REVELAÇÕES
CAPÍTULO 67 – Habibit e Hayati
Zinara andou um pouco para um lado e outro e, depois de uns segundos em silêncio, encostou-se novamente na porteira e resolveu desabafar: -- Quando eu te conheci naquela festa maluca, minha auto estima como mulher tava completamente abalada. Mais do que nunca! -- confessou -- Fazia um tempo que Grazi tinha me deixado e eu tava decidida a não mais me envolver com ninguém... -- pausou brevemente -- Eu tava me sentindo um peixe fora d’água naquela festa e já me preparava pra ir embora quando você veio me abordar... -- sorriu nostalgicamente -- Fiquei sem saber o que fazer...
“--Oi, tudo bem? -- Jamila se aproximava sorridente e segurando dois copos -- Posso saber como consegue continuar sozinha numa festa como essa? -- piscou para a outra
--Ah... eu... oi! -- sentia as bochechas queimarem -- Oi! -- estava sem graça -- "Smallah, que moça linda!” -- pensou admirada
--Tá calor, né? -- ofereceu uma bebida -- Aceita, é refrigerante! -- continuava sorrindo -- Reparei que você não bebe alcoólicos.
“Reparou?” -- pensou espantada -- Ah... -- não sabia o que fazer -- Chukran! (Obrigado!) -- aceitou constrangida -- “E eu que tampouco bebo refrigerante!” -- pensou
--Chukran? Você fala essa língua? Mumtaz! (Excelente!) -- exclamou admirada -- Ana ismii Jamila! (Meu nome é Jamila!) -- estendeu a mão
Surpreendeu-se. -- Ana ismii Zinara! -- cumprimentou a jovem -- Tacharafna! (Prazer em conhecê-la!) -- sorria -- Kifel haal? (Como vão as coisas?)
--Tudo vai bem! -- bebeu um gole de refrigerante -- Melhor agora que converso com você! -- respondeu sedutoramente
“Ela tá me dando cantada?” -- pensou estupefata -- "Majnum! (Louca!)” -- concluiu -- É... -- não sabia como falar -- Olha, moça... eu acho que não serei das companhias mais agradáveis pra você... -- sentia-se muito envergonhada
--Bitichkii min eh? (Qual é o problema?) -- insistia -- Tenho certeza de que não haverá companhia melhor pra mim nessa festa... -- passou a mão nos cabelos”
Jamila também visitou em sua mente as lembranças daquela noite e sorriu.
--Eu reparei que você parecia um bichinho assustado no meio da mulherada. -- achou graça -- Não sei explicar, mas algo me chamou pra você e não pude evitar de me aproximar, mesmo percebendo que Zinara Raed era totalmente diferente das mulheres com as quais eu costumava sair... -- olhava para a outra -- E quando começamos a conversar, mais fiquei com vontade de te conhecer melhor... -- cruzou os braços -- Você foi a primeira mulher que parecia realmente me ver... ver algo mais que um corpo... -- pausou brevemente -- A Jamila forte, sedutora e decidida que sempre fiz questão de mostrar nunca passou de uma mulher cheia de inseguranças que morria de medo de se entregar e sofrer por amor. -- assumiu -- Mas você desde o começo ultrapassou minhas barreiras e me enxergou... -- mordeu o lábio inferior -- Wallah wed-dony baØ¡et fe ‘aenaya Haga tanya! (Eu juro que a vida mudou diante de meus olhos!) -- emocionou-se e viajou no passado
“--Habibit, -- a astrônoma se aproximava -- não tenha medo, vai dar tudo certo. -- tocou o rosto dela -- Você vai passar no exame da ordem e logo será uma advogada conhecida e respeitada pelo mundo afora! -- sorria -- Macleech! (Não se preocupe!) Apenas fique tranqüila e confie no que sabe! -- aconselhou
--Choo? (O que?) Eu não tenho medo! -- indignou-se -- Nem tava pensando nesse exame! -- mentiu
Sorriu compreensiva. -- Às vezes você me parece uma eterna menina. -- puxou-a para um abraço -- Não precisa fingir comigo! -- sussurrou no ouvido dela -- Você é um ser humano, não precisa ser forte sempre. -- falava com carinho -- Ana laka, ya habibit! (Estou aqui para você, minha querida!) -- garantiu
A jovem fechou os olhos e abraçou a namorada com força. -- Tenho medo de não passar... -- confessou envergonhada
--Você vai passar! Eu sei! -- afirmou convicta -- Mas não basta eu acreditar! -- segurou o rosto da jovem com carinho -- VOCÊ tem que acreditar!
--Eu acredito em tudo que você me diz... -- beijou-a -- Behebbik ya, hayati! -- respondeu emocionada”
--Ao mesmo tempo que nós vivíamos uma relação linda, aquilo tudo também era uma coisa que me assustava terrivelmente! -- a geógrafa desabafava o que não queria admitir no passado -- Meu coração estava em suas mãos e eu não queria me sentir tão refém...
--Confesso que também tive muito medo de você. Desde que nos conhecemos... -- assumiu -- Uma jovem linda, cheia de estilo, classe média alta, 20 anos de idade, que morava sozinha e cursava direito e geografia ao mesmo tempo... -- pôs as mãos nos bolsos -- Nunca tinha me envolvido com alguém tão mais jovem, era nítido que você era experiente em termos de relacionamentos e que não costumava a se prender... Também era óbvio que os ambientes que costumava a frequentar eram um tanto sofisticados... -- pausou brevemente -- Era como se fôssemos de mundos diferentes em tudo!
--Eu ficava agoniada com sua mania de gostar de roça, de lugares rústicos, esportes de aventura... -- sorriu e abaixou a cabeça -- Nada disso fazia parte do meu mundo mesmo! -- esfregava o pé na grama -- Também sempre achei que você trabalhava demais, embora meu tempo fosse bastante tomado... -- olhou para a professora -- E você sempre esteve tão na minha frente... -- suspirou -- Eu me sentia uma analfabeta namorando uma ganhadora do prêmio Noble....
--E eu me sentia sempre uma caipira brocoió namorando uma garota chique da high society... -- encostou-se na porteira -- Mas nunca acreditei que houvesse diferenças que não pudessem ser transpostas pelo amor! -- afirmou emocionada -- Eu me entreguei, Jamila! -- olhava para ela -- Investi na gente com todas as minhas forças apesar de tudo! Hawaky Ø¡abelto w fe sanya gereet ‘aaleeh! (Eu encontrei o seu amor e num segundo estava correndo atrás dele!)
A advogada derramou uma lágrima e se aproximou receosa. -- Eu sei, hayati! -- tocou o rosto dela -- E eu também te amei e me entreguei! -- conteve-se para não chorar -- Só que... o que eu podia te dar naquela época, era menos do que você merecia! -- admitiu -- Não consegui de fato olhar pra você e te ver! -- falou com tristeza -- Acho que só te conheci mesmo e aprendi a te amar como deveria depois que nos separamos! -- acariciava os cabelos dela -- E ler o Kitaab de Zahirah me esclareceu muitas coisas!
“Eu sabia que ela devia ter lido tudo!” -- pensou um tanto contrariada
--As coisas pelas quais fui forçada a passar por conta do caso Hamatsu... me fizeram refletir, repensar minha vida, hayati! -- segurou os ombros da ex -- Eu mudei, não é mentira, eu mudei, wallahi (eu juro)! -- afirmava com certo desespero -- Behebbik ya, Zinara! Acredite em mim! -- pedia
--Jamila. -- segurou as mãos dela com carinho e buscou acalmá-la -- Eu também venho refletindo muito sobre minha vida e creia que pensei em nós à exaustão! -- entrelaçaram os dedos -- A verdade é que sempre houve um descompasso entre você e eu, e isso é capaz de desestruturar qualquer relacionamento! -- falava com jeito -- Não foi apenas culpa sua, eu também tive minha parcela de erros! -- assumiu -- Eu também não deixei você me olhar e me ver! Hoje percebo isso muito bem... -- emocionou-se -- E não foi por maldade, mas por defesa! Meu mundo interior é tão conflituoso que assusta até a mim mesma!
--Eu sei... -- chorava contidamente
--Acho que... no fundo estávamos um tanto iludidas! -- desabafava -- Você era a personificação de tudo que sempre admirei em uma mulher! Talvez você fosse o que eu queria ser, mas nunca houve jeito! -- sorriu com tristeza -- É como se diz em Cedro: “o caipira é caipira, mesmo que tome sopa em colher de prata!” -- citou um provérbio de sua terra natal -- E talvez eu tenha sido o porto seguro que você nunca encontrou em usritik (sua família)... a personificação da paz que sua alma busca mesmo sem perceber, ainda que eu não tenha encontrado essa paz pra mim mesma! -- pausou brevemente -- Seu coração sempre quis um amor, Jamila! -- afirmou convicta -- Você é que nunca admitiu isso!
--Hoje admito! E quero seu amor! -- insistiu agoniada -- Ana cawza!! (Eu quero!!)
--Talvez você queira tanto, por pensar que se desistir perderá pra Clarice! E perder é algo que você não admite... -- afirmou com cuidado -- A competitividade sempre foi algo muito forte em sua personalidade.
--Hayati... -- resmungou contrariada
--Você pode estar apenas lutando por vaidade... assim como eu te maltratei naquele dia lá em casa por um pequeno e medíocre desejo de vingança! -- confessou -- Doeu em mim, mas lá no fundo queria te ver sofrer... -- uma lágrima teimosa rolou-lhe pelo rosto -- E foi horrível...
A jovem pensava no que ouvia e não sabia o que dizer. Seu coração sentia que a verdade era aquela, mas o racional não queria admitir.
--Eu não me arrependo de nada vivido a seu lado, Jamila! -- afirmou com verdade -- E sou muito grata por tudo que fez por mim! -- agradecia -- Por me incentivar a sentir orgulho de mim mesma, por estar do meu lado quando fiz a doação de rim, por cuidar de mim toda vez que me machuquei fazendo caipirices radicais... -- riram juntas por alguns instantes
--Também não me arrependo, hayati... -- olhava nos olhos -- Também te agradeço por tudo de bom que fez em minha vida! Eu não teria chegado onde cheguei sem você!
--Nunca esquecerei que você fez da luta pelo pedido de indenização pra usritii (minha família) o objetivo máximo da sua carreira que se iniciava... -- lembrou-se do passado
“--Maama, baba! -- Zinara entrava correndo na cozinha -- Tenho notícias maravilhosas! -- olhava emocionada para os dois -- Maravilhosas por demais da conta!!! -- largou a mochila no chão
--Eita, qui eu num sabia qui ocê vinha pra cá! -- Amina exclamou surpresa e feliz -- Qui acunticeu, minina? -- estava curiosa
--Ave Maria, minina! -- Raed sentiu o coração acelerar -- Ocê fali logu qui o coração chega dói di consumição!! -- queria saber
--Nossa advogada conseguiu!! -- anunciou -- O Governo de Suriyyah vai pagar uma indenização pra usritina (nossa família) até o fim da vida dos dois!! -- pulava -- Finalmente!!! -- sentia-se nas nuvens -- E não vai ser pouquinho dinheiro, não, viu? -- olhava para eles
--Smallah! -- Amina caiu de joelhos no chão -- Lôvadu seja Deus! -- chorava emocionada -- Lôvada seja a Virgi!! -- agradecia -- Lôvada seja a adévogada!
--Oh, Aba! (Meu Pai!) -- Raed se ajoelhou também -- Dispois di tantus anu, di tanta luta! -- emocionou-se -- Lôvadu seja Deus e a Virgi pra todu sempri! -- agradeceu -- Lôvada seja a adévogada!
--Ajueia aqui mais nóis, minina! -- Amina pediu e a filha obedeceu -- É uma graça grandi pur dimais da conta! -- sorria embevecida -- Tem qui agradicê!
--E ocê, Zinara? -- o pai perguntou -- Ocê num ganhô, não? -- olhava para ela -- Afinar di conta ocê também é vítima di guerra, uai!
--Meu processo ainda vai levar mais tempo porque o Governo de Suriyyah entende que não preciso. -- explicava controlando a emoção -- Eles afirmam que sou jovem, tenho boa profissão e posso me manter. -- passou a mão nos olhos -- Vou entrar com recurso, mas o importante é que ya said (o senhor) e maama conseguiram! -- sorria satisfeita”
--Eu não fiz nada, hayati. Não teria condições de ter encarado um caso tão complexo e antigo naquela época. -- reconheceu humildemente -- Apenas infernizei a vida de minha professora e ela comprou a briga. Fiquei só acompanhando marginalmente... -- sorriu -- Ainda nem tava formada...
--Apesar do seu nome não constar nos autos do processo, sei que você fez a maior parte do trabalho, sei disso muito bem! -- afirmou convicta -- Um processo que se arrastava há anos e que só se resolveu por sua paixão pela causa!
--EU me arrastava há anos e só aprendi a viver por sua causa! Ya agmal hedeya ba’aathaly el adar leya! (Você é o presente mais bonito que o destino mandou para mim!) -- segurou-a pelo casaco -- Por favor, hayati, fique comigo, eu faço qualquer coisa!
--Jamila… -- não sabia o que dizer
--Qualquer coisa!! -- insistiu nervosamente
-- Não faz isso... min fadlik! (por favor!) -- Zinara desvencilhou-se da outra com cuidado e ficou uns segundos calada -- Seneen shayfek fe aHlamy, banady ‘aaleeky dommeeny... (Por um ano eu vi você em meus sonhos e te chamei para que viesse e me abraçasse…) – desabafou -- Layaly kont mosh ‘aayesh w mestaneeky teHyeeny... (Por noites, eu não vivia e apenas te chamava para me reviver…)
--Estou aqui agora, hayati! -- respondeu com tristeza
--Eu desisti de você, Jamila! -- derramou outra lágrima sentida -- Subi no cume da montanha e gritei bem alto, deixando o vento levar tudo embora! -- lembrava-se do que viveu no passado recente
“--Você vai deixar passar! -- o guia de montanha falou
“Jamila, eu desisti de você! Pra sempre!” -- pensou com muita tristeza -- AHAHAHAHAHAHAHAHAH!!!!!!!! -- chorava mais
--Liberdade! -- o guia falava -- Liberdade! -- emocionou-se”
--Acabou, Jamila! -- olhava nos olhos -- Habibit e Hayati não existem mais!
A advogada controlava-se para não chorar pesadamente.
--Te perdôo, habibi, não guardo mais rancor! Não quero guardar rancor! -- falava com muito sentimento -- Habaitak dfa’at elthaman o shfeet! (Eu te amei, paguei o preço e me curei!) -- respirou fundo -- Eu criei expectativas, eu acreditei que você me daria o que não tinha preparo pra me dar... então meu sofrimento foi consequência de coisas que criei! -- pausou brevemente -- Agora quero aproveitar o pouco tempo que me resta pra fazer o que me cabe cumprir e viver momentos de felicidade com a mulher de minha vida! -- pensava em Clarice -- E peço a Deus que o amor chegue pra você! -- desejou -- Amor de verdade, amor que te faça bem, que te ajude a superar os medos! Sei que agora você tem condições de viver o que esse sentimento nos pede!
--Você encontrou esse tipo de amor com Clarice? -- perguntou sofridamente
--Se eu pudesse personificar o amor num rosto de mulher, seria ela! -- respondeu de coração -- Ela é minha Sahar, meu amanhecer tardio numa vida onde a Luz passou o tempo todo tentando dissipar a escuridão...
A jovem caminhou em círculos transtornada e parou diante da morena com expressão de pesar. -- Dam’ai Hekee ‘aanni... (Minhas lágrimas falam por mim...) -- sussurrou quase para si mesma
--Não precisa falar coisa alguma, apenas aceite os fatos e recomece! -- pediu -- Não tenha raiva de mim ou de Clarice! E me perdoe no que falhei com você! Por favor, habibi, me perdoe!
--Não há porque te perdoar... -- passou a mão nos cabelos -- Mas... me dá pelo menos um abraço? -- falou como criança -- O último abraço!
Zinara abriu os braços e Jamila se refugiu neles chorando copiosamente. Sabia que haviam chegado ao final e que insistir seria inútil. Internalizava a verdade que negou nos últimos tempos e buscou naquele abraço um consolo para a despedida que não desejava fazer. Queria apenas que o tempo parasse...
“Que pena que eu despertei tarde demais...” -- Jamila pensava -- "Que pena...”
“Não aprendi dizer adeus,
Mas tenho que aceitar,
Que amores vêm e vão,
São aves de verão,
Se tens que me deixar,
Que seja, então, feliz...”
--Te deixo ir, meu amor! -- olhou para Zinara com o rosto banhado em lágrimas -- Te deixo em paz... -- falava a verdade
--Obrigada, habibi! -- agradeceu emocionada
“Não aprendi dizer adeus,
Mas deixo você ir,
Sem lágrimas no olhar,
Se adeus me machucar,
O inverno vai passar,
E apaga a cicatriz...”
Leandro & Leonardo – Não Aprendi a Dizer Adeus [a]
“Era o fim, Kitaabii. De fato, ali naquele momento, nossa história chegava ao final. Habibit e Hayati se despediam... Não havia mais o que dizer; todas as ilusões foram desfeitas. Era hora de crescer, mais que em tempo de recomeçar.
E eu me sinto livre, Kitaabii. Porque deixei as mágoas de lado, os rancores e frustrações. Não que tivesse esquecido das dores, mas porque simplesmente decidi não lembrar... Nunca mais!”
CAPÍTULO 68 – “A Fim de Saber a Verdadeira Verdade”
Cátia e Magali desciam de um dos ônibus que o sindicato havia fretado para conduzir os manifestantes até o local do protesto contra o leilão do campo de Balança. O motorista abriu o bagageiro para que os professores retirassem seus cartazes e faixas.
