departamento e me vem com essa? -- perguntou desanimado -- E eu aqui pensando em te passar a chefia de novo... -- lamentou
--Oxi digo eu, homem! -- ralhou -- Você devia se orgulhar de ser o chefe! -- cruzou os braços -- Mesmo com a dor de cabeça que isso representa!
Sentou-se na cadeira. -- É que eu tô sendo egoísta... -- respondeu com sinceridade -- E também me sentia mais seguro quando você era chefa... -- falou a verdade -- Mas, me diz, quais os planos? -- queria saber -- O que você tá pensando e pra onde vai? -- olhava para ela
--Não é pra esse ano porque temos muito trabalho aqui. -- debruçou-se sobre a mesa -- Mas penso em ingressar no pós doc em março do ano que vem. -- informou -- Aí eu sairia da cidade em fevereiro porque tem que ver esses trem de lugar pra ficar e por aí vai. -- pausou brevemente -- Quanto aos observatórios virtuais e ao trabalho conjunto de análise de dados com a equipe de Urubba, te peço pra cuidar somente da burocracia. No mais, itrouk el baqi a’alateh (deixe o resto comigo). -- pausou brevemente -- A orientação dos meus alunos tá sob controle também.
O homem concordava balançando a cabeça.
--Quanto às aulas tenho resolvido tudo com os colegas que me substituíram quando tirei minha licença não remunerada. -- continuava informando -- Nenhuma atividade ficará desatendida. -- garantiu -- Wallahi! (Eu juro!) -- prometeu
--E você vai pra onde dessa vez? -- perguntou curioso -- Em qual parte do mundo se abrigará Zinara Raed? -- forjou uma voz de mistério
--Ainda tô tratando disso... -- respondeu pensativa -- Por volta de novembro terei uma resposta definitiva. -- olhou para cima e postou as mãos -- Inshallah! (Se Deus quiser!)
***
--Eu depositei um cascalhinho pro moleque ontem, sabe qual é? -- Getúlio dizia para Raquel -- Agora que as parada tão ficando sólida vô podê fazê isso todo mês, tá ligada? -- sorria
“Que coisa incrível!” -- Raquel pensou maravilhada -- Fico feliz que você esteja se aprumando. -- respondeu sorridente -- E o curso de pintura industrial? Como tem ido? -- perguntou curiosa
--Já acabou, gata. Passei bem mermo! -- respondeu todo prosa -- Agora tô pegando umas pintura na casa de geral pra juntá a grana e podê fazê as provas de certificação. -- explicou
--E tem isso? -- não sabia
--Tem. -- balançou a cabeça positivamente -- E neguinho met* a mão no preço das provas de certificação, aí! -- contava -- Cinco mil e caralhada! -- aproximou-se dela falando mais baixo
--Credo, que roubo! -- chocou
--Mas eu tô quase lá. -- afirmou satisfeito -- Mês que vem já vô podê marcá de fazê as prova. -- contou -- É teoria e prática!
Olhava bem para ele. -- Nossa, Getúlio, umas provas tão caras... você podia ter deixado pra depositar o dinheiro pro Di depois que tivesse conseguido fazer. -- considerou -- Ele não tá passando necessidade, não tinha pressa.
--Que é isso, princesa? -- protestou com sinceridade -- Meu moleque é a coisa mais importante da minha vida! -- falava com verdade -- Eu fico boladão de nunca tê dado a ele o que devia dá! -- olhou na direção do filho -- Não tem mais o que esperá, não... -- olhou novamente para ela -- Já esperei muito, já dei muito mole!
Getúlio e Raquel conversavam enquanto Deodoro brincava na patinação no gelo com outras crianças. Estavam em um shopping.
--Sendo assim... -- suspirou e gastou uns segundos calada -- Nossa, você tá tão mudado... -- olhava para ele -- Na apresentação, na maneira de falar, nas atitudes... -- sorria -- Não sabe o quanto fico feliz com isso! -- afirmou com carinho
Titubeante segurou uma das mãos dela. -- E será que agora eu tenho chance, princesa? -- perguntou humildemente -- É tudo que eu mais quero na vida, aí!
A mulher recolheu a mão com cuidado. -- Getúlio, eu não vou te dar esperanças... -- desviou o olhar -- Além do mais tô dando um tempo pro meu coração.
Ficou triste. -- Tá certo... -- decidiu não insistir -- Tá certo...
--Pai, olha o que eu sei fazer! -- deu uma pirueta desajeitada
--Esse é o meu moleque! -- bateu palmas orgulhoso -- Tu viu, gata, o que ele faz? -- perguntou todo bobo -- O moleque é atleta, manja dessas parada toda de patinação!
Achou graça. -- Nosso filho é um menino muito especial... -- sorria olhando na direção do menino -- Muito especial...
Após alguns segundos em silêncio, resolveu perguntar: -- Aquele cara... o X9 cabeludo... -- olhava para o chão -- Ainda tá saindo com ele?
--Não! -- respondeu convicta -- E nunca mais hei de ter nada com ele! -- jurou
--É mermo?? -- olhou para ela empolgado
--Mas isso não significa que você e eu temos uma chance! -- esclareceu de pronto -- Por favor, não fique aí pensando coisas. -- passou a mão nos cabelos -- Tô feliz em perceber as mudanças em você, mas é o que já te falei: tô dando um tempo. -- pausou brevemente -- Os fatos são esses, Getúlio!
--Falô! -- balançou a cabeça concordando -- "Sem aquele fura olho babaca no meu caminho as parada fica mais certa!” -- pensava esperançoso -- "Eu vô reconquistá essa gata! Ah, mas eu vô mermo!” -- prometeu a si
***
Clarice pulava animada abraçada ao telefone.
De repente a porta da sala se abre. -- Que diacho é isso, menina? -- Leda achava graça -- Não satisfeita em tarar os ursos e as almofadas da casa, agora é a vez do pobre telefone? -- brincou
Achou graça. -- Minha velhinha fofa! -- beijou a testa da idosa e a abraçou -- Tô feliz porque Zinara foi pra Belo Visual dar uma palestra e amanhã vai vir pra cá, passar o final de semana comigo! -- olhou para a mãe -- Ela me pediu pra perguntar se a senhora deixava e eu disse que sim. -- esperava uma resposta
--Sabe que eu sempre deixo. -- desvencilhou-se da filha e foi se sentar no sofá -- Gosto daquela menina e a família dela sempre nos recebe muito bem na roça. -- pausou brevemente -- Só não quero saber de acasalamento debaixo desse teto! -- advertiu
Riu brevemente. -- Não vai ter acasalamento! -- sentou-se ao lado da mãe -- "Pelo menos não debaixo desse teto!” -- pensou bem humorada -- E a senhora, tá com uma carinha desanimada... -- reparava nela -- Por onde andou que só chegou agora? -- queria saber -- A senhora não costuma a bater perna até essa hora da noite. -- achava estranho
--Eu hein, menina, que interrogatório! -- não pretendia dizer onde esteve -- Eu sou a mais velha aqui, essa coisa da perguntação é comigo! -- gesticulou contrariada -- "Ninguém precisa saber que ando visitando asilos!” -- pensou
Achou graça, mas ficou cismada. -- Já lanchou? -- perguntou interessada -- Deixei um sanduíche na geladeira e comprei aquele suco de maçã que a senhora adora!
“Tão atenciosa comigo, minha menina...” -- pensou enternecida -- Vou tomar um banho e daí lancho. -- levantou-se e foi indo para o quarto -- Nem parece que é agosto, vou te contar! Calor do cão nessa cidade!
“Eu não sei o que mamãe anda fazendo que vira e mexe ela some por aí sem dar uma satisfação sequer!” -- pensava desconfiada -- "Será que é por causa de Raquel?” -- queria saber -- "Vou sondar minha irmã pra ver se esses sumiços têm alguma coisa a ver com ela!” -- decidiu
***
Zinara apresentava o último slide de sua palestra sobre a interferência da astronomia no clima. Havia falado também sobre sua teoria relativa à verticalização do eixo do planeta e observava que o auditório lotado se dividia entre pessoas que concordavam com ela, céticos e algumas criaturas que ficaram nitidamente apavoradas com as consequências decorrentes da mudança na inclinação do eixo. Pausou por uns instantes e apresentou uma imagem onde se via um rio de águas cristalinas.
--Certamente todos vão achar que em nada se relaciona esta imagem no contexto da palestra, mas uma vez que estamos aqui para falar de clima, vou insistir em uma questão a qual sempre abordo. -- olhava para os presentes -- Belo Visual não está com problemas de falta de água. Cidade Restinga, onde eu moro, também não. Mas o que dizer de Paulicéia? -- caminhava pelo tablado -- O que dizer de centenas de cidades neste país que não contam com um sistema de abastecimento decente? Muitas nem têm qualquer sistema de água e esgoto! -- falava como se quisesse despertá-los -- Eu não me canso de dizer que os governos do mundo gastam muito tempo e dinheiro com sequestro de gás carbônico, geração de créditos de carbono, mas e quanto à água?? -- gesticulou -- Essa história de aquecimento global antropomórfico é uma grande farsa pra permitir que muita gente enriqueça e que o consumismo de certos países não mude! -- pausou brevemente -- Eu vou contar uma história para vocês, vamos aos fatos. -- apertou o controle do data show -- E às fotos. -- mostrou a imagem de pessoas miseráveis
--Cruzes, que coisa horrível! -- uma mulher exclamou penalizada
--Eu venho de Cedro e já vivi o drama da falta de água. Já tive que beber urina para não morrer. -- contava -- Uma vez, um jovem chamado Amir se perdeu de nossa caravana, quando estávamos migrando em busca de um abrigo seguro, e ficou uma semana sem água. Vocês têm ideia do que isso significa? -- perguntou a todos
--Deus me livre! -- um homem resmungou sozinho
--Pois eu vou dizer o que ele nos contou e o que pude ver com meus próprios olhos! -- lembrava-se do rapaz -- A saliva torna-se espessa, parece que se forma um coágulo na garganta, que incha tanto que se torna difícil respirar, criando uma sensação terrível de afogamento. -- descrevia os fatos -- A língua incha tanto que passa dos maxilares. Sente-se a face rígida devido ao ressecamento da pele. Muitos começam a alucinar. -- lutava contra a própria emoção -- As pálpebras se racham como folhas secas e os globos oculares começam a derramar lágrimas de sangue. -- muitos se chocaram ao ouvir -- Quando Amir foi encontrado por nós, sua pele parecia couro, de uma cor púrpura esverdeada, estava toda arranhada, mas sem vestígios de sangue. -- lembrava -- Os lábios tinham desaparecido como se tivessem sido amputados. O seu nariz estava mirrado até metade do comprimento. Os seus olhos permaneciam fixos num olhar vazio. -- pausou brevemente -- A mensagem que eu quero deixar é a seguinte: precisamos urgentemente preservar e cuidar das águas, que estão sendo poluídas ou covardemente privatizadas! -- afirmou enfática -- Não importa se vocês concordam ou discordam de minhas posições científicas, não importa o gênero, a cor, a religião, a condição social de cada um aqui ou qualquer outra coisa que se possa pensar! -- olhava para todos -- Porque se qualquer pessoa ficar uma semana sem água, chorará sangue! -- a frase impactou a assembleia -- Obrigado! -- encerrou a apresentação
(Nota da autora: do filme “Ouro Azul: As Guerras Mundiais pela Água”)
As pessoas aplaudiam em estado de choque. A maioria estava, de verdade, pensando no que fazer para preservar os mananciais de água doce do planeta Água.
***
Clarice preparava-se para ir embora quando Ana Paula apareceu em sua porta.
