Transliteração do árabe para O Céu.
AL JANNA
Capítulo 14 – Pontos de Vista
--Mas, Clarice, você tem titica na cabeça ou o que? -- Magali ralhava com a amiga -- Como pôde ir com Cátia Magalhães pra Costa Azul e dar uma de arigó dessa maneira? Deus do céu, a essa altura ela deve achar que você é louca! E isso pra dizer o mínimo! -- bebeu um gole de café
--Ah, Magali, eu fiquei muito tensa! -- justificava-se -- Parecia até uma coisa, que tudo que mamãe me advertiu se confirmou ali, diante de mim! -- bebeu um gole de café também -- E Cátia tem mesmo um jeito tão cafajeste...
As amigas haviam acabado de almoçar.
--Mas, criatura, e daí? -- respondeu gesticulando -- Você não vai se casar com ela, é só pra curtir e desestressar um pouco! -- balançou a cabeça contrariada -- E o que sua mãe entende dessas coisas? Uma senhora idosa que teve um único homem a vida toda! É nítido que ela é ciumenta e por isso implica com a outra! -- bebeu mais um gole -- Eu não sei o que é pior: os conselhos que ela te dá ou você parar pra levar a sério!
--Mamãe tem visão das coisas, Magali! -- argumentou -- E tudo que ela falou tava lá, nítido na minha cara!
Revirou os olhos. -- Garota, você não queria ser algemada na cama? Dissesse não! Não queria apanhar de chicotinho? Propusesse outra coisa! -- rebateu -- Até um pato de borracha você me sacou não sei de onde! -- acabou achando graça
--Eu não saquei nada! -- protestou -- Cátia tem um pato, palavras dela! -- bebeu o último gole de café -- Mamãe me advertiu sobre esse bicho e eu fiquei apavorada!
--E esse pato faz o que, mulher? -- riu de novo -- Se fosse eu, tinha passado um final de semana delicioso com aquela gata gostosona e se ela viesse com o tal do pato, eu abraçava ele e fazia um quáquáquá!
--Eu, hein? -- acabou rindo -- Mas agora já era! -- levantou-se e pegou a bolsa -- Se Cátia desistir de mim depois desse fiasco, fazer o que?
--Pois é! -- levantou-se também -- E você perdeu uma boa chance de viver momentos deliciosos no paraíso! -- pegou a bolsa -- Ah, que fosse eu! -- desejou
--Não sou mulher de fazer sex* à revelia, Magali. -- seguiram andando -- Só consigo se for por amor.
--Humpf! -- fez um bico -- Fazer o que, né? -- pausou brevemente -- Se quer passar seus dias esperando por Zinara em seu amor platônico neo moderno...
--Não fale assim... -- fez uma cara triste -- Ontem eu soube que ela tá no CTI e isso acabou comigo. Creio que foi essa internação que me fez acordar tão agoniada na madrugada. -- concluiu -- Sei lá, acho que senti de alguma forma!
--Nossa! -- surpreendeu-se -- E o estado dela é grave, é? -- olhou para a outra
--O médico disse que inspira cuidados... -- suspirou
--Olha, amiga, eu te repito o que disse uma vez: desencanta dessa mulher, porque não dá! -- voltou a olhar para frente -- Quem sabe ela já tá no fim?
--Tudo depende do ponto de vista, Magali. -- rebateu -- Talvez esteja no começo... -- queria ter esperanças
***
Dias depois, Jamila estava reunida com seu cliente Eduardo Hamatsu.
--Eu consegui uma entrevista com uma pessoa muito influente da Capital Federal e vou através dela buscar acelerar as coisas pra que sua proteção judicial seja decretada o quanto antes. Viajo hoje à noite e volto na segunda, até porque tenho questões pessoais a resolver por lá. -- explicava -- Paralelamente, consegui entrar em contato com um repórter, que é correspondente internacional da BNN, e ele disse que vai adorar ouvir e divulgar a sua história. -- olhava para o homem -- A imprensa pode nos ajudar muito nesse sentido!
--Ótimo! -- exclamou empolgado -- E quando ele vai conversar comigo? Tô disponível em qualquer dia que ele disser que pode!
--Dimitrius chega na cidade depois amanhã, então vamos marcar pra esse dia mesmo. Deixe que ligo pra ele e cuido de tudo. -- marcou na agenda -- Depois ligo pro senhor e transmito os detalhes.
