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EM BUSCA DO TAO por Solitudine

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Palavras: 17476
Acessos: 10465   |  Postado em: 18/01/2018

Notas iniciais:

"O crepúsculo não significa que a Luz se rendeu às trevas, mas apenas que ela surgirá em outro lugar".

O título deste capítulo está escrito em árabe e não tem tradução em português

 

غآسبيّ

CAPÍTULO 106 – Conflitos Familiares

 

--Você realmente esteve com Ar-rabiic (A primavera), Sahar. -- Zinara dizia enquanto descascava as frutas -- Ela era exatamente do jeito como você descreveu. -- olhou rapidamente para a amada -- Smallah! -- exclamou admirada -- Emocionante!

 

--Eu sei que não foi apenas um sonho! -- arrumava a mesa -- E por isso me impressionou tanto! -- pausou brevemente -- As coisas que ela me mostrou sobre o futuro... as revelações... -- observou a namorada começar a colocar as frutas cortadas nos pratos de ambas -- Deu um medo... -- olhou para Zinara

 

--Macleech, Sahar... (Não se preocupe, Amanhecer...) -- respondeu com carinho -- Não é pra ter medo...

 

--Mas Zahirah disse que faltam menos de cinqüenta anos pra acontecer! -- insistiu

 

--Deve ser isso mesmo, -- terminou de servir a ambas -- mas ainda assim, não há razão pra temer.

 

--E você me contava sobre seus estudos e os de Karim! -- continuava falando sobre o sonho -- Você dizia que não conseguia calcular com incerteza aceitável o momento de aproximação do tal astro que vai “puxar” a gente pra verticalizar o eixo do nosso planeta.

 

--Já conversamos sobre isso e é a mais pura verdade. -- respondeu tranquilamente -- Vamos sentar? -- convidou e ambas se sentaram -- Quando publiquei meu mais contundente artigo que discutia sobre essa hipótese, logo após o tsunami de 2010, fiquei muito desacreditada por vários colegas do meio científico. -- comentou -- Nunca tive um aluno que quisesse se envolver nesse tema, certamente por medo de cair no descrédito também.

 

--Eu sei... e embora já tivéssemos conversado sobre isso, acho que a ficha não tinha caído, sabe? -- suspirou -- Lá no meu centro já fizemos vários debates sobre a transição planetária, mas, sei lá... O que sua prima me mostrou... me fez acordar pra verdade!

 

--Ouça o que ela te disse, Sahar: -- segurou uma das mãos dela -- continue no caminho reto e use seu trabalho pra alertar as pessoas, pra alertar os poderosos do mundo. Você tem uma missão e tem todas as condições de cumpri-la. -- sorriu ternamente -- E no mais, confie em Allah! -- soltou a mão da amada e começou a comer

 

--E me pareceu que você não iria seguir do meu lado... -- afirmou com tristeza

 

--Somente Allah pode saber, habibi. -- respondeu sem olhar para Clarice

 

--O que está me escondendo, Zinara? -- perguntou à queima roupa -- Sei que há alguma coisa que ainda não me contou! -- cobrou

 

--Sahar, coma seu café da manhã. -- pediu com delicadeza -- Essas frutas maravilhosas estão aí no seu pratinho, pedindo pra ser devoradas, e você... -- brincava

 

--Responde, Zinara! -- insistiu agoniada -- E olha pra mim! -- pediu

 

A astrônoma gastou uns segundos calada e olhou nos olhos de seu grande amor. -- Confie em mim e não me faça perguntas, min fadlik (por favor). -- respondeu serenamente -- Vamos viver um dia de cada vez, não fique aí temendo pelo meu destino. -- pausou brevemente -- Itrouk el baqi a’alateh. (Deixe o resto comigo.) -- voltou a comer

 

Clarice não gostou da resposta vaga, mas não insistiu. Pegou seu garfo e começou a comer pensando em mil coisas.

 

***

 

--Mas será possível, quem tá fazendo esse fuzuê no meu portão? -- Leda foi até a janela para ver -- Mal amanhece o dia e já vem uma peste me infernizar?

 

--Gente, será que essa barulheira não vai acordar meu marido? -- Raquel perguntou aflita

 

--Humpf! -- Leda fez um bico e puxou a cortina para ver -- Cecília?! -- surpreendeu-se -- Péra, menina, vou abrir o portão! -- gritou para a filha

 

--Ué? O que será que houve? -- Raquel também não entendia

 

--Vamos ver. -- a idosa abriu a porta e foi para o quintal. A filha foi atrás

 

--Mamãe, eu preciso de um colo! -- Cecília afirmou chorosa -- Meu coração tá partido em pedaços! -- fez beicinho -- Sofro tanto que me dá até uma coisa no peito!

 

--E por causa de que, dessa vez? -- aproximou-se do portão -- Já não tinha terminado com aquela última bomba que você namorava? -- separava a chave

 

--Mas a senhora não sabe o que aconteceu anteontem... Ai, não sabe... -- suspirou

 

--Ô, valei-me Deus, e foi o que? -- abriu o portão e estranhou o que viu -- Que tanta mala é essa?? -- arregalou os olhos

 

--Ai, mamãe!! -- agarrou a outra em um abraço de urso -- Eu vim morar com a senhora porque preciso de um colo, carinho e compreensão!!

 

“E mais essa!” -- pensou ao se sentir sufocada

 

--O que?? -- Raquel protestou com as mãos na cintura -- Não tem espaço pra você aqui, Cecília! -- reclamou de cara feia -- Volta pra tua casa! -- ordenou -- Eu hein!

 

 

 

--Hum! -- soltou a mãe e caminhou até a irmã -- E quem é você pra dizer alguma coisa? -- colocou as mãos na cintura também -- Essa casa não é sua!

 

--Tampouco sua! -- retrucou -- E hoje em dia eu sou uma sem teto e você tem onde morar! Logo, deve ficar na SUA casa! -- deu um tapa no ombro da outra

 

--Mas acontece que eu quero ficar aqui! -- bateu no ombro da irmã também

 

--Aí, mulherada! Será que dá pra gritar mais baixo que eu quero dormir, malandragem? -- Getúlio pediu sem sair da barraca

 

--Cala a boca, ogro! -- Leda respondeu de pronto -- E vocês duas, vão ficar de baixaria no quintal? -- olhava indignada para as filhas

 

--Você sempre morreu de ciúmes de mim, né, Cecília? -- discutia com a irmã -- Só porque o destino me trouxe pra junto do seio materno, você logo quis vir também!

 

--Que conversa é essa de seio? -- a idosa reclamou contrariada -- Não foi bem o destino que te trouxe, não, mas as patifarias do teu ogro! -- gesticulou

 

--Goste ou não, eu sou filha também e mereço o seio de mamãe tanto quanto você! -- colocou o dedo na cara da outra

 

--Ih, gente, deixe meus peito quieto! -- resmungou

 

--Volta pra tua casa e deixa a gente em paz! -- ordenou -- Passa, passa, passa! -- apontou para a rua

 

--Tá pensando que eu sou cachorro, é? -- deu um tapa na mão da outra -- Que negócio é esse de passa, passa, passa? -- reclamou de cara feia

 

--Cachorro não é, mas cadela... -- respondeu com deboche -- E cadela no cio!

 

--Ah, mas você vai engolir o que falou! -- agarrou nos cabelos da outra

 

--Solta meu cabelo, sua louca! -- agarrou nos cabelos da irmã também

 

--Ô, galera, vão brigar lá na rua! -- Getúlio saiu da barraca -- Tá dando pra dormir não, tá ligado? -- fazia cara feia

 

--Ah, mas eu vou acabar com essa patifaria aqui no meu quintal! -- Leda decidiu -- Agora vai ser como nos velhos tempos! -- foi até as filhas

 

--Ai, ai! -- Cecília soltou a irmã -- Pára, mãe!

 

--Ai, mãe, pára, tá doendo! -- Raquel protestou também

 

--Toma chinelada no rabo pra deixar de ser besta! -- Leda caprichava nas chineladas -- Tão pensando o que? -- ralhava -- Acaba com essa baixaria! -- continuava batendo

 

--Ai, mãe, isso dói! -- Raquel correu para dentro

 

--Chinelo de borracha, mãe! -- Cecília reclamava

 

--Corre, bicha, e deixa de fazer vexame aqui fora! -- e tome de chinelada

 

--Cruzes, eu hein! -- Cecília correu para dentro também

 

--Eu hein, digo eu! -- respondeu de cara feia -- Duas mulher feita, tudo crescida, e brigando no quintal que nem duas molecas! -- jogou o chinelo no chão e calçou de novo -- Como se não bastasse, ainda tudo atrás de peito meu!

 

--Mandou ver, sogrona! -- Getúlio apoiou -- Essa baixaria aqui não podia continuar, sabe qual é?

 

--Se não quiser levar chinelada no rabo você também, pega as mala de minha filha e põe pra dentro! -- ordenou de cara feia -- Simbora, sujeito! -- bateu uma palma

 

--Calma aí, sogrona! -- correu para pegar as malas

 

--Ô, meu Pai, e qual será a bomba que Cecília vai despejar em cima de mim? -- foi andando desanimada para dentro de casa

 

***

 

--E aí, mamãe, ele veio me procurando com aquele jeitinho sedutor e... -- Cecília contava

 

--Jeitinho sedutor? -- a idosa interrompeu a filha -- O sujeito é um grosso de marca maior, criatura! -- gesticulou -- A sedução dele é o que? Tapa no meio da tua cara ou dedo no teu olho?

 

--Deve ser... -- Raquel resmungou -- Agora ela deve gostar de apanhar... -- riu discretamente

 

--Ah, mamãe, ele nunca me bateu! -- negou de pronto -- E eu acho ele muito macho, tá? -- retrucou

 

--Humpf! -- Leda fez um bico e cruzou os braços

 

--E, aí, como eu tava dizendo... ele veio, me seduziu e... -- pausou brevemente -- aconteceu! -- abaixou a cabeça

 

--Tá, mas e depois da sacanagem? -- Leda queria entender o desfecho da história -- Aconteceu o que?

 

--E depois que... -- olhava sem graça para a mãe -- Eu acordei quase meio dia e... percebi que ele tinha me roubado...

 

--Te roubado?! -- não entendeu

 

--É... -- ficou encabulada -- Ele carregou meus móveis, meu dinheiro e mais um monte de coisas... Só deixou mesmo os móveis de banheiro, meu armário, a pia da cozinha e a cama em que eu dormia.

 

--O que??? -- Leda e Raquel perguntaram ao mesmo tempo

 

--Mas, Cecília, como pode? -- a irmã reclamou -- Como que ele carregou essas coisas todas e você não acordou? Como não percebeu? -- não aceitava -- Ele deve ter usado um caminhão, senão como é que levaria as tralha toda?

 

--Pra começo de conversa, eu não tenho tralha nenhuma! -- protestou furiosa e gastou uns segundos calada -- É que eu tinha bebido um pouquinho de uísque e... -- abaixou a cabeça -- Acho que passei da conta, sabe?

 

--Eu não canso de me perguntar onde foi que eu errei com essas meninas... -- olhou para cima -- Responde, meu Pai, diz pra essa velha sem vergonha onde foi que eu errei!

 

--Ai, mamãe, não fala assim! -- Cecília pediu chorosa

 

--E pra onde aquele traste foi? -- olhou para a filha -- Por que você não deu queixa à polícia?

 

--Mas eu dei queixa... Ontem passei o dia na delegacia... -- suspirou desanimada -- Descobri que ele tá sendo procurado por estelionato, formação de quadrilha e roubo de caminhão...

 

--Maravilha... -- revirou os olhos

 

--Viu, mamãe? Depois a senhora fala do meu Getúlio! -- protestou

 

--Um ogro ladrão não justifica o outro! -- deu um tapa na perna da filha -- E cala a boca aí, que a mãe aqui sou eu! Eu que posso reclamar!

 

--Ai! -- esfregou a perna dolorida

 

-- Eu preciso ficar aqui pra poder refazer minha vida, mamãe! -- olhou para a idosa com olhos súplices -- Por favor, me dá abrigo no teu seio!

 

--Ô, mas que diacho de obsessão com meus peito! -- reclamou

 

--Bom dia! -- Clarice abriu a porta animada e deu de cara com Cecília. Reparando nas expressões das mulheres desmanchou o sorriso -- Nossa, que caras são essas?

 

--SabaaH il-kheer. (Bom dia.) -- Zinara cumprimentou desconfiada -- "Ih, meu Deus, Cecília já chegou de mala e cuia!” -- pensou -- "É hoje!”

 

--Ah, não, Clarice trouxe a outra pra morar aqui também?! -- Raquel protestou ao se levantar -- Só me faltava essa! -- pôs as mãos na cintura

 

--Ué, mas a coisa já tá assim, é? -- Cecília se levantou também -- A senhora falou das minhas malas, mas olha só o mochilão da Zinara! -- apontou -- Aposto que veio pra ficar pro resto da vida! -- gesticulou

 

“Considerando que meu resto de vida não deve ser essa coisa toda...” -- a morena pensou

 

--Alto lá como vocês falam! -- Clarice protestou -- Zinara veio passar uns dias com a gente e mamãe sabia disso e permitiu!

 

--A senhora anda muito liberal, né, mamãe? -- olhou para a idosa -- O pobre do meu marido não pode entrar nessa casa, mas a comunidade GLS faz o que quer! -- gesticulou furiosa

 

“Uai! E eu sozinha sou a comunidade GLS?” -- pensou sem entender

 

--Eu só quero ver se você vai querer me tirar daqui pra dar abrigo a essa tua, tua... -- não sabia o que dizer -- Amiga de arco íris! -- Cecília falava desaforada

 

--Olha, que as duas tão querendo levar mais chinelada no rabo! -- ameaçou ao se levantar

 

--Não venha se meter na minha vida, Raquel! -- protestou furiosa -- Tem comunidade nenhuma aqui! Pior foi teu marido que montou a própria favela bairro no quintal! -- fazia cara feia -- E você também, Cecília, tá se metendo por que, posso saber?

 

“Eita, pistinga dos infernos, o quê que eu faço agora? Se tivesse dinheiro pra pagar hotel...” -- Zinara pensou constrangida -- Karaahiyya! (Que ódio!) -- resmungou

 

--Olha ela xingando palavrão, mamãe! -- Raquel deu queixa -- Por que não dá chinelada nela?