--Oi, com licença? -- pediu respeitosa -- Ih, você tá de saída? -- percebeu a movimentação da colega -- Ai, desculpa, mas é que eu precisava muito de sua ajuda... -- comentou sem graça
--Pretendo sair um pouquinho mais cedo hoje. -- respondeu ao pegar sua bolsa -- Minhas aulas já acabaram e espero receber Zinara em minha casa. -- olhou para o relógio -- O voo dela chega daqui a quarenta minutos.
--É que é rapidinho... -- insistiu timidamente -- Tenho que lançar as notas dos alunos no sistema só que perdi meu acesso... -- explicou o problema -- O chefe de departamento viajou ontem pra uma reunião na Capital e me disse que você tem perfil de administradora... -- encostou-se no portal -- O prazo de lançamento é hoje, senão eles ficam com grau incompleto...
Deu um suspiro profundo. -- Você deixou pra fazer isso em cima da hora, né? -- respondeu meio chateada
--Eu me confundi, pensei que o prazo era sexta que vem e não essa... -- justificou-se
--Tudo bem, vamos ver isso. -- deixou a bolsa na cadeira e ligou o computador -- Cadê as provas? -- percebeu que Ana Paula estava de mãos vazias
--Deixa eu pegar na minha sala! -- saiu rapidamente
--E mais essa... -- revirou os olhos ao se sentar
Dez minutos depois a mulher apareceu cheia de papel nas mãos. -- Pronto!
--Mas que demora! -- reclamou -- Tava ligando pra sua sala e nada! -- colocou o telefone no gancho
--Tive que dar uma saída porque o celular tocou. -- sentou-se do lado de Clarice -- Na minha sala o sinal é muito fraco... E também não dava pra eu não atender. -- explicou-se -- Assuntos de trabalho.
--Tudo bem, vamos resolver logo isso. -- olhava para a mulher -- Me diz o código da disciplina, por favor, e vai ditando as notas por aluno, quando o sistema habilitar.
--Tá. -- concordou -- Anota aí: OCE 2387.
A paleoceanógrafa digitou. Em seguida, Ana Paula foi ditando as notas. Quando estavam perto de concluir, o departamento ficou sem energia por alguns segundos.
--Ai, eu não acredito! -- reclamou revoltada -- Perdeu tudo!! -- olhou para o relógio -- E faltam só vinte minutos pra Zinara chegar!
--Você não salvou? -- ficou pasma
--O sistema é burro, ele só salva no final! -- reiniciou -- São essas empresas ridículas que o Governo contrata pra vender serviços pra gente!
--Mil perdões, Clarice, mas tem que ser feito hoje... -- insistiu
--Eu sei, por isso que tô reiniciando! -- respondeu com educação mas não muito satisfeita -- "Parece até praga dessa criatura, Deus me perdoe!” -- pensava -- "E não posso nem ligar pra Zinara, porque tá no avião...”
Enquanto isso, no aeroporto.
“Nunca na história desse país avião chegou mais cedo, mas dessa vez a caipira deu sorte!” -- pensava satisfeita -- "Vou pegar um táxi e fazer uma surpresa pra Sahar na faculdade!” -- decidiu -- "Aposto que ela vai gostar!” -- sorria -- Jayed jedan! (Muito bom!)
Clarice e Ana Paula tiveram de retomar o trabalho mais duas vezes para que desse certo. Ao terminar, a paleoceanógrafa constatou que Zinara já deveria ter chegado no aeroporto.
--Ai, meu Deus, eu fiquei tão consumida aqui que nem me lembrei de telefonar na hora certa! -- pegou o celular e se levantou -- Coitada, vai ficar pensando que eu esqueci! -- chamou o número -- Atende, amor... -- falava consigo mesma
--Fique calma, meu bem, avião sempre atrasa. -- arrumava suas coisas -- Aposto que ainda nem pousou! -- levantou-se também
--Seja como for, tá mais que na hora de ir pro aeroporto! -- arrumou-se para sair -- Perdoe, querida, mas preciso sair e trancar a sala. -- pediu gentilmente
--Sabe de uma coisa, Clarice? -- queria retardar a saída dela -- Eu tive a curiosidade de ler o relatório que o tal grupo internacional do qual você faz parte divulgou. -- comentava para ter assunto -- Achei o máximo que apesar do cancelamento do congresso de vocês, os trabalhos continuaram. -- sorria -- E os resultados apresentados tiveram uma certa repercussão, mesmo com toda CAP21 vindo por aí. -- olhava para ela -- E que relatório! Um trabalho super multi disciplinar! -- elogiou -- Vai ser meio impossível não falarem sobre ele no evento.
--Eu amei fazer parte daqueles trabalhos, mas não tô com tempo e nem disposição pra ficar conversando sobre isso agora. -- respondeu com sinceridade -- Será que poderia me dar licença? -- pediu novamente -- Preciso sair! -- repetiu chateada
--É sempre tão tensa, meu bem? -- deixou as provas sobre a mesa e se aproximou sedutoramente -- Acho que precisa aprender a relaxar...
--Eu não costumo a ser grosseira, mas saia daqui agora senão vou perder a paciência com você! -- falou energicamente -- Não acha que me atrapalhou o suficiente por um dia?
--Ai, que mulher braba! -- tocou o queixo dela com a ponta dos dedos
E novamente, uma queda de energia.
--Que droga! -- reclamou -- "Não vejo um palmo diante do nariz!” -- pensou revoltada
“Perfeito! Mais um blackout era tudo que eu precisava!” -- agarrou Clarice pela cintura -- Chega de tensão, porque a gente quer a mesma coisa! -- beijou-a com desejo e violência
--Não! -- lutava para se desvencilhar -- Hum! -- não conseguia se libertar da outra -- Pára! -- mordeu-lhe o lábio inferior com força
--Ai! -- reclamou franzindo o cenho -- Isso doeu!
--Me solta, eu não quero nada com você! -- debatia-se revoltada
--Eu sei que tudo isso é charm... -- foi imobilizada por alguém que lhe apertava o pescoço com força -- Argh... -- sentia dor e falta de ar -- Aah... -- não entendia o que estava acontecendo. Rapidamente Clarice afastou-se dela
--Ya habla, enti zayy iz-zift! Enti ghaawiz iD-Darb bi-sittiin gazma!! (Sua imbecil, você é como lixo! Você merece ser chutada por 60 sapatos!!) -- rosnou enfurecida -- Gaatak niila, ya ahbal!! (Vá para o inferno, sua idiota!)
--Zinara? -- surpreendeu-se -- Ai, meu amor... -- sorriu emocionada -- Chegou na hora certa!
--Quem você pensa que é pra colocar as mãos nela, ya bint il-Homaar (sua filha de um burro)? -- continuava enforcando -- Desgraçada!
E nisso a luz voltou.
--Tá me... ah... -- Ana Paula não conseguia respirar direito -- Argh... -- babava
--Solta ela, meu bem, por favor! -- pediu com carinho -- Solta essa louca e vamos embora! -- olhava para a morena
--Sorte a sua, maldita! -- soltou a mulher, que caiu no chão com falta de ar -- Sahar! -- abriu os braços para a amada
--Amor! -- abraçou-se à caipira e fechou os olhos por uns instantes -- Olha, meu bem, eu tava aqui ajudando ela, -- olhou para a namorada -- quando no final de tudo, acabou a luz e ela se aproveitou da situação pra vir me agarrar! -- contava a verdade
--Nem me passou pela cabeça que você me traía, Sahar. -- beijou-a -- Essa behiima (estúpida) é que não sabe respeitar ninguém! -- olhava furiosa para a outra ajoelhada no chão
Ana Paula ainda não conseguia se levantar. Esfregava a mão no pescoço e sentia dores. O lábio sangrava um pouco por causa da mordida de Clarice. “Que merd*!” -- pensou -- "Parece que fui atropelada por um caminhão!” -- sentia-se atormentada -- "Essa Zinara Raed é uma terrorista, puta merd*!”
A morena se desvencilhou gentilmente da namorada e segurou a outra pelo braço. -- Eu não sei se você pensou nas consequências dessa sua gracinha. -- rispidamente fez com que se levantasse -- Mas isso não vai ficar assim, não, viu, fi? -- ameaçou -- Você vai sair corrida daqui!
--Não, pelo amor de Deus! -- pediu olhando para as duas -- Não vai mais acontecer, eu juro! -- postou as mãos em súplica -- Pelo amor de Deus, não conta pra ninguém porque senão vai ser o fim da minha reputação e da minha carreira! -- quase chorava
Clarice prestava atenção na mulher.
--Pensasse nisso antes, bicha fuleira! -- deu-lhe um empurrão -- Se eu não tivesse chegado aqui, só Allah sabe o que seria capaz de fazer com minha Sahar! -- acusou
--Eu não sou estupradora, não iria buscar possuí-la a força, eu juro! -- falava a verdade -- Só queria convencê-la a me dar uma chance!
--AHHa, mas é uma cara das mais de pau... -- preparou-se para agredi-la -- Cala essa boca amaldiçoada wa la te shaghilny (e não me aborreça)! -- levantou a mão
--Amor, não! -- colocou-se entre as duas mulheres -- Não quero que seja violenta, por favor! -- pediu com carinho -- Essa história acaba aqui! -- decidiu
--Choo? (O que?) -- não acreditava
--E quanto a você, -- virou-se de frente para sua agressora -- nunca mais me dirija a palavra, nunca mais entre na minha sala! -- pediu com o dedo em riste -- Porque se você me incomodar de novo eu te denuncio a polícia e espalho pra todo mundo a fofoca do que aconteceu aqui! -- ameaçou
--Nunca mais, eu juro! -- prometeu apavorada -- Eu juro! -- olhou para Zinara -- Nunca mais eu me aproximo da sua mulher! -- aproximou-se da porta e correu para fora
Clarice percebeu que as provas dos alunos da outra ficaram esquecidas sobre sua mesa. -- E ainda largou isso aqui! -- passou a mão nos cabelos -- Não tem problema, segunda-feira deixo na secretaria pra ela pegar. -- decidiu
--E essa bicha dá aula pros filhos dos outros, é? -- cruzou os braços revoltada
***
--Ai, mamãe, só sei que foi horrível! -- narrava os fatos para a idosa -- Se não fosse por Zinara, aquela safada fingida teria me dado muito mais aborrecimentos! -- revirou os olhos
--Aborrecimentos? Essa mulher podia era te estuprar! -- gesticulou revoltada
--Dah JaHiim! (É um inferno!) -- reclamou -- Quando penso nisso me dá um ódio que chega dói! -- fez cara feia
--Ela não faria isso. -- discordou -- Ana Paula é uma sedutorazinha de quinta categoria que pensou que pudesse me deixar a fim dela por causa de um beijo roubado. -- ajeitou-se no sofá -- Mas não dá pra ela, não. Nem que eu estivesse solteira há séculos! -- afirmou enfaticamente
--Mulheres também agarram à força e estupram outras mulheres, Sahar! -- retrucou -- Eu ainda acho que a gente devia ter ido na delegacia pra dar queixa a polícia!
--Eu também! -- Leda concordou -- Ela se aproveitou de que vocês duas estavam sozinhas no departamento e veio pensando em fazer o pior! -- estava revoltada -- Tinham que ter ido pra delegacia mesmo!
--Não, eu não queria enxame! -- levantou-se do sofá -- E de mais a mais, Ana Paula demonstrou que morre de medo de ter o nome envolvido em escândalo. -- passou a mão nos cabelos -- Ela vai se comportar bem até o final do ano, quando então vai embora do departamento. -- considerava -- E tenho certeza de que não colocará mais os pés por lá!