--Nossa, eu ouvi falar bem do seu trabalho mas não imaginava que tivesse tantos contatos influentes! -- sorriu
--A gente vai fazendo nosso networking, né? -- sorriu -- Essa pessoa da Capital eu conheci quando defendi uma moça que denunciou um verdadeiro império do narcotráfico, e o repórter conheci por intermédio de uma grande amiga. -- pensava em Zinara -- Ele a ajudou numa contenda internacional... -- suspirou -- Mas vamos voltar ao nosso assunto principal! -- pegou os documentos relacionados ao caso dele -- Já conversamos sobre o aqüífero Tupi, agora fale-me o que preciso saber sobre o caso do aqüífero de Cima do Chão. -- pediu -- Qual foi a problemática relacionada a suas pesquisas sobre ele?
--Bem, -- pigarreou -- durante o tempo em que chefiei o grupo de trabalho que se dedicava ao Tupi, mantive uma colaboração muito proveitosa com um grupo que estudava o aqüífero de Cima do Chão. -- explicava -- Eu sabia da existência desse aqüífero, mas não imaginava que ele armazenasse 86,4 bilhões de metros cúbicos de água, quase o dobro do Tupi, representando o maior reservatório subterrâneo do planeta! -- afirmou enfático, fazendo Jamila arregalar os olhos -- Com seus 437,5 mil quilômetros quadrados e espessura média de 545 m, ele abrange os estados do Amassunu, Carimbó e Amapaba e, felizmente, não faz fronteira com países limítrofes.
--Ele é menor que o Tupi em extensão, mas é mais espesso. -- concluiu -- Por isso tem mais água...
--Exatamente! -- concordou -- E enquanto a maior parte do Tupi está debaixo de rocha, o aqüífero de Cima do Chão tá debaixo de solo arenoso, tornando nossa vida bem mais fácil! -- acrescentou -- Quando a chuva cai, penetra com facilidade no solo e a areia acaba funcionando como um filtro natural.
--E a água do aqüífero chega limpa pra gente beber! -- concluiu mais uma vez
--Que tesouro, não? -- balançou a cabeça pensativo -- Daria pra abastecer a população mundial por 300 ou 400 anos, se a água fosse usada com racionalidade.
--Minha nossa! -- novamente se surpreendeu
--E eu, que já vinha travando a luta que lhe relatei, acabei ficando a par de outros fatos muito graves pra esse país. -- falava com seriedade -- O que nós temos no mundo de hoje é uma verdadeira financeirização da natureza que afeta fortemente nossa Terra de Santa Cruz! -- debruçou-se sobre a mesa -- O tal do mercado de carbono tem um discurso muito bonito por trás dele, mas não me convence! A doutora sabe que o crédito de carbono é uma espécie de certificado que é emitido quando se diminui a emissão de gases de efeito estufa. Pois bem, -- continuava suas explicações -- as empresas que reduzem a emissão de gases poluentes recebem esses créditos e podem vendê-los nos mercados financeiros nacionais e internacionais. Os créditos de carbono são commodities e geralmente são comprados por empresas de países que não conseguem ou não querem -- enfatizou -- reduzir a emissão dos gases poluentes, permitindo que eles mantenham ou aumentem sua emissão! -- fez uma expressão de desagrado -- Ou seja, eu poluo menos aqui pra você continuar poluindo mais no seu país; só que, em compensação, ganho um dinheiro! E ainda dizem que tá certo porque a natureza não tem fronteiras! Que coisa, não? -- cruzou os braços contrariado
--E o mercado de carbono ainda vive sob uma insegurança jurídica muito grande nesse país. -- complementou -- Não existe um marco regulatório bem definido e nós, advogados, temos que usar do empreendedorismo jurídico pra chegar em alguma solução segura quando atuamos em questões ligadas à reduções certificadas de emissão. -- pausou brevemente -- Mas qual a relação entre o mercado de carbono e o aqüífero de Cima do Chão? -- não entendia
--As queimadas e os desmatamentos respondem por 75% das emissões de gás carbônico em nosso país, enquanto que a utilização de combustíveis fósseis representa apenas 25% do total. Estamos entre os seis maiores emissores mundiais de gases de efeito estufa por causa disso. -- novamente debruçou-se sobre a mesa -- A doutora sabia que essa conversa toda de créditos de carbono serve de pano de fundo pra que comunidades indígenas assinem contratos com empresas estrangeiras pra exploração, compra e venda desses créditos a partir da “preservação” -- fez aspas com os dedos -- da floresta? -- olhava para ela -- E adivinha quais as áreas que os gringos querem preservar? Justamente aquelas sobre o aqüífero!