 

A idosa olhou para a morena.

 

--Não é palavrão e eu tô dodói, ya Leda! -- lembrou -- Sou café com leite... -- fez cara de cão pidão -- Bate não! -- pediu

 

--Deixa de falar besteira, gente! -- Clarice retrucou -- Vocês só falam besteira, nunca vi! -- olhava de cara feia para as irmãs

 

--A senhora não vai me tirar daqui por causa dela, mamãe! -- Cecília segurou o braço da idosa -- Eu sou tua filha, ela não é!

 

--E eu também não vou embora! Sou filha da mesma forma! -- Raquel segurou o outro braço -- Eu fico e meu filho e meu marido ficam também!

 

--É melhor eu ir embora... Não quero causar problemas... -- a morena se preparou para partir -- Não cheguei em boa hora, Sahar. -- falou mais baixo para a namorada -- Macasalaama. (Até logo.) -- ajeitou a mochila nas costas

 

--Não! -- impediu a passagem da amada -- Por favor, mamãe! -- olhou para a idosa -- Também sou sua filha e Zinara fica! -- pediu chorosa -- Também quero minha parte no aconchego do teu seio!

 

--Mas será possível que tá todo mundo de olho nos meus peito? -- Leda retrucou ao se libertar das duas filhas que a seguravam -- Não me diga que até você quer? -- perguntou de cara feia para a astrônoma

 

--Laa, ya Leda! (Não, senhora Leda!) -- negou de pronto -- Quero não! -- balançou a cabeça negativamente

 

--Ela também fica, mamãe! Por favor! -- segurou o braço de Zinara -- "Se o marido de Raquel fica, minha namorada fica também!” -- pensou resoluta

 

--Nossa, tá todo mundo aqui! -- Deodoro apareceu na sala -- Eu ia chamar a vovó pra jogar comigo no computador! -- sorriu para a idosa

 

--Pobre criança ouvindo essas tristezas! -- Raquel puxou o menino e cobriu os olhos dele -- Isso traumatiza, viu, mamãe? -- olhou para a idosa -- Esses conflitos familiares, esse liberalismo neo moderno...

 

--Então você devia ter tapado os ouvidos dele, né, Raquel? -- Clarice respondeu ironicamente

 

“Ave Maria, sinto que me dei ligeiramente meio muito mal por demais da conta...” -- Zinara pensou com vontade de fugir

 

***

 

Marco havia chegado na roça há umas duas horas. Raed não estava em casa e o homem conversava com Amina e Najla.

 

--Janaína me contou sobre Ahmed João e me lembrei de um amigo boxeador que tinha uma filha psicóloga. Já naquela época ela era muito bem recomendada. -- contava -- Liguei pra ele e soube que a moça é especializada no trato com crianças e tem um consultório no Setor Sul, perto do Hospital dos Pequenos. -- olhava para as duas mulheres -- Ela disse que pode atender o menino sem problemas quando ele for passar as férias de meio de ano em Gyn, na casa de Aisha.

 

--Oh, Marco, que notícia maravilhosa! -- Najla sorriu embevecida

 

--Muitu agradicida, homi! Di verdadi! -- Amina balançou a cabeça positivamente -- E quantu qui é as consurta dessa piscóloga?

 

--Não se preocupe. Fica por minha conta. -- afirmou resoluto

 

--Que é isso, Marco? -- Najla arregalou os olhos

 

--Anêim! -- Amina protestou -- Ficu agradicida, mas num podemu aceitá, num sabi?

 

--Por favor, eu insisto! -- segurou uma das mãos de Najla e uma das mãos de Amina -- Eu me sinto parte dessa família, será algo feito com o coração! -- falava com sinceridade -- Não me façam essa desfeita, por favor! -- lançou um olhar especial para a namorada

 

--Ai, mas pedindo assim... -- respondeu melosa

 

--Uai... -- Amina recolheu a mão que o homem segurava -- Achu qui Raed num vai concordá cum issu, não... E eu ficu mei sem jeitu... -- abaixou a cabeça

 

--Ah, é... -- Najla recolheu a mão também -- Tem Raed... -- suspirou pensativa -- E ele é mais teimoso que um camelo!

 

--Por favor, deixem que eu converse com ele. -- insistiu -- E não tem porque ficar sem jeito, Amina! -- olhava para a cunhada -- Devo muito a essa família! Ela me deu o tesouro mais precioso... -- pensava em Najla

 

--Ai... -- a ex fazendeira suspirou

 

--Vamos ficar assim: o tratamento do menino corre por minha conta. -- propôs -- Quando as férias dele terminarem a gente combina com a psicóloga como será a frequência das consultas, mas fica sempre por minha conta. Vocês pagam as passagens dele de ida e volta pra Gyn.

 

--Hum... Podi sê... -- Amina considerava -- E si ocê qué falá cum Raed...

 

--Eu falo! -- respondeu resoluto -- Certas coisas têm que ser de homem pra homem!

 

“Diz se não é um negão de tirar o chapéu?” -- Najla pensava apaixonada

 

***

 

--Intonce qué dizê qui ocê qué pagá us tratamentu di meu netu? -- Raed perguntou desconfiado -- E tudu pur causu du teu amô pur minha irmã? -- olhava para o outro

 

--É isso mesmo! -- respondeu resoluto

 

--E ocê acha qui eu num veju o qui tá pur ditráis dessa tua bãodadi toda? -- fez cara feia

 

Achou graça do que ouviu. -- Não há nada escondido! -- retrucou

 

--AHHa, qui eu num sô besta, não, homi créu! -- levantou-se -- Sei qui ocê qué fazê issu modi eu num mi aborricê cum o qui tá acunticendu! -- falou mais alto -- Mais eu já mi apercebi di tudu qui ocês iscondi!

 

--E o que é que tá sendo escondido? -- levantou-se também e encarou o cunhado

 

--A tua pôca vergonha mais Najla! -- respondeu de pronto -- As safadeza, us assanhamentu!

 

--Ah, faça-me o favor, Raed! -- protestou contra o absurdo da situação -- Najla e eu somos dois adultos! Não te devemos satisfação de nada!

 

--Pois ocê pensa qui o céu é pertu, mais né não, seu créu! -- sacou facão -- A honra di minha irmã eu defendu! A honra da famia eu defendu faiz é tempu! -- segurou-o pelo colarinho -- Num é di hoji qui eu tinha um particulá di homi pra homi modi tratá cuntigu, num sabi?

 

--Eita! -- arregalou os olhos -- "E eu que não vi que ele tava de facão à tiracolo!” -- pensou engolindo em seco -- Que conversa é essa?

 

--Ocê vai casá cum minha irmã e vai sê agora! -- ordenou -- Sinão corto teus trem di homi fora, num sabi? -- mirou o facão entre as pernas do outro

 

--Mas eu quero casar! -- tentava se desvencilhar -- Só não pode ser assim, desse jeito!

 

--Ah, num podi? Intão fica sem os trem di homi! -- levantou o facão -- Queru vê abusá das irmã dus ôtro dispois dissu!

 

“Eu não posso deixar isso acontecer!” -- pensou desesperado -- Me larga, seu louco! -- deu um soco na barriga do outro

 

--Marditu! -- sentiu dor e soltou o colarinho de Marco -- Ah, mas agora vô picá teus trem e sirví prus porcu cumê! -- rosnou enfurecido e mirou o facão de novo

 

--Vamos ver! -- agarrou o cunhado pela cintura e caíram os dois no chão -- Larga! -- apertou o pulso dele com força, fazendo-o soltar o facão -- AH! -- gritou

 

--Mais qui diachu! -- Raed reclamou -- Ocê tá cum us dia di créu contadu, seu infiliz! -- socava a cabeça dele -- AHAH! -- gritou também

 

--Miserável! -- rolavam brigando no chão

 

--PAREM COM ISSO!!! -- Najla berrou ao se aproximar -- PAREM!!!

 

E os homens continuavam brigando.

 

--Oh, Aba, e agora? -- não sabia o que fazer -- SOCORRO!!! -- gritava desesperada -- SOCORRO!!!

 

Amina veio correndo. -- Oxi, dêxi di sê lesa e agi! Toma aqui, muié! -- deu um pano molhado nas mãos da cunhada -- Vamu acabá cum essa bestagi agora! -- bateu com o pano nas costas de Raed -- Dêxa di fulerági, homi! -- ordenou -- Pára!

 

--Ai, muié! -- reclamou ao sentir dor -- AHHa!

 

--Pára, Marco! -- Najla não sabia onde bater -- E agora? -- pensava indecisa

 

--Anda, muié, pareci uma pomba sem fé! -- Amina reclamou -- Larga eli, homi! -- insistia batendo no marido

 

--AHHa! -- reclamava -- Pari di mi batê, Amina!

 

--Pára, Marco! Ou vai levar um pano na ridfaan (bunda)! -- ameaçou

 

“Que será ridfaan?” -- pensou intrigado, mas logo descobriu ao sentir a cipoada -- Ai!

 

--Diachu di homi pra brigá! -- Amina continuava batendo

 

--Avi Maria, qui issu dói! -- Raed se desvencilhou do outro -- Só eu qui apanhu, aHHa! -- sentou-se de cara feia

 

--Chega, né, Marco? -- a ex fazendeira perguntou cruzando os braços

 

--Não fui eu quem começou a briga. -- sentou-se também -- Seu irmão queria me castrar! -- deu queixa

 

--Eu queru é qui ocê dê dignidadi pra minha irmã e casi cum ela, issu sim! -- Amina o ajudava a se levantar -- Oxi, qui uma lambada dessis panu dói. -- reclamou com a esposa

 

--Eu quero casar, mas não pode ser agora como você quer! -- levantou-se ajudado pela namorada -- E minha ridfaan ficou doída, tá? -- reclamou com Najla

 

--Desculpa, habibi, mas eu não tive escolha. -- lamentou -- "Deu até pena bater numa ridfaan dessas, tão durinha, boa de morder...” -- pensou -- Ui! -- abanou-se

 

--Ocê vai casá, seu créu! Vai qui eu tô mandandu! -- ameaçou

 

--Pois eu não tô nem pensando nisso, Raed! -- Najla afirmou de cara feia -- Deixa do jeito que tá! -- decidiu -- Ai, olha, machucou os lábios... -- comentou condoída ao reparar no namorado

 

--Num qué?? -- Raed arregalou os olhos -- Mais ispia pra issu, muié! -- olhou para Amina -- Tá ôvindu a poca vergonha di minha irmã?

 

--Najla é muié feita e da vida dela, ela cuida, uai!

 

--Oxi? -- Raed ficou pasmo -- Quê qui ovi cum as muié da famia?

 

--Deixe de se meter na minha vida, Raed! -- segurou a mão de Marco -- Eu caso se EU quiser e quando EU quiser! -- olhou para o negro -- Vem, habibi. Eu vou cuidar de você!

 

--Cuida, minha dona... -- pediu meloso

 

--Cuido, meu negão de tirar o chapéu... -- respondeu dengosa

 

--Ô, bestagi... -- Raed resmungava

 

--Vamos, habibi. -- olhou para o irmão -- E você nunca mais se meta na minha vida, viu? Aqui não é Cedro e seu tempo de machismos acabou! -- cuspiu no chão e partiu com o amado

 

--Inda mi faiz disfeita, veja issu! -- resmungou ofendido

 

--O tempu qui ocê vigia a curnicha di tua irmã, prestava atenção im... -- pensou no que dizer -- ôtros trem! -- Amina falou de cara feia e se retirou também

 

--Hum... -- coçou a cabeça pensativo -- O qui será qui ela quis dizê cum issu? -- perguntou-se intrigado -- Ai. -- sentiu uma pontada de dor nas costas

 


CAPÍTULO 107 – Novas Experiências

 

Jamila seguia por um corredor ao lado de uma mulher com a qual conversava.

 

--Zinara vinha sempre aqui, mulher! -- Paula dizia enquanto caminhavam -- Ao longo dos anos passou vários feriados com a gente, como natal, carnaval, Páscoa... -- contava nos dedos -- Como também veio em alguns dias das mães, dias dos pais...

 

--Ana a’arfa... (Eu sei...) -- respondeu sem olhar para a outra -- "Eu é que nunca quis vir, por achar deprimente ficar no meio dos velhos...” -- pensou arrependida

 

Paula não entendeu a resposta mas continuou falando. -- Ela veio se despedir da gente não faz muito tempo e posso te dizer... já tá fazendo uma falta danada! -- chegaram em uma espécie de pátio e pararam de andar -- Aí estão minhas crianças. -- apontou para os idosos -- A maioria deles gosta de ficar aqui de tardinha.

 

A advogada passou os olhos no ambiente e reparou em cada velhinho, sentindo imensa piedade de todos eles. Pareciam bichinhos frágeis e indefesos abandonados à própria sorte. -- As famílias visitam? -- perguntou curiosa

 

--Famílias? -- achou graça -- Eles foram abandonados pelas famílias, meu bem! -- olhava para Jamila -- Foram largados pelas ruas de Cidade Restinga ou simplesmente esquecidos no Hospital Central. Quando recebem visitas são de pessoas religiosas ou de gente de boa vontade como você e Zinara.

 

“Oh, Aba, que coisa triste!” -- pensou condoída -- E... tão todos aqui? -- não deixava de prestar atenção nos idosos

 

--Não. -- respondeu com pesar -- Cinco deles estão acamados e ficam o tempo todo nos quartos. -- apontou para uma direção -- Daquele lado ali.

 

--Nunca saem? -- ficou surpresa

 

--Desde que ficaram de cama, não. São muito fraquinhos e João e eu não damos conta. -- explicou -- São como porcelana fina: a qualquer movimento podem quebrar.

 

--Somente vocês dois trabalham aqui? -- estava pasma -- Sem ajuda de mais ninguém?

 

--Então... hoje em dia somos só nós dois e mais alguns voluntários sob as bênçãos de Deus. -- estava feliz com o interesse da outra -- Mas os voluntários somem e aparecem, não dá pra contar com eles no dia a dia. -- cruzou os braços -- O que é normal, porque todo mundo tem que cuidar da própria vida, né?