--Cátia, cadê as tais dez mil pessoas que você disse que viriam protestar contra esse leilão? -- reparava no ambiente -- Já achei a coisa estranha quando vi que sobrou um monte de lugar nos ônibus que o sindicato fretou. -- pegou alguns cartazes -- O que mais vejo aqui é poder armado! -- comentou desconfiada -- Gente, tem até helicóptero! -- olhou para cima
--Calma, querida, ainda tá muito cedo! -- olhou para o relógio -- Vamos caminhando pra perto da onde montaram o cerco e aguardar os outros por lá. -- pegou uns cartazes -- Vamos lá, gente, peguem os cartazes e as faixas e vamos começar o protesto! -- dirigiu-se aos demais -- Esse leilão não pode acontecer!
--É isso aí!!! -- os outros gritaram
O grupo se encaminhou para perto da barricada que o poder armado montou próximo ao local do leilão e se posicionou com seus cartazes e faixas, gritando palavras de ordem.
--Olha lá o grupo quilombola e o movimento LGBT! -- a geofísica apontou animada para umas pessoas que se aproximavam -- Beleza!
--Beleza, Cátia? -- Magali perguntou fazendo um bico -- São meia dúzia de gatos pingados! -- gesticulou -- Enquanto isso, repara só: -- mostrava -- tem todo esse poder armado montando barricada aqui e mais a polícia, a cavalaria, os guardas, dois helicópteros e dois navios de guerra! -- apontou para o mar -- A gente vai virar paçoca!
--Ninguém veio pra cá pra guerrear, Magali! -- respondeu olhando para a amante -- Nós viemos protestar e mostrar nossa indignação contra esse leilão absurdo!
--Que a gente não veio guerrear eu sei, mas quanto a eles... -- apontou para as autoridades -- ponho minha mão no fogo, não...
--Não tenha medo! -- tentava tranquilizar a outra -- Quando os estudantes chegarem, os outros grupos quilombolas, o pessoal do movimento LGBT e demais patriotas que se comprometeram a vir, a coisa vai mudar de figura, você vai ver! -- ergueu seu cartaz -- Leilão, leilão, é privatização, o petróleo é nosso e disso não abrimos mão!! -- cantava
“A gente vai é apanhar muito, isso sim...” -- pensou preocupada
***
Lúcia chegava sozinha ao local do protesto.
“Nossa, como tem pouca gente!” -- reparava -- "Se tem umas duzentas pessoas aqui, tem muito!” -- olhava para todos os lados -- "E haja poder armado!” -- constatou
--Vejam a tristeza do que se observa aqui, meus amigos! -- Cátia discursava no alto de um carro de som -- Por que o Governo não mobiliza esse poder armado pra combater o crime, o tráfico de drogas e a corrupção no país? Por que? -- olhava para os demais -- No entanto, quando é pra entregar o patrimônio de Terra de Santa Cruz, nosso governo lança mão de todos os recursos pra garantir que isso aconteça! Agem como se fôssemos bandidos, terroristas ou criminosos! -- falava bem alto ao microfone -- Você que está aí de guarda pra nos combater, veja que não somos seus inimigos! -- dirigia-se aos homens e mulheres do poder armado -- Estamos aqui lutando por um patrimônio que é meu, -- bateu no peito -- seu, -- apontou para várias pessoas -- dos seus pais, dos seus filhos e de todos nós!! -- tentava fazer as pessoas pensarem -- Vocês estão colaborando para sua própria pobreza no futuro! Para a pobreza de seus filhos, que herdarão um país cada vez mais dilapidado e desrespeitado em sua soberania! -- as pessoas aplaudiam
--Olha ela ali... -- Lúcia sorriu ao ver a amante discursando
--Esse leilão não pode acontecer! -- gesticulava -- O governo pode e deve entregar o campo de Balança pra nossa estatal explorar e com isso o país vai ganhar de verdade! -- olhava para as pessoas -- Do contrário, o que se disser é a mentira de sempre que contam pra nós! Que Terra de Santa Cruz é o pais do futuro, um futuro que nunca chega! -- os manifestantes gritavam palavras de ordem em apoio à geofísica
--Ai, ai... -- Magali suspirou admirando a loura
--Ô, ô... -- Lúcia reparou uma movimentação estranha
Os homens da barricada posicionaram-se com suas armas e inesperadamente começaram a atirar contra os manifestantes. Ao mesmo tempo, lançavam bombas de gás aleatoriamente e borrifavam spray de urtiga contra os mais próximos.
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!! -- Magali corria desesperada sem saber o que fazer -- "Ai, meu Deus, socorro!!!” -- temia ser atingida por um projétil ou bomba
--Mas que merd*! -- Cátia abaixou-se no carro de som e gritou para o motorista: -- Recua, recua!!!!
--Droga! -- Lúcia corria também
Várias pessoas foram atingidas e se machucaram. Quando os ataques terminaram, voluntários fizeram curativos nos feridos e borrifaram sprays que anulavam o efeito de queimação proporcionado pela urtiga.
--Voltem, meus amigos!!! -- a geofísica convocou do alto do carro de som -- Esse ataque injustificado não pode nos amedrontar e impedir que nossa luta continue!!!
--Eu, hein, Cátia tá é maluca! -- Magali resmungava -- Eu vou ficar é aqui! -- parou perto de um quiosque onde algumas pessoas assistiam TV
--Apesar das tentativas de diálogo por parte do poder armado, os manifestantes mantiveram uma atitude hostil diante da barricada que impedia o acesso ao local do leilão! -- a repórter dizia -- Para acalmar os ânimos, as autoridades tiveram que usar da força. -- algumas imagens do ataque foram exibidas
--Que mentira!!!! -- Magali discutia com a TV -- Não teve nada disso, eles atacaram sem mais sem menos e machucaram um monte de gente!! -- gesticulava
--Eu sei, moça. -- o dono do quiosque concordou -- Tô vendo tudo isso, mas a imprensa diz o que quer e o povo acredita!
--Essa imprensa aí é podre! -- olhou desgostosa para o televisor -- Quero ouvir a imprensa séria e verdadeira como aqueles ali! -- apontou para alguns repórteres
--Humpf! -- o homem fez um bico -- A voz deles é abafada por esse pessoal aqui. -- deu um tapa no aparelho de TV -- Deixei ligado só pra ver até que ponto chegaria a cara de pau desse povo!
--Qual o objetivo desses ataques?? -- um homem negro discursava no carro de som -- O que a professora Cátia disse que poderia ter causado essa reação? -- olhava para as autoridades -- O que fizemos pra justificar isso? -- questionava -- Gente, abram os olhos, esse campo é um tesouro de todos nós! Vocês vão ficar aí nos agredindo pra garantir que o país fique mais pobre, é isso mesmo? -- provocou -- Devíamos todos estar do mesmo lado e contra a pouca vergonha desse leilão!! -- as pessoas gritavam em apoio
--É isso aí!!! -- Cátia gritava -- Leilão, leilão, é privatização, o petróleo é nosso e disso não abrimos mão!! -- as pessoas começaram a cantar também
Lúcia reparou que o número de manifestantes reduziu-se quase à metade depois do primeiro ataque do poder armado. -- Caraca, esvaziou bastante... -- olhava para todos os lados
--Ai, meu Deus!! -- Magali arregalou os olhos ao perceber que um novo ataque viria -- AHAHAHAHAH!!!! -- correu para longe em antecipação
Novamente o som dos tiros e bombas ecoaram naquelas ruas de São Sebastião. E muito spray de urtiga foi lançado contra as pessoas.
--Que inferno!! -- Cátia quase se jogou do carro de som ao perceber que uma bomba foi lançada contra ele -- AHAHAHAHAH!!!! -- gritou ao ouvir a explosão
“Tenho que tirar ela de lá!” -- a bombeira pensou enquanto fugia dos ataques -- "Vai acabar sendo atingida!”
--Mas o que é isso?? -- uma mulher com duas crianças escondeu-se debaixo de umas árvores junto com Magali -- O que é que tá acontecendo? -- perguntou nervosamente -- Por um triz uma bomba dessa não pegou no meu menino! -- abraçou os filhos -- E a gente nem tava em protesto nenhum! -- olhava para a professora
--É o fim do mundo, moça, isso é que é! -- respondeu trêmula
--Ei, olha aquilo ali. -- a geofísica apontou para um pequeno grupo de rapazes que chegavam -- São os Blekiplok! -- comentou com um colega manifestante -- Ai! -- tossiu ao sentir o gás -- Arde... -- reclamou
--É agora que a coisa vai ficar feia... -- o homem respondeu preocupado
A bombeira correu para perto do carro de som e chamou pela namorada. -- Cátia!!! -- gritou -- Cátia!!!!
--Lúcia?! -- arregalou os olhos -- "Eu não sei o que é pior: as bombas do poder armado ou minhas duas mulheres juntas no mesmo protesto!” -- pensou apavorada -- Que faz aqui, criatura??
--Desce daí! Vem!! -- gesticulava nervosamente -- Os Blekiploks chegaram e quando o terceiro ataque do poder armado começar, a coisa vai feder ainda mais!
A loura respirou fundo e respondeu: -- Não posso desistir da luta! -- olhava para a outra mulher -- Vou até o final! -- novamente pegou o microfone e voltou a discursar
--Merda de mulher teimosa! -- deu um soco no carro de som
--Mas que diabo que Cátia não sai de lá! -- Magali saiu de seu esconderijo e caminhava reticente para perto do carro de som -- Vai acabar sendo ferida ou presa! -- passou a mão nos cabelos -- Eles prendem as pessoas sem motivo mesmo... -- olhava para todos os lados -- Gente, não deve ter nem cem pessoas aqui! Já foi um monte de manifestante embora!
Um desentendimento começou no meio dos Blekiploks dando origem a um novo ataque por parte do poder armado, que reagiu com ainda mais violência que antes.
--Ai, mas que droga!!! -- Magali corria para longe apavorada
Uma bomba foi lançada no meio dos banhistas, que correram em desespero abandonando alguns pertences nas areais da praia.
--AHAHAHAH!!! -- Magali se jogou no chão -- Socorro!!! -- gritava em desespero -- É guerra, é guerra!!! AHAHAH!!! -- arrastava-se para debaixo de uma árvore
Helicópteros davam rasantes sobre as pessoas, que se desesperavam com medo que lançassem bombas.
--AHAHAH!!! -- outra bomba foi lançada contra o carro de som e a loura se desesperou pulando sobre a grama -- MERDA!!! -- gritou ao sentir o tornozelo dolorido
O gás da bomba invadiu rapidamente o ambiente e a geofísica sentia os olhos e a garganta queimarem.
--Vem, sua teimosa!! -- Lúcia ajudou-a a se levantar -- Corre!!! -- tentava correr
--Não consigo!! -- respondeu sentindo dor -- Não dá pra correr!! -- tossiu
--Vem como puder, então! -- abraçou-se com a amante e buscavam seguir para longe da confusão
A polícia surgiu correndo pelas ruas laterais e cercou os manifestantes agredindo com cassetetes a quem passava por perto.
--Ai, e agora?? -- Cátia olhou em desespero para a bombeira -- MALDITOS!!! -- gritou
--Vem comigo! -- continuava seguindo e se esquivando
Um grupo de estudantes formou uma pequena barreira para proteger Cátia e Lúcia, que conseguiram chegar até as areais da praia.
--Vamos ficar debaixo de uma árvore dessas! -- Lúcia propôs nervosamente -- Não há mais o que fazer!
“Magali!” -- a loura pensou preocupada -- Uma grande amiga veio também e não sei onde está agora. -- tirou o celular do bolso -- Ela não tá acostumada com isso e deve estar morrendo de medo!
--Senta aí. -- a bombeira ajudou a outra a se sentar -- Deixa eu ver esse tornozelo. -- abaixou-se para massagear -- Hum... -- apertou
--Ai!! -- fez uma careta e recolheu a perna -- Tá doendo! -- reclamou
--Calma, confia em mim. -- segurou o tornozelo dela novamente
--Deixa eu ligar pra minha amiga. -- discou o nome da professora e aguardou
--Cátia, socorro, eu tô morrendo de medo!! -- atendeu apavorada -- O couro tá comendo, a gente tem que ir embora!!
--Onde você está? -- perguntou preocupada -- Ai!!! -- gem*u de novo
--Debaixo de uma árvore perto de um quiosque chamado VerãoZão! E você?
“Como é??!” -- olhou para trás e achou o quiosque. Rapidamente reconheceu Magali encolhida debaixo da árvore -- Ah, eu... -- não sabia o que dizer
BUM!!!!!!!! -- bombas explodiam assustadoramente
--AHAHAHAH!!! -- Magali e Cátia gritaram ao mesmo tempo
--Vamos ter que sair daqui! -- Lúcia anunciou -- Desliga esse telefone e vem! -- levantou e puxou a outra para fazer o mesmo
--Calma, mulher! -- a geofísica levantou-se desconjuntada -- Vamos pra onde?
BUM!!!!!!!!!!
--Praquela árvore ali! -- seguiu arrastando a loura
--Aquela não!! -- arregalou os olhos e tentou impedir -- "Ai, meu Deus, é a árvore de Magali!” -- constatou engolindo em seco
--Por que, mulher? -- não entendia
--Já tá meio lotada, né? -- respondeu sem graça -- Vamos ficar por aqui mesmo! -- sugeriu
--AAAI!!!!! -- um homem gritou ao cair no chão -- Tomei um tiro!! -- levou as mãos a perna
BUM!!! BUM!!!
--Pensando bem... -- a loura mudou de idéia e contatou a outra amante novamente -- Magali, foge daí e corre pra mais longe! -- ordenou
--Tô com medo!! -- quase chorava
--Corre pra longe, vai!! -- insistiu
--Essa Magali tá onde? -- Lúcia perguntou intrigada -- Por que a gente não se junta a ela? -- continuavam seguindo abraçadas -- Anda, Cátia, se esforça que assim eu não agüento! -- pediu nervosa
--Ah, ela... -- desligou o celular -- Sabe que eu nem sei de mais nada?
Magali estava tão apavorada que nem percebeu que Cátia se aproximava com Lúcia. Levantou-se e saiu correndo pelas areias com desespero.
--Nossa, aquela ali corre com vontade! -- Lúcia comentou
A geofísica reconheceu Magali e suspirou aliviada. -- Graças a Deus!
--Pelo que? -- não entendeu novamente
--Que aquela mulher tem força e coragem pra correr daquele jeito. -- disfarçou -- Quisera eu...
***
Horas depois, Cátia e Lúcia estavam bem longe do local das manifestações, sentadas nas cadeiras de um dos quiosques da praia. A loura segurava um saco de gelo sobre o tornozelo.
--Nem sei como conseguimos escapar. -- comentava para a bombeira -- Pensei que acabaria levando uma surra da polícia ou sendo presa!
--Isso não aconteceu porque os estudantes nos ajudaram a fugir pras areias da praia. Do contrário... -- balançou a cabeça
--Magali tinha razão, não veio quase ninguém... -- lamentou com tristeza -- Justo na luta mais importante...
--As pessoas ainda não têm noção do que isso significa, amor. -- respondeu ternamente -- O preço das passagens de ônibus é algo mais próximo da realidade delas do que um campo de petróleo mega gigante!
--Infelizmente... eu fiz tudo que podia pra conscientizar... mas não foi o suficiente... -- suspirou -- Não saberia te dizer o quanto que tô triste! É como se tivesse morrido alguém...
--Own, meu amor... -- teve pena -- É assim mesmo, um dia a gente perde, outro a gente ganha e a vida continua.
--Mas eu só vejo a gente perder! -- reclamou -- Quando que as coisas nesse país vão mudar? -- deu um tapa na mesa -- Que merd*!
Não sabia o que dizer para consolar e decidiu mudar de assunto. -- E a tal de Magali, sua amiga? -- perguntou curiosa -- Cadê ela? O que aconteceu?
--Eu disse pra ela se juntar aos outros colegas que fugiram pra perto do restaurante Minho e pegar o ônibus que conseguiu ir pra lá. -- passou a mão nos cabelos -- Um dos motoristas me ligou pra dizer isso.
--Por que não fomos nesse ônibus também?
--Não dava pra gente chegar a tempo. -- falou a verdade -- "E que bom que não dava, senão eu tava frita! Magali e Lúcia no mesmo ônibus? Deus me livre!” -- pensou aliviada
--E como sabe que ela pegou o ônibus?
--Quando liguei de novo pra Magali ela já tava nele, indo embora. -- esfregava o gelo no tornozelo -- Está a salvo dessa loucura... -- olhou para Lúcia -- Não devia ter vindo... Você se arriscou por minha causa e podia ter se dado muito mal!
--Eu tinha que vir, amor! Pelo país e por você! -- sorriu ternamente
--Você é uma mulher maravilhosa, Lúcia. -- afirmou com verdade -- Não sei o que seria de mim se não fosse por você aqui hoje! -- emocionou-se -- Acho que minha tristeza seria ainda maior!
--Mesmo toda suja de areia, machucada e com o tornozelo ferido, Cátia Magalhães não deixa de ser fofa... -- reclinou-se na cadeira e se aproximou da outra -- Não sabe o quanto me sinto envolvida com você!
Sentiu vergonha ao ouvir aquilo e abaixou a cabeça. -- Não fala assim que tô quase chorando...
--Minha manifestante rebelde... -- tocou o rosto da amante
--Cátia??? -- uma mulher que se aproximava perguntou desconfiada
Cátia e Lúcia olharam na direção dela. A geofísica engoliu em seco.