--Mas esses contratos internacionais não têm valor legal porque não existe regulamentação aqui! -- revoltou-se -- Todo crédito que fosse colocado à venda no mercado internacional nessas circunstâncias não teria a menor validade! -- argumentou
--Eu sei! -- balançou a cabeça -- E seus colegas de profissão também sabem! Tanto que quando denunciamos o que tava acontecendo, a Agência dos Advogados Gerais do País analisou todos os contratos e os denunciou na esfera judicial! -- olhava nos olhos dela – Sob o meu ponto de vista essas empresas não tão nem aí pra crédito de carbono! Elas querem é a exploração da terra e do que tem debaixo dela! -- esclareceu -- Pra senhora ter uma noção, assinou-se um acordo entre uma empresa de Eireann e uma prefeitura municipal do estado de Amassunu, que dava créditos de uma área de 135 mil hectares, cerca de um terço do município! -- esfregou as mãos nas pernas -- O detalhe é que o tal acordo foi intermediado por uma ONG!
--ONGs! -- fez um bico -- É de se contar a dedo as que são sérias! A maioria das que conheço não passam de máscaras bonitinhas pra esconder interesses escusos!
--Essa mesma empresa tem também um acordo em que lhe dá o direito de negociar por 30 anos os créditos de carbono obtidos na preservação de uma área de 2,5 milhões de hectares! -- gesticulava -- Com acesso irrestrito ao território e a sua biodiversidade! Devo salientar que ela têm mais quinze contratos do tipo!
--É muita coisa absurda que se vê aqui! E uma empresa de Eireann, um país tão sem expressão! -- afirmou com desgosto -- Sabendo disso, não me admira que quando o príncipe Barnes veio aqui em 2009 ele foi justamente pra região que se encontra no coração do aqüífero! -- balançou a cabeça contrariada
--Esses gringos não pregam ponto sem nó, doutora! Não esses!
--E por tudo isso é óbvio que ter desmascarado essas negociatas sujas deve ter aumentado consideravelmente sua lista de inimigos! -- cruzou os braços
--Especialmente porque algumas negociatas foram desfeitas!
--É, doutor Hamatsu... A briga é mesmo boa... -- afirmou pensativamente -- Eu diria que é até assustadora!
--Vou entender se a senhora quiser sair do caso... -- respondeu com certa tristeza -- Já me admirei bastante por ter desejado se envolver nisso...
--Sair do caso? -- riu brevemente -- Pois é agora que eu quero ficar e bater bem forte!
(Nota da autora: inspirado nas informação apresentadas em http://www.brasil.gov.br/sobre/meio-ambiente/climas/credito-carbono, http://www.geodireito.com/?p=3255, http://www.apublica.org/2012/03/terra-e-dos-indios-carbono-e-de quem
http://grupocartadebelem.wordpress.com/2013/07/29/agu-denuncia-venda-ilegal-de-creditos-de-carbono-em-area-indigena/)
***
Najla estava sentada sob a sombra de uma árvore com o diário de Zahirah no colo. Não sabia do que se passava com Zinara e imaginava que a falta de contato dela fosse uma necessidade de espaço, por isso não a procurava.
Após alguns segundos de contemplação silenciosa da natureza, respirou fundo e abriu o livro. Faltava pouco para concluir a leitura e ela sentia verdadeira necessidade disso.
--Vamos lá... -- disse para si mesma buscando coragem
“Yoom Kitaabii (Meu Livro dos Dias),
É com muita tristeza que escrevo que agora está tudo resolvido: partiremos para Al Maghrib daqui a seis dias. Você há de me perguntar o porque da tristeza e eu lhe direi que giddu Raja decidiu não ir conosco. Ele crê que sua presença poderia nos colocar em risco e se considera, além de tudo, um estorvo. Hoje todos nós fomos ter com ele, pois foi um pedido que nos fez. Sabíamos que era uma despedida e doeu muito. Não sei lhe dizer o quanto já chorei por causa disso. Até quando, Aba (Meu Pai), até quando?