--Se ela tem amor pela vida, fará isso! -- Zinara resmungou de cara feia
--Bem, agora vou tomar um banho! -- olhou para as duas -- Me esperem pro lanche, tá? -- soprou um beijinho e seguiu para o quarto
--Essa menina tem muito sangue de barata, não sei a quem puxou! -- Leda criticava -- Quando sofri uma tentativa de estupro, deixei a tarada na lona! -- lembrava -- Foi cada ursada certeira que só você vendo!
Lembrou-se que a tarada era Cátia e se conteve para não rir. -- Tá certa, ya Leda. -- concordou
Olhou para a caipira. -- De hoje em diante eu vou cortar a mania dessa menina de sair do departamento depois do expediente! -- decidiu -- Enquanto aquela aprendiz de tarada estiver trabalhando por lá, eu não deixo! -- afirmou com firmeza
--Aywah. (Sim.) -- concordou balançando a cabeça -- Deixe mesmo não! -- apoiava
Ficou olhando para a outra até que resolveu falar: -- Mas sabe de uma? A culpa de tudo é isso é sua! -- acusou -- Esses são os fatos!
--Uai?! -- não entendeu -- Por que minha culpa?
--Se já tivesse casado com minha filha, duvido que Clarice fosse inventar de sair tarde do serviço! -- levantou-se e foi andando para a cozinha -- Você não ata e nem desata, aí dá nisso: até uma tarada aparece pra infernizar o juízo! -- deu tchauzinho -- Vou comer porque as intrigas dessa noite me deram uma fome de Cão!
“Ô, meu Pai, até ya Leda...?” -- lamentou olhando para cima
***
Zinara e Clarice passeavam de mãos dadas na orla da zona oeste de São Sebastião.
--O tempo passa e eu não me conformo com aquela bicha fuleira e tarada que trabalha no seu departamento, Sahar! -- reclamava de cara feita -- Bint il-Homaar!! (Filha de um burro!)
--Esqueça isso, meu bem, já passou. -- pediu com carinho -- E certamente não vai se repetir. -- acreditava nisso -- Não gosto de vê-la zangada ou enfurecida. -- pausou brevemente -- Pra dizer a verdade até me assusta... -- confessou
Ficou sem graça. -- Eu sei que quando saio do sério viro um monstro... -- abaixou a cabeça -- La mo'axza, Sahar... (Desculpe, Amanhecer...)
Pararam de andar. -- Não estou brigando com você, amor. -- segurou as duas mãos dela -- Eu acredito de verdade que você seria incapaz de me fazer mal.
--Juro sob Deus e sob o nome de meus ancestrais que eu nunca encostaria um dedo em você pra te machucar, eu juro, wallahi (eu juro)! -- afirmou em desespero
--Eu sei, amor. -- interrompeu-a com carinho -- E só não cubro você de beijos porque estamos na rua! -- sorriu
--Uai... -- ficou feliz -- A gente pode se esconder num canto! -- propôs
--Nada de canto, dona Zinara! -- ralhou bem humorada -- A senhora anda muito safadinha pro meu gosto! -- fingiu que brigava -- Pode abaixando esse fogo! -- voltaram a andar. Estavam de braços dados -- Agora esquece de Ana Paula! -- pediu
--Você promete que se aquela tarada vier pra cima de você...?
--Eu vou te dizer, fazer um escândalo e denunciá-la a polícia! -- interrompeu-a novamente -- Já te disse isso, caipira desconfiada! -- beijou o ombro dela
--Tem que cuidar, né? -- justificou-se -- Eu queria ter quebrado aquela bisca no pau! -- franziu o cenho
--Ui, que a minha caipirinha é tão brava! -- brincava -- Dá até medo!
--Mexe com minha Sahar, pra ver o que é bom! -- falava sério -- Gaatak niila, Ana Paula! Tiizak Hamra! (Vá para o inferno, Ana Paula! Seu rab* é vermelho!) -- gesticulou para ninguém
Achou graça. -- Agora esqueça isso, meu bem. -- pediu novamente -- Vamos falar de assuntos melhores. -- propôs -- E aquela mulher, definitivamente, não é assunto pra gente perder mais um segundo sequer!
Após alguns minutos calada pensando, Zinara quebrou o silêncio para perguntar: -- Sahar, diga um lugar romântico onde você nunca esteve, mas adoraria conhecer. -- perguntou à namorada -- Pode ser dentro ou fora de Terra de Santa Cruz.
--Hum... Acho que montanhas são românticas... -- pensava -- De repente a serra no sul do país ou os Albus, em Schweiz... -- considerava -- Ou talvez San Carlos, Torres del Magallanes... Ah, tem tanto lugar! -- olhou para a amada -- Por que? -- sentiu o coração acelerar -- "Será que ela tá pensando na lua de mel depois que a gente casar?” -- pensou esperançosa
--Porque eu pensei numa conversa que tivemos sobre a gente fazer diferente no final do ano. -- olhava para a outra -- Depois do natal na roça, uma fuga pro réveillon em outro canto. -- sorria -- Só você e eu... -- olhava para a amada -- As coisas na minha vida estão entrando nos eixos! -- parou de andar -- Habibi, gaya agmal sineen! (Querida, os melhores anos vêm vindo!) -- abriu os braços animada
Clarice suspirou decepcionada e respondeu com um sorriso nada convincente: -- A moeda estrangeira tá cara, querida, não convém ir pra fora do país. -- passou a mão nos cabelos -- A gente podia ir pro sul e curtir uma temperatura mais friazinha. -- sugeriu -- Eu queria mesmo uma viagem só com você num clima romântico.
Notou a decepção da namorada e entendeu porque. -- Eu não esqueci de nós, Sahar. -- falava com verdade -- Já te pedi pra confiar em mim.
--Tudo bem, Zinara. -- voltou a andar -- Melhor a gente voltar pra casa. -- olhou para o relógio -- Tá tarde e parece que vai chover. -- observou
Aproximou-se da namorada e sussurrou no ouvido: -- Rigeili beek omri elli fat... (Com você, eu recuperei minha vida perdida...) -- deslizou o nariz no pescoço dela -- Viver com você é minha prioridade, habibi.
Arrepiou-se toda. -- Ai, Zinara, que é isso? -- deu um tapinha no braço dela e se afastou perturbada -- Fazendo essas coisas comigo no meio da rua? -- ralhou dengosa
--Onde será o canto bom mais próximo? -- perguntou sorridente -- Aí eu faço isso e muito mais!
Acabou achando graça. -- Eu não conheço todos os cantos bons da cidade, tá, Zinara Raed? -- cruzou os braços -- E hoje eu nem poderia... -- olhou para um lado e outro -- Ai, o melhor mesmo é ir pra casa. -- respondeu desanimada -- "Que pena que tô naqueles dias...” -- lamentou mentalmente
“Sahar ficou chateada porque pensou que eu ia falar do casamento e não falei...” -- concluiu -- "Ela não quer nem namorar comigo hoje por causa disso...” -- lamentou -- Eu tenho me organizado pra viabilizar algumas coisas. -- olhava para Clarice -- Não tenho detalhado porque ainda aguardo respostas. -- explicou -- Mas tenho plano B! -- garantiu que nem criança
A paleoceanógrafa deu um suspiro profundo. -- Eu disse que te esperava, não foi? -- respondeu tranquilamente -- Ainda estamos dentro do meu prazo. -- voltou a andar -- Vem, Zinara. -- chamou
“Eita, que a caipira quis agradar e acabou dando rata...” -- a morena pensava decepcionada -- "A pressão por esse casório ainda acaba comigo...” -- seguiu a namorada -- "E o pior é que eu quero casar, mas o fato é que ninguém acredita...” -- suspirou -- Calma, Sahar, me espera. -- pediu acelerando o passo
***
Cid havia se acidentado andando a cavalo. Após sair do hospital de volta para sua casa, recebia a visita de alguns membros da família. Todos haviam lanchado e algumas das mulheres cuidavam da louça.
--Homi, mais o qui diachu ocê mi arrumô pra levá uma queda tão feia, sô? -- Nagibe perguntava ao irmão -- Quebrô perna, braçu, custela, denti... -- reparava no irmão -- Avi Maria!
Tentava ver onde os parentes estavam. -- Tá todu mundu na cuzinha? -- perguntou em voz mais baixa
Olhou para trás e depois novamente para o irmão. -- As muié tão na cuzinha, mas baba tá lá fora vendu num sei o que cum Ahmed. -- não entendia a pergunta -- Pur que?
--E as criança? -- continuava querendo saber
--Cum camma Najla brincandu nu quintár, pur que? -- estava intrigado
--Eu achu qui essa queda foi castigu di Deus, num sabi? -- cochichou para o irmão
--Castigu pelu que? -- ficou mais curioso ainda
Chamou o irmão para se aproximar ainda mais. -- Andei mi deitandu cum ôtra muié. -- falou bem baixinho
--Oxi?! -- surpreendeu-se -- Cum quem?? -- cochichava
--Lembra daquela forastêra qui veiu pra cidadi comprá cavalu cum Zeferino? -- Nagibe balançou a cabeça positivamente -- Foi cum ela.
--E comu qui ocê cunseguiu si deitá cum uma muié daquela? -- perguntou curioso -- Bunita qui chega dói e cheia du dinhêru? -- comentou surpreendido -- Parecia inté uma princesa!
--Nem sei dizê. -- respondeu com sinceridade -- Um belu dia ela dissi qui si agradô di eu e ficô naquela coisa, num sabi? Daqueli jeitu fogosu... -- contava -- Aí eu arrisquei e deu certu. -- sorriu -- E qui muié boa, Avi Maria! -- lembrava -- Tão gostosa... -- suspirou -- Sabi fazê cada coisa...
--E quantas veiz ocê si deitô mais ela? -- continuava cochichando
Parou para pensar e respondeu: -- Umas deiz! -- Nagibe arregalou os olhos -- Só parô dispois qui ela foi simbora.
--E cumé qui ocês si deitaru tantu juntu e ninguém sôbi? -- estava pasmo
--Purquê eu dava minha marmita prus cavalu cumê e ia comprá quentinha cum dona Juvença. -- explicava -- Aí, passava lá pur trás du armazém, pra fingí qui ia cumê no mei do matu, mais na verdadi... -- cochichava bem baixinho -- Cumia era ela! -- sorriu
Acabou achando graça. -- Eita ferru... -- balançou a cabeça negativamente -- Eu intendu qui di quandu im veiz apareça uma muié qui dexi a genti doidu, mais num podi caí nessa di ficá pulandu cerca, não, uai. -- olhava para o irmão -- Nossas muié também devi di tê us momentu delas, mas num põe chifri im nóis.
--Mais nóis é homi! -- retrucou -- A carni é mais fraca! -- justificou-se
--Ocê tá parecendu inté Ahmed falandu! -- reparou para ver se os parentes ainda estavam longe -- Num tem issu, não, homi, si aceitô casá tem qui si sigurá e ficá cum a famia! -- ralhou -- Já pensô si Penha discobri? E si maama ou baba discobri, já pensô?
--Deus mi livre! -- teve medo -- Eu mi arripindi, apesá di tudu... -- ajeitou-se melhor na cama -- Essa queda mi feiz pensá... Foi um riscu muitu grandi... -- deu um suspiro profundo -- E safadeza... -- reconheceu
--E ocê contô issu pra mais arguém? -- perguntou preocupado -- Arguém discunfiô?
--Não, que nada, discunjuru! -- benzeu-se -- Eu só tô contandu procê! -- garantiu -- E pelu amor du Pai, num conti nada! -- pediu preocupado -- Já mi bastô essa queda pra mi castigá, purque eu sei qui foi castigu! -- falou a última parte da frase um pouco mais alto
--Castigu pelu que, homi? -- Dora perguntou curiosa ao entrar no quarto
--Castigu?? -- Amina cruzou os braços franzindo o cenho -- Quê qui ocê andô aprontandu, hein, mininu?