--Quem é você? -- a bombeira perguntou desconfiada
“Pensa, mulher, pensa!” -- não sabia o que fazer -- Magali, -- olhou para a professora -- Lúcia é uma bombeira que conheci nas manifestações e se tornou uma grande amiga. -- falou rapidamente -- Lúcia, -- olhou para ela -- Magali é uma amiga da faculdade que quis vir nesse protesto pela importância da causa! -- apresentou-as nervosamente -- Falávamos dela há segundos atrás, lembra? -- sorria como boba
--Ah, então você que é Magali? -- perguntou intrigada -- Pensei que tivesse ido embora no ônibus...
--E eu pensei que Cátia tivesse ficado sozinha, como me disse que estaria. -- respondeu de cara feia
Um clima estranho imperou entre elas.
--É que eu encontrei com a Lúcia depois... -- justificou sem graça
--Depois do que? -- questionou de cara feia -- Tô com você desde que se jogou do carro de som!
Magali riu brevemente com raiva. -- Eu não sou idiota, Cátia! Já saquei tudo! -- cruzou os braços -- Quer dizer, eu sou, porque desci daquele ônibus no meio do caminho preocupada com você! -- falava aborrecida consigo mesma -- Voltei pra cá igual uma idiota pensando no seu bem e pra encontrar o que? -- olhou para as outras duas
--Então quer dizer...? -- Lúcia levantou-se da cadeira revoltada -- Você tá saindo com nós duas ao mesmo tempo?? -- concluiu -- Desde quando?
A mulher mexia os lábios sem produzir som. “Ai, meu Deus, e agora??” -- pensou em desespero
--Você não vale nada, Cátia! Mentirosa, cínica, fingida! -- acusou -- Por isso não queria que eu viesse! -- deduziu -- E a idiota aqui acreditando que você queria me proteger!
--Magali, Lúcia, eu posso explicar... -- tentou se levantar mas sentiu dor e permaneceu sentada -- Eu juro que posso explicar...
Deu um tapa no braço da ex. -- Nunca mais se atreva a me procurar! Nunca mais! Se aparecer na minha sala te expulso a pontapés! -- Magali retirou-se revoltada
--E nem a mim! -- deu um tapa no braço dela também -- Não se atreva!! -- foi embora furiosa
--Esperem, por favor! -- chamava em vão -- Ei, gente, calma! -- pedia -- Preciso de ajuda pra poder ir embora! -- acompanhou a trajetória das duas mulheres que seguiram separadas -- Sem campo de Balança, sem Magali, sem Lúcia, mancando... -- suspirou -- É, Cátia, nessa você se ferrou...
***
--E foi assim que você descobriu que ela te traía? Graças ao protesto? -- Clarice perguntou boquiaberta -- Mas me tira só uma dúvida: numa orla tão grande, como foi que encontrou Cátia com tanta facilidade?
--Foi pura sorte! Ou azar, não sei... -- balançou a cabeça contrariada -- Quando desci do ônibus do sindicato peguei um ônibus urbano pra voltar pra praia e foi ali que ele me deixou. -- contava -- Mal soltei no ponto e vi uma mulher parecida com Cátia sentada no quiosque com outra. -- fez um bico -- Fui conferir e deu no que deu! Descobri a verdadeira verdade!
--Eu te disse pra tomar cuidado... -- falou com jeito -- Cátia é envolvente, sedutora, e você anda carente... ia acabar gostando dela e se magoando! -- suspirou -- Não sei o que foi pior nessa história toda: sua decepção com ela ou a entrega do campo de Balança sob repressão violenta e exagerada!
--Quero apagar aquele dia horrível da minha mente! -- passou a mão nos cabelos -- A violência irracional e desnecessária do poder armado, a mobilização de tantos recursos pra garantir a entrega do patrimônio nacional, o som das bombas explodindo, o gás queimando minhas narinas e garganta, gente ferida, gritos, desespero... -- balançou a cabeça como se quisesse espantar as lembranças -- Posso te dizer que depois de vivenciar aquela experiência passei a respeitar sua namorada de uma forma absurda! -- confessou -- Bastaram breves horas de violência pra me deixar marcada! Imagino o caso de Zinara, que viveu na guerra por anos a fio!
--Nem me fale! Quando penso na vida que teve, morro de pena da minha caipirinha... -- respondeu com pesar -- Zinara é uma pessoa tão complexa, tão visceral... Às vezes me questiono se a lógica, o pragmatismo dela, não seriam freios necessários pro seu conturbado mundo interno e suas sofridas lembranças... -- ponderava -- Ninguém sai ileso de uma guerra... e acho que a guerra também não sai de ninguém... -- suspirou -- Mas vamos falar de assuntos melhores! -- propôs -- Você tá toda triste aí e não quero te manter nesse baixo astral. Não combina com minha amiga Magali! -- segurou uma das mãos dela
--Vai passar, Clarice. -- sorriu com tristeza -- Cátia nunca mais! E quanto ao campo de Balança, a briga não acabou! Ainda correm processos na Justiça!
--E se Deus quiser algo de bom vai acontecer! -- desejou -- Na sua vida e no futuro do país!
--Voltemos a falar do casamento na roça! -- debruçou-se sobre a mesa da outra -- Pelo que você me contou a festa foi um arraso! -- comentou
--Foi sim! -- concordou sorridente -- Boa companhia, boa comida, diversão, um lugar agradável... Adorei aquela roça!
--Muito sex* na barraca de camping... -- complementou assanhada -- Vai abrindo o jogo aí, conta tudo! -- pediu batendo uma palma
--Mas será possível que nem sofrendo você abaixa esse fogo? -- perguntou impressionada
--Ah, minha filha, eu sofro mas o gosto pela sacanagem continua! -- respondeu de pronto -- Deixa de me enrolar e vai falando! -- ordenou
Acabou rindo. -- Ai, ai, Magali... -- balançou a cabeça divertida -- Você também não é mole...
***
--Entre, dona Ritinha. Por favor, dona Zezé. -- Cláudia recebia as idosas em seu consultório -- Sentem-se, por favor. -- pediu e as mulheres se sentaram -- Eu não atendo mais nesse horário e já tava até me preparando pra sair, -- falava com jeito -- mas quando a secretária disse que eram as senhoras... -- sentou-se também -- Aconteceu alguma coisa? -- perguntou disfarçando a preocupação
--Então... Eu vim aqui porque estou a fim de saber a verdadeira verdade! -- Ritinha afirmou resoluta
--Estamos a fim de saber, a fim de saber! -- Zezé enfatizou o ponto
“Isso não é letra de música?” -- lembrava de uma canção -- E qual a verdadeira verdade que as senhoras querem saber especificamente? -- imaginava sobre o que seria
--Zinara! -- responderam em coro -- Como anda a saúde daquela menina? -- Ritinha perguntou com o coração acelerado -- Ela até estava bem no casamento, mas não parece uma moça saudável!
--O que ela tem ao certo? É grave? -- Zezé perguntou com tristeza -- Ela mudou de vida, largou tudo e voltou pra roça! O que é que tá acontecendo, doutora? Conta pra gente?
--Nós sabemos que Zinara não quer nos preocupar! Ela só diz as coisas por meias verdades...
--Não nascemos ontem! Sabemos que algo vai mal! E muito mal! -- gesticulava
Cláudia abaixou a cabeça e pensou muito no que responder, até que decidiu dizer a verdade: -- Zinara está morrendo, minhas amigas... -- as mulheres estarreceram em choque -- Ela não tem muito tempo de vida... O câncer no pâncreas evoluiu muito rápido, apesar de todos os cuidados que tomamos... -- pausou brevemente -- Creio que não terminará este ano... -- não conseguiu completar a frase -- Se terminar, não evolui muito no ano que vem...
--Mas outubro já tá no fim! -- Zezé se alarmou -- Então quer dizer que... -- seus olhos marejaram
--E por que você não tá tratando dela? -- Ritinha perguntou derramando uma lágrima -- Por que não tá usando de toda sua medicina pra curar ela? -- não se conformava
--Porque ela não quis tentar! -- olhava para as idosas -- Só Deus sabe o quanto insisti, mas ela não quis tentar. -- levantou-se e andou um pouco pela sala -- Zinara se limitou a fazer umas poucas sessões de um tratamento que propus e só. -- passou a mão nos cabelos -- E só... -- afirmou com tristeza -- Os pais dela também insistiram muito mas depois acreditaram que o melhor seria cuidar dela na roça. -- suspirou -- Acho que eles querem estar por perto quando a filha morrer... e sabem que ela sempre gostou muito da roça, né?
--E o que nós podemos fazer? -- Zezé perguntou chorando -- Não existe um tratamento daqueles do tipo tiro e queda que ela podia fazer? A gente convence ela!
--A gente convence! Nem que seja na base da chinelada!
--Não existe garantia de cura e a bem da verdade, Zinara tinha razão o tempo todo... -- reconheceu -- Os tratamentos são muito fortes e acarretam pesados efeitos colaterais... -- cruzou os braços -- Ela fez uma escolha e tem todo direito... -- pausou brevemente -- mesmo que eu não concorde com o que escolheu.
--Eu vou fazer uma promessa! -- Zezé segurou o braço de Ritinha -- Nós vamos! Não podemos desistir! Essa maldita doença vai acabar!
--Vai sim! -- concordou -- Vamos fazer uma promessa pra Deus e pra Nossa Senhora! E se tudo der certo a gente vai pagar por ela no Santuário!
Cláudia olhou para as idosas com muita pena. Já não conseguia acreditar que a astrônoma tivesse quaisquer chances. -- É isso mesmo. -- incentivou -- Entreguem nas mãos de Deus e de Nossa Senhora e peçam com fé. -- pausou brevemente -- Zinara precisa de oração!
--Precisa e vai ter! Mais do que a gente normalmente reza por ela! -- Ritinha prometeu
--Vamos naquele asilo que Zinara freqüentava pra colocar todo mundo pra rezar! -- Zezé decidiu -- Com tanta gente unida alguma coisa há de acontecer!
--Ela vai curar, doutora! -- Ritinha prometeu com o rosto molhado por lágrimas -- A senhora ainda há de ver!
--Se Deus quiser... -- respondeu sem fé
***
--E então foi isso... -- Jamila desabafava com Leonor -- Eu não queria aceitar, mas acabou mesmo... -- brincava com o gelo no copo -- Zinara definitivamente não me quer mais... -- reconheceu com tristeza -- E essa é a verdadeira verdade... Infelizmente!
--Eu tô até agora passada com tudo isso! -- a outra respondeu indignada -- Você se rebaixou demais indo pra tão longe atrás daquela doida! -- fez cara feia -- Sabendo que a mulher tem outra, ainda teve coragem de ir no casamento do irmão dela? E sem ser convidada? -- balançou a cabeça contrariada -- Espero que depois dessa humilhação você esqueça de vez de Zinara!
--Não me senti humilhada, ela não fez isso comigo! -- retrucou e gastou uns segundos calada -- Apenas caí na real... -- suspirou -- Acabou! BaØ¡i ‘aomor aktar... (Há mais vida por vir...) Assim espero... -- estava triste
--E você vai continuar brigando com Mike Ametista por causa da família dela? -- perguntou revoltada -- Deixa esse pessoal pra lá, joga no vento! -- aconselhou
--Não misturo assuntos pessoais com trabalho, Leonor! -- olhou para a irmã -- Vou lutar até o final! -- afirmou decidida -- Tenho uma idéia pra buscar um acordo amigável com o Ametista e acho que podemos resolver esse problema em poucos meses! -- falava pensativa -- E quando isso acontecer, procurarei por Kristie Puell e vou me juntar a ONG dela contra a guerra de Suriyyah... Vai ser bom pra mim passar uns tempos longe...
--Por que não se junta logo a essa ONG? -- debruçou-se impaciente sobre a mesa -- Godwetrust não vai esperar você resolver esse caso com o Ametista pra decidir se invade Suriyyah ou não! -- tentava convencê-la a mudar de ideia -- Passa o caso pra outro e vai embora! Compra a passagem e partiu! Foi! -- gesticulava
--Laa! (Não!) -- respondeu de pronto -- A pressão contra a guerra é grande e Godwetrust precisa dar tempo ao tempo. Ninguém vai invadir Suriyyah da noite pro dia! As coisas pra eles não andam tão boas pra permitir que seja assim! -- bebeu o último gole da bebida -- Tudo tem seu tempo, minha irmã. Tudo tem seu tempo... -- mirou um ponto no infinito -- Eu quero ajudar a família de Zinara a recuperar essa fazenda! Não aceito a derrota nesse caso!
--Você nunca aceita a derrota, né, Jamila? -- retrucou fazendo um bico -- Tudo isso por mera vaidade...
--Não é por vaidade! -- discordou -- Eu quero, preciso ganhar esse caso! -- olhou para a irmã -- Você jamais entenderia, mas sinto como se devesse isso a Zinara! -- pausou brevemente -- E não descansarei enquanto não conseguir! -- prometeu
CAPÍTULO 69 – Mais da Roça
--Ai, meu Deus, ô, minha Nossa Sinhora, ô minha mãe, ai, ai, ai... -- Catiúcia gemia e respirava com sofreguidão -- Ai, qui dô! -- reclamava
--Fica carma, minina, que tá dando certu! -- Amina dizia para a nora -- O mininu tá vindu!
--Respira, Catiúcia, respira! -- Najla aconselhava
Ahmed e a esposa passavam a tarde na casa dos pais dele quando a mulher inesperadamente entrou em trabalho de parto. Amina e Najla correram para auxiliá-la, enquanto Zinara, Raed e Ahmed providenciavam panos limpos e água quente. Khadija, que também estava lá, sentia-se agoniada sem entender de muita coisa.
--Eu já fiz várius partu, minina! -- a sogra garantia -- Cunfia qui vai dá tudu certu!
--Eu também já participei de vários! -- Najla tentava inspirar segurança -- Não houve um potro ou bezerro de minha fazenda que eu não tivesse acompanhado o nascimento!
--Mas eu vô tê mininu, num vô tê potru e nem bizerru! -- retrucou sentindo dor -- Ai, ai, ai!!! -- gritou
--Eu trouxe mais panos! -- Zinara entrou no quarto correndo
--E água! -- Ahmed e Raed vieram atrás
--Dêxi aí e sai os homi tudu! -- Amina ordenou -- Vai tumá conta di Khadija, Raed!
--Eu queru ficá, maama!
--Simbora, mininu, já mandei! -- retrucou de cara feia -- Num queru vê machu dismaidu pelu chão!
Ahmed e o pai saíram do quarto contrariados.
--Olha, tá nascendo! -- Zinara sorria -- Smallah! -- aproximou-se para ajudar
--Baba, eu tô tão nervosu! -- Ahmed andava de um lado a outro na sala -- Dá uma gastura na genti... -- passou a mão na cabeça
--Ajoeia aqui e reza, homi! -- mandou -- Faz comu nóis e cala a boca! -- Khadija estava quietinha ajoelhada ao lado do avô
--Qui agunia! -- obedeceu e fechou os olhos -- Ajuda, Pai! -- pedia angustiado
--Youyouyouyou!!! -- Amina, Zinara e Najla cantavam alegremente
--Nasceu! -- Raed se levantou sorrindo -- Nasceu, meu fio! -- olhou para o jovem -- Nasceu, minina! -- olhou para a neta
--Oba!!! -- a menina pulava que nem pipoca
--Queru vê meu fio! -- correu para o quarto e bateu na porta -- Dêxi eu entrá, maama! -- pediu emocionado
Zinara abriu a porta sorridente. -- É um belo menino! -- anunciou dando passagem
Ahmed correu e se ajoelhou na cama ao lado da esposa, que segurava o menino carinhosamente. -- Meu fio... -- chorava
--Ói cumé um mininu lindu! -- Catiúcia mostrava a criança ao marido emocionada -- Obrigada, dona Amina! Obrigada, dona Najla! -- olhou para elas -- Pôcas muié têm a honra di tê os fio em casa hoji im dia. Inda mais na casa dus sogru!
Amina e Najla entreolharam-se orgulhosas.
Raed e Khadija apareceram na porta. A menina chorava copiosamente.
--O que foi, meu amor? -- a morena ajoelhou-se ao lado da sobrinha -- Por que chora tanto? -- puxou-a para um abraço -- É pra ficar feliz! -- deu um beijinho nela
--Mais eu tô filiz, camma! Muitu filiz... -- respondeu chorando
“Como Khadija é uma criança emotiva...” -- pensou impressionada
--Meu netu... Mais um pru nossu clã! -- Raed sorria abestalhado -- Amanhã mesmu nóis vai apresentá eli no clubi Cedro-Suriyyah!
--Abaxi o fogu homi! -- Amina ralhou -- Mal nasceu o mininu e já marcandu compromissu!
--No próximo final de semana a gente leva, Raed. -- Najla concordava com a cunhada -- Ainda é muito cedo.
--Ahmed, Catiúcia... -- Zinara se levantou segurando a mão da sobrinha -- Será que deixariam Khadija e eu darmos o primeiro banho no menino? -- pediu humildemente
Os dois se entreolharam e concordaram com a idéia. -- Claru qui podi! Ocê vai batizá eli, uai! -- o irmão respondeu sorridente -- É inté bão! Vai qui o mininu já vai ficandu intiligenti?
--É mesmu! -- Catiúcia concordou -- E vai qui já vai ficandu ricu também?
Zinara achou graça. “Se depender de banho de professora pra enricar, o destino desse menino é ser pobre e apanhar da polícia em passeata!” -- pensou contendo o riso
***
Zinara e Khadija estavam em outro quarto com o bebê, que se encontrava deitado sobre uma toalha branca e limpa. A morena usava apenas uma pequena bacia de água morna e uma esponja macia para banhá-lo.