 

--Como se você não cuidasse da sua. -- sorriu simpática

 

--João e eu vivemos aqui, moça. Nossa vida é aqui. -- sorriu também -- Mas essa foi uma escolha nossa e não dos voluntários. -- pausou brevemente -- Não recebemos recursos de Governo, de ONG, ou seja lá da pessoa jurídica que for. Vivemos dos nossos próprios recursos e dos donativos que os voluntários tragam.

 

--Me leva pra ver os velhinhos que tão de cama? -- pediu

 

--Claro. -- indicou o caminho novamente -- Vem comigo. -- seguiram na direção dos quartos -- Por aqui. -- apontou a primeira porta e se aproximou -- Dona Jandira é quem fica aqui. -- abriu a porta -- Ela não é lúcida e raramente esboça qualquer reação... -- comentou ao entrar no quarto

 

Jamila se aproximou receosa e teve muita pena do que viu. Uma senhora muito magra, olhando fixamente para o teto, a boca aberta e uma expressão bastante sofrida estampada no rosto.

 

--Nós a encontramos sozinha sentada no chão, nos fundos do Centro de Artesanato. -- contava -- Toda suja, urinada, triste... Ela disse que tava esperando a filha, mas já naquela época não falava coisa com coisa. -- olhava para a mulher com pesar -- Depois foi ficando deprimida, muda e caiu de cama. Faz tempo que não fala uma palavra. Parece viver em outro mundo.

 

--Ya wail... (Que pena...) -- tocou o rosto da idosa com delicadeza -- Talvez seja o modo dela continuar esperando por quem não vem...

 

--Consegui que um médico viesse aqui um dia desses e ele falou que embora não esteja necessariamente doente a ponto de justificar uma internação, -- aproximou-se da jovem para falar mais baixo -- ela pode morrer a qualquer momento por se encontrar muito debilitada.

 

--Depressão mata... -- acariciava os cabelos brancos -- "Como pode alguém abandonar a mãe desse jeito?” -- questionava-se indignada

 

Jandira virou lentamente o rosto na direção dela e esboçou um sorriso.

 

--Meu Deus!! -- Paula arregalou os olhos -- Ela sorriu pra você! -- cobriu os lábios com as mãos -- Eu nunca tinha visto ela sorrir! -- olhou emocionada para Jamila

 

Segurou delicadamente uma das mãos da idosa. -- Olhe, Paula, eu também não vou viver aqui, -- mantinha seu olhar fixo no da velhinha -- mas a partir de hoje quero ser uma voluntária e vou fazer muita coisa pra trazer mais gente pra ajudar aqui e melhorar esse lugar. -- prometeu

 

--É muito bem vinda, Jamila! -- sorria

 

--Tenho planos de passar uns tempos trabalhando em Godwetrust, mas antes de ir dá pra fazer muita coisa aqui. Pelo menos eu acho que dá. -- sorria para a idosa

 

--Tempo bem aproveitado rende! -- Paula comentou radiante

 

--Fique tranqüila, mãínha. -- falou para Jandira -- Sua filha voltou pra lhe cuidar... -- beijou a testa dela

 

***

 

--Veja só isso! -- Cátia mostrava uma folha de jornal para uma colega da faculdade -- Nossa Empresa Estatal alcançou um índice de sucesso geológico de 100% no Prima di Sale no ano passado. Todos os poços perfurados pela companhia identificaram a presença de óleo!

 

--Gente! -- Ana ficou surpresa -- Nenhuma outra empresa no mundo atinge um sucesso desses em perfuração! Não até onde eu saiba! -- olhava para a loura -- Que jornal é esse aí? -- perguntou curiosa -- É O Mundo?

 

--Que O Mundo, o que? -- entregou o jornal para a outra ler -- Já viu O Mundo escrever uma linha que seja pra falar bem de alguma coisa que presta pra Terra de Santa Cruz? -- retrucou de cara feia

 

--Ah, é o jornal do Conselho de Classe. -- reconheceu -- É mesmo, você tem razão. -- começou a ler a matéria -- Mas se tivesse vazado uma gota de óleo que fosse, aí sim! -- sorriu ironicamente -- Ia ter manchete pra semana toda!

 

--É igual fazem com as faculdades. Eles só sabem falar de nós se é pra dizer que estamos em greve, e tem vezes que nem estamos e eles dizem o contrário! -- revoltou-se -- Mas vê se falam do nosso rendimento, das pesquisas, das inovações, do que os alunos e nós fazemos, vê se eles falam?

 

--Eu tenho a consciência tranquila de não dar audiência pra TV Mundo. -- Ana comentou enquanto lia -- Assisto qualquer titica, menos ela!

 

--E eu! -- concordou -- Não suporto essa empresa!

 

--Boa tarde! -- Sérgio entrava na sala de professores

 

--Boa tarde! -- as duas responderam em coro

 

--Cátia, queria mesmo falar contigo. -- sentou-se do lado dela -- Ouvi você dizendo que tava querendo fazer um pós doc fora do país, então lembrei de você depois de uma reunião que tive ontem com uns pesquisadores de Godwetrust. -- olhava para a colega

 

--Godwetrust? -- perguntou desanimada -- Não tava nos meus planos estudar por lá.

 

--Calma, deixa eu explicar primeiro. -- pediu -- A Universidade de Suissets tá formando uma equipe internacional e multidisciplinar pra se dedicar à sísmica 4D. A ideia é formar material humano que alcance a fronteira do conhecimento e estenda essa fronteira até o inatingível. -- explicava empolgado -- Recebi três pesquisadores de lá e eles me apresentaram o projeto. Vou mostrar esse material na próxima reunião do Departamento, mas posso te passar todos os detalhes antes disso, se quiser.

 

--E o que Godwetrust pretende com isso, Sérgio? -- cruzou os braços indignada -- É óbvio! Eles querem se capacitar pra vir fuçar aqui, no nosso Prima di Sale! Não foi à toa que vieram pra cá oferecer vaga pra pós doc!

 

--Não sou idiota, Cátia, eu sei disso. -- respondeu com seriedade -- Mas podemos tirar proveito da situação!

 

--Humpf! -- fez um bico

 

--Se você for pra lá e ficar um ano estudando vai voltar com muito mais conhecimento pra somar pra gente! -- tentava convencê-la -- Pra somar pro país!

 

Deu um suspiro profundo. -- Tudo bem, passa o material que você tem pra eu ver, por favor. -- pediu -- Mas não garanto que eu vá querer. -- advertiu -- É bom ver com outros colegas também. E falar com os alunos que tão terminando o doutorado, é claro.

 

--Claro. -- balançou a cabeça e se levantou -- Daqui a dois minutos eu te mando tudo por e-mail. -- aproximou-se da mesinha e serviu-se de café

 

“Tudo bem que eu preciso dar um tempo fora pra espairecer e tentar dar um rumo diferente pra minha vida, mas daí a estudar em Godwetrust...” -- pensava

 

***

 

--Anota aí no teu caderninho, Clarice! -- Magali dizia -- Mês que vem tem festança! É meu casamento com Lúcia! -- anunciou sorridente

 

--Tá anotado! -- sorria feliz -- Jamais perderia uma festa dessas! -- debruçou-se sobre a mesa -- Quem te viu e quem te vê, hein? -- brincou

 

--Pois é! -- bebeu um gole de café -- Rodei por lá e cá e fui encontrar o amor nos braços de uma bombeira linda, gostosa e fogosa! -- suspirou embevecida -- Ai, ai...

 

Achou graça. -- E quando que vocês vão morar juntas? -- perguntou curiosa

 

--Após as devidas análises, considerações, deliberações e pequenas providências, -- cruzou as pernas -- daqui a exatos oito dias!

 

--Nossa! -- bateu palmas -- Parabéns pras duas! Tudo de bom! -- desejou com sinceridade -- Não sabe o quanto fico feliz em te ver assim! De coração mesmo!

 

--Obrigada, amiga! -- fez um carinho breve em uma das mãos da paleoceanógrafa -- Agora fala aí! -- ajeitou-se na cadeira -- E você e Zinara lá na tua casa, como é que tão? -- perguntou curiosa -- Tuas irmãs e o genro ogro já foram embora?

 

--Que foram embora nada! -- respondeu enfaticamente -- Raquel e Cecília tão me deixando louca! E Getúlio então... -- olhava para a outra

 

--Ué, mas eles não dizem quando vão embora, não? -- estranhou

 

--Humpf! -- fez um bico -- Nossa casa tá parecendo um albergue de beira de estrada, tem que ver que bagunça! -- passou a mão nos cabelos -- Se não fosse pelo Di, acho que já teria feito um fuzuê daqueles! -- mexia em um pedaço de guardanapo -- Noto que Zinara fica cheia de vergonha... -- suspirou -- Coitada...

 

--Mas me conta isso, como é que vocês tão fazendo, hein? -- queria saber -- Tão dormindo onde? Se pegando como? E na hora daquela gemidinha básica, como é que disfarça? Morde a fronha?

 

--Ah! -- teve que rir -- Tem ninguém se pegando, criatura, não tem como! -- riu de novo -- Você e mamãe com essa história de morde a fronha...

 

--Mas vocês dormem onde?? -- repetiu a pergunta

 

--Após muita confusão, Raquel se mudou pra barraca de camping com o marido, meu sobrinho dorme com mamãe, Zinara comigo no meu quarto e Cecília na sala.

 

--Zinara dorme no teu quarto?! -- estranhou -- Cheia dos respeitos e das formalidades como ela é, tá dormindo no teu quarto??

 

--No chão... -- complementou

 

--Agora sim, me parece uma atitude caipiresca! -- riu -- E vem cá, -- aproximou-se mais -- não vai rolar nem um motelzinho pra descontrair, não? -- deu um tapinha no braço da outra -- Quando a cabeça fica louca de tanto estresse, a passarinha tem que se soltar pra aliviar a tensão! -- aconselhou -- Tem que botar pra derreter, amiga, senão fica batendo pino! A bicha endoida ensandecida!

 

--Endoida ensandecida, você fala cada coisa... -- achou graça e gastou uns instantes calada -- Tô planejando dar uma fugidinha com minha caipira nesse final de semana... Sinto muito por mamãe, mas já disse a ela que preciso de tempo com meu amor.

 

--Claro que sim! -- concordou -- A mulher veio pra ficar com você, tem que aproveitar, tem que curtir! Suas irmãs que se virem! -- gesticulou

 

--Ela não veio pra ficar comigo, Magali... -- respondeu com tristeza -- Quer dizer, veio e não veio...

 

--Como assim? -- não entendeu

 

--Ela veio se despedir, Magali. -- olhou com tristeza para a colega -- Zinara não se abre, não me diz o que vai na cabeça dela, mas sei que não volta mais pra roça, nem pra Cidade Restinga e tampouco fica aqui...

 

--Ué? -- tinha pontos de interrogação na cabeça

 

--Ela vai pra algum lugar... não sei o que pretende, mas posso sentir. -- respirou fundo -- Acho que um belo dia ela vai acordar e ir embora... -- seus olhos marejaram

 

--Pra onde?! -- perguntou de imediato -- Se não vai pra roça, não vai pra casa, não fica aqui, pra onde vai essa mulher?

 

--Essa é Zinara, Magali... -- passou a mão sobre os olhos -- Exatamente como o significado do nome que carrega: misteriosa.

 

--E você aceita isso? -- ficou revoltada -- Pelo amor de Deus, Clarice, você aceita coisas demais! -- protestou -- É família, é namorada, todo mundo faz o que quer e você não reage, não põe limites! Ser boa não é sinônimo de ser boba, não, tá?

 

--Eu sei... -- considerou -- Você tem toda razão, eu sou muito boba, mas no caso de Zinara não quero ficar procurando fundamento porque sei que ela não vai voltar atrás no que decidiu.

 

--Mas e aí? Vai viver com mais essa tensão, sem saber se ela vai embora ou fica?

 

--Não tenho levado a coisa por esse lado. -- respondeu mansamente -- Entreguei nas mãos de Deus. Ele sabe do que cada um de nós precisa. Não quero sofrer pelo que ainda não aconteceu. -- suspirou -- Considero o que estamos vivendo como mais uma experiência nova.

 

--Ih, eu hein! Experiência nova... -- fez um bico -- Essa história de Zinara já tá me enchendo o saco, vou te contar! Se fosse Lúcia com essas gracinhas, já tinha amarrado ela na cama e queria ver se ia sumir! -- gesticulou -- Amarrava ela, só de calcinha e sutiã, e queria ver se... -- parou para pensar -- Hum, sabe que me deu uma idéia...? -- sorriu com malícia -- Ai! -- ficou cheia de fogo -- Isso sim seria uma experiência nova...

 

--Essa é Magali! -- achou graça

 


CAPÍTULO 108 – O Que Aprendi Com Você

 

--Perdoa, Sahar... -- Zinara estava sentada de cabeça baixa -- Não quero que pense que não consegui porque não te amo ou não te desejo... -- olhava para as mãos -- É que eu tô cansada... -- sentia-se envergonhada -- Aasif... (Sinto muito...)

 

--Own, meu amor, fica assim não! -- sentou-se no colo da morena e envolveu-lhe a cintura com as pernas -- Eu não te trouxe aqui só pra fazer amor com você, meu bem. -- segurou o rosto dela com as duas mãos -- Olha pra mim. -- pediu e ela obedeceu -- Não fica com vergonha. -- sorriu e a beijou -- Minha fofinha...

 

--Você não tá decepcionada? -- perguntou insegura

 

--Não! -- beijou-a novamente -- Claro que não! -- respondeu carinhosa -- Você continua sendo minha amada caipirinha linda... -- mordeu o lábio inferior da amante -- Linda e safada! --beijou-a

 

“Linda?!” -- Zinara ficou toda prosa e sorriu -- Por que me chama de safada?

 

--Porque você é bem safadinha... -- envolveu o pescoço da outra com os braços -- E eu amo isso! -- abraçou-a com força -- E amo a minha caipirinha!

 

--Behebbik ya, Sahar! (Eu te amo, Amanhecer!) -- fechou os olhos e a abraçou também -- Não saberia jamais te traduzir como! -- pausou brevemente -- Nunca saberia dizer o quanto aprendi com você!