--Hum... -- Penha estava desconfiada -- Castigu...? -- esfregou a mão no queixo
--Eu achu qui vô dá uma oiada nas criança lá fora, num sabi? -- Georgina afastou-se prevendo o pior
--Uai? -- Nagibe pensava no que dizer -- É qui di quandu im veiz acunteci uns trem na vida da genti qui é um verdadêru castigu, num sabi? -- levantou-se rapidamente -- Cadê o baba? -- queria mudar de assunto -- Eu achu qui o cavalu ficô doidu e tem qui vê isso! -- não sabia o que fazer com as mãos
“Nessi matu tem coeio...” -- Dora pensava cabreira
--Sei... -- Amina estava descrente
--Ocês num mi ingana, não! -- Penha respondeu desaforada -- Eu iscutei Cid falá qui foi castigu! -- repetia a frase do marido -- E si foi castigu, é purque andô fazendu coisa errada!
--O quê qui ocê andô aprontandu, Cid? -- a mãe pressionou -- Eu cunheçu essa tua cara di ratu qui robô queju num é di hoje! -- gesticulou
--Nagibe sabi o qui foi! -- Dora acusou -- Tão us dois aí di comum acordu, cheiu di cuchichu! -- desconfiava do marido
“Ô, qui já vi tudu... vô tê problema im casa pur causo das peripéça di Cid!” -- pensou preocupado -- "Ô, diachu!”
--Eu... -- Cid não sabia o que dizer -- Ai! -- sentiu uma dor nas costelas -- "Mi lasquei foi todu...” -- pensou aflito
--Num mi inrola, não, qui eu sei o qui é! -- Penha aproximou-se do marido -- Ocê mi traiu! -- foi logo dizendo -- Ocê mi traiu e foi mais di uma veiz!!
--O que??????? -- Amina e Dora perguntaram ao mesmo tempo
Nagibe e Cid se entreolharam apavorados.
--Que bafafá é esse que tá acontecendo lá dentro? -- Najla perguntou a Georgina -- Falatório danado! -- estranhou
--Nem quêra sabê, dona Najla! -- respondeu desconfiada -- Vamu ficá aqui brincandu cum as criança que é mió, num sabi?
--Eu possu ixplicá! -- Cid queria se levantar da cama, porém não podia -- Ai! -- sentia dores pelo corpo -- Ai... -- gemia
--Ocê pensô qui eu num sabia? -- Penha cruzou os braços -- Qui eu num sintia? Qui eu num discunfiava? -- olhava para ele de cara feia -- Eu sei num é di hoji! Só tava dexandu chegá o momentu dessa cunversa acunticê!
--Mais, Cid... -- Amina ficou decepcionada -- Eu num isperava issu docê... -- lamentou -- Num foi us insinu qui teu pai ti deu!
--Ocê também andô nessas esparrela, Nagibe? -- Dora perguntou de cara feia
--Eu não! -- respondeu de pronto -- Juru sob Deus e sob o nomi di meus ancestrá! -- beijou os dedos em cruz
--Penha, pur favô, nossu casamentu é bem maió qui isso! -- pedia com olhos marejados -- Eu sei qui errei mais eu ti amu! -- jurava -- Num mi dêxa pur causu di uma bestagi! -- pedia -- Nóis tem uma fia inocenti qui pricisa di eu!
--Eu queru a verdadi! -- deu um soco na mão -- Dêxi di lamentu e mi diga! Queru oví da tua boca!
--Eu também queru! -- Amina concordou
--E eu! -- Dora deu força
--É mió nóis tudu saí e dexá o casár discuti sozinhu, num sabi? -- Nagibe propôs -- É prosiadu sériu pur dimais da conta! Coisa das intimidadi!
--Eu sô mãe deli, eu queru sabê! -- discordou
--E eu sô cunhada e queru sabê também! -- Dora afirmou de cara feia -- E ocê trati di ficá quetu purque podi sobrá pru teu ladu! -- ameaçou
--Carma, Penha, eu ixplicu tudu... -- Cid estava à beira do desespero -- Mais num mi dêxa! -- pedia
--Pur que qui ocê feiz isso?? -- perguntou ofendida -- Pur que? -- emocionou-se -- Num ti fui muié suficiente??
--Num é issu... -- derramou uma lágrima -- Ocê num sabi... Eu juru qui mi arripindi! -- falava a verdade
--Ah, Nagibe, si eu sobé qui ocê participô dessas indecença... -- ameaçava enfurecida
--Juru qui não, muié! -- postou as mãos -- Juru! -- garantiu -- Fiquei sabendu hoji!
--Ah, mininu, quandu ocê tivé mió dessa queda eu vô ti metê tanta chinelada nu rabu! -- Amina prometeu enfurecida -- E Raed eu nem sei o qui há di fazê! -- gesticulou
--Não, maama, pur favô! -- implorava -- Penha, óia, eu ixplicu tudu! -- chorava -- Foi a maió bestagi da minha vida!
--Pois di agora im dianti eu nunca mais qui façu marmita procê! -- prometeu enfurecida -- Num trocô minha cumida pelas quentinha di dona Juvença? -- gesticulava -- Pois di agora in dianti vai morrê di gastá dinhêru comprandu cumida! -- decidiu
--Cumé??? -- Amina e Dora não entenderam nada
Cid tinha mil pontos de interrogação na cabeça.
--Eu falei cum eli, eu ralhei! -- Nagibe aproveitava a situação -- Eu dissi a eli qui meis quandu a cumida feita pela muié da genti num tá di nossu agradu, num podi istragá, num sabi? -- gesticulou -- Jogô cumida prus cavalu cumê, e óia nu qui deu: castigo! -- balançava a cabeça
--Ocê jogô a cumida prus cavalu, mininu?? -- Amina espremeu os olhinhos -- Ah, mais vai tomá chinelada nu rabu purque ocê num aprendeu issu im casa!
--Eli pensô qui eu num sabia, minha sogra! -- Penha dava queixa -- Mais bastô eu butá os pé no armazém di seu Genaro qui dona Juvença foi logu dizendo: -- preparou-se para imitar a voz da outra -- “Teu maridu cumeu di meu temperu di si fartá! Pareci qui tua cumida num andava du agradu deli, num sabi?” -- fazia careta
--Mais qui pôca vergonha, hein, meu cunhadu? -- Dora repreendeu -- Ocê qui num mi faça uma dessa qui vai ficá sem marmita também! -- falava apontando para o marido
--Deus mi livre! -- Nagibe se benzeu
--É, eu... -- Cid resolveu se aproveitar da situação também -- É verdadi, eu dei a cumida prus cavalu e cumprei quentinha cum dona Juvença! -- assumiu -- Fiz issu pur dez dia. -- secou os olhos molhados -- Traí ocê cumendu fora!
--E eu fazia a cumida cum tantu gostu... -- começou a chorar
--Ai, muié, num chora... -- Dora abriu os braços para acolhê-la -- Cid tevi o qui mereceu. -- encaminharam-se para fora do quarto -- Ocê tá certa, num faça mais cumida pra eli. -- aconselhou -- Aprendê a dá valô!
--Nunca mais, muié, nunca mais... -- prometeu
--Dipois qui ocê miorá, -- Amina dizia de cara feia -- vai tomá chinelada nu rabu! -- prometeu novamente -- Prepara o lombo! -- lançou-lhe um último olhar e saiu do quarto também
Respirou aliviado. -- Avi Maria, qui essa foi pur pôcu! -- desabafou -- Deus seji lôvadu! -- agradeceu
--E foi esse fuzuê todu sem elas sabê du pió! -- Nagibe salientou -- Si as marmita já deru o qui falá, imagina si elas fica sabendu da ôtra muié! -- advertiu em voz baixa -- Qui seji a úrtima veiz qui ocê aprontô! -- falava com o dedo em riste -- Purque si ocê chifrá tua muié di novu e Penha discubrí, Dora vai achá qui eu tenhu curpa e vai sobrá pra mim! -- concluía -- Aí ocê vai apanhá di maama, di baba e di mais eu! -- prometeu -- Dá moli? -- saiu do quarto do irmão
--Avi Maria... -- resmungava consigo mesmo -- Foi a primêra e úrtima veiz qui pulei cerca! -- prometia para si -- Deus qui mi livri!
--O sinhô iscutô o fuzuê lá dentru da casa di Cid? -- Ahmed perguntou desconfiado ao pai -- Argum furdunçu acunticeu! -- concluiu -- Só num sei pelu quê.
--Num quêra mi inrolá falandu das doidiça di seu irmão qui eu num sô besta, não, sô! -- repreendeu o filho -- Mi disséru qui ocê andô si ingraçandu pru ladu da forastêra qui tevi posandu pur aqui, num sabi? -- acusou -- E eu num quéru sabê di ocê si deitandu cum mais ninguém qui num seji Catiúcia! -- falava com o dedo em riste
--Mais eu num tivi nada cum ela, baba! Juru pur todus us mortu da guerra di Cedro! -- dizia a verdade -- Num sei quem lhe dissi issu, mais eu num fiz nada! -- garantiu -- "A muié num mi deu nem tchum...” -- pensava lamentando
--Hum... -- mirava bem o rosto do filho -- Fiquemu conversadu, Ahmed! -- falava com seriedade -- Eu num queru sabê di ocê pulandu cerca di jeitu ninhum!
--Eu sei, baba... -- respondeu desanimado -- E Zinara também mi dissi tanta coisa dispois que fiz a zécomia... -- lembrava -- Eu sei qui tem qui mi aquetá...
--Tô di oio, mininu! Tô di oio... -- ajeitou o cinto nas calças e foi para dentro da casa do filho mais novo
“Inquantu baba vivi di oio im mim, nem imagina qui quem si deitô cum a forastêra foi Cid...” -- pensava chateado -- "Só num intregu eli purque si um dia eu pricisá num vô tê apoiu di ninguém...” -- suspirou -- "Essis são us fatu: quandu si tem uma fama, us ôtro é qui deita na cama e ocê qui leva a curpa!” -- concluía chateado
CAPÍTULO 156 – O Passado que Volta
--Você tem certeza? Pensou com sabedoria, Zahi? -- Farida perguntava agoniada -- Ana xaafa! (Estou com medo!) -- segurava as duas mãos dela -- Os tempos de hoje são ainda mais brutais!
--Não tenha, ya habibi. -- respondeu com carinho -- Eu pensei, conversei com os Superiores, orei a Allah e não há dúvidas em meu coração. -- falava mansamente -- Quero voltar. Preciso voltar!
--Sa'ban ‘alay... (É difícil para mim...) -- pausou brevemente para conter o choro -- Não consigo imaginá-la novamente no meio da guerra! -- queria fazê-la desistir -- E quem vai zelar por Cedro e Suriyyah como você tem feito?
--Você! -- sorriu -- Por todo este tempo temos trabalhado juntas. Você saberá o que fazer sem mim. -- olhava para a outra -- Gidda (Vovó) Selima e giddu (vovô) Raja estarão do seu lado. Eles me prometeram isso.
--Zahi... -- segurou o rosto dela com as duas mãos -- Somente Allah poderia dizer o que se passa em meu coração diante da possibilidade... -- derramou uma lágrima -- Eu não queria vê-la sofrendo novamente as mesmas dores do nosso povo...