--Isso, meu bem, com muita delicadeza. -- orientava a sobrinha enquanto secavam uma das perninhas da criança -- Temos que limpar cada partezinha do corpo dele uma de cada vez. -- explicava -- E então secar bem devagar. -- sorria para a menina -- Sabia que na nossa tradição o primeiro banho é um momento sagrado?
--É? -- perguntou admirada
--É sim! -- balançou a cabeça confirmando -- Agora deixa que a camma (tia) termina o banho. -- limpava a região genital do bebê
--Eu gostu tantu di Ahmed Mateus! -- falou para a morena -- Num sei purque!
Achou graça. -- Que bom, né? Sinal de que vão ser muito amiguinhos! -- sorriu para ela -- Pega a roupinha dele ali pra mim, meu bem? -- pediu e a menina trouxe -- Obrigada! -- vestiu-o com todo carinho -- Ele é tão calminho! Nem chora, quase não se mexe e só faz barulhinho de neném! -- sorria embevecida para a criança
--É purque eli é bão, né, camma? -- perguntou animada
--Chorar não é sinal de maldade, ya gamil (sua linda)! -- explicava com delicadeza -- Você chorava muito quando nasceu e é um amorzinho! -- levantou-se com o bebê no colo e sentou numa cadeira perto da janela -- Vem cá, Khadija, vamos pedir a Deus do céu pra que tudo dê certo pra Ahmed Mateus. -- olhava para a menina
--Vamu! -- concordou e se aproximou fechando os olhinhos
Fechou os olhos também. -- Allah (Deus), por favor, humildemente Lhe imploramos para que Ahmed Mateus seja muito feliz e bem sucedido em sua vida que se inicia no seio de usritina (nossa família)! -- embalava o menino -- Que Ahmed e Catiúcia saibam orientá-lo para o Bem e que ele tenha sabedoria para as melhores escolhas. -- abriu os olhos -- Quer pedir alguma coisa, meu bem? -- perguntou a sobrinha
--Qui eli nunca fiqui sem maama e baba! -- a menina pediu e abriu os olhos
--Amém! -- Zinara surpreendeu-se com aquele pedido
--Canta pra eli, camma? -- sorriu -- Eli vai gostá!
A astrônoma achou o pedido bonitinho e pensou no que poderia cantar. Entoou então a primeira música que instintivamente lhe veio à cabeça:
-- Salamit-ha oum Mateus, meil ein weil meil hassad (Deus a abençoe mãe de Mateus, do olho do mal e da inveja), -- cantava com carinho -- wei salamtak ya Mateus, meil reim sheilee hassad (e Deus abençoe você Mateus, do chicote que te invejou) -- emocionou-se -- Salamit-ha, salamit-ha (Deus abençoe, Deus abençoe), -- notou que Khadija também se emocionava -- Salamit-ha, salamit-ha oum Mateus (Deus a abençoe, Deus a abençoe mãe de Mateus), -- sorriu para o bebê -- salamit-ha, ya... (Deus a abençoe, senhora...) -- silenciou de repente e lembrou-se de quando cantou essa música pela primeira vez
“--Zinara, canta para mim? -- Jamal pediu olhando para ela -- Você canta tão bonito...
--Os outros dormem... -- advertiu -- Como cantar?
--Ghanili shwaaye... (Cante para mim, suavemente...) -- insistiu falando devagar
--Tudo bem. -- concordou -- Já sei o que cantarei. -- acariciou a cabeça dele -- Feche os olhos e pense em ommak (sua mãe). -- ele obedeceu e Zinara respirou fundo para começar a cantar -- Salamit-ha oum Jamal, meil ein weil meil hassad (Deus a abençoe mãe de Jamal, do olho do mal e da inveja), -- continuava fazendo carinho -- wei salamtak ya Jamal, meil reim sheilee hassad (e Deus abençoe você Jamal, do chicote que te invejou) -- chorava por dentro -- Salamit-ha, salamit-ha (Deus abençoe, Deus abençoe), -- percebeu que ele adormecia -- Salamit-ha, salamit-ha oum Jamal (Deus a abençoe, Deus a abençoe mãe de Jamal), -- recolheu a mão -- salamit-ha, ya Leila... (Deus a abençoe, senhora Leila...) -- parou de cantar e derramou uma única lágrima”
--Tudu vai sê mió agora! -- Khadija afirmou convicta olhando para o bebê -- Né, camma?
--É, ya habibi... -- respondeu intrigada
***
--Ai, amor, que notícia ótima! -- Clarice respondeu animada enquanto se abraçava com um urso de pelúcia -- Que bom que o menino nasceu com saúde e Catiúcia já tá novinha em folha! -- sorria -- Deixa só eu falar pra mamãe! Dá um segundo, por favor? -- pediu
--Claro, Sahar! -- concordou
--Mãe! -- chamou por Leda -- O filho de Ahmed e Catiúcia nasceu! -- anunciou sorridente -- Zinara diz que é um menino lindo e calminho que quase nem chora!
--Que beleza, graças a Deus! -- saiu da cozinha e foi para a sala -- E a mãe, passa bem? -- sentou-se na poltrona -- Como é que ela tá?
--Zinara disse que ela tá ótima! -- sorria -- Acredita que o menino nasceu em casa? Foi dona Amina e dona Najla que fizeram o parto! -- contou a novidade
--Ah, então é por isso! -- fez um gesto -- Se tivessem ido pra hospital o parto tinha sido um inferno e mãe e filho ainda estariam internados! Do jeito que a coisa é hoje em dia... -- revirou os olhos
Clarice riu e voltou a falar com Zinara. -- Manda uma foto dele pra gente ver, amor? -- pediu melosa -- Tiraram muitas?
--Tiramos um monte! -- respondeu de pronto -- Mas fui proibida de mandar pra vocês porque maama quer fazer isso, só que ela tem competido no uso do laptop com camma Najla e tá concorrido o negócio! -- achava graça
--Por que? -- achou graça também
--Lembra de ya Marco? -- olhou na direção da tia -- Vira e mexe os dois tão de papo no LivrodasFuça! -- riu -- O laptop tem até agenda agora pra coordenar o uso!
Qamar: O menino é tão fofinho, seu Marco, parece até um bonequinho! Vou lhe mandar umas fotinhas dele!
Qamar: Já mandei pra Aisha e ela ficou encantada!
Marco: Imagino!
Marco: Esta família só tem gente linda! A começar pela senhora!
Qamar: O senhor, como sempre, um galanteador...
Qamar: :)
--AHHa, qui Najla nunca qui sai dessi lepitópio! -- Raed resmungava -- Assanhamentu!
--Acho que você vai ter que dar um laptop pra sua tia também, amor! -- Clarice sugeriu brincando
--O orçamento não tá dando pra isso, Sahar... E maama não se incomoda, quem reclama é baba! -- falava baixo para os pais não ouvirem -- Ele tá sempre com ciúmes de ya Marco! -- riu brevemente
--Falando em ciúmes... -- largou o urso e levantou-se da poltrona -- E Jamila, hein? -- perguntou de cara feia -- Depois daquela conversa que vocês tiveram ela voltou a atacar ou se mancou de vez?
--Deixe aquela sebosa comigo que faço uma boneca vudú pra ela e meto alfinetada! -- Leda gesticulou contrafeita -- Se fiz uma pra estupradora da terceira idade, faço pra essa outra também!
--Ela nunca mais me procurou, Sahar. -- respondeu com a verdade -- Finalmente entendeu que acabou de vez! Entendeu que a mulher da minha vida é você! -- afirmou convicta -- Ya amarii fe ‘aez layaleya! -- sussurrou
--Ai, traduz! -- pediu dengosa
--Você é minha Cynthia em minhas noites mais escuras... -- traduziu melosa
--Ai, Zinara... -- voltou para a poltrona e se abraçou com o urso
“Hum... começou a lambição!” -- Leda pensou divertida -- "Não satisfeita em tarar a almofada agora é a vez do pobre urso!” -- achava graça
--Najla, vai si preparandu aí qui tá chegandu na minha hora di leptópio! -- Amina advertiu da cozinha
--Tá, já tô saindo! -- respondeu
Qamar: Tenho que me despedir do senhor. Amina quer usar o laptop e já estamos aqui há muito tempo.
Marco: Estamos? Eu nem senti o tempo passando!
Qamar: Nem eu...
Qamar: Ai, ai... Mas tenho que ir.
Marco: É uma pena mesmo...
Marco: Mas se tem que ir, só me resta desejar que o tempo passe mais depressa e o amanhã chegue o mais rápido possível!
Najla suspirou embevecida. “Que homem!” -- pensou
Qamar: Até amanhã, seu Marco!
Marco: Até manhã, dona Najla...
“É tão bom conversar com ela! Pena que as duas só têm um laptop!” -- Marco pensava -- "Ai, ai...” -- suspirou apaixonado
--Pode usar, Amina! -- a ex fazendeira levantou-se da cadeira -- Deixei no LivrodasFuça pra você entrar.
--Brigada, muié. -- sentou-se apressada -- Mas dêxa eu intrá primêru nos é-meiu modi mandá pra ya Leda as fotu di Ahmed Mateus!
--Agora é Amina qui num vai mais largá dessi tar di lepitópio! -- Raed resmungava
--Sahar, avisa pra ya Leda que maama entrou na internet! -- Zinara anunciou divertida
--Vou falar. -- olhou para a mãe -- Dona Amina já entrou na internet! -- avisou
--Oba! -- seguiu empolgada para o quarto
--Lá foi ela toda animada, amor! -- comentou sorrindo -- Só não foi tão animada quanto uma certa paleoceanógrafa quando é pra conversar com um certa astrônoma... -- brincou melosa
--Garanto que essa astrônoma também se derrete... -- respondeu cheia de dengo -- Oh, Sahar, ya reet ana ashoufak osady...
--Traduz, amor... -- agarrou o urso com força
--Quisera que eu pudesse ver você aqui, diante de mim... -- traduziu romanticamente
--E se pudesse me ver agora... -- perguntou em voz mais baixa -- faria o que? -- fazia um charme
--Puxaria você lentamente pra junto de mim desejando uma coisa só: bousa ala shafayef (beijar os seus lábios)! -- sussurrava
“Quando ela fala da minha bousa eu fico louca!” -- pensou excitada
Siriema: Oi, ya Leda!
Siriema: Ó, mandei as fotinha du mininu. Corri pra vê nus é-meiu!
DonaBord: Oi, querida! Pode deixar que eu vou ver sim!
DonaBord: Deixa só Clarice terminar a lambição com sua filha, porque eu não sou boa nessa coisa de e-mail!
DonaBord: kkkkkk
Siriema: kkkkkkk
Siriema: E agora aqui tem ôtra lambição!
Siriema: Najla mais Marco, aqueli amigu di Janaína, num sabi?
--É! Você é um negão de tirar de chapéu, não posso dar mole senão você créu, me ganha na manha e baubau, leva meu coração... -- a ex fazendeira cantarolava pela casa
--Só mi fartava essa! -- Raed resmungava -- Najla cantandu fanqui! Negóçu di créu, indecença! -- fez um bico
--É! Você é um ébano, lábios de mel, um príncipe negro feito a pincel, é só melanina cheirando à paixão... -- cantava animada
Siriema: Agora tá ela cantandu pela casa...
Siriema: Inquantu issu, Raed resmunga!
Siriema: kkkkkk
Siriema: E Zinara tá na rede quasi rodandu qui nem pião!
DonaBord: E Clarice tá aqui com o urso de brinquedo!
DonaBord: kkkk
“É hoje que esse bicho perde sua virgindade de pelúcia!” -- Leda pensava olhando para a filha
--AHkeelak eih? Khalas manta shayef: ganbik hayati dee agmal Hayah… -- a morena sussurrava para seu amor
--O que você me disse dessa vez, hein, minha caipirinha? -- deitou-se em cima do urso
--O que eu posso te dizer? Você já é capaz de ver: minha vida com você é a mais bela vida possível!
--Hum, você já gosta de me enlouquecer falando assim, né, Zinara? -- se remexia na poltrona
“Eita, que esse urso vai ser tarado é agora!” -- Leda pensou com vontade de rir
Siriema: Ya Leda, sabi quem tevi aqui modi perguntá pela sinhora?
Siriema: Ya Rafi!
“Hum... Lá vem ela querendo me alcovitar com aquele Rafi das perna fraca!” -- pensou fazendo um bico
DonaBord: Ih, menina, esquece essa história! Eu não quero lambição pro meu lado, não!
DonaBord: Já aposentei a periquita!
Siriema: kkkkkkk
Siriema: Achu qui apusentei a minha também, num sabi?
DonaBord: Ah, mas você e seu marido podiam aproveitar que estão aí com os filhos crescidos pra fazer uma nova lua de mel!
DonaBord: Por que não?
Siriema: Qui nada! Tem issu di lua di mer, não!
Siriema: Nunca nem tivemu essis trem!
Amina olhou para Raed sentado no sofá. “Humpf!” -- fez um bico -- “Só Raed mesmu pra querê lua di mer!” -- balançou a cabeça negativamente
--Vem aqui visitar o neném, Sahar! -- convidou -- Aí você aproveita e vem ver outro neném que tá carente! -- brincou -- Sniff, sniff... -- imitou choro de cachorro
--Bobinha! -- brincou -- Eu vou tentar, mas estamos em novembro e você sabe que final de ano na universidade é sempre uma correria louca!
--Eu sei, mas veja se consegue... -- pediu -- Min fadlik, ya habibi! (Por favor, querida!)
--Vou tentar, sim! Prometo, amor! -- deitou a cabeça no peito do urso
“Agora só falta um cigarrinho na boca de Clarice e outro no fucinho do urso!” -- Leda pensou achando graça
DonaBord: Põe um fogo no teu homem, mulher!
DonaBord: Ressuscita esse casamento!
Siriema: Ih, eu, hein?
Siriema: Dêxi minha curnicha mansa qui a bicha tá bem assim!
Siriema: kkkkkkk
DonaBord: kkkkkkk
DonaBord: Então junte-se a mim no grupo das curnichas adormecidas!
“Inquantu issu, a curnicha di Zinara tá qui num si aguenta!” -- reparava na filha se mexendo na rede -- "E a di Najla tá doida pra piá di novu, num sabi?” -- olhou para a mulher que dançava sozinha
--Meu preto retinto, malandro distinto, será que é instinto, mas quando te vejo, enfeito meu beijo, retoco o batom, a sensualidade da raça é um dom, é você, meu ébano, é tudo de bom! -- sorria abobalhada
--Ô, bestagi... -- e tome de Raed resmungar
CAPÍTULO 70 – A Última Ferida
Zinara estava com Amina no centro de mãe Agda. Nos últimos tempos, a morena vinha participando mais ativamente durante as sessões e auxiliava os processos mediúnicos doando ectoplasma.
De pé, no centro do salão, mantinha-se concentrada em oração com os olhos fechados e as duas mãos erguidas. Amina, que estava sentada junto a outras pessoas, apoiava a filha com suas preces humildes e fervorosas.
Os tambores tocavam cadenciadamente e mãe Agda e outros participantes da sessão entoavam uma melodia graciosa: -- Aruanda é longe, e ninguém vai lá... é só os pretos-velhos, que vai lá e torna a voltar...
Sentindo-se gradualmente tomada por estranho torpor, a astrônoma estava prestes a vivenciar mais uma experiência extra física no campo astral da casa.
--Vai qui tem quem ti isperi, muié! -- Agda estalava os dedos repetidamente diante de Zinara -- Vai!
Usando pembas coloridas, duas jovens rabiscaram no chão um pentagrama centrado no local onde a professora se achava. Tão logo terminaram de fazê-lo, a morena caiu de joelhos e se encolheu toda, abraçando-se às próprias pernas.
--Ya aini? (Meus olhos?) -- a bela voz do irmão despertou Zinara no plano astral
--Youssef! -- ficou de pé e o abraçou emocionada -- Ana ma saddaØ¡t ya aini! (Não acreditei nos meus olhos!) Que felicidade vê-lo novamente! -- falava na língua de Cedro
Segurou o rosto da irmã e respondeu também na língua de Cedro: -- Estar aqui agora me enche o espírito de alegria, ya habibi! -- sorriu -- Mas não se apegue ao que pode ver. -- aconselhou -- Sentir é muito mais importante! -- beijou a testa dela -- Mesmo que não me veja, saiba que estaremos sempre próximos, Ya aini. Laa haØ¡dar youm aseebik, wala ‘aomri fyoum ansaki... (Eu não poderia deixá-la, ou nunca em minha vida esquecê-la...)
A astrônoma apenas sorriu com os olhos marejados.
--Estou muito orgulhoso do que vem fazendo no seio de usritina (nossa família), Ya aini! -- segurou as mãos da irmã -- Novamente você assume seu papel de elemento integrador e tem ajudado as pessoas a permanecerem unidas! -- balançou a cabeça -- Jayed jedan! (Muito bom!) -- exclamou satisfeito -- No entanto, ainda falta curar a última ferida!
--Choo? (O que?) -- não entendeu -- Explique-me, min fadlak (por favor)! -- pediu humildemente
--Você precisa fazer algo, que além de lhe ajudar bastante, vai possibilitar que Khaled finalmente encontre a paz. -- respondeu de pronto -- Akhhuuina (Nosso irmão) está em tratamento espiritual há um tempo, mas ainda não conseguiu curar uma ferida grave. -- esclarecia -- Uma ferida que também machuca seu coração, mas que você preferiu tentar adormecê-la em suas lembranças... -- pausou brevemente -- Só que está aí e ainda dói! -- olhava nos olhos
--Laa acrif... (Eu não sei...) -- sentia-se confusa
--A única pessoa que ainda não perdoou... -- respondeu mansamente
E a lembrança de um homem surgiu nítida na mente de Zinara.