 

--Eu também te amo, minha linda! -- olhou para a astrônoma e ficou acariciando seu rosto -- E da mesma forma aprendi muito com você... -- sorriu -- Me diz o que aprendeu comigo? -- perguntou dengosa

 

--Você me ensinou a amar e ser amada. -- acariciava as costas da paleoceanógrafa -- Com você aprendi a amanhecer... -- sorriu -- Wehyat eneyya mamil lel-gher... (Pela vida dos meus olhos, ninguém mais me interessa...) -- afirmou convicta -- Mihtagalik! A’oumri mnil ashwaik nadalik... (Eu preciso de você! Mais do que sua imaginação consiga conceber...)

 

--Sempre me deixando derretida... -- respondeu dengosa

 

--É verdade! -- beijou-a -- Ya bajat al-rouh... (Prazer da minha alma...) -- sussurrou no ouvido

 

Ficou toda arrepiada. -- Ai, quando você fala assim... -- beijou-a demoradamente

 

--Nada é mais gostoso que... -- sussurrou novamente -- bousa ala shafayefik... (beijo nos seus lábios...)

 

“Mesmo cansada essa mulher não tira minha bousa da cabeça, meu Pai!” -- pensou toda prosa -- Pare de ficar aí me seduzindo... -- pediu dengosa -- Caipira safada! -- brincou e ficou uns segundos calada apreciando o rosto da amante -- Você diz que te ensinei a amanhecer... então por que está deixando o sol se pôr?

 

--Não estou, Sahar. -- respondeu com verdade -- Não estou...

 

--Você vive numa contagem regressiva, meu bem. -- afirmou com delicadeza -- Acha que não percebo?

 

--Meu corpo sim, minha alma jamais! -- olhava nos olhos -- Não depois de você!

 

Respirou fundo e acariciou ternamente o rosto de Zinara. -- Ai, ai, meu amor... -- decidiu não insistir com aquele assunto -- Sabia que tenho lido seu Kitaab religiosamente? -- deslizava os dedos pelas sobrancelhas negras da amada -- Eu tenho um jeito de ler que é muito peculiar, sabe? Leio rápido, vou pro final, volto pro começo, mapeio tudo na minha cabeça e depois volto pra ler tudo de novo e devagar, com todo detalhe.

 

--Eu hein! -- achou graça

 

--Agora eu tô na fase da leitura detalhada do Kitaab. -- continuava acariciando o rosto da astrônoma -- Leio com uma intensidade tal, que me sinto capaz de viver do seu lado cada momento que descreveu. É como se eu fizesse ainda mais parte de sua vida a cada linha que leio!

 

--Não te entreguei o Kitaabii (Meu Livro) como quem simplesmente entrega arquivos eletrônicos! -- continuava acariciando as costas da namorada -- Quando fiz o que fiz, estava me mostrando completamente pra você. E só pra você!

 

--Own... -- beijou-a repetidas vezes -- Fofinha!

 

--Fofinha... -- achou graça -- Tô mais pra caipira piaba! -- brincou

 

--Que é piaba? -- perguntou divertida

 

--Um peixinho seco que nem eu! -- respondeu brincando -- Tem uma pele ruim... -- revirou os olhos

 

--Ai, eu adoro meu peixinho! -- beijou-a e sorriu -- Boba! -- acariciava os ombros dela -- Sabe... a única coisa que não gosto de ler naquele seu Kitaab é sobre a mulherada que você teve! -- comentou enciumada -- Caipira safada! -- deu-lhe um tapinha no braço -- Shamash eu respeito, com Jamila me acostumei, mas as outras... -- deu-lhe outro tapinha -- Pura pouca vergonha aquilo lá!

 

--Uai?! -- espantou-se -- Que mulherada? Que pouca vergonha? -- não entendia

 

--Você teve dez mulheres na sua vida, Zinara! -- respondeu de pronto -- Contando comigo foram dez! -- mostrou todos os dedos das mãos -- Dez, tá?

 

Ficou envergonhada. -- É que eu gosto de número redondo... -- brincou para disfarçar

 

--Ah, é? -- deu outro tapinha -- Olha como é safada!

 

--Brincadeira, Sahar... -- abaixou a cabeça -- Eu não queria isso... tava buscando acertar... -- olhou para a amada -- Você sabe que minhas namoradas sempre me jogaram no vento. Só você e Shamash que não...

 

Ficou com pena. -- Ah, minha caipirinha, não fala assim. -- beijou-a -- Não vou te jogar no vento, não... -- prometeu

 

--Eu me envolvi com aquelas moças por carência. Precisava ardentemente, angustiadamente, me sentir aceita, me sentir fazendo parte de alguma coisa, parte da vida de alguém... Eu me sentia uma pessoa jogada fora... -- pausou brevemente -- Depois que Jamila me deixou é que fui aprendendo que não deveria buscar o que me faltava em alguém, porque nunca iria encontrar...

 

--Mas se envolveu com Karim! -- relembrou ciumenta

 

--Eu tava muito triste porque me vi gostando de você e totalmente sem chances por causa daquela Cátia. -- assumiu -- Pensei que me envolver com Karim me faria bem... -- segurou as duas mãos da namorada -- E ela também me jogou no vento... -- pausou brevemente -- Não deveria ter ciúmes de ninguém... -- olhava nos olhos -- foi com você que aprendi que amor verdadeiro não cria dependências. Foi pra você que me dei inteira, sem medos, sem reservas... Ya-illi enti agmal hikaya! (Você é minha história mais bonita!) -- tocou o rosto dela com uma das mãos -- Depois de você, a vida mudou de cor...

 

--Ai, lá vem ela me seduzindo... -- ficou toda derretida -- Pára com isso, tá? -- deu-lhe um tapinha dengoso

 

--Eu tô quieta! Caipira inofensiva. -- brincou

 

--Hum... -- beijou-a -- Sei o quanto é inofensiva, essa caipirinha safada... -- pegou uma mecha dos cabelos da astrônoma e ficou brincando -- Sabe... quando meu pai era vivo, ele me pegava no colo e mostrava o céu noturno. -- lembrava -- Ele me explicava as coisas, não com todo seu conhecimento astronômico, mas com os mesmos olhos românticos que você tem... -- deslizou as mãos pelos braços da morena -- Depois que ele morreu passei longos anos sem olhar pro céu... foi com você que reaprendi a fazer isso.

 

--Fico feliz! -- beijou-a -- Agora sei que sempre que olhar pro céu também vai se lembrar de mim.

 

--Loucura sua pensar que um dia eu possa te esquecer, Zinara... -- Clarice ficou uns segundos calada. -- Diz pra mim, amor... -- envolveu o pescoço dela com os braços novamente -- Fala tudo de você, fala o que não escreveu no Kitaab.

 

--Sobre o que quer saber? -- deslizou as mãos pelas coxas da mulher -- Especificamente.

 

--Quais foram os momentos mais marcantes da sua vida? Diz pra mim! -- pediu

 

--Tantos... -- mirou um ponto no infinito -- Mas eu só quero falar dos bons.

 

--Sim! -- concordou

 

--Quando Zahirah e Farida perceberam que eu já sabia ler e escrever e Farida me ergueu no colo comemorando... -- sorriu

 

“--Awlaadina (nossa criança) é tão inteligente, Zahi! Mabrook! (Está de parabéns!) -- pulava com a menina no colo -- Zinara já sabe ler e escrever! Que maravilha! Que felicidade!

 

--Zinara será uma grande mulher, Farida! -- a ruiva afirmou sorridente -- Ana a’arfa! (Eu sei!)

 

--Zinara quer ser mudarris (professora) e quer ser cantora! -- a menina respondeu empolgada

 

--Você vai ser tudo que quiser, Yatamanna (Esperança)! -- Zahirah segurou o rosto dela -- Sonhe, sonhe sempre e acontecerá!

 

--Que Allah cubra seu caminho com um manto de Luz! -- Farida desejou

 

A ruiva se aproximou e as duas mulheres beijaram o rosto da criança. Uma de cada lado.”

 

--Não era muito comum em nossa cultura essa coisa de beijar crianças, especialmente as meninas. -- Zinara lembrava -- Naquele dia me senti tão valiosa!

 

--Mas você é valiosa, habibi! -- beijou-a -- Um verdadeiro tesouro. -- sorriu -- Continua me contando, vai?

 

--Quando giddu Raja disse que Zahirah e eu éramos suas preferidas... -- permanecia lembrando -- Foi naquele dia trágico em que ele morreu, mas foi muito especial ouvir...

 

--Imagino que sim!

 

--Quando chegamos na fazenda de camma Najla! -- podia vislumbrar as imagens diante de si -- Era tudo tão lindo, tão maravilhoso... pensávamos ter chegado em al dar es-salaam (a casa da paz)! -- sorria -- Ouvi o canto da siriema, a ave mais marcante do interior de Guaiás, e me apaixonei. Terra de Santa Cruz me conquistou desde o primeiro momento!

 

--Quem não percebe seu amor por essa terra? -- acariciava o rosto dela

 

--Quando aprendi a língua daqui a ponto de entender o que o hino nacional queria dizer... -- balançou a cabeça -- Oh, Aba, fiquei arrepiada! É a mais bela canção que conheço!

 

--Também adoro o hino! -- concordou

 

--Quando Youssef, Khaled e eu subíamos na pedra grande da fazenda de camma Najla e pulávamos lá de cima pra cair no rio... -- falava como criança -- Era bom por demais da conta, Sahar! Eu me sentia de posse da verdadeira liberdade; da mais simples e mais pura liberdade! -- riu de alegria -- Foi Aisha que ensinou a gente a pular de lá.

 

--Por que não me surpreendo com isso? -- achou graça

 

--Quando ela me... -- não sabia como dizer -- Quando ela me deu... -- abaixou a cabeça e sorriu -- Bousa ala shafayef... (Beijo nos lábios...)

 

“Gente, Aisha deu a bousa pra ela??” -- pensou em estado de choque -- "Então foram onze mulheres ao invés de dez!!” -- concluiu -- Mas como pode isso? Quando foi que...? -- mudou de idéia -- Não, eu não quero saber quando você fez amizade com a bousa dela! -- decidiu enciumada

 

--Choo?? (O que??) -- não entendeu

 

--Por favor, continue. -- pediu gesticulando -- Pulemos essa parte sobre a bousa alheia!

 

--Uai?! -- permaneceu sem entender mas decidiu continuar a falar -- Quando, apesar de tudo, viajei cheia de sonhos pra Gyn e Khaled veio se despedir de mim, correndo como louco naquele cavalo... -- emocionou-se -- Trouxe um buquê de caliandras!

 

--Ai, eu chorei muito quando li isso! -- comentou -- Lindo demais!

 

--Quando conheci Shamash. Quando ela me olhou e me viu... -- ficou sem graça -- Desculpe, Sahar. -- pediu

 

--Já disse que respeito demais essa mulher. Não precisa se desculpar. -- respondeu tranquilamente

 

--Quando consegui me formar em técnica e foi gente amiga por demais da conta na minha formatura! Deu um orgulho que chega doeu!

 

--Admirável! Ainda mais tendo em vista o que você passou!

 

--Bem... -- respirou fundo -- Em relação à vida profissional, teve também quando me formei na faculdade, quando fui estudar fora, cada prêmio que ganhei, as pessoas incríveis que conheci... Quando vi que nosso curso de astronomia em Cidade Restinga havia progredido e se tornado referência... -- sorria -- Ver os alunos se formando...

 

--Sua vida profissional é realmente um motivo de admiração! -- afirmou orgulhosa

 

--Chukran, ya habibi! (Obrigada, querida!) -- agradeceu -- E no que diz respeito à família, também tenho muito pra lembrar, como quando Khadija nasceu, depois Cidmara... Segurá-las nos braços, banhá-las pela primeira vez... foi uma emoção magnífica! Senti como se fosse maama delas também!

 

--Os filhos de Ahmed você só conheceu bem depois, né?

 

--Aywah! (Sim!) Já estavam grandinhos, mas também foi uma emoção. -- sorriu -- Bem como quando Ahmed Mateus nasceu e pude banhá-lo. E o batizado dele... Foi muito especial!

 

--E uma baita festa, né? -- brincou -- Toda festa naquela roça é um arraso!

 

Achou graça. -- Quando reencontrei camma Najla e finalmente pudemos nos entender. Quando reencontramos Aisha como por encanto!

 

--E cantando depois de cair do telhado de uma casa de show! -- achou graça -- Só você mesmo, Zinara! -- riu

 

Riu também. -- Quando conheci giddatii (minha avó) no Plano Astral e pude rever giddu Raja, Zahirah... Quando Youssef me apareceu no centro de mãe Agda... Quando pude rever Khaled... lúcido, após tantos anos sem razão...

 

--Foram grandes honras pra você! -- beijou-a -- Fico feliz que Deus tenha lhe permitido assim!

 

--Allah me deu grandes felicidades, Sahar! -- afirmou cheia de gratidão -- Como quando maama e eu tivemos aquela conversa na praia e ela disse que me amava! -- emocionou-se mais uma vez -- Quando baba e eu decidimos esquecer o passado e recomeçar, quando encontrei Hassan perdido em Maurítia... -- derramou uma lágrima

 

--Sem dúvida momentos maravilhosos! -- emocionou-se também e secou os olhos da morena -- Maravilhosos...

 

--E não menos importante, porque propositadamente deixei por último... -- olhou nos olhos -- Quando te conheci, primeiro virtualmente, depois naquele congresso. -- sorriu -- Quando meus olhos encontraram os seus, pensei que não daria conta de tamanha emoção! -- confessou -- Quando conheci ya Leda e ela me aprovou... -- segurou o rosto de Clarice -- Quando nos amamos pela primeira vez... -- acariciava a pele sob suas mãos -- Cada minuto que passamos juntas, Sahar, foi um sol que brilhou dentro de mim!

 

--Ai, Zinara... -- gem*u dengosa

 

--Não importa o que aconteça, habibi, tenha sempre em mente que depois de você, tudo se fez vida! -- falou com intensidade -- Depois de você, aos poucos fui aprendendo o que significa paz! Depois de você deixei de viver no passado... -- beijou-a -- Sihrik, sawtik, rasmik saaro minni iw fiyyi! (Seu perfume, sua mágica, sua voz e sua imagem tornaram-se parte de mim!)

 

--Meu Deus, Zinara, você me deixa de um jeito... -- beijou-a com paixão -- "A bousa fica uma coisa louca!” -- pensou -- "Que pena que a caipira tá cansada...”