--Eu não tenho medo, Farida! -- seus olhos marejaram -- Rihon wa ghaymon wa barkon wa raadon wa tajlon wa naroon! (Vento e nuvens e relâmpagos e trovões e gelo e fogo!) -- segurou o rosto da amada -- Harb Ahliyya (Guerra Civil), sangue, mortes, destruição, terrorismo, mentira, dor! -- também derramou uma lágrima -- Eu não tenho medo de nada disso! -- afirmou com muita verdade -- Allah sempre acende as estrelas quando o sol se põe... -- pausou brevemente -- Sob a guarda do Pai Altíssimo e o conforto do amor que você me dá, sei que posso enfrentar qualquer coisa!
--Allah te protegerá para todo o sempre! -- colou testa com testa -- E você terá meu amor enquanto o infinito durar! -- prometeu -- Meu coração estará contigo Zahi! -- fechou os olhos -- Não importa onde estiver, você nunca saberá o que é solidão!
--Eu sei... -- fechou os olhos também -- Yali maleat aayamee hana, ya habibi... (Você enche meus dias de felicidade, minha querida...)
Afastou-se um pouco da outra e apenas desejou: -- Bismillah! (Quer dizer, boa viagem, referindo-se à próxima encarnação de Zahirah)
--Behebbik ia, Farida! (Eu te amo, Farida!) -- abraçaram-se emocionadas
--Muito me preocupa saber que Zahirah voltará. -- Raja falava para Selima -- Renascer no seio de uma família de Suriyyah justamente nos territórios tomados pelo Estado Radical... -- balançou a cabeça apreensivo -- Já não bastava que nosso Amin voltasse cheio de aleijões... e agora ela... -- lamentou -- Por que não ficam aqui trabalhando como os outros de usritina (nossa família)?
--Amin precisava disso, habibi. Ele foi corajoso e sábio em ter regressado. -- Selima respondeu calmamente -- Ele precisava novamente se ver diante da dor para buscar resistir aos impulsos violentos que o levaram ao terrorismo na última encarnação. -- olhava para Zahirah e Farida abraçadas -- E a menina quer voltar porque se vê na necessidade de cumprir uma missão... -- sorriu -- Sei que cumprirá! -- afirmou com convicção
--Eles serão novamente refugiados... -- lamentou
--Mas não a vida inteira. -- olhou para o amado -- Raja, albii (meu coração), você não confia mais nas palavras do Rabi? -- sorria para ele -- O destino do planeta Água será ditoso! -- tinha fé -- Todos estamos trabalhando para dar cumprimento a esta promessa! -- lembrava -- Não devemos ter pena de Amin ou de Zahirah, mas orgulho!
--Ya bajat al-rouh (Prazer da minha alma), perdoe este velho teimoso... -- sorriu também -- Você está certa! -- concordou -- Eles se sairão bem e nós estaremos aqui, zelando por todos, abaixo de Allah!
--Inshallah! (Se Deus quiser!) -- a mulher falou com as mãos para cima -- Nunca se esqueça, ya habibi: Allahu Akbar (Deus é Grande)!
--Akbar, akbar! (Grande, grande!) -- ele complementou
***
Zinara voltava tarde do trabalho para casa. Lembrou-se que deveria comprar pão e desceu do ônibus perto da padaria. Após receber o saquinho, foi pagar no caixa e deu de cara com a televisão. A imagem de um pequeno menino morto em uma praia de Bizâncio fez com que paralisasse no meio do caminho.
--Oh, Aba... -- emocionou-se -- Ghunf, wafaah... (Violência, morte...) -- bombas explodiam bem longe em seu subconsciente -- Awlaad... (Criança...) -- falava sozinha -- Refugiados...
Amina e Raed assistiam TV na casa de Cid e ao ver o menino, ambos se levantaram do sofá imediatamente.
--O qui foi? -- Cid e Penha perguntaram ao mesmo tempo
O casal se entreolhou emocionado.
--Lissa faker? (Você lembra?) -- Raed perguntou com os olhos marejados -- Hassan, Jamal... -- derramou uma lágrima -- Al Maghrib...
--Awlaad... -- Amina também derramou uma lágrima sentida -- Smalla'Alik, awlaad! (Deus proteja você, criança!)
--O qui meus sogru tão falandu? -- perguntou para o marido
--Eu num falu a língua di Cedro, muié... -- olhava para os pais -- Mais elis devi di tá lembrandu das tristeza du passadu... -- teve pena deles -- O minininhu mortu devi di tê tocadu fundu... -- também se emocionou
Najla estava na casa de Marco. Os dois assistiam televisão abraçados na cama.
--Oh, Aba! -- a mulher se desvencilhou nervosamente e levantou-se com as mãos no coração -- Xajlaan, wafaah... (Vergonha, morte...) -- os olhos marejaram -- Awlaadii... (Minha criança...) -- ficou triste
--Minha dama! -- levantou-se também e parou do lado dela -- Essa criancinha morta mexeu com você, não foi? -- perguntou delicadamente
--Refugiados... -- derramou uma lágrima -- Usritii... (Minha família...) -- olhou para ele -- Refugiados... -- começou a chorar -- Essa é nossa história... -- estava muito emocionada -- Usritii... Se não foram refugiados, foram mortos... -- chorava com tristeza -- E eu fugi, habibi... eu fugi...
--Ah, meu amor! -- abraçou-a com força -- Se eu pudesse, apagava essas lembranças tristes de seu coração. -- emocionou-se
“Um menino, Kitaabii, tão pequenininho e morto na areia da praia... Ele fazia parte de tantos grupos de pessoas que fugiam da dor, do sofrimento, da guerra...
Sou filha de Cedro, Kitabii. Nasci quando a guerra civil começou. Ouvi bombas e vi sangue escorrendo pelo solo em que pisava por toda minha infância. Fui refugiada...
Tenho certeza de que todos aqueles nascidos em Cedro ou Suriyyah, os quais hoje vivemos acolhidos nos braços da Mãe Gentil, não passamos imunes àquelas imagens.
Certas coisas marcam uma vida para sempre...”
CAPÍTULO 157 – Contra a Parede
--Menina, você viu que tristeza? Aquele garotinho morto na praia? -- Magali perguntou para Clarice enquanto caminhavam -- Lúcia chorou e tudo...
--Ai, nem me fale! -- passou a mão nos cabelos -- Zinara ficou super mal, tadinha. -- pensava na amada
--Lembranças, né? -- olhou brevemente para a amiga, que balançou a cabeça -- Imagino. -- respondeu com pesar -- Sua caipira foi uma refugiada, ela sabe como a coisa é.
--Queria que ninguém mais nesse mundo soubesse... -- desejou suspirando -- Mas infelizmente ainda viveremos muitas dores coletivas antes que estas misérias sejam banidas desse planeta... -- considerou
--Cruzes, Clarice, não profetiza assim que me dá medo! -- benzeu-se rapidamente -- Não quero saber de dor coletiva e nem individual! -- gesticulou
--Você se benzendo? -- estranhou -- Acho que realmente você tem ficado mais soft depois de Lúcia... -- brincou para aliviar o clima
--Ih, meu Deus! -- benzeu-se de novo
--O que foi dessa vez? -- acompanhou a direção do olhar da outra e deu de cara com Ana Paula -- Hum... -- fez um bico discreto
A mulher cruzou com as duas professoras pelo corredor e abaixou a cabeça.
--Olha só, faz as merd*s e depois anda assim: cabeça baixa que nem besta amarrada na feira! -- Magali comentou
Achou graça. -- Essa você aprendeu com mamãe! -- olhou rapidamente para trás e viu que Ana Paula já ia longe -- Desde aquela vergonha que ela aprontou comigo, nunca mais teve nem coragem de olhar na minha cara. -- contava -- Se Deus quiser, quando dezembro chegar ela vai embora daqui.
--Você devia ter jogado muita merd* no ventilador! -- afirmou contrariada -- Se fosse eu, aquela professoreca de uma figa não tinha mais um dente na boca! -- gesticulou revoltada
--Não, eu não gosto de enxame. -- fez um gesto -- Ela ficou na dela, não me perturba mais e nem vai perturbar. -- pararam de andar -- Além do mais, já bastou Zinara querendo enforcar o pescoço dela aqui no departamento!
--Claro, né, amiga? -- concordava com a caipira -- Se fosse com Lúcia, eu tinha enforcado a tarada também!
Balançou a cabeça negativamente. -- Ai, não, nem pensar de deixar aquela história crescer. Não gosto de briga, nem de violência! -- afirmou enfática -- Ana Paula já teve o castigo que merecia! -- ajeitou os livros debaixo do braço -- Além do mais, não queria ver Zinara se met*ndo em problemas sérios especialmente agora, que a vida dela tá entrando nos eixos.
Reparou na outra. -- É por isso que você desestressou com o negócio do casamento? -- perguntou curiosa -- Tenho notado que anda mais mansa...
--Mansa? -- fez cara feia -- Eu hein, Magali, parece até que eu sou uma fera! -- protestou
--Fera não é, mas tá com uma fúria pra casar... -- provocou
Acabou achando graça. -- Eu não mudei meus planos, meu bem, tô apenas dando o tempo que minha caipirinha pediu. -- informou -- Mas se até o final do ano ela não tiver definido nada, aí vou dar uma prensa daquelas! -- decidiu -- Zinara vai terminar de entrar nos eixos de uma forma ou de outra! -- garantiu -- Eu sei imprensar alguém contra a parede quando quero!
--Pobre Zinara! -- comentou divertida -- Tô começando a ficar com pena dela... -- brincou
--Boba! -- deu um tapinha no braço da outra -- Vamos trabalhar que ninguém tá com a vida ganha, não! -- deu tchauzinho -- Até mais!
--Até! -- retribuiu o aceno e seguiram por direções distintas -- Pobre Zinara... -- falava sozinha -- Mulheres como Clarice e Lúcia são assim: mansinhas, meiguinhas e todas fofinhas, mas quando se pisa no calo delas... -- riu brevemente -- sai de baixo!
***
Raed e os demais homens líderes de clã estavam presentes na primeira reunião do clube Cedro-Suriyyah após a morte de Rafi. Najla, Amina e outras mulheres participavam também.
Bagdhadhi, uns dos filhos mais jovens de Rafi, discursava na presença dos irmãos, apresentando os planos da família para o futuro do clube e da associação. -- E intonce, depois de umas conversa entre nós, os herdêro, -- indicou os demais -- cheguemo a essas conclusão sobre como que vai funcioná o clube Cedro-Suriyyah daqui pra frente, num sabi? -- olhava para todos -- Nós num vamo mantê o estado de coisa que baba mantinha, mas isso nem no quimba! -- garantiu -- Por isso que convoquei a reunião módi todo mundo sabê e desde já mostrá nossos plano!
--E no finar di tudu, us planu di ocês é qui di hoji im diante vai tê tanta taxa pra pagá qui chega dói! -- Raed resumiu o contexto
Não gostou da forma como o outro colocou a situação. -- Eu queru dizê que baba sustentava esse clube praticamente sozinhu, ya Raed, e num pedia nada em troca! -- gesticulou -- Esse tempo acabô! -- afirmou enfático -- De agora em diante, vai tê mais justiça aqui!
As pessoas ficaram indignadas e começaram a comentar entre si.
--Todo mundo tem que lembrá que esse terreno do clube, -- apontou para o solo -- é da nossa famia! -- apontou para si e para os irmãos -- E que a maió parte do que tem aqui, foi baba que mandô construí! Ele que comprô! -- falava com arrogância -- Num teria associação, museu, espaço social ou mercadinhu se num fosse por ele!
--Alto lá, rapaiz! -- um homem protestou ao se levantar -- Rafi sempri qui recunheceu que num feiz nada sozinhu, não, sô! -- olhava para o outro -- Ocê num podi simplesmenti falá dessi jeitu, comu si teu pai tivessi trabaidu só e nóis tudu aqui di braçu cruzadu isperandu eli terminá!