“--Oh, então é você a famosa Zinara? -- o homem reparava na moça de cima a baixo -- Perdi as contas de quantas vezes Khaled me falou seu nome!
--Essi é o dotô Viegas. -- Raed apresentou -- O médicu qui cuida di seu irmão.
--É um prazer! -- estendeu a mão e sorriu mostrando um reluzente dente de ouro”
Sentiu o coração acelerar. -- Doutor Viegas... -- a morena balbuciou com raiva
Bombas começaram a explodir em seu espírito.
“--Que tipo de remédios são esses que ya said (o senhor) tem dado a ele? -- a jovem Zinara perguntava com ódio -- Eu pesquisei cada um nessa receita -- agitava o papel furiosamente -- e descobri que causam dependência além de terríveis efeitos colaterais! -- deu um soco na mesa do médico
--Pensei que cursasse astronomia e não farmácia. -- respondeu debochadamente
--Tiizak Hamra , ibn il-Homaar!! (Seu rabo é vermelho, seu filho de um camelo!!) -- xingou o homem -- É por isso que Khaled não cura nunca!! -- falava aos berros
--Acho que você também faz jus a uma internação no manicômio! -- respondeu cruzando os braços”
Bombas explodem.
--AHAHAH!! --a professora gritou ao se afastar de Youssef
--Essa história ainda não acabou, Ya aini. -- ele disse -- Precisa encontrá-lo!
“--Assassino!!! -- Zinara invadia a sala do médico gritando com ódio -- Yixrib beitak wa-beit illi xallafuuk!! (Meu Deus destruirá sua casa e a casa daqueles que lhe deixaram nascer!!!) -- derrubou no chão as coisas que estavam sobre a mesa -- AHAHAHAH!!!! -- avançou contra o homem e o agrediu com socos e pontapés
--Tirem essa louca daqui!! -- Viegas gritou desesperado ao cair no chão -- Socorro!!! Polícia!!!
--Minha fia! -- Amina veio correndo e olhou desesperada para o marido
--Carma, Zinara! -- segurou-a pela cintura e a afastou do homem -- Carma, minina! -- pedia apavorado -- Num faiz issu!
--Allaah yinghal abuuk!! (Meu Deus amaldiçoa seu pai!!) -- ela gritava com os olhos marejados -- Ana bakrahk, doktuur Viegas!!! (Eu te odeio, doutor Viegas!!!) -- gritava como louca -- Ana bakrahk!!! AHAHAH!!!!!!!”
Bombas explodem, gritos de dor, desespero, escuridão.
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!! -- Zinara gritava no plano astral
--Sua perturbação está atraindo Khaled para junto de você. Ambos encontram-se desequilibrados. -- Youssef dizia para a irmã -- Yahda’u, Ya aini! (Fique calma, Meus olhos!) -- pedia impondo as mãos sobre ela -- Fique calma! -- começou a orar
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!!!!!!!!! -- a astrônoma despertou no plano material e levantou-se furiosa -- AHAHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!! -- gritava nervosamente com os olhos arregalados
--Khaled? Meu fio? -- Amina podia sentir -- Zinara! -- emocionou-se
--Cunfia, muié! E acarma teu coração di mãe! -- o preto velho, manifestado em um médium, pediu a ela -- Num dêxi di orá! Teus fio pricisa docê orandu pur elis agora! -- aconselhou
Amina obedeceu e ajoelhou-se orando enquanto chorava.
--AHAHAHAHAH!!!!! -- a morena gritava e convulsionava como seu irmão fizera tantas vezes no passado -- AHAHAHAHAHAH!!!!
--É preciso procurar por Viegas, Ya aini, e curar de uma vez essa ferida que maltrata dois corações! -- Zinara ouvia a voz do irmão dentro da mente -- Você precisa fazer isso! Pelo bem de ambos!
Bombas explodem.
--Só assim, as bombas deixarão de explodir... -- Youssef continuava
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!! -- a astrônoma jogou-se no chão contorcendo o corpo nervosamente
Um grupo de pessoas formou um círculo ao redor de Zinara, ao mesmo tempo em que Agda ficou de pé, próxima a ela, com as mãos postas para o alto.
--Os guia du Orienti chega modi trazê Luz prus sofredô! -- Agda falou antes de se ajoelhar e segurar a cabeça da morena com as duas mãos
--As-Salamu Alaikum, Yatamanna! (Que a paz esteja convosco, Esperança) -- a doce voz de Zahirah ecoava na mente de Zinara -- Acalma tua mente e teu coração, ya habibi! -- pediu com carinho -- Somente assim, akhhuuik (seu irmão) amado poderá também se acalmar.
--Zahirah... -- a professora balbuciou emocionada antes de fechar os olhos e respirar fundo. Sentia uma corrente de vida fluindo em seu corpo e aos poucos conseguia conter os impulsos desenfreados que à princípio lhe dominaram. Buscou se concentrar e orou em favor de Khaled -- "Oh, Aba, eu Lhe suplico, acalma o espírito de meu amado Khaled. Imploro por Tua piedade para com akhuuya (meu irmão)!” -- pediu humildemente
--É necessário que você procure por Viegas para ajustar o que ainda se encontra em desalinho. -- ouvia novamente a voz de Youssef -- Você será inspirada quanto ao que fazer. E no momento certo, a verdade se mostrará.
Zinara abriu os olhos e lentamente se sentou. Agda orientou para que se levantasse e ela assim o fez. Duas jovens iniciaram a aplicação de um passe com uso de ervas locais, enquanto um pai velho baforou seu rosto com a fumaça de um charuto.
--Modi ocê si livrá da carga pesada! -- a mãe preta manifestada em Agda esclarecia
--No mais, não nos veremos até o dia do seu desenlace, Ya aini. -- continuava ouvindo a voz do irmão dentro da mente -- Mas estarei sempre por perto... Rahimaka Allah! (Deus te abençoe!)
“Macasalaama, Youssef!” (Até logo, Youssef!)” -- respondeu mentalmente -- "Obrigada, ar-rabiic!” -- agradeceu a Zahirah -- "Graças Lhe dou, Aba (Meu Pai)!” -- sentia-se bem
CAPÍTULO 71 – Começar de Novo
Lúcia acabava de chegar no ponto de ônibus após encerrar mais dia de trabalho. Cátia, que a esperava dentro do carro, preparou-se para abordá-la.
--É agora, Cátia! -- dizia para si mesma ao sair do carro -- Hora de pegar de volta o que é teu! -- atravessou a rua em direção ao ponto de ônibus -- “Hum, mas olha só essas pernuchas!” -- pensou reparando na outra de cima a baixo -- "E ela também tem uma bunda deliciosa, vou te contar...” -- esfregou as mãos -- "Vê lá se eu consigo ficar longe dessa bombeira gostosa?” -- sorriu -- No way! -- ajeitou-se toda -- Oi, querida! -- abordou-a delicadamente
Sentiu o coração acelerar. -- Você?! -- olhou para a outra de cara feia -- Eu hein, parece até que tá me seguindo! -- cruzou os braços -- "E eu que achei que essa cara de pau nunca mais viesse me procurar!” -- pensou
-- Será que posso te dar uma carona? -- perguntou humildemente -- A gente podia parar em algum lugar pra tomar uma bebida, conversar... -- sorria -- "fazer um monte de coisa que o diabo gosta...” -- pensou -- “Calma, Cátia, mantenha o foco!” -- recriminou-se -- E aí depois te deixava em casa. -- ofereceu
--Não tem o que conversar, Cátia! -- virou-se de costas para a outra
Aproximou-se um pouco mais e falou bem baixinho: -- Por favor, Lúcia. -- pediu -- Me dá uma chance de ao menos me explicar! -- insistiu -- Não acredito que nosso namoro tenha sido tão irrelevante na sua vida, apesar do pouco tempo que durou. -- sussurrou sedutoramente -- Morro de saudades de você! De nós...
“Ela sabe me deixar arrepiada...” -- pensou disfarçando o que sentia -- Não tem o que conversar! -- olhou para a geofísica novamente -- Acabou! -- afirmou decidida
--Não é isso que vejo nos seus olhos! -- retrucou igualmente decidida -- Me dá uma chance pra pelo menos me explicar! -- caprichava nos olhares -- Por favor, querida!
“Meu Deus, essa mulher sabe mexer comigo!” -- pensou nervosamente ao desviar o olhar -- Não, Cátia, eu não quero te dar mais nada! -- virou-se de costas novamente -- Vai embora! -- ordenou
--Lúcia... -- insistiu
--Não, Cátia! -- olhou mais uma vez para a loura -- Não insista! -- pediu de cara feia -- "Porque senão sou capaz de aceitar!” -- confessou em pensamento
--Eu PRECISO conversar com você, meu amor! -- afirmou sedutoramente
--Vai pra bem longe da minha vida! Vai! -- gesticulou de cara feia -- Vai, vai, vai!
***
--Vem, vem, vem!! -- pedia excitada -- Ai, amor, vem! Ah!! -- gem*u
Cátia deleitava-se entre as pernas da bombeira, que gemia de olhos fechados.
“Ô que saudade dessa coisa boa...” -- a geofísica pensava enquanto provocava a amante com língua e dedos de todas as formas
--AHAHAH!!!!!!! -- gem*u alto em um orgasmo intenso -- Ah...
--Ainda não terminou, meu bem! -- seguiu beijando e lambendo o corpo da outra até chegar nos seios -- Não terminou... -- penetrou-a com os dedos rapidamente
--AHAHAH!!!!!!! -- sentiu que estava prestes a goz*r pela segunda vez
Satisfeita em perceber o prazer que proporcionou a Lúcia, Cátia sorriu vitoriosa enquanto deslizava as mãos pelo corpo da mulher que sempre lhe deixava tão excitada. -- Você é minha, Lúcia... -- afirmou possessiva -- Como ainda não percebeu isso? -- beijou-lhe o queixo
--Ai... -- suspirou e abriu os olhos -- E você... de quem é? -- perguntou recuperando o fôlego -- Minha e da outra? -- desvencilhou-se para se sentar -- Ou melhor dizendo, das outras? -- olhou para a loura -- Sabe-se lá quantas mulheres você tem!
A geofísica riu e sentou-se também. -- Não tô com essa bola toda! -- passou a mão nos cabelos -- Sei que dei motivos pra você não confiar em mim, mas... -- acariciava as pernas da outra -- Apesar de ter errado muito por aí, um dia a gente cresce, Lúcia... -- beijou um dos joelhos dela -- Sei com quem quero ficar... -- olhou nos olhos
--Ai... -- suspirou apaixonada
--Vamos começar de novo, querida! -- pediu ao beijar uma das coxas dela -- Hein?
Segurou-a pelos cabelos da nuca e olhou firmemente nos olhos. -- É sua última chance, viu? -- afirmou seriamente
Semicerrou os olhos. -- Não me pega assim que eu gamo! -- beijou-a com paixão
“Meu Deus, que mulher é essa?” -- a bombeira pensou enquanto se beijavam
***
--Olha só isso, que pouca vergonha, que revolta! -- Magali reclamava sozinha enquanto lia o jornal -- Privatizaram o aeroporto e o preço de venda foi mais caro que o campo de Balança! -- fez uma expressão de desgosto -- Onde já se viu um aeroporto valer mais que um campo cheio de petróleo de boa qualidade! -- amassou o jornal furiosa -- É o fim da picada! Coisa ridícula!! -- jogou no lixo
--Eu também fiquei furiosa quando li isso! -- concordou com ela -- Queria ouvir o que os amantes do entreguismo diriam pra justificar essa distorção inaceitável!
--Cátia?! -- levantou-se da cadeira chateada -- Ainda bem que já terminei meu café. -- pegou a bolsa -- Deixa eu ir embora que já passou da hora de ir pra casa. -- olhou para o relógio -- Quase sete da noite! -- preparou-se para partir
Colocou-se na frente da colega para não deixá-la ir. -- Por favor, querida! -- caprichou nos olhares -- Vamos conversar, meu bem. -- pediu sedutoramente -- Nossa história ainda não terminou... -- aproximou-se -- e nem eu quero que termine!
--Você deveria era dar graças a Deus de não ter perdido nenhum dente! -- respondeu de cara feia -- Eu e aquela outra fomos muito boazinhas contigo! -- gesticulou -- Você já tava com a patinha lascada e a gente bem que podia ter lascado a outra pra você não andar e ficar esparrachada no chão esperando a polícia chegar pra te jogar spray de urtiga na cara! -- falou desaforada -- Quem sabe assim aprendia a lição!
--Que é isso, Magali? -- perguntou espantada -- Pra que tanta agressividade? -- fez cara de vítima -- Parece até que esqueceu de nossos bons momentos... -- fazia vozes
--Não pense que porque esperou um mês pra vir falar comigo que tua barra ficou limpa! -- deu um tapa no braço da outra -- Minha memória é muito boa! -- afirmou resoluta -- E agora com licença! -- começou a andar
--Espera, meu bem! -- foi seguindo atrás -- Deixa eu me explicar! -- pedia -- Aquilo tudo, aquela situação, foi um grande mal entendido! -- tentava se justificar -- Eu tava carente, confusa... você sabe como eu fiquei depois que Clarice me deixou...
--Cátia, olha só... -- parou de andar e encarou com a loura -- Eu até acreditei na gente e desejei que você e eu fossemos mais que só um casal que vive uns gostosos momentos de sex*, mas vi que fui muito burra! -- olhava nos olhos -- Você é uma safada e eu dei mole, porque esperei mais do que alguém como Cátia Magalhães podia me dar!
--Magali... -- sussurrou com olhar cafajeste -- Eu não vou mentir, não vou te enganar, -- segurou-a pelos braços -- não posso ser a companheira que deseja, mas com certeza sou a amante que sempre sonhou ter! -- afirmou com raça
“Gente, mas ela fala com uma vontade...” -- pensou inebriada -- Até que não me arrependo de ter me envolvido contigo, -- desvencilhou-se fazendo um tipo desinteressado -- porque g*zei bastante! -- passou a mão nos cabelos -- E foi só! -- olhou para a loura com desdém -- Agora acabou porque mesmo pra sacanagem é preciso que haja um mínimo de decência! -- voltou a andar
--Não acredito que tenha esquecido das loucuras que fizemos em todas as posições possíveis e imagináveis! -- a geofísica vinha atrás falando com voz sexy
Corou e olhou para todos os lados. -- Dá pra falar mais alto? -- pediu sarcasticamente enquanto caminhava sem olhar para trás
--Não acredito que tenha esquecido daquele fogo selvagem que incendeia tudo quando estamos juntas numa cama! -- continuava argumentando -- Nossos movimentos marcados para o prazer...
“E põe marcados nisso... É um fogo doido...” -- suspirou saudosa -- Vai embora, Cátia! Quero ir pra casa e você me perseguindo! -- gesticulou -- Xô! -- apressou o passo -- Pára com isso, porque senão...
***
--AHAHAH!!! -- Magali gemia alto -- Não pára com isso porque senão te mato!!! -- pedia com os olhos fechados
Sentada com o sex* na direção da boca de Cátia, Magali movimentava-se como se cavalgasse. Com uma das mãos a loura estimulava os seios da amante e com outra apertava-lhe uma das coxas com força.
--AHAHAHAHAH!!!!!!!!! -- gem*u extasiada e se jogou na cama -- Nossa, eu sempre... -- acalmava a respiração -- quis alguém que topasse experimentar essa loucura... -- sorria
--Tô sempre a fim de experimentar uma coisa diferente. -- passou a mão sobre os lábios e deitou-se por cima da outra -- Quer dizer, com bicho na parada eu tô fora! -- lembrou-se de Úrsula e Zeca, a galinha lésbica -- Nada de sex* com bicho no meio! -- afirmou desgostosa
--Bicho?! -- achou graça -- Deus me livre! -- sorriu e acariciou o rosto da geofísica permanecendo uns segundos calada -- Não me sacaneia de novo, não, tá? -- pediu seriamente -- A gente pode não tá se preparando pra casar, mas não aceito mais mentiras! -- advertiu
--Mentiras? -- mordiscou um mamilo da outra -- Estamos começando de novo... -- mordeu-lhe o queixo
--Hum... -- sorriu -- E falando em começar de novo... -- reverteu as posições e deitou-se sobre a loura -- Hora de recomeçar... -- mordeu o queixo dela e seguiu rapidamente direto para o sex*
--AH!!!!!! -- gem*u surpreendida -- Magali, você é um vulcão! -- fechou os olhos e deleitou-se com o que a outra fazia com a língua -- Ai....
CAPÍTULO 72 – Pedidos e Conselhos
Zinara havia terminado de jantar na companhia dos pais e de sua tia Najla. Depois de cuidarem da louça, estavam ainda à mesa proseando um pouco.
--Zinara mais eu procuremu im tudu qui foi cantu e num achemu cristão qui dessi informação du paradêru di dotô Viegas, num sabi? -- Raed comentava gesticulando -- Pareci inté qui abriu um buracu nu chão e o homi sumiu pra dentru deli!
--Ninguém sabe de coisa alguma! -- a morena exclamou desanimada -- Ezzai? (Como pode?) -- olhava para os parentes -- Fomos na antiga clínica mas ela tá fechada há anos, e ninguém nas redondezas soube o que dizer do Viegas.