 


CAPÍTULO 109 – Inspiração

 

--Di agora im dianti num tem mais purque ocê disfarçá qui namora o teu homi, num sabi? -- Amina dizia -- Si Raed num cunsegui aceitá issu pur bem, vai aceitá pur mar!

 

--Pois é, chega dele se meter comigo! -- Najla concordou -- E com o passar do tempo, conforme o menino for se tratando com a psicóloga de Gyn, Marco vai fazer cada vez mais parte de usritina (nossa família) e Raed terá que aceitar isso!

 

--Num tem purque num aceitá, num sabi? -- concordou

 

A ex fazendeira ficou olhando para a cunhada até que resolveu perguntar: -- Você tá tão murchinha... É por causa de Zinara, não é?

 

--Ô, muié, aquela minina... -- abaixou a cabeça -- Uma parti di mim diz qui ela num vorta mais pra cá e ôtra parti qué acriditá qui é inganu...

 

--Tenha fé, habibi! -- pediu -- Você sempre foi tão firme nas suas crenças!

 

--Eu tentu... -- respirou fundo -- Intreguei pra Virgi... -- olhou para Najla -- Raed comu sempri num qué vê o qui tá acunticendu e meus ôtro fio também. Mas todu mundu sabi qui us trem tão sem muita basi. Todu mundu senti qui Zinara num vorta...

 

--Volta sim! -- afirmou resoluta -- Eu quero acreditar que sim!

 

Amina permaneceu calada.

 

--Sabe uma coisa que aconteceu ontem à noite e eu fiquei boba? -- queria mudar de assunto sem deixar de falar da sobrinha -- Khadija me pediu as cartas do baralho de Zahirah e ficou brincando, arrumando e desarrumando cada uma delas. -- contava -- De repente ela foi posicionando uma a uma, do jeito que as ciganas fazem, mas claro que com a habilidade natural pra idade dela. Daí ficou olhando, olhando e depois virou pra mim e disse: macleech (não se preocupe)!


--Smallah! -- exclamou admirada

 

--Ela falou de um jeito, sabe? Com uma convicção! -- gesticulou -- Depois arrumou tudo direitinho, guardou e me deu de volta. -- olhava para a cunhada -- Foi só o que me disse, mas quando falou, parecia que era uma resposta aos meus questionamentos mais íntimos!

 

--Ocê acha qui ela tava inspirada? Acha qui ela falava di minha fia? -- perguntou esperançosa -- Khadija e Zinara sempri tivéru um chamego ispeciá, sempri foru muitu ligada!

 

--Pode parecer loucura o que vou te dizer... -- ajeitou o lenço nos cabelos -- O olhar que ela me lançou, Amina... tinha algo de... -- pausou brevemente -- Algo de maama... -- olhou para os braços -- Nossa, fico até arrepiada, espia! -- mostrou

 

Amina ficou uns segundos pensativa. -- Zahirah lia as carta e sempri falô qui era pur inspiração di tua maama. -- sorriu -- Será?

 

Segurou as duas mãos da cunhada e sorriu também.

 

***

 

--Eu fico pensando, sabe? Seria muito bom investir num pós doc por agora. -- cruzou as pernas -- Sair do país por um ano, dar uma arejada na cabeça, mergulhar totalmente no estudo, repensar minha vida... -- considerava -- Tô na dúvida porque tenho algumas possibilidades interessantes, mas... a melhor, academicamente falando, é aquela que te comentei em Godwetrust. -- fez um bico -- Infelizmente!

 

--E por que a antipatia tão grande com a possibilidade de estudar em Godwetrust? -- a psicóloga perguntou

 

--Ah, Vera, pelo amor de Deus! -- gesticulou -- Um país que se diz civilizado e vive de fomentar guerras mundo afora passando por cima de todas as convenções internacionais? Um país que orquestra manobras econômicas das mais nojentas só pra explorar a pobreza de outros países e conseguir mão de obra barata? -- fazia cara feia -- Um país que explora e sacaneia Terra de Santa Cruz de todo jeito? -- cruzou os braços -- Eu fui protestar contra o leilão do Campo de Balança! Sei muito bem que tem dedo deles naquela pouca vergonha lá!

 

--Certamente. -- concordou

 

--É muito suspeito que agora, na nossa era do Prima di Sale, eles tenham esse interesse em desenvolver o tal grupo de estudos multidisciplinar que falei pra você!

 

--Concordo que não deve haver apenas o puro e simples interesse acadêmico nessa ideia.

 

--Então! -- olhava para ela -- Como é que eu vou fazer parte de um negócio desses? Vou entregar o ouro pro bandido e apunhalar meu país pelas costas? Ah, isso não! -- fez um bico

 

--Mas vamos discutir com mais calma quanto a isso. -- cruzou as pernas -- Em primeiro lugar, é necessário que façamos uma distinção entre o Governo de Godwetrust e o povo de Godwetrust. -- olhava para a loura -- O Establishment de fato é podre, mas no seio da população daquele país há muita gente boa e honrada! Imagine como ficaríamos enquanto nação se os estrangeiros nos julgassem pelo comportamento vergonhoso de nossos governantes?

 

--Ah, isso é. -- balançou a cabeça concordando

 

--Você pode muito bem ir estudar lá, aprender e colaborar, sem, no entanto, tornar públicas quaisquer informações confidenciais que tenha de seus trabalhos no Prima di Sale. -- aconselhou -- Deixe todos os arquivos confidenciais fora de seu laptop, tenha máxima atenção com suas coisas, cuidado com o que fala e vá estudando. Pode aprender muitas coisas e, ao regressar, enriquecer ainda mais seu trabalho aqui.

 

--Hum... -- esfregou a mão no queixo

 

--Você vai interagir com profissionais de excelência de várias partes do mundo. -- continuava falando -- Pode ser muito proveitoso! Além do que, o contato com outras culturas vai arejar sua mente. Intercâmbio sempre é bom.

 

--Eu fiz mestrado aqui, mas o doutorado foi fora. -- comentou -- É sempre bom frequentar novos ambientes pra enriquecer a visão de mundo.

 

--Então pense nisso com carinho e isenta de preconceitos. Não nivele todas as pessoas de Godwetrust pela baixeza de seus governantes!

 

--Tá certo... -- balançou a cabeça -- Vou pensar melhor.

 

--Agora me conte, e quanto ao resto? -- sorriu -- Como tem ido?

 

--Ah, Vera, parece até uma praga! -- revirou os olhos -- Só porque decidi me comportar melhor tenho sido tão assediada naquela faculdade... -- suspirou -- Não sei o que houve, mas parece que de repente um monte de garotas quer pular na minha cama!

 

--É assim mesmo! Sempre que a gente deseja mudar de hábitos, largar um vício, as tentações aparecem em maior quantidade.

 

--E põe quantidade nisso! -- afirmou enfática -- Mas tenho segurado a onda, na medida do possível... -- abaixou a cabeça -- O lance é que tenho feito justiça com as próprias mãos um dia sim e no outro também! -- comentou -- Ainda bem que tenho dez dedos saudáveis!

 

Achou graça. -- Você vai conseguir, Cátia! Pode acreditar!

 

--Espero que esse pós doc me dê inspiração pra realmente conseguir, porque tá brabo... -- coçou a cabeça -- Não se surpreenda se um dia eu aparecer aqui com a mão torta!

 

Vera simplesmente riu.

 

***

 

--Mas você, hein, mulher? Vou te contar! Ao invés de se livrar dos compromissos pra ir logo simbora, ainda foi me inventar de adotar asilo! -- Leonor reclamava -- Não sei o que te deu que agora pensa que virou Madre Teresa!

 

--Eu não tô com pressa nenhuma de ir pra Godwetrust. -- respondeu calmamente -- Minhas prioridades no momento são muito simples: recuperar a fazenda de Aisha, -- enumerava nos dedos -- colocar um fogo no meu dossiê denúncia pra incomodar bastante e cuidar de minha mais nova mãínha e do asilo onde ela vive. -- olhou para a irmã -- Não necessariamente nessa ordem em termos de relevância na minha vida. -- ajeitou os óculos escuros

 

--E por quanto tempo acha que vão te esperar em Godwetrust?

 

--Leonor, tudo a seu tempo. -- fez um gesto despreocupado -- Se mudarem de ideia, que procurem outra. -- sentou-se na cadeira de praia -- A luta por Suriyyah me motiva, mas antes de cuidar do país dos outros preciso cuidar do meu. -- levantou-se -- E do povo que é meu. -- passou a mão nos cabelos -- Vamos pra água? -- convidou

 

--Vamos. -- levantou-se também e foram andando -- E, mudando de assunto, como foi ontem? -- deu um tapinha no ombro da irmã -- Como foi o encontro? -- piscou

 

--Decepcionante. -- entravam lentamente dentro da água -- Aquela mulher não tem nada na cabeça e só falou abobrinha o tempo todo. -- uma pequena ondinha respingou água em seus óculos -- Ui! Melhor tirar, né? -- colocou os óculos no alto da cabeça

 

--Tá, ela era fuleira mas isso não muda o fato de ser uma mulherona! -- respondeu sorridente -- Rolou, né?

 

--Não. -- pararam em um trecho com água pouco acima da cintura -- Desempolguei.

 

--Ave Maria, mas você mudou mesmo! -- comentou surpreendida -- A Jamila que eu conheço não deixaria passar.

 

--A Jamila que você conheceu, mudou! Já não era mais pra se surpreender com isso! -- respondeu de pronto -- Então, deixa eu mudar de assunto. Que tal a gente organizar uma festa surpresa pra maama? Faz tanto tempo que a gente não reúne a família toda. Podia ser bem massa! -- sorriu

 

 

--Nossa, mas tá mudada mesmo! -- ficou pasma -- Querendo até organizar festa com a família! O quê que anda te inspirando pra ter ficado assim tão... -- pensou em como dizer -- humana?

 

--Concorda ou não, hein? -- deu um tapinha no ombro dela -- Vamos fazer? -- sorria

 

--Oxi, claro! Festa eu tô sempre dentro! -- mirou um ponto no infinito -- Aproveito pra convidar um carinha que tá me interessando... Ele é DJ! -- sorriu para a irmã

 

Molhou o rosto rapidamente. -- E o seu DJ vai trabalhar de graça? -- brincou -- Sua sedução vai ser boa o suficiente pra ele fazer tudo por amor?

 

--Eu vou tentar! -- piscou -- Veremos se ainda sou boa nisso!

 

--É sim, Leonor. Na nossa família, a sedução tá no sangue!

 

--Mas se ficar sem usar perde a validade! -- jogou água na outra -- Fica vencida!

 

--Não mesmo! -- jogou água na irmã também e começaram uma guerrinha

 


CAPÍTULO 110 – Dilatando o Tempo

 

A astrônoma dormia e Clarice lia o Kitaab enquanto isso. Parecia-lhe que ler sobre a vida de sua amada tinha a estranha capacidade de dilatar o tempo. Era como se, viajando com a leitura, pudesse viver o passado de Zinara ao lado dela.

 

--Vamos voltar a ler com detalhes o trecho onde parei: o início da faculdade. -- falava consigo mesma -- Documento Ano 1999; é esse aqui. -- clicou e abriu -- Tinha parado nessa página. -- começou a ler

 

“Apesar de todos os esforços não consegui vaga no alojamento da faculdade, Kitaabii. Havia muita gente na lista de espera e eu teria que aguardar ainda um ano. Durante essa fase de tentativas e insistências vivi escondida no alojamento com a ajuda de Cláudia, mas chegamos a um ponto em que não havia mais como continuar naquela situação.

 

Nesse meio tempo procurei um emprego para me manter e tive muita dificuldade. O país vivia em recessão, para pagar o preço de sua moeda valorizada, e a indústria não desejava contratar técnicos em química; ao contrário, ela os demitia. Cheguei a trabalhar por um mês como vendedora de sapatos, mas fui demitida porque não me vestia bem o suficiente. E como poderia comprar roupas se mal tinha dinheiro para o básico, Kitaabii?

 

Busquei trabalhar com monitoria na faculdade, mas precisava estar acima do segundo período para ser aceita. Fosse como fosse, as bolsas de monitoria haviam sido cortadas e eu continuaria na mesma. Por fim, consegui dar aulas de matemática e física em um cursinho pré vestibular, às terças e quintas, e ganhava uma miséria com a qual me sustentava aos trancos e barrancos.

 

Eu já estava me preparando para voltar a viver nos banheiros, quando conheci Valentina. E foi aí que tudo mudou...”

 

--Vocês não entendem! Não vêem ou não querem ver a realidade! -- a jovem discursava -- O Plano Reale é uma farsa, a maior mentira da história econômica desse país! -- gesticulava -- Não passa de um pacote de medidas concebido pelo Fundo Condenário Internacional em conjunto com o Banco Estrangeiro, o qual tem sido adotado por vários países com um único objetivo primário: controlar a hiperinflação e manter o ambiente menos arriscado pros grandes bancos conseguirem lucrar com garantias! -- olhava para todos

 

--Aquela ali, falando que nem um deputado, é Valentina. -- Claudia mostrou achando graça -- Ou Tina, como gosta de ser chamada. -- cruzou os braços -- Ela adora se envolver com política!

 

--Tô gostando do discurso dela, viu, fi? -- prestava atenção -- Essa é das minhas!

 

“Valentina era uma jovem baixinha, bonita, dona de cabelos negros e curtos. Vestia-se como um rapazinho, mas seu rosto era feminino demais. Morena, olhos claros, carismática e cheia de personalidade, discursava com uma paixão contagiante. Confesso que ela me impressionou com facilidade, Kitaabii.”

 

--Cadê o dinheiro que o Fundo Condenário emprestou pra gente no ano passado? Cadê? -- perguntava desaforada -- O maior empréstimo concedido pelo Fundo até então não chegou aqui, mas garantiu a reeleição desse presidente que aí está!