--Muita genti trabaiô! -- outro ancião se revoltou -- Tem dinheru di várias famia nessi ispaçu aqui!
--E as mão di nossas muié, qui sempri cuidaru da limpeza e num dexaru fartá cumida boa nas festa! -- mais um homem retrucou
--E nóis participava di juntá dinhêru e fazê as economia pras festa! -- uma senhora falou mais alto
Os demais concordavam.
--Eu num acusei ninguém de ficá de bestagi! -- defendeu-se -- Mais ocês tudo hão de recunhecê que sem abuuya (meu pai), isso aqui nunca que ia existí! -- repetiu enfático -- Intonce de agora em diante, todo mundo paga mensalidade, taxa e mais os outros trem que eu mostrei!
--Até agora ocê tá só pensadu em fazê du clubi um modu di ganhá dinhêru, num sabi? -- Raed afirmou ao se levantar -- Jogandu na cara di nóis tudu qui teu baba financiô us trem e nóis entremu só cum us braçu módi trabaiá! -- olhava firmemente para o homem -- Só qui dinhêru sozinhu num finca um morão nu chão, num levanta paredi e anêim faiz um terrenu alagadu virá essa boniteza qui nóis tem aqui hoji!
Todos apoiaram.
--Tem veiz qui Raed fala uns trem certu qui chega dói, num é, muié? -- Amina perguntou para a cunhada
--Concordo! -- ela respondeu
--Ya Raed, eu sei que o sinhô é muito respeitado pela sua luta na resitença de Cedro, mas... -- Bagdhadhi começou a falar
--Ocê num sabi é di nada! -- interrompeu-o com firmeza -- Minha famia mais eu, -- bateu no peito -- fomu us primeiru estrangeiru a si firmá aqui nessas terra. -- afirmou com propriedade -- Dispois é qui us ôtru foru posandu e si num fossi pur nóis, a comunidadi num tinha criscidu comu cresceu!
--Verdadi! -- muitos concordaram
--E di tudu qui nóis pudia prosiá, us assuntu mais importanti qui nóis qué tratá num é di suas taxa, não! -- continuava falando -- Nóis qué falá dus refugiadu di Cedro, di Suriyyah, da Babilônia e di todus us cantu ondi o Estadu Radicár e as guerra do Orienti tem feitu disgracêra cum o povu! -- gesticulava -- Nóis qué discutí o modu comu nóis vai recebê essas pessoa aqui! Seji em nossas casa, seji nu clubi!
--É issu meis! -- concordavam
--Isso, Raed! -- Najla apoiava
--Pois num tem o que prosiá! -- Bagdhadhi se opôs de imediato -- Eu e meus irmão é contra! -- deu um soco na mão -- E num vai entrá refugiado nenhum aqui pra vivê nesse clube! E nem nessa cidadi!
Os anciãos se escandalizaram. -- Mais comu qui pódi? -- perguntavam-se
--Quem ocê e seus irmão pensa qui são?? -- Amina se levantou enfurecida -- Comu qui nóis, qui um dia fomu tudu refugiadu, podi fechá as porta pru nossu povu dessi jeitu?
--Lembre-se que a família do seu pai era toda refugiada, rapaz! -- Najla também se levantou para protestar -- E que rodou por vários países até vir parar em Guaiás! -- repetia as histórias de Rafi -- Vocês podem até mandar no clube, mas não têm o direito de dizer quem entra e quem não entra aqui nessa cidade!
--As sinhora trati de se sentá porque aqui as muié só ouvi! -- Bagdhadhi repreendeu de cara feia
--E ocê trati di baxá a voiz pra elas, purque si minha muié e minha irmã qué falá, num vai sê um frangu qui nem ocê a impidí! -- Raed ameaçou de cara feia
“Tem veiz qui essi homi fala di um jeitu qui mi dá um orguiu!” -- Amina pensou toda prosa
--Vejo que com o clã do falecido ya Rafi não temos o que dialogar. -- Najla olhava para todos -- Nós somos os refugiados do passado ou então somos filhos desses refugiados! -- discursava com propriedade -- Um dia precisamos de uma nova terra pra recomeçar a vida e eis que surge Terra de Santa Cruz, a Mãe Gentil que nos abriu os braços, e aqui estamos! -- caminhou para o centro da roda -- Temos uma obrigação moral de ajudar nosso povo, os irmãos de Suriyyah ou da Babilônia ou seja lá de onde for! -- falava com sentimento -- Se o clube agora virou uma possessão dos herdeiros de ya Rafi e decidiu manter as portas fechadas àqueles que hoje precisam de ajuda, façamos nós a diferença! -- convocou -- Vamos abrir nossas casas e receber quantas pessoas pudermos!
--Isso é doidice! -- Bagdhadhi retrucou -- Essa cidade num vai aguentá recebê um tantão de gente faminta e miserávi! Pra vivê de quê?
--De trabalho honesto de várias formas! -- Najla respondeu de pronto -- Não foi o que todos aqui fizeram? Não foi o que o seus ancestrais fizeram? -- provocou
--Du jeitu qui nóis fizemu! -- Amina complementou -- Cheguemu aqui sem nada e hoji nóis tem inté um roçadu! E nossus fio tudu tem casa e du qui vivê!
--Elis vão vivê cum a capacidadi qui nossu povu sempri tevi di recumeçá du zeru! -- Raed afirmou emocionado -- Quem tá cum nóis levanta a mão! -- levantou a dele
A maioria esmagadora levantou a mão, a exceção da família de Rafi e de mais alguns de seus bajuladores.
--AHHa! -- Bagdhadhi reclamava de cara feia -- Já que inventaru essa de recebê refugiado, isso é problema de cada um! Só num vem pedi ajuda a minha famia! -- olhava para todos -- Agora eu queru sabê é do pagamento das taxa! Pois eu digu que quem num quisé pagá tá fora! -- ameaçou
--Pois eu sô cunselhêru dessi clubi desdi qui si fundô! -- Raed parou frente a frente com o homem -- Mió dizendu, eu era! -- olhava nos olhos -- Agora num queru mais fazê parti dissu! -- declarou em alta voz -- E num pagu é taxa ninhuma!
--Anêim! -- outros disseram
--Nem eu! -- mais alguns apoiaram a postura de Raed
--Pru infernu cum essas taxa! -- as mulheres gritaram
--Mais deixa eu perguntá: tá todo mundo querendo abandoná o clube, por acauso? -- Bagdhadhi estava nervoso -- Óia que se quisé vortá num vai tê vorta! -- ameaçou
--Quem si recusa a fazê parte dessa bestagi larga o clubi! -- Raed convocou os demais -- Vamu simbora! -- gesticulou -- Rifdouhou birrouhou mali ‘oul! (Coração do nosso Oriente, para todo sempre!) -- gritou
--Cedro!!!! -- todos os antigos refugiados responderam em coro
Os filhos de Rafi cochichavam nervosamente sem saber o que fazer enquanto viam as pessoas se retirando. Bagdhadhi começou a gritar chamando o grupo de volta mas foi sumariamente desprezado.
--Fiquei orguiosa docê, homi! -- Amina elogiou o marido -- Butô o bicho nu lugá deli, imprensô nas paredi, num sabi? -- sorria -- Agora tá lá gritandu qui nem um bizerru dismamadu! -- riram
--Ocê achô? -- perguntou meloso
--Mais e num é? -- deu um beijinho envergonhado no rosto dele
--Uai... -- o homem corou
“Hum...” -- Najla pensou divertida -- "Olha só meu irmão e Amina se ensaiando numa lambição...”
--Intonci... -- segurou a mão de Amina receoso -- Tem qui honrá meu paper nessa comunidade...
--E honrô! -- concordou satisfeita -- Vamu simbora pensando im quandu marcá uma ôtra riunião cum a comunidadi módi discutí um jeitu di recebê o povu!
--Vamu falá cum Zinara! Ela podi orientá nóis! -- aconselhou -- Eu num sei comu qui entra im contatu cum o povu notrus cantu fora di Terra de Santa Cruz. Ela devi di sabê!
Najla ficou pensando enquanto caminhavam. -- Falemos com Zinara sim, mas eu ainda lembro de alguns caminhos... -- olhou para o casal -- Ouçam o que vou dizer a vocês! -- a ex fazendeira sentia-se tocada por algo especial -- Quando eu recuperar minha fazenda, e eu vou recuperar, -- tinha fé -- levarei comigo quantos refugiados eu possa! -- prometeu -- Najla Raja é mulher de palavra e se digo que farei, eu farei!
--Pra fazenda? -- Raed se surpreendeu -- Tem certeza, muié?
--Eu recebi refugiados uma vez e falhei! -- pensava neles mesmos e se emocionou -- Quero consertar isso com outras famílias. Com quantas puder acomodar! -- derramou uma lágrima -- Demorei muito tempo na vida pra descobrir meu destino, até que a imagem daquela criança na praia me despertou! -- falava mais para si do que para os outros -- Minha missão é essa: dar uma nova chance a quem precisa de abrigo e paz!
--Cum todus us teus erru, muié, ocê deu... -- Amina afirmou igualmente emocionada -- E há di fazê mió agora!
--Nóis tá du teu ladu, Najla! -- Raed garantiu -- E nossa famia qui mora nu Céu há di também istá!
Selima e Raja olhavam orgulhosos para seus dois filhos.
***
Zinara abriu a porta do apartamento e curvou-se indicando a entrada para o amor da sua vida. -- Ghafwan! (Seja bem vinda!) -- falou cheia de mesuras -- Meu humilde lar se abre para Al Sitol Nisaa! (A Rainha das Mulheres!)
--Você agora cismou de me chamar assim... -- respondeu dengosa e entrou
--Falo a verdade. -- entrou também e fechou a porta -- Por acaso você não é Al Sitol (A Rainha)? -- sorria -- A caipira aqui é toda pra te servir! -- aproximou-se lentamente
--A caipira aí, -- segurou-a pela roupa -- é toda safada! -- beijou-a
--Safadeza exclusiva! -- abraçou-a pela cintura -- Exclusivíssima! -- beijou-a sem pressa
--Acho... bom... viu? -- respondeu entre beijos -- Eu não divido minha caipira com ninguém! -- afirmou dengosa
Tirou os sapatos. -- O que é de uma rainha é somente dela, ya habibi! -- levantou-a no colo -- A partir de agora, apenas relaxe! -- caminhava para o banheiro -- WItrouk el baqi a’alateh. (E deixe o resto comigo.)
--Ai, eu não canso de bendizer a moça que me convidou pra compor a banca de qualificação em cima da hora. -- sorria -- E a menina ainda foi tão inspirada que marcou a defesa justo em um dia quinta-feira... -- comentava satisfeita -- Amanhã ainda teremos uma reunião de planejamento...