--Mais homi, -- olhou para o marido -- nóis já sabia qui a clínica fechô faiz é tempu! -- Amina ficou sem entender -- Que qui ocês foru fazê lá?
--Procurar pistas, maama. -- a astrônoma respondeu de pronto -- E tentar achar alguém que pudesse nos dizer alguma coisa!
--E num si sabi é nada! -- Raed repetiu enfático
--Calma, gente, não desanimem! -- Najla aconselhou -- Se Youssef disse que Zinara deveria encontrar esse homem, no tempo certo a espiritualidade vai mostrar o que fazer. Vai dar intuição!
--Conto com isso, camma! -- concordava com a tia -- E preciso muito dessa inspiração, porque tá difícil...
--E é pur causa dissu qui ocê anda tão apoquentada? -- Amina aproveitou a deixa para perguntar
--Também tenho percebido você muito angustiada, Zinara. -- Najla concordou -- Shoo sarlake? (O que acontece com você?)
--Podi cunfiá, minina! -- o pai também queria saber -- O qui anda remoendu tuas ideia? -- olhava para a morena
Zinara gastou uns segundos calada até que resolveu confessar. -- Essa história de doutor Viegas me preocupa muito sim, mas é que... -- abaixou a cabeça envergonhada -- Eu... -- não sabia como falar -- Meu dinheiro... acabou... -- não sabia o que fazer com as mãos -- Pensei até que não fosse durar até novembro, mas durou... -- suspirou -- só que acabou... -- pausou brevemente -- Xajlaan... (Vergonha...)
--E quar é o problema? -- o homem perguntou olhando para a filha -- Ocê tá cum tua famia e eu nunca fui homi di dexá meus fio cum pricisão dos trem pra vivê! -- respondeu dando um tapa na mesa
--Não é vergonha, filha. -- Najla respondeu com carinho -- E eu que nem renda tenho? -- acabou ficando encabulada também
--Levanti a cabeça, minina! -- Amina ordenou e a filha obedeceu -- Num tem qui tê vergonha dissu, não! -- afirmou seriamente -- Ocê já feiz muitu pur nóis tudu e di mais a mais é nossa minina! Inquantu pricisá nóis cuida docê! -- olhou para Najla -- Ninguém tem qui tê vergonha! Famia é famia, e tudu juntu nóis vai levandu!
--Tem qui tê vergonha, não! -- Raed concordava
--Há quantos anos que não... -- Zinara gastou uns segundos calada -- Nossa, eu nem me lembro mais como é ser sustentada por usritii (minha família). Passar por isso depois de burra velha... -- sentia as bochechas queimarem
--Sei como se sente, tenha certeza! -- a ex fazendeira tocou o rosto da sobrinha -- Mas, por favor, não fique envergonhada, habibi! -- pediu com carinho -- Você nunca será um peso pra ninguém!
--Fique assim não, minina! -- o pai tentava falar com carinho também -- E ocê num é pesu, não!
--Fique assim não, purque sinão eu dô tapa! -- Amina ameaçou -- E botu pra cumê bifi di figadu!
--Ah! -- acabou rindo -- Tá bom, maama... -- sorriu -- Sem bife de fígado ou tabefes, min fadlik (por favor)!
E o telefone tocou.
--Vai atendê qui devi sê Clarice! -- Amina falou para a morena -- E vê si miora essa cara!
--Com sua licença, maama, baba e camma. -- pediu aos três e levantou-se correndo para atender
--Eita, qui chega vai pulandu! -- Raed reparou desconfiado -- Já inté mudô di cara mesmu! -- observou
--Elas são amigas! -- Najla tentava disfarçar -- E amigas amam se falar ao telefone!
--É normar! -- Amina dava força
“Devi di sê mesmu coisa di muié!” -- o homem sempre chegava àquela conclusão
--Alô! -- a professora atendeu toda animada
--Oi, xiita, que empolgação, viu, fi? -- Fred respondeu brincalhão -- Pensando que era a namorada mega culta? Lamento dizer, mas sou eu!
--Oi, Fred! -- continuava sorrindo -- Pensei que era ela, sim, mas te atender também me deixa feliz. -- caminhava pela casa -- Só que, me perdoe, com ela eu fico mais feliz! -- falou baixo -- Mas, deixa eu te perguntar, tá tudo bem?
--Sem ofensas, honey, eu sei que a namorada te alegra mais! Do contrário, pra que namoro, né? -- riu brevemente -- E sim, aqui as coisas vão bem. O bofe é que andou meio pra baixo por causa de uma virose, mas agora renasceu das cinzas. -- contava -- Sabe como é homem, né? Basta uma dorzinha ou um mal estar pra ficar um bagaço! -- pausou brevemente -- E você? Como vai a saúde?
--Tenho ido bem, graças a Deus. -- respondeu com sinceridade -- Não tô cem por cento, mas me sinto bem. -- sentou-se na poltrona da sala
--Que ótimo, então você pode aceitar o meu convite! -- respondeu satisfeito -- Que tal pegar sua namorada estilosa e viajar comigo e meu marido no réveillon? -- propôs -- A gente não sabe pra onde vai, mas em casa é que não vai ficar. -- afirmou resoluto -- Esse negócio de ficar vendo a contagem regressiva da TV Mundo enquanto se come uma ceia gordurosa é trash demais, né, Zi? -- perguntou com seu jeito afetado
--Dah mumill!! (Isso é um saco!!) Cruz credo! -- concordou com ele -- Mas acho que vou retribuir seu convite com outro! -- passou a mão nos cabelos -- Que tal vocês dois virem passar o réveillon aqui na roça? -- convidou -- Garanto que não é nada monótono e não se assiste TV Mundo na virada! -- brincou -- Aproveita que eu tô achando que ganhei uma sobrevida e não vou bater as botas em 2013! Já em 2014 eu não garanto...
--Ai, que brincadeira de mau gosto! -- reclamou chateado
--Mas o convite foi sério! -- insistiu
--Bem... -- pensou um pouco -- Deu a MAIOR vontade de aceitar, xiita, mas me responda... como seria isso, hein? -- perguntou curioso -- Um casal gay no seio de uma legítima família de Cedro? E nem você, que é prata da casa, se assumiu? Ah, honey, sei não! -- estava receoso -- Temo pela minha vida e tampouco desejo ficar viúvo!
Achou graça. -- Calma, Fred, só falta dizer que somos terroristas! -- cruzou as pernas -- Se vocês não ficarem ofendidos, basta disfarçar. -- aconselhou -- Nada de troca de carícias, beijos ou abraços apaixonados em público. Clarice e eu agimos como amigas e fica tudo certo. -- comentava falando mais baixo
--Ninguém sabe de nada? -- desacreditou -- Eu acho vocês duas tão óbvias que chega dói! -- riu
--Daqui de casa, só maama e camma Najla sabem de nós. Os outros, se percebem, ficam todos quietos.
--De fato, a gente costuma a disfarçar em público, my darling, porque não queremos ser manchetes de jornal... -- respondeu pensativo -- Mas eu vou ter que fingir de macho pra não levantar suspeita, né? Isso é tão... -- suspirou -- Queria tanto que ser gay não fosse esse pecado tão grande... -- lamentou
--Também queria, mas o mundo ainda tem que evoluir mais pra que essas coisas tenham fim... -- pausou brevemente -- Pense com carinho nessa proposta e depois me responda. -- aconselhou -- Eu preciso muito passar o máximo de tempo que puder com usritii e não tô em condições de viajar. -- respondeu com a verdade -- Clarice virá com a mãe e talvez até as irmãs dela venham. Convidamos outras pessoas também e a expectativa é de uma festa boa! -- ajeitou-se no sofá -- Pense com calma.
--Juro que vou pensar! Mas também tenho que falar com o homem, né? Saber o que ele acha. -- considerou -- Seja como for, muito obrigada, xiita!
--Al’afw! (Não há porque agradecer!)
De repente, uma lembrança veio à mente da astrônoma.
“--E você hoje trabalha em que, Fred? -- Zinara perguntou curiosa
--Indústria farmacêutica, honey. -- respondeu orgulhoso -- Mas, graças a Deus, agora tô bem longe dos remédios de tarja preta e mais aqueles muito punks que tanta gente toma em tratamento psiquiátrico!
--Nem me fale... -- fez cara feia -- Nem me fale... -- pensava em Khaled”
--Fred, deixa eu te perguntar... -- uma idéia ocorreu à professora -- Os médicos que receitam muitos remédios de tarja preta devem ter alguma espécie de cadastro, não? -- arriscou pensando em Viegas -- Algo do tipo... um cartão de milhagem diamante?
Ele riu da comparação. -- Não é bem assim, mas... Aqueles que prescrevem muitos medicamentos controlados acabam se tornando, eu diria... conhecidos. -- explicou superficialmente -- Existe uma espécie registro.
--Será que se eu pedir pra você mexer os pauzinhos... -- levantou-se excitada -- você encontraria uma pessoa pra mim?
--Não garanto, mas posso tentar. -- respondeu de pronto -- Além do mais eu, que adoro um desafio! -- também se animou -- Quem você procura, meu bem? Paixão antiga? -- brincou
--Longe disso! -- mirou um ponto no infinito -- Mas preciso muito encontrar um homem chamado José Arnaldo Viegas. -- pronunciou o nome com o cenho franzido -- Médico psiquiatra que por muitos anos trabalhou aqui em Guaiás, medicando e internando centenas de pessoas... -- sentiu um certo mal estar ao lembrar -- Duvido que houvesse alguém nesse estado que receitasse mais remédios de tarja preta do que ele!
--Me manda por e-mail tudo que você puder sobre ele, viu, fi? Se eu puder te ajudar...
--Tô contando com isso, Fred... -- sorriu pensativa -- Tô contando com isso...
***
Zinara ninava Ahmed Mateus, que dormia calmamente em seus braços.
--Parô di chorá? -- Catiúcia perguntou baixinho ao se aproximar
--Parou. -- respondeu em voz mais baixa também -- Mas quando ele acordar, acho que vai querer mamar. -- sorriu
--Si vai! -- sorriu e abriu os braços para receber o menino -- Mais, pur inquantu, dêxi eu levá eli modi durmi cumigu -- segurou o filho no colo -- purque tua mãe mi ofereceu a cama e eu num preguei os óio essa noiti!
--Vai lá. -- olhava para a cunhada -- Aproveita e descansa um pouco! -- beijou de leve a cabeça do bebê -- Rahimaka Allah, ya habibi! (Deus te abençoe, meu querido!) -- sussurrou com ternura
Catiúcia pediu licença e foi com o menino para o quarto de Amina e Raed, os quais se despediam dos outros filhos de Ahmed no portão.
--Ele dormiu? -- Najla se aproximava da sobrinha -- O bebê dormiu? Cadê ele? -- olhava para Zinara
--Dormiu, graças a Deus. Catiúcia levou ele pro quarto e saiu daqui segundos antes de ya sayyida (a senhora) chegar. -- estranhou que a tia estivesse sozinha -- Cadê maama e baba?
--Pegaram a carroça e foram com os meninos até a cidade porque ficaram com pena de ver os bichinhos indo embora. -- sorriu
--Também queria ter me despedido deles, mas alguém tinha que acalmar o bebê... -- lamentou -- Pelo menos a gente brincou muito! -- sorriu -- Foi um dia e tanto!
--Elis intenderu purque ocê num foi inté a portêra si dispidí mais baba e maama! -- Ahmed comentou ao chegar na sala -- E todus elis gosta muito docê! -- exclamou sorrindo -- Possu garanti qui os mininu adoraru as brincadêra di hoji! Fica preocupada não!
--Uai? -- olhou surpresa para o irmão -- Pensei que tivesse ido junto com eles na carroça! -- estranhou
--Eu também! -- Najla comentou sem entender
--É qui... -- olhou sem graça para as duas mulheres -- Eu precisava di tê um dedinhu di prosa cocê, Zinara... -- explicou-se -- Quiria apruveitá a ocasião, num sabi? -- sorriu encabulado -- Num é sempri qui si podi tê um particulá, né mesmu?
--Entendi, você quer privacidade pra conversar com ela e achou que o momento era esse. -- a ex fazendeira concluiu -- Então deixa eu aproveitar que o laptop tá sem uso -- ajeitou o lenço nos cabelos -- pra ver se encontro o senhor Marco on line na internet. -- deu tchauzinho para os dois -- Com licença. -- retirou-se toda serelepe para seu quarto
--Essi sinhô Marco é o tar homi qui baba num ingoliu, né? -- Ahmed perguntou achando graça
--O próprio! -- divertia-se também -- Mas, deixa eu te perguntar, -- cruzou os braços -- sobre o que quer conversar? -- estava curiosa -- Pelo seu jeito, deve ser coisa séria!
Não sabia como dizer e ficou uns segundos calado até que resolveu falar de uma vez só: -- Mi diz tudu qui ocê sabi sobri a zécomia! -- pediu falando mais baixo
--Sobre quem? -- não entendeu
--Arre, mais ocê num sabi dissu, não? Qui decepção, muié! -- franziu o cenho contrariado -- Zécomia é aquela operação qui um homi faz módi num tê mais fio, sô! -- esclareceu
--Ah! -- teve que fazer força para não rir -- Tudo bem, mas o nome é vasectomia. -- corrigiu com educação -- O que quer saber sobre isso? Imagino que deseje fazer essa operação. -- deduziu
--Hum... -- coçou a cabeça -- Eu quiria, mais... -- olhou para todos os lados e se aproximou mais -- issu num faiz perdê a macheza, não? -- foi direto ao ponto
--Como é?! -- novamente controlou-se para não rir -- Choo? (O que?)
-- Cid falô qui faiz! -- citou a fonte da informação -- E eu num queru trocá di sexu, não! -- afirmou enfático
Zinara não resistiu mais e riu gostosamente. -- Ai, ai... -- tentava se recompor -- Mil perdões, Ahmed... -- passou a mão nos olhos -- Mas é que Cid delirou! -- balançou a cabeça negativamente -- Tem nada disso, não! -- passou a mão nos cabelos -- Perder a macheza, veja só! -- achava graça
--Vem aqui mais eu! -- chamou para fora de casa -- Num queru ninguém ôvindu essi prosiadu! -- saiu para o quintal
--E mais essa... -- revirou os olhos achando graça
***
--Discurpa fazê ocê tocá nessis assuntu mais eu. -- estava envergonhado -- Sei qui é meiu indecenti, mas eu tinha qui mi isclarecê cum argúem... -- justificava-se -- Ocê foi a única pessoa qui mi ocorreu indagá, mais inda assim eu matutei muitu antis di tocá nu assuntu, num sabi? -- falava a verdade
--Não é indecente, Ahmed. Se você tem dúvidas, tá certo de se esclarecer. -- a morena respondeu com delicadeza -- A vasectomia é um procedimento muito simples, principalmente se a gente compará-la com o ligamento das trompas realizado nas mulheres. -- olhava para o irmão -- A recuperação é muito rápida e sua vida sexual não vai ser alterada por causa da cirurgia. Não tem isso de perder macheza! -- achou graça novamente
--Mais cumé qui o médicu vai fazê cumigu? -- perguntou curioso
--Presta atenção! -- abaixou-se para pegar dois pequis e três gravetos finos. Ahmed se agachou também -- Nos testículos dos homens é que se fabricam os espermatozóides -- colocou os pequis um ao lado do outro -- e quando você faz amor com alguém e se satisfaz, o esperma segue pra uretra e então você ejacula. -- posicionou um graveto ao lado de cada pequi e fincou o terceiro graveto no meio deles -- Esse líquido é transportado dentro do seu órgão masculino graças a uns canais fininhos, chamados canais deferentes. São como esses dois gravetos aqui. -- apontou -- E esse outro que eu finquei no chão é igual sua uretra.
--Sei. -- acompanhava o raciocínio
--O cirurgião irá cortar os canais deferentes e amarrar as duas pontas deles. -- quebrou os dois gravetos para simular o corte -- Por isso o líquido vai ficar sem espermatozóides, porque não tem como eles chegarem na uretra.
(Nota da autora: baseado em http://www2.uol.com.br/vyaestelar/vasectomia01.htm)
--E aí eu num vô fazê mais fio e nem perdê minha macheza! -- concluiu
--Aywah! (Sim!) -- balançou a cabeça e se levantou -- É isso mesmo!
--Belez! -- levantou-se empolgado -- Intão possu fazê os trem sem tê medu di fazê mininu! -- sorriu -- Num vai aparicê muié atrás di mim falandu qui tá prenha pur causa deu! -- esfregou as mãos pensando bobagem
Zinara percebeu as reais intenções do irmão e resolveu interferir. -- Mas tudo na vida tem um preço, Ahmed. -- cruzou os braços -- Depois de fazer uma operação dessas, um homem tem muito mais facilidade em pegar doença venérea, mesmo que use camisinha. -- mentiu -- Se tá pensando em pular a cerca, recomendo que não opere, porque senão vai se lascar todo!
--É?? -- perguntou espantado
--Conheço histórias de homens que pegaram cada doença que nem sei! -- continuava mentindo -- E aí, meu filho, perde-se a macheza, os trem -- gesticulou para ele entender que falava do p*nis -- e muito mais!
--Ave Maria! -- arregalou os olhos
--Ahmed, por favor... -- abraçou-o pelos ombros e começaram a caminhar pelo quintal -- Você já aprontou bastante por aí, teve várias mulheres, quatro filhos, casou... Não acha que é hora de se portar com seriedade? -- aconselhava -- Ser homem não é dormir com toda mulher interessante que se conheça!