 

--É verdade! -- a morena concordava empolgada

 

--Nossa moeda é valorizada? Tá parelha com a moeda de Godwetrust? Mas, me digam, quanto a gente tá ganhando com isso? Alguém sabe dizer? -- provocou -- Pois eu vou responder: a gente tá é pagando uma conta muito cara pra manter essa fuleiragem da porr*! Perdemos um monte de direitos trabalhistas e sociais, privatizamos um monte de empresas importantes a preço de banana, as taxas de juros são altíssimas e vivemos com a segunda maior taxa de desemprego do planeta! -- quase gritava -- Nossas universidades têm recebido um reale e dez centavos por aluno, gente! Isso não paga nem a porr* de uma passagem de Kombi!

 

(Nota da autora: baseado em http://brasiliamaranhao.wordpress.com/2010/10/27/plano-real-maior-mentira-historia-brasil/)

 

--É isso aí! -- Zinara apoiou

 

--Nosso crescimento é medíocre, nossa produção em termos de Ciência e Tecnologia é baixíssima, o valor agregado de nossos produtos exportados é muito aquém do que poderia ser! -- olhava para os outros estudantes -- E, aliás, quais são os produtos de exportação de Terra de Santa Cruz? Quais são? -- gesticulava -- A mesma porr* de sempre: grão, minério, café, laranja, ou seja, igualzinho na época que a gente era colônia! -- riu brevemente -- Era colônia, não, né? A gente NUNCA deixou de ser. Só mudou de dono!

 

--Somos colônia de Godwetrust! -- a morena falou -- Inclusive culturalmente! -- fez cara feia -- Ralã! -- expressão de nojo

 

Valentina desceu do palanque aplaudida por muitos colegas. Vários deles foram abordá-la.

 

--Vem, Zinara, vamos falar com ela! -- segurou a amiga pelo pulso -- Simbora!

 

--Yaalah! (Vamos lá!) -- concordou

 

Após alguns minutos de espera, finalmente Claudia conseguiu falar com Valentina e apresentar Zinara. As duas se entrosaram logo de início e a conversa começou fluindo naturalmente sobre política, até que Claudia abordou o assunto que a levou até ali.

 

--Então é isso, mulher. -- contava a história -- Ela não conseguiu vaga no alojamento e tem vivido escondida comigo lá desde pouco antes do período começar.

 

--Porr*! -- espantou-se -- Falta só mais duas semanas pro período acabar!

 

--Pois é, e até agora nenhuma solução! -- Claudia continuava falando -- Não dá mais pra ela ficar lá! -- cruzou os braços -- E morar em banheiro eu não aceito!

 

Zinara percebeu que Valentina ficou sem entender. -- É que nos tempos de Escola Técnica cheguei a morar em um banheiro de lá e pensei em fazer isso de novo aqui. -- esclareceu

 

--Ah, não, isso não! -- discordou -- Faz o seguinte... -- ficou pensando -- Eu vivo numa República com duas bicha doida e tá faltando uma pra completar o grupo. Nossa colega se formou e até agora não achamos outra pra colocar no lugar.

 

“Uai? República?” -- não entendeu -- "Mas isso não é forma de governo?” -- ficou pensando

 

--Vou te dar o endereço da gente e você passa lá amanhã pra uma entrevista. -- Valentina buscava um pedaço de papel

 

--Entrevista?? -- Zinara e Claudia perguntaram ao mesmo tempo

 

--Oxi, não é qualquer uma que pode morar com a gente, não, visse? -- respondeu como quem diz o óbvio -- Ah, achei! -- pegou uma caneta e começou a escrever o endereço

 

--Vê lá o que você vai arrumar pra garota! -- Claudia advertiu preocupada -- Ela veio do interior! O mais que conhece de cidade é Gyn e a Capital, que são bem menores que aqui!

 

--Te aperreia não! -- entregou o papel para Zinara -- Chega lá amanhã por volta das onze horas! -- deu um tapão no braço dela -- Fui! -- deu tchauzinho e se foi

 

--Eita, que mão pesada. -- esfregou o braço dolorido e depois olhou para o papel -- Onde é esse lugar aqui?

 

--Vixi, e eu que sei? -- respondeu após ler o endereço -- Vamos ter que perguntar pro pessoal daqui, não sabe? -- olhou para a morena -- Você quer ir lá fazer a tal da entrevista?

 

--Uai... -- pensava em como perguntar -- Como é esse trem de República, hein? É coisa de política? -- estava intrigada

 

***

 

“Demorei a encontrar o endereço de Valentina, Kitaabii. A tal da república ficava em um bairro próximo à faculdade, mas as ruas eram tão emaranhadas que faziam do labirinto do Minotauro uma brincadeira.

 

Vi que se tratava de um prédio antigo e pequeno com apenas dois andares, todo ele ocupado por estudantes, e à primeira vista o ambiente me pareceu bem simpático. Nem precisei chamar quando cheguei, porque Valentina me viu e veio correndo abrir a porta. Entrei e fomos direto para o segundo andar, onde suas amigas nos aguardavam. De repente, enquanto fui sendo apresentada a elas, vieram as outras residentes do segundo e do primeiro andar e virei a atração do dia. Por fim, decidiu-se que a entrevista seria feita por todo mundo e eu fiquei ali: imprensada por elas e me sentindo como participante de um programa de perguntas e respostas...”

 

--Tu é de onde, hein, mulher? -- Ingrid perguntou -- Nascesse em que país? -- estudava o rosto da outra

 

--Cedro. Mas sou naturalizada como cidadã de Terra de Santa Cruz! -- respondeu orgulhosa

 

--UHU!!! -- as garotas gritaram achando o máximo -- Maneiro, da hora, massa! -- algumas disseram

 

A morena estranhou aquela reação.

 

--E tu sabe escrever com aquelas cobrinhas?? -- Bruna ficou empolgada -- Bah, eu acho tri legal!

 

--Cobrinhas?! -- achou graça -- Se essas cobras são a caligrafia do Oriente, eu sei, uai! -- sorriu

 

--Show! -- Bruna comemorou -- Tu vai escrever meu nome, daí!

 

--Cê estuda o que? -- Diana perguntou seriamente -- É do tipo CDF, largadona, cabeção, qual é a tua?

 

--Eu estudo astronomia, mas os outros trem que você falou não entendi nada.

 

As garotas riram.

 

--Claro que ela é cabeçuda, né, ô, bicha lesa? -- Valentina respondeu para a colega -- Faz oito matérias e ainda trabalha dando aula!

 

“Cabeçuda? AHHa!” -- não entendia -- "Nariguda pode até ser, mas esse trem de cabeçuda me intrigou!”

 

--Ei, à propósito, você tem telescópio? -- Valentina perguntou curiosa -- Sempre quis usar um!

 

--Aywah! (Sim!) -- balançou a cabeça confirmando -- E se tiver cuidado deixo você usar ele. -- passou a mão nos cabelos -- Foi uma pessoa muito especial que me deu e eu o trato com muito carinho! -- pensava em Olívia

 

--Teu cabelo é lindo, guria! -- Bruna comentou

 

Zinara sorriu e abaixou a cabeça envergonhada. -- Chukran. (Obrigado.) -- respondeu em voz mais baixa -- Agradecida. -- traduziu

 

--Tu é caipira demais, meu! -- Fabiana jogou uma almofada nela -- Aposto até que é virgem! -- riu

 

--Uai... -- corou -- Sou não... -- continuava de cabeça baixa

 

--Pia só, muié, ocê é bolacha ou é careta? -- Nalva foi direto ao assunto -- Já deu pra perceber que essa República aqui tá cheia de bolacha!

 

Todas se calaram para ouvir a resposta.

 

“Bolacha?! Será que isso quer dizer lésbica?” -- pensava -- Laa acrif... (Eu não sei...) -- levantou a cabeça -- Se bolacha quer dizer lésbica... -- analisava se deveria assumir ou não -- Eu sou! -- resolveu confessar

 

--AHAHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!! -- várias garotas gritaram e a morena se assustou

 

--Beleza, mulher! -- Valentina bateu uma palma -- Depois te levo pra conhecer o reduto bolacha!

 

--E você tá pegando alguém, tá solteira...? -- Aline queria saber

 

--Eu... Ana araamil (eu sou viúva), minha Shamash morreu no ano passado. -- percebeu que elas não entenderam coisa alguma -- Sou viúva... minha esposa morreu no ano passado. -- explicou

 

--Pôxa... -- Aline ficou sem graça -- Foi mal aí.

 

--Macleech. (Não se preocupe.) -- olhou para a outra com tranquilidade -- Vocês não tinham como saber.

 

--Ei, vamos falar de coisas mais alegres, mais picantes! -- Patrícia se intrometeu -- Diz aí, você é do tipo que gosta de dar, de comer ou das duas coisas? Vai cuspindo!

 

--AHHa! -- Zinara arregalou os olhos

 

--Porr*, Pat, dá um tempo! -- Valentina reclamou -- A garota é encabulada, não notasse?

 

--Então diz, como foi que você perdeu teu cabaço? -- Patrícia continuou -- Fala aí!

 

--Ah, mas essa ela vai ter que responder! -- Laila bateu palmas -- Conta, conta!!

 

--Conta, conta!!! -- Paulinha deu força

 

--Ave Maria! -- continuava abestalhada -- “Eita, pistinga dos infernos!” -- pensou

 

--Gente, pega leve, porr*! -- Valentina pediu -- Falar de cabaço?

 

--Responde, garota! -- Rosa insistiu -- Cabaço, virgindade, hímen, ou seja lá o termo que você use! -- esclareceu -- Conta como perdeu e aproveita pra contar como tua mãe descobriu isso! -- pediu -- Já pensou? Uma garota de Cedro contando pra mãe que perdeu o cabaço? -- achava graça

 

--Oh, Aba, wana amil eh? (Oh, Meu Pai, fazer o que?) -- suspirou -- Bem, foi muito diferente do que vocês esperam ouvir... -- viajou no tempo

 

“--Intonce, dotôra... -- Amina explicava constrangida -- minha minina danô-si di si incafifá purque ela botô uns... -- abaixou a cabeça -- uns sanguinhu nas carçola, num sabi? -- mexia na barra do vestido -- E num sei si já tá im tempu dela virá moça... -- pausou brevemente -- Zinara tem trêzi anu mais eu num sei... Nóis passemu tanta dificurdadi nus tempu di guerra... Num sei si cum a farta di cumida e água qui nóis vivia deu comu ela si formá im moça...

 

--Muitas meninas têm sua primeira menstruação por essa idade. -- a ginecologista comentou -- Mesmo vivendo com dificuldade. -- olhou para a jovem, que estava morta de vergonha

 

--Pur ôtro ladu, eu mandei ela mi mostrá us trem di muié e... -- continuava de cabeça baixa -- Discunfiei qui... -- pigarreou -- Discunfiei qui já num é mais... -- pausou brevemente -- minina virgi... -- olhou para a mulher -- E si o pai dela sobé...

 

--Você teve relação com algum rapaz, filha? -- perguntou delicadamente para a morena

 

--Laa! (Não!) -- negou de pronto

 

--O problema num é us homi, não, dotôra! -- Amina respondeu -- É us cavalu!

 

--Como é??? -- a médica arregalou os olhos -- Como assim os cavalos?? -- olhou apavorada para Zinara

 

--Ô, maama, ixplica direitu, min fadlik (por favor)! -- pediu sentindo o rosto queimar de vergonha

 

--É qui Zinara num podi vê um cavalu qui fica doida! -- esclareceu

 

--Fica doida, em que sentido? -- a médica continuava desconfiada

 

--Querendu trepá, uai!

 

--Trepar...? -- ajeitou-se na cadeira -- "Esse pessoal de Cedro é esquisito mesmo... Menina zoófila!” -- pensou horrorizada

 

--Fala montá, maama! -- tentava esclarecer -- Montá!

 

--E ela mi dêxa cabrêra purque num gosta di usá aqueli trem qui as muié usa modi trepá cum sigurança, num sabi?

 

--Que trem?? -- queria saber -- Camisinha?

 

Zinara não sabia o que era camisinha, mas se opôs veementemente. -- Sela, uai!! -- fez cara feia -- "Diacho de doktuur mais lesa!” -- pensou revoltada

 

--Eu achu qui ela cabô perdendu a virgindadi cum us cavalu! -- Amina afirmou envergonhada -- E num sei o qui fazê! -- suspirou -- Quandu Raed discubri...

 

--Vai ser um impacto... -- a médica balançou a cabeça pensativa -- "Pobre pai...” -- olhou para Zinara condenando”

 

As garotas riam com vontade.

 

--Aquela doktuur era pomba das mais lesa e entendeu tudo errado. -- a astrônoma contava de cara feia -- Preconceituosa pensou bobagem, só porque a gente era de Cedro e maama não sabia se expressar direito na língua daqui! -- fez um bico -- Me examinou, viu que eu não era mais virgem e no final ainda me deu lição, falando sobre sex*, amor e animais!

 

--Ai, essa foi ótima! -- Fabiana balançava a cabeça achando graça -- Zinara, o terror dos cavalos! -- brincou -- Prende os bicho que ela tá solta, mano! -- riu

 

--E teu pai descobriu que você perdeu a virgindade com os cavalos? -- Paulinha perguntou rindo

 

--Maama nunca disse nada pra ele! -- olhou para cima agradecendo -- Mas eu levei uma surra de varinha pra nunca mais andar de cavalo sem sela!

 

--Foi o movimento do teu corpo no trote sem sela que te fizesse deixar de ser virgem? -- Ingrid perguntou boquiaberta -- Oxi, que se eu soubesse disso nunca tinha sentado em sela!

 

--Meninas, chegamos!!! Oi!!! -- três vozes femininas se fizeram ouvir

 

--Ih, agora é que vai danar! -- Rosa comentou achando graça -- As caipiras chegaram!

 

--Oi!! -- cumprimentaram ao entrar no apartamento -- Por que tá todo mundo aqui, uai? -- uma delas perguntou

 

--Ah, é a garota que Tina falou! -- uma das três estendeu a mão -- Encantada! Eu sou Clarisléia! -- apresentou-se

 

--Tacharrafna! (Muito prazer!) -- apertou a mão dela -- Zinara!

 

--Eu sou Clarisnice! -- apresentou-se também

 

--E eu, Clarismarry! -- veio para perto

 

“Ave Maria, que nomes!” -- pensou estranhando -- "Mas o importante é ter saúde, né?” -- sorriu para as moças -- É um prazer!

 

--Donde cê é? -- Clarismarry perguntou -- Nós somos de Tukanatim!