--Ana mabsoutah! (Estou feliz!) -- chegou no banheiro e entrou no box -- Graças a tudo isso, terei Sahar do meu lado até domingo! -- colocou-a de pé -- Diga se poderia acontecer algo melhor? -- abraçou-a com força e beijou-a demoradamente -- Já não via a hora de bousa ala shafayef (beijo nos lábios)! -- sussurrou e beijou-a mais uma vez
“O destino de minha bousa é viver doida por causa dessa caipira...” -- pensou excitada -- E você... -- sentia mãos ágeis procurando despi-la -- fica feliz com isso porque... -- lábios famintos devoravam seu pescoço -- só pensa... -- ficou arrepiada -- em fazer safadeza comigo... -- retrucou dengosa -- Ai... -- gem*u -- "Gente, ela já me deixou toda nua...” -- fechou os olhos -- "Muito rápida...” -- sorriu -- Ai, Zinara, você tá cada vez mais safada, sabia? -- reclamava melosa -- Pára! -- empurrou-a para que se afastasse -- Pára! -- fazia um dengo
--Tem que ser eficiente! -- começou a se despir com pressa -- Não se pode fazer feio com Sahar! -- sorria -- Chega de dar rata nessa vida! -- ficou nua também -- Tô em busca da qualidade total! -- abaixou-se e começou a beijar e morder as pernas da outra
Achou graça. -- Você só não é eficiente na hora do compromisso... -- segurou a namorada pelos cabelos -- Mas pra safadeza é muito! -- sentia as mãos da outra pressionando-lhe as nádegas -- Tô precisando te imprensar contra a parede pra ver se vai! -- mordeu o lábio inferior -- Ai! -- gem*u
Levantou-se. -- Você gosta contra a parede? -- segurou-a pelas coxas e fez com que as pernas lhe envolvessem a cintura -- A’jabani haqqan! (Eu gosto muito!) -- imprensou-a contra a parede -- Muito... -- deslizou uma das mãos para o sex* da amada
--Ah... -- gem*u mais alto -- Você é muito sem vergonha, Zinara Raed... -- sentia prazer com os lábios que lhe devoravam o pescoço e a mão que a estimulava -- Ai... -- envolveu o pescoço da morena com os braços
--Calor? -- subitamente abriu o chuveiro
--AH! -- deu um gritinho e riu brevemente -- Essa água gelada... -- sorria -- Ah! -- gem*u
--Kont fein yalli qalbak maaya? (Onde você andava, você cujo coração é meu?) -- sussurrava no ouvido enquanto penet*ava -- Kont fein ya shaghili hawaya? (Onde você andava, você que roubou meu amor?) -- movimentava-se ritmicamente contra a outra
--Ai, amor, ai… -- gemia e respirava sofregamente -- AH! -- gritou ao sentir a outra mão da amante comprimindo um ponto em sua coxa -- Ai!
--Não é melhor assim? -- sussurrou no ouvido mordendo a orelha
--Com você tudo é maravilhoso! -- respondeu muito excitada antes de beijá-la
Permaneceram em um gostoso amasso por mais alguns instantes até que Clarice atingiu o orgasm*. Arranhava as costas da outra e gemia falando coisas sem sentido.
***
--Uma vez refrescada e bem alimentada, hora de levar Sahar pra cama! -- seguia carregando a paleoceanógrafa no colo
--Você não se limitou a me dar banho e lanche, dona Zinara. -- beijou o rosto dela -- Não mesmo... -- referia-se ao fato de terem se amado no chuveiro e em cima da mesa da cozinha -- Safadinha... -- fingiu que ralhava
--Uai? -- deitou-a na cama -- As outras coisinhas fazem parte do tratamento exclusivo de minha Sitol (Rainha). -- deitou-se ao lado dela -- Não tá do seu agrado? -- virou-se de lado e abraçou-a pela cintura -- Hein? -- beijou-a
Virou-se de lado também. -- Você sabe que me deixa louca, minha caipirinha linda! -- beijou-a repetidas vezes -- Behebbik ia, Zinara! (Eu te amo, Zinara!) -- beijou-a de novo -- Dayman betkhaleeeni mebtsmeh! (Você sempre me faz sorrir!) -- sorriu
--Smallah! -- exclamou satisfeita -- Olha só como minha Sahar fala fluente! -- beijou-a com empolgação -- Ah, mas é quero é muito essa mulher pra mim! -- mudou as posições e deitou-se sobre ela
--Quer mesmo...? -- fez um dengo
--Ô! -- beijou-a demoradamente -- Se quero! -- beijou-a mais uma vez
Clarice ficou admirando o rosto da amante, percorrendo os traços de sua fisionomia com as pontas dos dedos. -- Sabe que eu acho seus olhos tão bonitos...? -- falava apaixonadamente -- Parece até que alguém lá em cima passou lápis e rímel quando você nasceu!
Achou graça. -- É a primeira vez que alguém me diz isso. -- beijou-a -- Eu acho tudo em você muito lindo! -- beijou-a de novo -- Tudo, desde os olhos, o sorriso, os lábios até... -- ficou admirando a outra -- Ah, hatee booseh! (Ah, beije-me!) -- beijou-a demoradamente
“Eu sabia que ela achava minha bousa bonita!” -- pensou toda prosa
Gastaram mais alguns segundos se admirando mutuamente. -- Tenho umas coisas pra te contar. -- Zinara quebrou o silêncio -- Eu ia esperar mais um tempo pra dizer, só que você acha que eu não me mexo, então... -- mudou de posição e deitou-se de barriga para cima -- Tô tratando de iniciar um pós doc e conversei com os colegas da Federal de São Sebastião. -- olhava para a outra, que mudou de posição também e deitou parcialmente sobre o corpo da morena -- Eles ficaram de me responder em novembro, mas se adiantaram e já me disseram que a vaga tá disponível e tem tudo pra ser minha. -- Clarice ficou animada -- Vou ficar um ano em sua cidade e nesse meio tempo a gente vai se acertando em como resolver a vida.
Beijou-a repetidas vezes. -- Ai, amor, que notícia maravilhosa!!! -- sorria de orelha a orelha -- E como vão ficar as suas coisas aqui em Cidade Restinga? -- perguntou curiosa
--No trabalho tá tudo certo, porque tô resolvendo com os colegas e os alunos. -- respondeu de pronto -- E esse apartamento eu vou deixar quieto. De quando em vez passo aqui pra dar uma olhada. -- pausou brevemente -- Quanto a isso, macleech (não se preocupe).
--Mas... -- pegou uma pequena mecha do cabelo da morena e ficou brincando -- Você tá mesmo disposta a viver comigo em São Sebastião? -- desviou o olhar -- Mudar de vez, pra valer? -- perguntou interessada -- Não deve ser fácil deixar tudo que você tem aqui pra recomeçar em outro lugar... -- considerou
--Sa'ban ‘alay... (É difícil para mim...) Não vou negar. -- assumiu -- Eu adoro viver em Cidade Restinga, esse apartamento é bom, tenho um emprego que amo, gosto do departamento, gosto das pessoas... -- olhava para a amada -- Por ser um estado pequeno, meu status aqui é interessante porque a gente acaba conhecendo as pessoas influentes, os políticos... -- contava -- Não que eu faça questão de andar no meio desse povo, porque eu nem ando, mas é algo que facilita a vida sob muitos aspectos. -- pausou brevemente -- Em São Sebastião eu sou apenas mais uma no meio de muitos.
--Entendo o que você diz... -- olhou para a astrônoma
--Só que o amor da minha vida mora em uma cidade, eu moro em outra... não dá pra viver indefinidamente um relacionamento a base de telefone, internet e viagens esporádicas. -- considerou -- Tenho que escolher entre ficar do seu lado mesmo ou simplesmente me acomodar. -- acariciava o rosto da amada -- E tudo tem um preço, não é? -- sorriu -- Yama kan nifsi aqablak baqali zaman... (Por tanto tempo eu desejei te encontrar...) -- cantarolou suavemente -- Khalas we hahlam leih... (E agora, não há mais necessidade de sonhar...) -- continuava cantando -- Mana ana hinna ganbi aghla el nas... (Já estou aqui diante da pessoa mais preciosa...) -- aproximou os rostos -- Ana ganbi ahla el nas... (Eu estou diante da pessoa mais linda...) -- beijou-a com carinho
“Ai...” -- pensou embevecida -- Quer parar de me seduzir e falar sério, amor? -- pediu melosa -- Temos um problema aqui eu quero resolver da melhor forma pras duas...
--Kulle muskila wa-liiha Hall. (Todo problema tem uma solução.) -- afirmou calmamente -- Com tudo pronto pra esse pós doc, arrumo um canto pra viver na cidade e daí vamos cuidando de nossa vida como vai ficar.
--Como assim arruma um canto pra viver na cidade? -- retrucou -- Você vai ficar lá em casa! -- decidiu -- E nem pensar de ir pra outro lugar!
--Sahar, presta atenção, ya gamil (minha linda). Eu não fiquei fazendo minhas considerações e pensando numa solução pra nós à toa, sem base nenhuma, porque a situação exige cuidado. -- explicava-se -- Você mora com ya Leda na casa dela. Se eu ficar vivendo lá é bem diferente de passar um final de semana ou uns dias com vocês. -- considerava -- Tenho que ficar pousando em outro lugar pra gente poder ir decidindo como vai fazer, onde vai viver em definitivo... -- analisava a situação -- Além de tudo, ya Leda tem suas regras, não admite certos comportamentos de nossa parte, e isso tá no direito dela que a gente tem que respeitar! -- observou
Clarice acabou concordando e balançou a cabeça. -- E eu também não tenho coragem de simplesmente sair de casa e deixá-la sozinha... -- confessou -- Mamãe é idosa, só pode contar comigo mesmo e eu me sentiria como que abandonando minha velhinha...
--A gente tem que morar num canto perto da casa dela, Sahar. -- afirmou -- Aí daria pra passar lá todo dia e não deixar ya Leda desamparada. -- pausou brevemente -- O negócio é encontrar esse canto e ter dinheiro pra pagar, porque em São Sebastião é uma carestia que só! -- revirou os olhos
--É... -- respondeu pensativa -- Sabe que parece que finalmente me caiu a ficha de que nossa situação não é fácil? -- reconheceu -- E vai exigir sacrifícios de todo mundo...
--Nada que não possamos resolver! -- beijou-a -- Basta fazer os trem com cuidado e ter a paciência necessária... -- beijou-a novamente
--Você vai querer mesmo experimentar uma mudança tão grande por minha causa? -- perguntou insegura
--Hobik, ya ghali, ghayarli hali... (Seu amor, minha preciosa, mudou meu visual inteiro...) -- novamente deitou-se sobre a namorada -- O que seria mais uma mudança na minha vida...? -- beijou-a apaixonadamente
“Ai, quando ela fala desse jeito...” -- pensou derretida -- Vem, amor! -- começou a despi-la
E nisso a campainha toca cheia de fé.
--Ô, meu Pai, dai-me forças... -- Zinara interrompeu o que fazia -- Lá vem ela me infernizar o juízo... -- revirou os olhos prevendo quem seria
--Será que é a sua síndica? -- perguntou descrente -- Às nove e pouco da noite? -- olhava para o relógio
--Quer ver? -- levantou-se contrariada ante a insistência dos toques -- Yahda’u! (Fique calma!) -- respondeu em voz mais alta -- AHHa! -- foi até a sala
--Gente... -- a paleoceanógrafa se sentou na cama -- Isso é hora de vir pra casa dos outros numa quinta à noite? -- resmungou
--Zinara, temos que ter uma conversa séria! -- entrou como um foguete quando a morena abriu a porta -- Você não sabe o que ouvi em alto e bom som quando tava na garagem fuçando no lixo! -- sentou-se no sofá -- Pode se sentar, por favor. -- ofereceu
--Ya sayyida (A senhora) agora também fuça o lixo do prédio, é? -- estava incrédula -- "A que ponto se chega!” -- pensou ao se sentar
--Ouvi coisas e preciso de sua ajuda pra descobrir as origens! -- falava como se não tivesse ouvido o comentário da outra -- A pouca vergonha tem que acabar!