--Ah, Zinara, eu gostu muitu di muié... -- retrucou chateado
--Me perdoe, mas isso não é gostar de mulher! Você gosta da conquista, da farra, do prazer... gostar de mulheres é saber amá-las e isso você não tem se deixado fazer.
--Humpf! -- fez um bico -- Ocê num é machu! É diferenti as muié e os homi! -- argumentou
“Oh, Aba (Oh, Meu Pai), que criatura machista!” -- lutava para não perder a paciência -- Não acha que baba seja muito macho? -- perguntou
--Claro, uai! -- respondeu de pronto -- Baba é dus homi mais machu qui já cunhici! -- afirmou com orgulho
--Baba nunca traiu maama, disso tenho certeza! -- soltou os ombros do irmão e continuou caminhando -- Ele afirma isso em nome da honra de usritina (nossa família) e eu acredito! -- olhou para Ahmed -- É fiel e muito macho!
--Mais é diferenti... baba é di ôtros tempu! -- não sabia o que dizer
--Nada a ver, Ahmed! -- deu um esbarrão nele de leve -- Nagibe e Cid não traem as mulheres. Se traem, são discretíssimos!
--Nagibe ama muitu Dora e Cid num trai purque tem medu di Penha discubrí e botá eli pra corrê! -- argumentou -- E os dois também têm medu di baaba, qui num aprova essas coisa.
--Você pode vir a amar Catiúcia, por que não? -- parou de andar e olhou para ele -- Ela te ama! Dê uma chance a garota! -- pediu -- Não é todo dia que aparece alguém disposto a nos dar amor, habibi!
--Humpf! -- coçou a cabeça contrariado
--Hoje você me diz que aprende que ser um baba não é fácil e que se arrepende por ter sido tão distante de seus filhos. -- continuava falando -- Um dia, mesmo que seja bem lá na frente no futuro, você vai se arrepender por ter sido um homem da bagunça. Creia que vai! -- tentava despertá-lo -- Não existe liberdade sem responsabilidade, akhuuya (meu irmão)! -- segurou o rosto dele com as duas mãos -- Se a consciência não te serve de freio, que a AIDS o seja! Essa doença existe, tá em todos os lugares, faz sofrer e mata!
--Ave Maria, discujuru! -- afastou-se com raiva -- Dêxi di sê agorenta!
--Não é agouro, é realidade! -- retrucou -- E agradeça muito a Deus por nunca ter pego doença depois de tanta coisa que já fez por aí!
--Uai... -- virou-se de costas e cruzou os braços -- Eu já tivi umas duença aí... -- confessou -- Só baba ficô sabendu o qui era... -- pausou brevemente -- Dispois di muita mão di obra qui curei...
--Smallah!! (expressão de espanto) Foi naquela época que você ficou de castigo por um tempão?
--Foi...
“Bem que eu desconfiei que aquilo tudo não era por ter tirado nota baixa...” -- pensou -- "Ahmed nunca foi bom aluno e baba não fazia nada!” -- lembrava -- "Muito esquisito que de repente resolvesse castigar por nota ruim! Especialmente o filho preferido!” -- balançou a cabeça contrariada -- “Baba foi capaz de mentir pra esconder as falhas de Ahmed...” -- um sentimento de revolta brotou em seu peito -- "Esquece isso, Zinara! É passado!” -- aconselhou-se -- Wana amil eh (Fazer o que)?
--O que? -- perguntou sem se virar
--É hora de crescer, Ahmed. -- virou-o de frente para si -- Se decidir operar, peço ajuda a doktuur Cláudia e ela indica um bom médico pra você lá em Gyn. -- olhava nos olhos -- Pode ficar na casa de Aisha e Janaína, duvido que elas se neguem a te receber. -- ergueu o dedo indicador, apontando para o jovem -- Só que vai ficar ciente que se pular a cerca, se dana! -- mentiu
--Eu sei... -- acreditava
--E se não quiser operar, se cuida, porque cinco, seis, sete awlaad (filhos) é demais!
--Tô lascadu! -- reclamou -- E baba vai mi cumê vivu si eu tivé fio cum outras muié! -- suspirou -- Catiúcia também num qué mais mininu! Pra ela bastô Ahmed Mateus...
--Então o que te resta é ser fiel, operando ou não! -- sorriu -- Vai descobrir que isso não é ruim!
--Humpf! -- coçou a cabeça
--Não se meta em situações que te deixem atiçado, cuide de Il-cela (a família) e viva como um homem casado! -- aconselhou -- Catiúcia vai ser uma boa zoga (esposa) pra você, então dê valor ao que ela te dá!
--Humpf! -- continuava dando muxoxo
--É fácil encontrar companhias, mas não é fácil encontrar uma pessoa companheira, Ahmed! Aprenda isso! -- deu um tapa no ombro dele
--E ocê lá intendi dissu? -- perguntou de cara feia -- É sortêra inté hoji! -- cruzou os braços -- Também num é homi pra intendê di vida cum muié!
“Ai, ai, tolinho... se você soubesse...” -- pensou contendo o riso -- Reflita no que te falei, porque não te disse nenhuma bobagem. E o que decidir, me fale! -- apertou a bochecha dele e sorriu -- Tudo esclarecido, deixa eu ir trabalhar um pouquinho! -- deu tchauzinho e voltou para dentro de casa
--Arre, qui eu tô incurraladu! -- o jovem coçou a cabeça pensativo -- É homi... -- falava consigo mesmo -- Achu qui teus dia di farra chegaru ao fim! -- suspirou com tristeza
"Allah (Deus), me perdoe por ter mentido quanto à informação de que homens vasectomizados têm mais risco de pegar doenças venéreas, mas foi por uma boa causa!” -- a astrônoma dirigia o pensamento a Deus -- "Se Ahmed não toma vergonha por bem, toma por mal!”
***
Úrsula apresentava o balancete do hotel fazenda para um representante de seu chefe Mike Ametista. O material que preparou continha ainda o histórico financeiro do empreendimento desde sua aquisição por parte do empresário.
--Meu Deus, mas de acordo com o que você me mostra aqui... -- o homem analisava -- essa fazenda sempre deu prejuízo desde o começo! -- constatou horrorizado -- Prejuízo esse que só fez aumentar ano a ano!
--Isso mesmo, senhor Cordeiro. -- balançou a cabeça positivamente -- Foi feito de tudo, mas inexplicavelmente nada deu certo de fato! -- lamentou -- Tivemos pequenas vitórias, mas as derrotas foram muito maiores. -- mostrou um gráfico -- E a procura por parte dos clientes nunca atendeu às expectativas.
--E agora que foi promovida a gerente de hotelaria você não tem nada a propor? -- retrucou contrariado -- Você não é mais uma gerentezinha de horário admistrativo, Úrsula! -- falava de cara feia -- Tem que honrar o cargo e o belo aumento que recebeu! -- gesticulou -- O que vai fazer pra reverter esse quadro? Esse hotel fazenda tem tudo pra dar certo, por que não dá?
A mulher achou graça do que ouviu mas manteve a compostura. -- Eu sempre funcionei muito mais como gerente de hotelaria, senhor Cordeiro, que os homens que nosso chefe empregou pra exercer essa função. -- respondeu calmamente -- Aliás, o ex gerente Rodrigo Serra, recém demitido pelo senhor, jamais teve o menor interesse em cuidar dessa fazenda. Os que vieram antes dele tampouco tinham fôlego pra tocar os negócios por aqui. -- cruzou as pernas -- Quanto ao belo aumento, não considero que duzentos reales a mais sejam tanta coisa assim. -- sorriu sarcástica -- E no que se refere a propor soluções pra reverter o quadro que lhe apresentei, eu só tenho uma coisa a aconselhar: -- reclinou o tronco e apoiou os joelhos sobre as penas -- o melhor que Mike Ametista tem a fazer é devolver a fazenda pra verdadeira dona!
--O que?! -- não acreditou no que ouviu
--Foi uma compra mal feita! Hoje eu conheço a história toda e sei que o falecido fazendeiro que vendeu isso aqui, passou mulher e filha pra trás! -- explicava -- É por isso que nada nunca dá certo! -- afirmou convicta -- Esse lugar é amaldiçoado!
Cordeiro riu gostosamente e encostou-se no sofá mirando o rosto de Úrsula. -- Não acredito que esteja me dizendo isso! -- sorria debochado
--Vários hóspedes já se queixaram de ver vultos, ouvir vozes, sussurros ameaçadores... -- relatou -- Semana passada um casal fez check out antecipado e saiu às pressas por conta de ver o fantasma de um homem que os abordou no meio da noite enquanto olhavam as estrelas.
---Isso é ridículo! -- protestou
--Isso é real! -- retrucou -- E outra coisa que sempre espantou os hóspedes foi o preço das diárias, que desde o começo foi alto demais!
--Mas nós criamos várias modalidades de tarifas! -- gesticulou -- Por sugestão sua, aliás!
--E começou dando certo, mas conforme os hóspedes tornaram-se mais frequentes, as reclamações sobre fantasmas também!
Cordeiro suspirou contrariado e se levantou arrumando-se para partir. -- Mike Ametista ficará a par da conversa que tivemos aqui! -- anunciou em tom de ameaça
--Ele vai ficar muito melhor se aproveitar o processo que rola contra ele e entregar essa fazenda amigavelmente! -- levantou-se também -- Se insistir, isso aqui vai acabar falindo. E os negócios dele não andam muito bem, não é?
--Ele vai ficar sabendo! -- pegou a maleta e ajeitou a gravata -- Inclusive dessa sua última observação. -- sorriu -- Passar bem! -- fez um gesto de cabeça e foi embora
--Puxa saco de merd*, cheirador de cú! -- praguejou para si mesma -- Vai se fuder, cordeirinho! -- cruzou os braços de cara feia
***
Najla estava com Zinara e Amina no centro de mãe Agda. A astrônoma concentrava-se para apoiar um dos médiuns de incorporação, enquanto sua mãe e tia deveriam permanecer orando.
O som dos tambores deixava a ex fazendeira angustiada.
--Eu não gosto disso aqui, Amina! -- sussurrou para a outra -- Não sei porque Zinara insistiu tanto pra eu vir dessa vez!
--Cala a boca e reza, muié! -- respondeu de boca torta
--Ocê! -- Agda, manifestando sua guia, apontou para Najla -- Vem aqui, muié! -- chamou
--Eu?! -- perguntou apavorada
--Dêxi di peitica, muié! -- Amina ralhou -- Si a mãe di santu chamô, ocê levanta e vai!
--Ave Maria! -- benzeu-se apavorada ao se levantar
--Tá cum medu, fia? -- Agda cuspiu fumaça de charuto sobre ela -- Tem medu, não... -- sorriu -- Senta ali, nu centru daquela istrela!
--Que estrela?! -- não entendia
Três jovens rabiscaram uma estrela de Davi no chão e Najla entendeu que deveria ficar no centro dela. Zinara estava de pé a uma curta distância de onde a tia deveria se sentar.
--Inshallah (Se Deus quiser) isso vai acabar logo! -- a ex fazendeira resmungava para si mesma ao se sentar
Pouco tempo depois, um homem magro e idoso posicionou-se diante de Najla e ficou olhando para ela. Com a repentina interrupção da música, ele caiu aos pés da mulher como se estivesse morto.
--Oh, Aba! -- exclamou assustada
--Cunfia, muié! -- Agda pediu -- Cunfia!
O homem sentou-se com dificuldade e gastou uns segundos calado e de cabeça baixa, até que começou a falar.
--Nunca que vou esquecer daquela viagem que mudou minha vida... -- respirou fundo -- Eu fui pra Cedro fechar negócio com um importador de carne e num conseguimos entrar em acordo... -- ergueu a cabeça e encarou com a mulher -- Aí ele me chamou pra ver as Miss desfilar e meu coração se encantou com a Miss Cedro 68!
O coração de Najla disparou. -- Cezário?! -- não acreditava
--Num demorou muito, te pedi em casamento! -- sorriu -- E que festança danada de boa, num foi, Jilinha?
“Jilinha...” -- admirou-se -- "Só Cezário me chamava assim...” -- pensou
--Nosso amor podia ter sido muito bonito, mas eu estraguei tudo... -- seus olhos marejaram -- Te traí, causei intrigas entre você e tua famia, fui mau pai... -- reconhecia -- e no final de tudo inda roubei o patrimônio que seria seu e de Aisha...
Najla derramou uma lágrima sentida ao ouvir aquilo.
--Paguei com muito sofrimento o que de mal fiz... -- ajoelhou-se -- E ainda sofro...
--Cezário... -- chorava contidamente
--Perdoa, Jilinha! -- implorou com as mãos postas -- Se eu pudesse voltar atrás... -- chorava também -- Faria tudo muito diferente...
--Eu não esqueci... -- secava os olhos com as mãos -- mas te perdoei! -- respondeu com a verdade -- Também errei muito e tive o que mereci! -- confessou
--Há anos eu faço tudo que posso pra fazenda vortá pras tuas mãos... -- sorriu com o rosto molhado por lágrimas – E vai vortá! -- prometeu
A mulher não sabia o que dizer. Estava muito emocionada.
--Ah, que eu pudesse te abraçar... -- estendeu a mão e quase tocou o rosto da ex esposa -- Também queria tanto abraçar Aisha... -- lamentou -- Diz pra ela que eu me arrependo, -- chorava -- que sinto saudade, que tenho orgulho dela e que amo aquela menina por demais da conta...
--Digo sim...
--Aisha reza por mim e isso me faz tão bem... É bão... -- balançou a cabeça -- Reza também? -- o homem fechou os olhos e respirou fundo. A música recomeçou
Najla percebeu que Cezário havia ido embora. -- Rezo! -- respondeu olhando para o médium que se levantou de repente -- Prometo que rezo... -- mais uma vez secou os olhos com as mãos -- "Vai com Deus, Cezário...” -- falou mentalmente -- "Vai com Deus...”
Alguns jovens começaram a dançar rodando em círculos.
***
--E foi assim, Aisha! -- Najla acabava de contar tudo a filha -- E era ele, eu sei! Tenho certeza!
--Eu acredito, mamii... -- respondeu emocionada -- E fiquei muito feliz que ele pôde falar com você pra pedir perdão! -- enrolava o fio do telefone nos dedos -- E também fiquei feliz em saber que a fazenda vai voltar pra gente!
--Quando você falou que Jamila propôs um acordo com Ametista eu não acreditei que houvesse possibilidade dele aceitar, -- contava -- mas agora eu acredito! -- sorriu -- Acho que podemos resolver isso sem esperar longos anos na Justiça! -- suspirou -- E seu pai vai poder ficar em paz!
--Eu levo fé, mamii! -- concordou -- E faz o que ele te pediu, por favor: reza por ele!
--Tenho feito, pode acreditar! -- sorriu emocionada -- E me sinto mais leve, sabe?
--Talvez agora você o esteja perdoando por completo!
--O sofrimento dele me tocou, habibi! Era real! Dava pra sentir!
--Acredito! -- pausou brevemente -- Já contou isso pro Marco?
--Ainda não! Queria falar com você antes de mais nada!
--A vida lhe sorri, mamii! -- afirmou animada -- Você reconciliou com a família, tem chances de recuperar a fazenda e mais a possibilidade de viver um grande amor! Aproveite, viu?
--Que é isso, menina? -- ralhou encabulada -- O senhor Marco e eu somos apenas bons amigos!
--Sei... -- achou graça -- Pra cima de moi? S'il vous plaît (Por favor), mamii! Meu detector de sacanagem não falha! -- riu brevemente -- Eu bem vejo o fogo de Marco quando se toca no seu nome! -- riu de novo -- Janaína disse que ele até passa perfume quando fala com você na internet!
--É mesmo? -- perguntou interessada
--E de vez em quando ele fica por aí cantarolando...
“Ai, ai...” -- suspirou -- “Meu negão de tirar o chapéu...” -- pensou
--Olha, melhor dizendo, a vida nos sorri, mamii! E eu não quero errar de novo dessa vez! -- afirmou com seriedade -- Se tudo der certo e a fazenda voltar pra gente, vou ser outra Aisha dessa vez!
--Eu também, habibi! Juro sob Deus e sob o nome de nossos ancestrais que aquela Najla dos tempos de prosperidade nunca mais dará as caras novamente! -- prometeu com a mão sobre o peito -- Vida nova, recomeço!
***
--E então, Sahar, quando é que você vem visitar os dois nenéns? -- Zinara perguntava manhosa -- Dezembro já começou...
--Dois?! -- não entendeu -- Nasceu outro?! -- perguntou curiosa
--Um é Ahmed Mateus e outro sou eu! -- brincou -- Preciso de minha Sahar pra me cuidar... -- fez um dengo
--Own, meu amor... -- respondeu derretida -- Sabe que o natal tá garantido, mas não vejo uma forma de aparecer por aí antes!
--Antecipa a viagem e vem logo! -- pediu fazendo um charminho -- Você só me enrola...
--As coisas na universidade estão uma loucura, minha querida, e ontem mamãe levou um tombo e se machucou. Tenho que ficar cuidando dela pra garantir que se recupere!
--Choo?! (O que?!) Ya Leda se machucou?! -- levantou-se da rede apavorada -- E eu que não sabia de nada, aHHa! -- reclamou -- Maama também não me disse nada!
--Calma, querida, tá tudo bem. -- tentava tranquilizá-la -- Ela levou um tombo aqui no portão ontem de tarde e tudo aconteceu muito rápido, por isso não avisei. Sua mãe também não sabe de nada. -- esclareceu -- Mamãe não quebrou osso algum, graças a Deus, mas se machucou e precisa de repouso por uns dias. Tanto é que agora tá dormindo. -- olhou na direção do quarto da idosa -- Não reparou como a casa tá quieta? -- abraçou-se com o urso de pelúcia
--Tadinha de ya Leda... -- sentou-se na rede novamente -- Vou avisar pra maama, baba e camma Najla pra todo mundo orar por ela.