 

--Eu vim de Guaiás! -- respondeu com orgulho -- Somo vizinha, uai! -- brincou

 

--Ah, então você deve gostar de moda de viola! -- Clarisnice comentou empolgada -- Canta com a gente! -- começou a bater palmas -- Vê lá!

 

--Ai, não! -- Ingrid revirou os olhos

 

--Nóis saímo cum a boiada, logu atráis du tocadô... -- Clarisléia cantava com sotaque forte -- si embrenhemu nas istrada, coração cheiu di dô... -- batia palmas

 

--Como fica a namorada, tão longe do meu amor? -- Zinara cantou -- Não me lembro mais de nada, só do vento que soprou...

 

--AHAHAH, ela sabe!!! -- Clarisnice aplaudiu empolgada -- E canta bem por demais da conta! -- olhou para as outras moças -- Por mim ela fica! Mais uma caipira pro bando! -- as irmãs balançaram a cabeça concordando

 

--Por mim também! -- Bruna concordou -- Ainda mais que ela sabe escrever com aquelas cobrinhas lindas do povo de Cedro! -- sorriu

 

--Você só curte essa música de caipira, é? -- Aline perguntou de cara feia -- Não gosta de outra coisa?

 

--Gosto, uai! Gosto da música do Oriente, dos clássicos, de música popular, de forró, de rock... -- respondeu para a moça

 

--Rock tipo o que? -- Aline insistiu -- Aposto que nunca nem foi num show! -- falou com descrença

 

--Pois eu fui num show de rock na Capital e vi um monte de banda boa! -- falava toda prosa que nem criança -- Sadikii (meu amigo) Fred simplesmente tascou um beijo na boca do Lobato Lusso! -- gesticulou -- E eu tenho uma foto nossa junto com Lobato!

 

--O QUE??? -- Aline gritou -- Cara, você conheceu Lobato Lusso?? -- ficou eufórica -- Viu a banda dele tocando na Capital?? -- olhou para as demais -- Ah, mas eu voto pelo sim! Zinara fica!

 

--Por mim também! -- Ingrid concordou

 

--Por mim tá aprovada também! -- Valentina declarou -- Se tem alguém contra, que fale agora ou vá pro quinto dos inferno! -- olhou para todas e ninguém se pronunciou -- Zinara! -- olhou para a morena -- Bem vinda à República das Bolachas e Cachorronas! -- sorriu

 

--UHU!!!!!!!!! -- todas bateram palmas saudando a nova integrante

 

A morena ficou feliz e sorriu animada.

 

--Se prepara que amanhã você vem! -- decretou -- Suas companheiras de quarto seremos Bruna, Aline e eu. -- apontou para cada uma -- As outras são vizinhas e todo mundo se ajuda.

 

Zinara lembrou-se de um detalhe importante e perguntou receosa: -- Mas e o aluguel? Não sei se vou ter dinheiro pra pagar...

 

--Se aperreie não que pra tudo se dá um jeito! -- Valentina respondeu despreocupada -- Vem e pronto! O importante é ser fiel às amigas e cumprir com o que se prometer aqui dentro. -- estendeu a mão para a outra -- Tá certo?

 

Apertou a mão dela com firmeza. -- Tá certo! -- olhou nos olhos -- Ana fez ‘ala mawa’idi! (Eu cumpro com promessas!) Pode confiar em mim!

 

“E naquele dia, Kitaabii, começava uma grande amizade. Do seu jeito bem peculiar, Valentina seria a pessoa me apontando o caminho. Ela me ajudou a deixar de ser uma caipira ingênua, me apresentou a cidade e me fez perder o medo de São Sebastião. Para dizer a verdade, ela me fez aprender a amar aquela terra de gente brincalhona e agitada.

 

Valentina marcou a minha vida e certamente muito me ajudou na construção de mim mesma. Eu estava deprimida, perdida, solitária e ela me trazia um pouco de alegria, um pouco de luz. Morei naquela República até minha formatura, Kitaabii. E foi uma das experiências mais ricas e mais loucas de toda minha vida.

 

Às vezes fico me perguntando... quem poderia prever que, anos mais tarde, São Sebastião me daria o grande amor da minha vida? Como teria sido se eu tivesse conhecido Sahar naquela época?

 

Mas, pensando bem, Kitaabii, foi melhor que o Amanhecer tenha se dado por agora. Antes eu não estaria preparada para ela. Meu coração ainda não estava limpo, desoprimido, maduro. Antes, minhas trevas não me permitiriam ver qualquer luz. Sahar chegou no momento certo... pena que me pareça que estou partindo no momento errado.”

 

--Ai, minha caipirinha... -- acariciou levemente as costas dela -- Por que você já aceitou que seu tempo acabou? -- falava baixinho para não acordá-la -- E por que eu não aceito isso? -- deu um suspiro profundo

 

***

 

 

Georgina acordou de madrugada se sentindo mal e fez um chá de boldo. Quando Hassan se levantou para começar a se arrumar, não o deixou perceber o que estava se passando. Despediu-se dele e acompanhou o menino partir com o olhar.

 

--Lá vai meu mininu, cheiu di esperança... Lá vai eli pra mais um dia di aula... -- falou para si mesma antes de voltar ao trabalho do lar

 

Pouco mais tarde ouviu uma jovem lhe chamar pelo nome e atendeu desconfiada.

 

--Não sei se lembra de mim. -- a moça falou -- Mas eu já tive aqui.

 

--Ocê veiu a mandu di Zinara. -- reconheceu -- Alembro docê, sim. -- foi abrir a porta

 

--E voltei a pedido dela de novo. -- Lídia respondeu sorrindo -- Vim trazer esse endereço. -- estendeu um pedaço de papel -- Desculpe a hora, mas saio cedo de casa e aproveitei pra passar aqui e resolver logo esse assunto.

 

--E issu é o que? -- olhou desconfiada

 

--O endereço de um hospital onde você pode se tratar de graça. -- ajeitou as folhas do fichário que segurava -- Parece que Zinara tem uma amiga médica e ela mexeu os pauzinhos pra lhe ajudar. -- comentou -- Vai lá pra ver como é. Custa nada! -- aconselhou

 

Georgina ficou surpresa. -- Tá, eu vô. -- concordou -- Agradicida!

 

--Não tem do que. -- deu tchauzinho -- Deixa eu ir que o dia vai ser longo! Tchau! -- afastou-se e seguiu caminhando com pressa

 

--Comu é qui podi issu? -- olhava abestalhada para o papel -- Zinara parece que adivinha... -- sorriu

 

***

 

--Raquel, tira esse teu maldito cigano dos peito cabeludo daqui! -- Cecília reclamava -- Eu odeio essa coisa! Troço horrível! -- fez cara feia

 

--Não sei porque! -- respondeu desaforada -- Ainda mais você, que não pode ver macho!

 

--Pior você, que não pode ver comida! -- argumentou com raiva -- Morta fome! -- gesticulou -- Você e seu marido são uma dupla e tanto! -- comentou irônica -- O ogro e a esfomeada morando no quintal!

 

--Por tua culpa, que tá fazendo aqui o que? -- gesticulou também -- Se recompondo porque teu ex te deixou aí, abandonada e ferrada!

 

--Vocês tão pedindo pra levar mais chinelada no rabo, vou te contar! -- Leda já veio com chinelo em punho -- Acho bom parar com essa baixaria aqui! -- ordenou

 

--Ela que começa, mamãe! -- Raquel reclamou -- Implicando com minhas coisas!

 

--E ela só vive me provocando, mamãe! -- Cecília deu queixa -- Jogando na minha cara o tamanho da minha dor!

 

--Ô, meu Pai, mas que tanta bobeira! -- olhou para cima e jogou o chinelo no chão -- Vocês duas têm quantos anos mesmo, hein? -- cruzou os braços e olhou para ambas -- Dez? -- provocou -- Meu neto tá fazendo mais vantagem! -- balançou a cabeça desgostosa -- Falando nele, cadê o menino?

 

--Na barraca junto com o pai! -- Raquel respondeu chateada -- E eu tô indo pra lá agora! -- decidiu

 

--Ya Leda, terminei de colocar o disjuntor novo. -- Zinara chegava na sala -- Agora já pode voltar a brincar com seu computador! -- sorria

 

--Finalmente uma notícia boa! -- bateu uma palma -- Vou entrar no LivrodasFuça e conversar com tua mãe. -- falava com Zinara -- E de noite vou ver minha luta. -- anunciou -- Ai de quem fizer fuzuê nessa hora, senão cabeças vão rolar! -- gesticulou

 

--Ô, Zinara, aproveita e lava a louça que a pia tá cheia! -- Raquel ordenou -- Vou voltar pra minha barraca. -- olhou para Cecília -- E você não se atreva a mexer no meu cigano!

 

--Pois eu mexo no teu cigano porque já disse que não quero esse troço aqui! -- Clarice apareceu de cara feia e tirou o retrato da parede -- E Zinara não é sua empregada! Se a pia tá cheia, então que você lave! -- afirmou com decisão

 

--Me dá meu cigano aqui! -- aproximou-se e pegou o retrato das mãos da irmã -- Implicância! -- abraçou-se com a foto

 

--Você compensa nesse bicho feio a falta de homem que tem com teu marido! -- Cecília zombou -- Depois fala de mim!

 

--Ah, vai se ferrar! -- gesticulou -- E vai lavar a louça, porque foi você que deixou a pia suja! -- abriu a porta para sair

 

--Raquel! -- Cecília chamou e ela olhou -- Só pra constar, a barraca é da Zinara! -- lembrou sarcástica

 

--Humpf! -- fez um bico -- Inferno de vida, vou te contar!

 

--Eu vou pro computador. -- Leda foi andando em direção ao quarto -- E já avisei, não quero fuzuê na hora da luta!

 

Clarice ficou olhando agoniada para as outras mulheres e chamou arrependida. -- Raquel, mamãe, esperem! -- pediu -- Esperem! -- caminhou até a porta da sala e não deixou a irmã sair -- Volta pra dentro, vamos conversar. -- segurou-a pela mão -- Por favor, mamãe! -- olhou para a idosa -- Esquece computador e vamos nos acertar aqui!

 

--E a louça, quem vai lavar? -- Cecília perguntou contrariada

 

--Você! -- Clarice respondeu seriamente -- Mas eu não tô preocupada com isso agora! -- guiou Raquel para se sentar no sofá -- Senta, mamãe. -- chamou -- Vem, Cecília, senta aqui com a gente. --pediu

 

Zinara pensou em deixá-las a sós, mas percebeu no olhar da amada que ela desejava que ficasse.

 

--Nós somos uma família, já moramos todas juntas no passado! Por que agora não conseguimos conviver? -- a paleoceanógrafa argumentava pesarosa -- Tem se tornado cada vez mais estressante passar um minuto que seja perto de vocês! Não pode ser assim! -- olhava para elas

 

--Ah, por que acontece isso? -- retrucou -- Mamãe implica com meu marido, Cecília fica se metendo comigo, você não deixa eu arrumar a casa do jeito que eu gosto!

 

--Eu implico com teu marido porque aquele traste sempre foi malandro, vagabundo e sem vergonha! -- gesticulou -- Se não fosse por ele, vocês não estariam aqui passando sufoco! -- falava de cara feia -- Sou espírita até um certo ponto, menina, e esse teu ogro me tira do sério!

 

--Eu me meto contigo porque você pensa que a casa de mamãe é sua! -- Cecília rebateu -- Tô sofrendo, carente, precisando de um colo e você não tem sensibilidade pra ver isso! -- respondeu mal humorada -- Apenas me defendo, neném, você que começa!

 

--E por causa dessas bobagens, nossa vida aqui tem que virar um inferno? -- Clarice perguntou para todas -- É preciso que haja respeito, gente, e um mínimo de tolerância! Até da minha sexualidade vocês fazem motivo de confusão!

 

--Claro, né? -- Cecília reclamou -- A casa tá cheia e você ainda traz mais uma! -- referia-se a Zinara

 

--Quem decide quem fica e quem não fica aqui sou eu, Cecília! -- Leda revoltou-se -- Nenhuma de vocês tem que dar pitaco, não! A casa é minha e eu não morri nem tô doida!

 

--E Zinara não veio pra morar aqui! -- Clarice salientou -- Infelizmente... -- complementou baixinho

 

--Ó, desculpa eu me meter, mas... -- a astrônoma se aproximou receosa -- Entendo bem como são esses problemas de Il-cela (família) e queria que me ouvissem, min fadlik (por favor). -- pediu com respeito -- Às vezes, quem tá vendo “de fora”, -- fez aspas com os dedos -- enxerga melhor certas coisas.

 

--Só me faltava essa! -- fez um bico -- Agora ela acha que pode se intrometer nos assuntos da família! -- gesticulou

 

--Cala a boca, Raquel! -- Leda ordenou -- Fala, minha filha. -- olhava para a morena

 

--Vocês estranham o que vivem hoje, porque a presença de todos aqui nessa casa muda a rotina e tira a privacidade. Geralmente as pessoas se ressentem por demais da conta quando são forçadas a mudar de hábitos. -- olhava para as mulheres -- Eu, por exemplo, só fui saber o que era privacidade lá pra depois dos meus vinte anos. Por isso, me perdoem, -- falava com jeito -- mas não consigo ver um problema real aqui. Com um pouco de paciência, diálogo e respeito mútuo, vocês conseguiriam viver bem. A casa é até grande...

 

--Também acho! -- Clarice concordou

 

--Eu tenho câncer, vocês sabem disso! -- afirmou com seriedade -- Precisei ver a sombra da morte pra consertar minha vida, pra aprender a perdoar de verdade e me esforçar pra ajudar usritii (minha família) a se tornar realmente uma família! -- emocionou-se -- O que vocês esperam pra fazer a mesma coisa? Uma doença grave chegar? Ou depois que se chorar no enterro de alguém, ficar lamentando pelo que não se fez?

 

Cecília abaixou a cabeça envergonhada.

 

--Se zogik (seu marido) fosse mais responsável, me perdoe dizer, certamente vocês não estariam sem casa hoje! -- olhou para Raquel -- Mas ele não vai mudar por si mesmo, acho que o tempo já te mostrou isso. Você precisa cobrar dele, impor certas coisas e fazer valer suas expectativas! -- gesticulou -- E também é necessário se lembrar que essa é a casa de sua mãe e Clarice. Não pode chegar aqui e simplesmente querer mudar o jeito da casa que elas se habituaram a ter. Também não pode sair comendo tudo e não contribuir! -- aconselhou -- É preciso ter mais humildade e consideração!