“E não é ela mesmo?” -- Clarice pensava ao chegar na sala -- Boa noite. -- cumprimentou educada e se sentou do lado da namorada
--E essa é quem? -- parou para examinar a paleoceanógrafa -- Ainda não te conheço, mulher! -- cobrou explicações -- Ou será que conheço e não lembro? -- avaliava a outra de cima a baixo
--Será que pode ir direto ao assunto, ya Julieta? -- a astrônoma cobrou impaciente -- Como pode ver, estamos de bizamaat (roupas de dormir) e nos preparando pra deitar. -- afirmou com seriedade
Julieta não sabia o que era bizamaat mas não se importou. -- Pois eu vou te contar o que houve! -- cruzou as pernas -- Ouvi gemid*s de uma mulher fazendo safadeza com algum macho no chuveiro! -- gesticulou -- E como gem*u, visse? Ave Maria! -- revirou os olhos
A paleoceanógrafa ficou vermelha como um pimentão. -- A senhora ouviu??? -- perguntou apavorada -- "Meu Deus, será que gemi tão alto assim??” -- pensou coberta de vergonha
“Eita, que dessa vez Sahar fez muito barulho...” -- pensou desconfiada
--Entendo porque ficasse em choque, minha filha, é mesmo uma pouca vergonha! -- gesticulou olhando para Clarice -- A voz do macho não se ouvia, não, mas a mulher! -- balançou a cabeça contrariada -- Parecia até as sirenes das ambulâncias da Sasu! -- enfatizou
--E o que a gente tem com isso, hein? -- a caipira cruzou os braços contrariada -- Agora ya sayyida já quer controlar até o que o povo faz dentro de casa? -- perguntou inconformada -- Faça-me o favor, AHHa! -- reclamou
--Zinara, pelo amor do Pai, isso não pode continuar! -- protestou revoltada -- Fazia tempo que eu não ouvia essa gem*deira escandalosa no prédio, mas a pouca vergonha voltou! -- afirmou de cara feia -- E o ai, ai, ai da mulherada vem sempre da mesma direção! -- gesticulava como doida -- Só não consigo identificar o apartamento! -- deu um soco no braço da poltrona
--Ai, ai, ai da mulherada?? -- olhou de cara feia para Zinara -- Mulherada??? -- repetiu a palavra
--Pois é, minha filha, aqui nesse prédio tem disso! -- respondeu para Clarice -- Nem sei como vocês não ouviram essa de hoje! -- gesticulava -- Pior do que esse escândalo, só mesmo a rapariga do negócio de boi! -- lembrava
--Negócio de boi??? -- continuava olhando de cara feia para a namorada -- Mas que negócio de boi é esse?? -- queria saber
--Ih, mas aquilo foi uma gritaria doida! Nem queira saber! -- comentou escandalizada -- Eu acho que era uns negócios de boi, de vaqueira, sei lá dessas perdições! -- olhou para cima -- Queima, Senhor! Aleluia! -- glorificou -- Segura, Pai!
“Ô, pistinga dos infernos, é hoje...” -- a morena pensou preocupada -- Ya Julieta, chega! -- levantou-se decidida -- É melhor ya sayyida voltar pro seu apartamento e cuidar da vida, não sabe? -- foi até a porta e a abriu -- Não me interessa quem anda gem*ndo por aí! -- ficou olhando para ela esperando que se retirasse -- Wa la te shaghilny, min fadlik! (E não me aborreça, por favor!)
--Eu não sei porque pensei que podia contar com seu apoio! -- levantou-se contrariada -- Você gosta de ser uma eterna oposição ao meu mandato! -- caminhou até a porta -- Mas não adianta que ninguém vai me derrubar! -- garantiu -- Comigo não tem impeachment! E minhas contas, ninguém rejeita! -- gesticulou ao sair -- Ninguém! -- repetiu
--AHHa! -- fechou a porta -- Oh, Aba, me perdoe, mas ya Julieta é um espírito obsessor no meu caminho! -- resmungava de cara feia -- Dah JaHiim! (É um inferno!)
--Zinara Raed! -- Clarice aguardava no meio sala de braços cruzados -- Quero entender direitinho que história de ai, ai, ai da mulherada é essa! -- cobrou de cara feia
“Eita, pau...” -- pensou aflita -- Sahar... -- coçou a cabeça preocupada -- Sempre te disse que ya Julieta exagera, né? -- comentou sem graça
--Que mulherada é essa? -- insistiu perguntando seria e pausadamente
--Uai... -- aproximou-se devagar -- Jamila... -- respondeu de cabeça baixa
--Quem mais? -- mantinha o olhar firme sobre a namorada
--Grazi... -- olhou desconfiada para a outra
--Mais alguma? -- queria saber impaciente -- Qual delas é a do négocio de boi? -- não gostou de saber disso
--Ah... -- pensou bem antes de responder -- Milena...
Deu um suspiro profundo. -- Por isso que teve negócio de boi! -- afirmou revoltada -- Esse apartamento aqui é um abatedouro! -- acusou
--Sahar... -- protestou como criança
--Barba ruiva! -- acusou novamente -- Você é uma barba ruiva, Zinara Raed!
--Você cisma com esse trem de barba ruiva... -- reclamou -- Sahar, eu não escondi de você que tive outras namoradas no passado! -- argumentou -- Vai brigar comigo agora por causa das doidices de ya Julieta? -- ficou chateada
-- Quer saber, eu vou me deitar! -- caminhou em passos firmes para o quarto -- E não se atreva a tocar em mim! -- advertiu -- Por hoje tá de castigo! -- decidiu -- "Vou seguir o exemplo de Lúcia e colocar essa caipira na linha!” -- pensou revoltada
Suspirou desconsolada. -- Primeira providência em São Sebastião: -- falava consigo mesma -- procurar um canto com excelente isolamento acústico e uma síndica surda! -- decidiu -- Dah mumill... (Isso é um saco...)
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Samirao
Em: 14/10/2023
Esse CAPS tem umas coisas que eu morro huahuahua
Solitudine
Em: 11/11/2023
Autora da história
Como o que?
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Femines666
Em: 18/03/2023
E é difícil entrar nos eixos com essa vida e essa síndica que a Zinara tem! Kkkk Capítulo lindo! Eu vou lendo direto e dá preguiça de comentar todo capítulo, mas estou amando!!!!
Solitudine
Em: 19/03/2023
Autora da história
kkkk A síndica é um capítulo à parte!
Que bom! Deixe a preguiça vencer não! rs
Beijos,
Sol
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Seyyed
Em: 26/09/2022
Essa ecologia mercantil é foda cara. Gostei de você explicar isso em EBT. E o perna fraca espinha as canela e Amina pensa que o marido vai pro mesmo caminho! Hahaha Casamento da Regi puta merda! E a fazenda tá no papo, né? Jamila e Cátia se mantendo. Lídia é uma graça! Triste a lembrança do menino morto bateu fundo em todo mundo de Cedro.Cid pulou a cerca e foi por um triz! Morri com a síndica entregando a pegação da Zi! ABATEDOURO! hahaha
Resposta do autor:
Que bom que você gostou! Eu achava que faltava um espaço para trazer outras ideias que não gozam do mesmo marketing.
kkkk Amina nunca foi acostumada com romantismo do marido. Aí fica logo desconfiada! rs
A fazendo ainda tem um caminho, mas vamos trilhá-lo.
Jamila e Cátia estão resistindo uma a outra! Lídia é sim uma gracinha.
Aquela imagem do menino de Bizâncio disse muito...
Cid ainda vai amargar essa pulada de cerca. Vejamos.
kkkk Você falou agora que nem a Clarice! rs
Beijos,
Sol
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Gabi2020
Em: 02/03/2021
Ei Solzinha!
Deixa explicar, clica no meu nome aí (Gabi2020), vai aparecer uma história que escrevi e estou postando... Rsrsrs....
Beijos e se cuida tá?
Resposta do autor:
É mesmo?? Vixe, que massa.
Vou ver, mas não será rápido, perdoe.
Beijos,
Sol
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Gabi2020
Em: 29/05/2020
Olá querida tudo bem? Nem acredito que a semana acabou, pense numa pessoa emocionalmente cansada, nossa! Imagino que você esteja fisicamente, emocionalmente e mais um pouco exausta, masssss chegou o fim-de-semana, então a senhorita tente descansar, mas conhecendo você, acho impossível.
Falta de verba é sempre a desculpa para deixar de investir em coisas importantes. Estamos vendo in loco o que essa “falta de verba” está causando, laboratórios fechados, centro de pesquisas sucateados e no meio disso tudo há uma cobrança para que se encontre a solução para o atual problema. Posso estar muito enganada, mas se houvesse investimento em áreas de saúde e tecnologia, talvez a vacina para a essa pandemia estaria mais próxima. Felizmente temos bravos e obstinados pesquisadores que mesmo em condições precárias trabalham por horas a fio em busca de alguma vacina ou medicação . Deixo aqui minha humilde homenagem a todos vocês.
Essas conversas no livro das fuças das velhinhas sempre rendem, adoro a interação delas. Pôxa seu Rafi morreu!
Raed sendo romântico é muito fofo. Meu baba era meio Raed, mas um homem muito justo e adorado por todos. Tem um fato dele interessante, ele sempre foi muito teimoso e um dia teve uma discussão feia com a minha mãe (ele estava errado), ela se chateou e chorou, ai ele pediu que eu fosse a uma lojinha e comprasse um presente pra ela, foi uma forma de se desculpar sem falar nada. Esse era meu baba!
Menina que casamento foi esse? Tô besta aqui com tanto luxo. Mas achei que a Regina ia convidar Zinara para madrinha.
Seleção de vôlei compareceu, que prestígio essa Regina tem! Preciso conhecer essa bicha, tem bom gosto pelo visto, pra ter a seleção de vôlei prestigiando, já ganhou o meu respeito.
Cem mil assim? Chocadaaaaaaa com tanta riqueza!
Eita comemoração boa de Jamile a Cátia!
Zinara não se aquieta nunca!!!
Olha o ogro virando gente! Mas grande parte disso se deve ao Deodoro (que nome!!).
Dona Leda podia falar logo o que está acontecendo, mania de ficar sofrendo sem necessidade.
Super Zinara salvando a pátria!! Gente essa Ana Paula é muito escrota , credo!
Sahar tenta ter calma, mas essa caipira enrola demais... Kkkkkkkk.... Sem perceber Zinara deixa Clarice insegura, pois fica nesse chove não molha, tem que deixar tudo às claras: “Seguinte Sahar, nós vamos nos casar sim, pelo meu cálculos matemáticos, daqui a dois anos estarei estruturada, enquanto isso ficamos nos preparativos.” Simples assim, mesmo que a teoria seja diferente da prática, mas só de falar assim, já passar uma segurança pra Clarice. Eu hein!
Cid se livrou por pouco, pensamento machista dele... Homem pode... Afff....
Lembro bem do menininho morto na praia, tão triste e infelizmente uma realidade que não muda. Até quando meu Deus?
Zinara é tarada demais, que energiaaaaa!!
E oitenta anos depois uma notícia boa para Clarice, Zinara vai pra São Sebastião!! Agora levo fé na caipira.
Clarice é das escandalosas? Não imaginava! Kkkkkkk.... Que coisa!
Zinara tem um talento pra entrar em confusão, que tá louco! Kkkkkkk....
Capítulo maravilhoso, como sempre!
Beijos
Resposta do autor:
Gabinha!
Repare que falta de verba é somente para o bem coletivo. É o lema dos "liberais": Estado mínimo para o povo e máximo para interesses privados de uma minoria seleta.
Essas velhinhas são todas moderninhas. E antenadas. rs
Raed está se esforçando e agora Amina percebe.
Leda procura asilo em silêncio porque infelizmente se acha um estorvo e não quer ser um peso na vida da filha.
Clarice é discreta em tudo, menos na hora H.
Zinara não é tarada, ela apenas aprecia a mulher que tem.
E a síndica que ela tem... valei-me!
Beijos,
Sol
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Solitudine Em: 11/11/2023 Autora da história
Amém!