--Obrigada, meu amor! -- agradeceu -- Mas espero que me entenda. -- pediu -- Mesmo que desse pra antecipar a viagem, quem cuidaria de mamãe? Não posso contar com minhas irmãs nessas horas! -- pausou brevemente -- O médico disse que obedecendo o repouso rigorosamente, vai dar tempo de se recuperar pra poder viajar no natal!
--Ah, mas vai dar tempo sim! Inshallah! (Se Deus quiser!) -- afirmou com fé -- Estamos no dia dois de dezembro, vai dar tempo sim! -- pensou em um detalhe -- E quem vai ficar com ela enquanto você vai pra faculdade?
--Dona Elisa, a vizinha aqui do lado. Ela se ofereceu e é uma pessoa de confiança! -- pausou brevemente -- Hoje tive que faltar pra cuidar de mamãe e ela já me deu uma força.
--Que bom que pode contar com ela! Fiquei preocupada com ya Leda sozinha enquanto você ia trabalhar!
--Entende agora porque, mais que nunca, não dá pra antecipar a viagem?
--Ana a’arfa... (Eu sei...) Entendo sim... -- suspirou tristemente -- Ai, ai... esperar até 24 de dezembro vai ser um castigo pra essa pobre caipira... -- lamentou
--Ah, minha caipirinha linda... -- respondeu dengosa -- Fica assim, não! -- deitou-se no sofá -- Quando a gente se reencontrar vai ser maravilhoso! -- prometeu
--Sempre é, Sahar! Mas eu queria que a gente se visse mais...
--Eu também, querida! Eu também... -- suspirou
--Não tenho muito tempo... -- comentou sem pensar
--Pare com isso, Zinara! -- ralhou -- E de mais a mais você tá tão bem! Lembra que me falou que não acreditava que chegaria viva em 2014?
--E 2014 ainda não chegou! -- retrucou -- Eu não sou pessimista, Sahar, mas só Allah (Deus) e eu sabemos o que se passa comigo! -- pausou brevemente -- Acho que terei só o tempo necessário pra fazer o que te contei que Youssef me pediu...
--Quem sabe do tempo que cada um de nós terá é só Deus! -- argumentou querendo mudar de assunto -- Eu tenho muita fé! Você vai curar! -- abraçou-se mais com o urso -- Oro fervorosamente por isso todos os dias!
A astrônoma ficou toda prosa. -- Chukran, ya habibi! (Obrigada, minha querida!)
--E quanto ao médico, alguma novidade? Fred descobriu o paradeiro dele?
--Ainda não. -- deitou-se na rede -- Acho que foi uma idéia maluca da minha parte. Muito provavelmente Fred não vai conseguir... Tenho que pensar num plano B! -- pausou brevemente -- Na internet não achei nada!
--Zinara, às vezes seu racionalismo te faz pessimista, sabia? -- comentou -- Tem fé, criatura! Vai dar tudo certo! Você vai encontrar esse homem!
--Inshallah! (Se Deus quiser!) -- olhou para o céu
--E antes disso vai me encontrar também! -- respondeu melosa
--Não vejo a hora! -- afirmou igualmente melosa -- Encontrar você é... -- não sabia explicar o que seu coração sentia -- Yoam ma etabelna da hafdal mish naseh... (O dia em que nos conhecemos é um dia que nunca esquecerei...) -- sussurrava -- Ana etkatabli aHla eset Hob Fe! (A mais linda história de amor foi escrita para mim naquele dia!)
--Ai, Zinara, quando você começa falando assim... -- remexeu-se toda na poltrona
--Clarice! -- Leda chamou do quarto -- Dá um tempo nessa lambição e me ajuda a ir no banheiro, por favor! -- pediu -- Quero fazer xixi!
--Amor, espera um segundo? -- pediu ao se sentar -- Vou ajudar mamãe e te ligo de volta daqui a pouco.
--Claro, Sahar! Ela tem prioridade! -- concordou -- Eu espero, sim. Macasalaama! (Até logo!)
--Volto já, já! -- prometeu -- Beijo!
--Beijo, minha amada! -- ouviu o telefone ser desligado do outro lado -- Uai! -- ouviu um som de torpedo no celular -- Quem será? -- estendeu a mão e pegou o aparelho que estava no beiral da janela -- Fred! -- levantou-se excitada -- Vamos ver!
“Xiita, me liga!” -- lia o que ele escreveu -- "Aconteceu um troço muito louco e acho que descobri onde seu homem se meteu! Comemora, viu, fi? Não levou nem um mês! ;)”
--Oh, Aba! -- sentiu o coração acelerar -- Será? -- fechou os olhos -- Dai-me forças, Senhor, pra suportar um reencontro com esse homem! -- pediu temerosa – "Tenho muito medo!” -- confessava mentalmente -- “Olhar nos olhos de Viegas é relembrar do sofrimento de Khaled e de tudo que também sofri por conta do que aconteceu com ele...” -- suspirou -- "Não sei se estou preparada, acho que não... Por favor, Aba, me ajude a passar por mais isso...”
(Nota da autora: Mnemsis e Cris Lane, vocês devem ter percebido que usei de suas palavras. No caso da primeira, foi durante a conversa de Zinara com Jamila. E quanto a segunda, foram os ‘movimentos marcados para o prazer’. Achei essa frase muito catiana, Cris Laninha! kkkk)
Fim do capítulo
Músicas do Capítulo:
[a] Não Aprendi a Dizer Adeus. Intérpretes: Leandro & Leonardo. Compositor: Joel Marques. In: Leandro & Leonardo Vol 5. Intérprete: Leandro & Leonardo. Chantecler, 1991. 1 CD, faixa 3 (3min06)
Ritinha e Zezé Cobram:
Falar a Verdade. Intérprete: Cidade Negra. Compositores: Ras Bernardo / Lazão / Da Gama
Najla Suspira com:
Meu Ébano. Intérprete: Alcione. Compositores: Nenéo / Paulinho Rezende
Zinara Lembra:
Sallamit-Ha oum Hassan. Intérprete: Farouk Salamah. Composição: sem informações
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Samirao
Em: 08/10/2023
Tô aqui lembrando de quando li esse CAPS pela primeira vez. Tá bom eu admito que o Tao também é o must! Apesar do tatuí huahuahua
Solitudine
Em: 11/11/2023
Autora da história
Obrigada, querida!
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Seyyed
Em: 19/09/2022
E chega mais um na roça. Najla no parto foi o máximo haha E haja namoro pela internet, por telefone e zoação em cima das apaixonadas. Cátia foi a luta e catou as duas hehe Esse Viegas vai ser mais uma pedreira na vida da Zi. E a gente vai rever a história do Kaled. Muito bom Muito foda!
Resposta do autor:
Sim, a família só aumentando!!! Najla investiu na experiência que tinha, fazer o que? rs
Para duas mulheres que moram longe, sobra a internet e as maamas para fazer troça! rs
Cátia é persistente. Em tudo!
Viegas ainda trará grandes revelações. Você verá (ou já viu rs).
Beijos,
Sol
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Seyyed
Em: 19/09/2022
Vou ter que sair agora. Parei com Cátia Magali e Lúcia se ferrando no protesto. Deu raiva apesar das tuas palhaçada de spray de urtiga e as confusões da Cátia pra fugir de ser descoberta E foi né? Hahaha Mas ela é patriota eu nem prestei atenção nessas coisas na época e pensar nisso agora revoltada!
EBT é o bixo!! Amando
Resposta do autor:
Saiu duplicado.
Sinal de que você tentou de verdade me escrever! rs
Beijos,
Sol
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Seyyed
Em: 19/09/2022
Vou ter que sair agora. Parei com Cátia Magali e Lúcia se ferrando no protesto. Deu raiva apesar das tuas palhaçada de spray de urtiga e as confusões da Cátia pra fugir de ser descoberta E foi né? Hahaha Mas ela é patriota eu nem prestei atenção nessas coisas na época e pensar nisso agora revoltada!
EBT é o bixo!! Amando
Resposta do autor:
Sim, quando eu lembro daquele leilão e de tudo que aconteceu também sinto muita raiva. E Cátia se deu mal duplamente, não? Perdeu a causa e foi descoberta.
Obrigada por seus elogios!
Beijos,
Sol
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Zaha
Em: 13/03/2018
Oie Sadikii!! Espero que os momentos dos seus dias estejam menos intensos e que você esteja se cuidando. Rezo todos os dias. Apenas n rezo qndo termino dormindo sem perceber..kkkk
Jamila e Zinara necessitavam dessa conversa , foi muito boa, principal pra Zinara. É exatamente o que pensava e continuo pensando .. a. Doutora Melanie Klein mandou bem, como sempre, na época ! ;).
Agora Jamila larga..desapega fia!!! kkkkk. Cátita tá chegando, falta pouco, Aliás, já se esbarraram duas vezes na cama..era pra ser!!
Jamila é tão fácil de entender...as atitudes, acho q por isso q no final n posso ficar chateada c ela ...se parece c uma pessoa ,né?! Hahahaha.
Acho engraçado o termo " sua bunda é vermelha", sei que é um grande insulto, mas vindo de outra cultura, tão diferente, n tem como não pensar assim. Outro significado, mas certamente quando aprenda o idioma sem precisar da tradução literal, possa entender. Conheci mais do Líbano e seus costumes no transcorrer dos 2 últimos anos e já posso compreende muitas atitudes e as frases são intensas e belas, um significado tão poético . Adoro o respeito que eles têm ao se comunicar com outro. As palavras que utilizam. Adoro o bom dia, mt bonito o significado literal.O pai nosso e ave Maria( tem uma parte diferente, é lindo e linda!). Tentarei orar com ele pra vc, passei pro papel e vou acender uma velinha como faço pra minha mae. Recito em português o dela, claro. RS.
Cátia não aprende, tem que ter MTa cara de pau e MT sofrimento pra querer tapar c tanta luxúria justamente pra n sofrer...mas td muda, sempre chega a pessoa ou um fato que nos provoca uma mudaça nossa visão ou derrubar "nossas "barreiras.(digo em relaçao a tudo...)
Chegou o momento de encontrar c Viegas! Achei MT forte qndo Zinara falou c o irmão ,chorei! N sei se escrevi algo sobre isso antes. No abc sim ou lesword. Digo por aqui. Relacionei com algo, que n foi igual,mas me fez lembrar algo. Uma parte me fez lembrar de algo, porém todo o momento me fez chorar tb por pensar que muitas pessoas podem sofrer assim!
É isso, n quero me prolongar!
Desculpa pela demora, sei que n responde ,mas seguro que estás ahí e te causa alegría , ojalá ! Isso que vale, fazer as pessoas felizes !! Não existe prazo maior!!
Te dejo un besote, mucha luz, cariño, amor y una sonrisa Lailesca! Cuídate mucho!
Ps: Vou demorar um pouco, n como vc hahahahaha. Hasta pronto, amiga querida! Que tengas unos hermosos meses!!
Resposta do autor:
Você me pedindo desculpas pela demora?? Eu que sou a demorada aqui!
Eu sabia que você andava estudando coisas do Oriente! Já entende até a parte subliminar da coisa...
Este Viegas é um ponto polêmico. Ele e os tratamentos que existem até hoje e muito me incomodam. Parece que os tarja preta estão cada vez mais "populares" ao invés da abordagem ter se direcionado para aquela medicina psiquiátrica mais humana, mais espiritual...
Será que você ainda lembra deste Tao?
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Gabi2020
Em: 17/05/2020
Olá Solzinha tudo bem? Descansou no fim-de-semana? Nada de trabalho viu?
A mão está bem melhor, a gata pegou de jeito! Ainda bem que foi a mão direita,se fosse esquerda seria mais complicado.
Arraso não mulher! Acho a língua do Cedro melodiosa, muito bonita!
Por que Samira não gosta de Clarice?
Olha aí descobriu o que é o tal rebuceteio... Kkkkkkk... É isso aí garota!!
Lembro bem o quanto você se envolveu com essa história, inclusive fisicamente.
Não se mate de trabalhae viu? Tome tento!
Beijos
Resposta do autor:
Olá Gabinha!
Tudo bem? Você é canhota. Ainda bem que a gata teve esse respeito, né? 😉
Trabalhei foi muito! Esse COVID dá o que fazer, Ave Maria. Além do mais trouxe uma velhinha aqui para casa. A bichinha estava precisando.
Samira não gosta porque ela quer Zinara com Jamila. Por que será? kkkkk
Cuide-se aí!
Beijos,
Sol
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Gabi2020
Em: 15/05/2020
Solzinha!
Jamila não entendeu ou não quis entender que acabou e se amasse Zinara de verdade, saíria de cena e deixaria as coisas fluírem, mas não... Não aceita perder, questão de ego? Talvez... Porém ela ama a Zinara, porém, descobriu tarde demais.
A despedida seja ela qual for é sempre tão triste...
Cátia só se mete em confusão, até em protesto a mulher tem problema com as amantes, eu hein! Ela é uma pessoa tão inteligente, tem uma visão de mundo incrível, luta pelo bem da sociedade, mas em compesação...
Essas velhinhas são umas gracinhas, que fé inabalável.
Mais uma Ahmed! Essa Khadija é tão lindinha né?
"Assanhamentu!" Kkkkkkk...
“Hum... começou a lambição!” -- Leda pensou divertida -- "Não satisfeita em tarar a almofada agora é a vez do pobre urso!” -- achava graça... Kkkkkkkk...
"Agora só falta um cigarrinho na boca de Clarice e outro no fucinho do urso!” -- Leda pensou achando graça" Kkkkkkk... Frases de dona Leda, daria um livro.
Macasalaama!
Resposta do autor:
Olá Gabinha!!!
Ahmed foi outro que demorou a amadurecer. Por esta época do casório ainda não. E Jamila está em pleno processo. Cátia demora um pouco mais.
E enquanto Zinara e Clarice namoram à distância, ya Leda fica só curiando e fazendo troça da filha! kkkkkkk
Mas quem e zanga com ela?
Beijos!
Sol
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Sem cadastro
Em: 13/03/2018
Oie Sadikii!! Espero que os momentos dos seus dias estejam menos intensos e que você esteja se cuidando. Rezo todos os dias. Apenas n rezo qndo termino dormindo sem perceber..kkkk
Jamila e Zinara necessitavam dessa conversa , foi muito boa, principal pra Zinara. É exatamente o que pensava e continuo pensando .. a. Doutora Melanie Klein mandou bem, como sempre, na época ! ;).
Agora Jamila larga..desapega fia!!! kkkkk. Cátita tá chegando, falta pouco, Aliás, já se esbarraram duas vezes na cama..era pra ser!!
Jamila é tão fácil de entender...as atitudes, acho q por isso q no final n posso ficar chateada c ela ...se parece c uma pessoa ,né?! Hahahaha.
Acho engraçado o termo " sua bunda é vermelha", sei que é um grande insulto, mas vindo de outra cultura, tão diferente, n tem como não pensar assim. Outro significado, mas certamente quando aprenda o idioma sem precisar da tradução literal, possa entender. Conheci mais do Líbano e seus costumes no transcorrer dos 2 últimos anos e já posso compreende muitas atitudes e as frases são intensas e belas, um significado tão poético . Adoro o respeito que eles têm ao se comunicar com outro. As palavras que utilizam. Adoro o bom dia, mt bonito o significado literal.O pai nosso e ave Maria( tem uma parte diferente, é lindo e linda!). Tentarei orar com ele pra vc, passei pro papel e vou acender uma velinha como faço pra minha mae. Recito em português o dela, claro. RS.
Cátia não aprende, tem que ter MTa cara de pau e MT sofrimento pra querer tapar c tanta luxúria justamente pra n sofrer...mas td muda, sempre chega a pessoa ou um fato que nos provoca uma mudaça nossa visão ou derrubar "nossas "barreiras.(digo em relaçao a tudo...)
Chegou o momento de encontrar c Viegas! Achei MT forte qndo Zinara falou c o irmão ,chorei! N sei se escrevi algo sobre isso antes. No abc sim ou lesword. Digo por aqui. Relacionei com algo, que n foi igual,mas me fez lembrar algo. Uma parte me fez lembrar de algo, porém todo o momento me fez chorar tb por pensar que muitas pessoas podem sofrer assim!
É isso, n quero me prolongar!
Desculpa pela demora, sei que n responde ,mas seguro que estás ahí e te causa alegría , ojalá ! Isso que vale, fazer as pessoas felizes !! Não existe prazo maior!!
Te dejo un besote, mucha luz, cariño, amor y una sonrisa Lailesca! Cuídate mucho!
Ps: Vou demorar um pouco, n como vc hahahahaha. Hasta pronto, amiga querida! Que tengas unos hermosos meses!!
Resposta do autor:
Você me pedindo desculpas pela demora?? Eu que sou a demorada aqui!
Eu sabia que você andava estudando coisas do Oriente! Já entende até a parte subliminar da coisa...
Este Viegas é um ponto polêmico. Ele e os tratamentos que existem até hoje e muito me incomodam. Parece que os tarja preta estão cada vez mais "populares" ao invés da abordagem ter se direcionado para aquela medicina psiquiátrica mais humana, mais espiritual...
Será que você ainda lembra deste Tao?
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Solitudine Em: 14/06/2024 Autora da história
Olá querida!
Zinara e Clarice na lambição à distância e as duas maamas só fazendo troça! kkkk
Você verá tudo sobre como Viegas se encaixa nessa longa história! Continue aqui.
Beijos,
Sol