 

Raquel fez um bico e nada respondeu.

 

--Se você tá sofrendo e veio pra cá porque precisa de ajuda, -- olhou para Cecília -- é preciso também ter humildade e paciência, porque a vida de todo mundo mudou! -- aconselhou a outra -- E não alimentar tantas esperanças a cada relacionamento. Enquanto ficar no desespero pra encontrar um grande amor, nunca vai atrair quem valha a pena! -- passou a mão nos olhos -- Experiência própria, habibi.

 

--Como se você entendesse de homem... -- resmungou para si mesma

 

--Se Getúlio não é o genro que ya sayyida (a senhora) desejava, -- olhou para Leda -- é preciso ter paciência, porque ele é o homem que bintik (sua filha) escolheu. E ele é pai do menino; isso não vai mudar!

 

--Fazer o que? -- a idosa resmungou também -- Tem criança que carrega um carma pesado...

 

--Clarice e eu temos um relacionamento, todas sabem disso. -- afirmou naturalmente -- E esse relacionamento é só nosso, não interessa a ninguém. -- gesticulou -- Que não concordem com isso, tá no direito de vocês. Que respeitem isso, é um dever!

 

--Com certeza é! -- Clarice concordou

 

--Essa situação aqui não vai durar pra sempre, mas vocês nunca deixarão de ser irmãs! Nunca deixarão de ser filhas de ya Leda. -- suspirou -- Ouçam o conselho de uma pessoa que corre contra o relógio: tenham paciência, tenham respeito mútuo e façam um esforço pra viver melhor. -- aconselhou -- Se Deus trouxe vocês pra perto uma da outra novamente, foi por um motivo importante. Não criem motivos pra se arrepender, porque a pior coisa é desejar mais tempo e não ter... -- pausou brevemente -- Eu vou tomar um banho e deixo vocês à vontade pra conversar. -- olhou para a idosa -- Com licença, ya Leda. -- pediu

 

--Vai lá, filha. -- respondeu emocionada -- Vai lá... -- Zinara saiu da sala

 

--Desculpe, mamãe. -- Cecília pediu de cabeça baixa -- Desculpe, Raquel... -- levantou-se -- Eu vou lavar a louça.

 

--Espera um pouco. -- levantou-se também -- Acho que todas devemos pedir desculpas. -- Clarice olhava para as demais -- Vamos fazer um esforço pra viver melhor a partir de hoje e buscar uma solução pros nossos problemas. -- propôs -- Eu não quero mais esse clima de briga dentro de casa!

 

--Tá certo... -- Raquel se levantou também -- Eu não coloco mais meu cigano na parede... Também não vou mais comer as coisas todas sem repor... -- olhou para as irmãs -- Desculpa, Cecília. Desculpa Clarice... -- olhou para a mãe -- Perdoa, mamãe, mas eu preciso da sua ajuda...

 

--E eu nunca vou deixar uma filha desamparada! -- Leda se levantou também -- Mas não quero mais saber de briga por aqui!

 

--Vamos fazer um esforço, né? -- Clarice pediu às irmãs -- Peço desculpas pelas palavras duras que posso ter dito pra vocês.

 

--Venham aqui, meninas! -- Leda abriu os braços -- E chega de tanta bobagem!

 

As mulheres se abraçaram com a idosa e beijaram o rosto uma da outra como costumavam a fazer na infância.

 

--A senhora bem que podia deixar meu marido ficar dentro de casa, né, mamãe? -- Raquel pediu fazendo dengo

 

--Como eu disse, menina: meu espiritismo só vai até um certo ponto! -- respondeu resoluta -- Não abusa!

 


CAPÍTULO 111 – Sem Palavras

 

Dias depois, Clarice acordou e estranhou não ver Zinara deitada. Sentou-se na cama sobressaltada e sentiu o coração acelerar. -- Meu Deus... -- surpreendeu-se com uma carta na mesinha de cabeceira -- Pra onde você foi, criatura? -- levantou-se e abriu a carta com ansiedade

 

https://www.youtube.com/watch?v=H5VtqQWfO-I

 

“SabaaH il-kheer, Sahar! (Bom dia, Amanhecer!),

 

Provavelmente quando você estiver lendo esta carta já estarei bem longe. Não quero que me odeie, nem que guarde mágoa por não ter ouvido de mim um último adeus, mas eu não conseguiria... Preferi apenas contemplar seu rosto sereno ao dormir e me despedir sem palavras. Acredite, Sahar, de todas as despedidas silenciosas, esta foi a mais difícil.”

 

Zinara chegava sozinha no aeroporto com seu mochilão. Desceu do ônibus e foi direto para o guichê da empresa aérea fazer o check in. Era cedo mas ela havia chegado com o mínimo de antecedência.

 

“Sahar, talvez você nunca me perdoe, mas eu não teria condições de fazer diferente... Para dizer a verdade, acho que ninguém nunca vai me perdoar, mas eu precisava ir. Loucura, pode dizer que é, mas albii (meu coração) me falou que o momento era esse, então eu fui...”

 

A astrônoma foi atendida rapidamente e logo se encaminhou para o portão de embarque. Distante dali, Clarice começou a chorar baixinho.

 

“Eu te amo, Sahar, com todas as minhas forças! Um tipo de amor que eu só conheci quando meus olhos encontraram os seus, quando minhas mãos puderam tocar as suas e suas palavras mansas e delicadas acariciaram meus ouvidos. Aquele amor que me iluminou a alma quando o dia amanheceu na minha vida; quando você raiou no céu do meu destino e se tornou a estrela plena do meu firmamento.”

 

A morena corria para embarcar no avião.

 

“Não vou para a roça, tampouco para Cidade Restinga. Vou para o último lugar que me faltava ir, mas estarei sempre no abrigo do seu coração.”

 

--Zinara... -- Clarice lamentava

 

“Você é como a chuva que cai depois das secas, fazendo o cerrado ficar verde como a esperança da Natureza. Você é como as flores dos ipês, colorindo os campos com as tintas alegres das cores de Allah. Você é como o brilho das estrelas, guiando o viajante pela escuridão da noite...”


Zinara se acomodava em seu assento, afivelando o cinto de segurança e posicionando os pequenos travesseiros nas costas. Olhou através da pequena janela e suspirou pensando na vida.

 

“Deixei com você muito mais que um simples Kitaab eletrônico. Deixei meus segredos, meus sonhos, minhas alegrias, minhas tristezas. Não fiz apenas te entregar um punhado de arquivos, mas toda minha vida. E é isso que você tem, Sahar: minha vida!”

 

Após uma rápida conferência de assentos por parte da tripulação, o avião já se preparava para decolar.

 

“Escrevi coisas, muitas coisas, e deixei-as todas com você. Não sem um motivo, não sem uma razão. Escrevi principalmente para me mostrar a você e porque também eu já estava cansada. Cansada de tantas mentiras, de tantas difamações! A cada vez que meu povo é chamado de terrorista e que as vítimas são apresentadas como culpadas por seu próprio sofrimento, isso me magoa e maltrata como nem sei dizer! Queria que o Ocidente pudesse saber, conhecer o outro lado da verdade que é afirmada por aqui. Mas, não tenho grandes pretensões. Sei que sou apenas uma professora, uma “escritora”, por muitos anos presa em um mundo preto e branco, mas que foi buscando mudar de cor. Graças a você, mudar de cor...

 

Acredite na sua missão, ya habibi. O momento do planeta é de mudança e você pode contribuir para que o Bem vença! A vida toda eu acreditei que sonhos não envelhecem e meu maior desejo sempre foi encontrar a Paz... Mas se não mudarmos o mundo, o mundo não vai nos mudar também. Temos nossos corações esperançosos e a sinceridade como virtude. Se não pude ver a Paz no mundo, encontrei-a ao menos dentro de mim, no aconchego do seu amor, no carinho de teus afagos e sob as bênçãos de Allah.”

 

Zinara despedia-se de Terra de Santa Cruz com os olhos marejados.

 

“Você deve achar que escrevi coisas sem sentido nesta carta, mas a emoção é forte ao extremo e talvez eu não consiga mais raciocinar claramente. Escrever com olhos marejados também é missão complicada. Meu cérebro não funciona mais e o coração assumiu o controle da caneta... Será que você entenderá o que meu coração diz?"

 

--Meu amor... -- Clarice tinha o rosto banhado em lágrimas

 

"Um dia, em outra vida ou no Além, estaremos juntas mais uma vez, tenho fé. Mas enquanto a distância da matéria nos separar, a força do amor nos manterá unidas em laços eternos por toda eternidade.

 

Fique bem, fique com Deus e seja muito feliz! Para você, desejo o que de mais belo poderia querer para uma filha de Allah.

 

Ana fy knt, wknt fy ly wallh fyna. (Eu em você, você em mim e Deus em nós.)”

 

Clarice fechou os olhos e chorou profundamente.

 

E um avião distanciava-se no horizonte...

 

(nota da autora: pequeno trecho baseado na música Je M’écris [a])

 

 

Fim do capítulo

Notas finais:

Música do Capítulo:

[a] Je M’écris. Intérpretes: Kery James ft Zaho & Grand Corps Malade. Compositor: sem informações. In: À L'ombre du Show Business. Intérpretes: Kery James ft Zaho & Grand Corps Malade. UP Music, 2008. 1 CD, faixa 10 (4min21)


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Comentários para 27 - غآسبيّ:
Samirao
Samirao

Em: 10/10/2023

Esse CAPS me mata! Huahuahua 


Solitudine

Solitudine Em: 11/11/2023 Autora da história
Duas vezes, aí ressuscita! rs


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Samirao
Samirao

Em: 10/10/2023

Esse CAPS me mata! Huahuahua 


Solitudine

Solitudine Em: 11/11/2023 Autora da história
Ai, que linda!


Responder

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Samirao
Samirao

Em: 10/10/2023

Ui habibem conseguiu finalmente escrever em árabe aqui. Qual o segredo?


Solitudine

Solitudine Em: 11/11/2023 Autora da história
Eu vi!
Oba!!!!!
Havia conseguido no Lesword, aqui não. Depois você me diz como fez, por favor!


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Femines666
Femines666

Em: 17/03/2023

Minha internet e o celular estão uma bosta! Mesmo provedor aí a gente se ferra. Não estou conseguindo ler direito. Mas o coração saiu pela boca. Como assim foi embora? Ela se foi pra morrer sozinha em Cedro?? Pobre Clarice. Pobre dona Amina!


Solitudine

Solitudine Em: 19/03/2023 Autora da história
kkkkkk Calma, menina, engole esse coração de volta aí! A caipira foi mas volta! rs
Beijos,
Sol


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Seyyed
Seyyed

Em: 21/09/2022

PUTA MERDA ZI FOIBEMBORA??? NÃO ME DIGA QUE FOI PRA PORRA DE CEDRO??? Autora tu mata uma! Ou duas três quatro puta que pariu 


Resposta do autor:

kkkkkkkkkkkkk Desculpe-me, mas não pude evitar de rir desse duas, três, que eu nem entendi direito.

Tenha calma, menina! Confia na caipira!

Beijos,

Sol

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Seyyed
Seyyed

Em: 21/09/2022

Puta merda, essas filhas da Leda são malucas! Só salva a Clarice que de vez em quando tem umas criancices que eu só observo. Hehe Najla e o negão de tirar o chapéu só no love. O frango tá serinho

Eu amo revisitar o passado da Zi. Adorei esse jogo passado presente e até futuro que você coloca em EBT. Isso aqui e SEM são super produções. Não são histórias e nem contos


Resposta do autor:

Ya Leda tem umas filhas meio muito loucas! rs E Clarice é insegura, aí dá nisso que você vê. 

Super produções, obras primas, você me cobre de elogios e lisonjeia. Esses contos foram escritos de corpo e alma. Creio que talvez nunca mais faça igual porque é um processo muito exigente e minha vida mudou demais. Ainda não consigo "aliviar" do lado de cá. Porém, tenho orgulho de ter estes contos conclusos e muito me felicita ler algo como o que você me dedica.

Beijos,

Sol

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Samirao
Samirao

Em: 19/09/2022

Falei cedo demais. Agora sim! Oh yeah


Resposta do autor:

kkkkkkkkkkk

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Samirao
Samirao

Em: 19/09/2022

Depois acerto o resto. Vai ficar tudo certinho 


Resposta do autor:

Tomara! Seja lá o que for que estava errado!

Beijos,

Sol

Responder

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Gabi2020
Gabi2020

Em: 19/05/2020

Olá Sol!

Esse sonho de Clarice com Zahirah é impressionante mesmo.

Percebe-se nos pequenos gestos que Zinara está se despedindo... Clarice no fundo sabe, mas teme perguntar e mesmo se perguntasse a astrônoma iria desconversar, como fez no café da manhã.

 

Dona Leda e essas filhas, coitada! E ainda leva o ogro de brinde... Kkkkkk...

 

Dona Amina deu jeito na briga e não é que seu Raed obedece? Kkkkkkk.... Esse homem de créu... Não aguento esses apelidos. Mas que briga mais fulera essa... Kkkkkk...

 

Jamila está encontrando seu caminho.

 

Zinara e suas lembranças alegres, muito bom relembrar coisas tão boas. Não aguento a Clarice com ciúmes da bousa de Aisha... Kkkkkkk...

 

E chegou o dia, lembro do quanto fiquei triste com a partida de Zinara e hoje quase seis anos depois ainda me emociono lendo a carta para Clarice e ouvindo a música.

“E um avião distanciava-se no horizonte...”

 

Bejjos


Resposta do autor:

Gabinha!!!

Clarice muitas vezes não quer ver o que está diante de si. É insegurança.

Ya Leda tem que ter paciência! kkk

A briga foi fuleira mas deu o que falar! Nem queira testemunhar uma dessas! Tenha medo! kkk

Clarice até hoje, e apesar de tudo, não sabe o que é uma bousa! kkkkkk

Você ainda se emociona porque continua a mesma romântica de sempre. Que bom!

PS: E eu adoro aquela música!

Beijos,

Sol

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