Desde que soubemos da viagem e da decisão de gidii (meu avô), camm Raed anda tenso e muito nervoso. Além da tristeza, creio que ele não se sente preparado para assumir a liderança de nosso clã. camma Amina e Leila oram o terço todas as noites e as crianças parecem assustadas e perdidas. Zinara passou mal e acho até que ficou mais magra... É muito triste deixar nossos anciãos para trás, Kitaabii... Aliás, existe alguma alegria em nossas vidas?
Sinto saudades demais... De tantas coisas que nem saberia enumerar ao certo. Saudades de maama, de baba, de akhuuya (meu irmão) Adel, da vida que tínhamos juntos. Saudades de coisas como ter uma casa, água encanada, eletricidade, cama, chuveiro, vaso sanitário, roupas limpas... Saudades do silêncio, da tranquilidade, da segurança... não queria mais ouvir as explosões das bombas que me perturbam tanto. Não queria ver cadáveres por todos os lados como se isso fosse uma coisa normal. O que será que se passa na cabeça de Zinara, Youssef, Khaled, Jamal, Hassan e de tantas outras crianças que nasceram neste país em guerra? Elas nunca tiveram contato com estas coisas materiais que me fazem falta, Kitaabii. Sequer conhecem a cultura de Cedro, pois são filhos da guerra, do conflito, e que cultura a violência traz? São infâncias brutalizadas...
E, verdade das verdades, sinto tantas saudades de Farida que a dor consegue marcar meu corpo. Farida, Farida, wa rouh liwugudek ‘atchana... tewahashni ‘ayneek... a bal’ edounya ba’it fadya, ma’a ‘eni enaas rayha wa gaya... (Farida, Farida, minha alma está sedenta clamando por sua presença... Eu sinto tanta saudade dos seus olhos... o mundo me parece vazio mesmo que multidões venham e se vão...).
Não tenho mais forças para continuar este relato, Kitaabii. Minha tosse nunca me abandona e cuspo sangue quase todos os dias. Sou uma mulher de 28 anos mas meu corpo se assemelha a uma pequena máquina cujas peças vão falindo dia a dia, até que o conjunto não mais possa trabalhar... Estas serão minhas últimas linhas. Eu não esperava que fosse acontecer assim, mas esta foi minha vida e estes foram meus dias em dez tristes anos de harb ahliyya (guerra civil). Entrego minha alma nas mãos de Deus e que Ele me conduza para onde quiser.
Zinara continuará a escrever esta história e minha fé me diz que ela verá dias melhores... Sei que ela vai continuar, apesar de tudo . Sei que vai, porque é necessário e ela não se esquecerá disso!
“Secam as fontes e os rios, ardem as searas e a nossa casa e as árvores nuas amaldiçoam o céu, sem sabermos porquê. Morrem os jovens antes de se amarem e os poetas com os poemas inacabados e as crianças olhando espantadas para o céu, sem saberem porquê. Um vento noturno deixou insepultos ventres e seios e desejos de maternidade nunca realizados, e secou risos e cantares subindo para o céu, sem sabermos porquê. Andam as guerras pelo mundo: somente possuímos uma voz, uma voz e ESSA VOZ NÃO SE CALARÁ e nós sabemos porquê! "
(Nota da autora: entre parênteses, texto de Tomaz Kim, em Campo de Batalha. Acho que ele diz tudo!)
***
Era noite alta e Zinara lembrava-se do encontro com o avô. Estava triste e agoniada por um mau pressentimento. Sentia que Raja corria perigo.
Lembrava-se das palavras que o avô destinou a seu pai.
“--Raed, binii (meu filho), sabe que na minha ausência cabe a você zelar por este clã e guiá-lo da melhor maneira possível. -- falava com seriedade
--Aywah, ana a’arfa... (Sim, eu sei...) -- respondeu com pesar
--De agora em diante dobre os teus esforços e reflita muito! -- aconselhava -- Obedeça a Allah (Deus), tenha lealdade com sua companheira, dignidade no desempenho de tuas funções de líder, atitudes justas e nunca arbitrárias. Cuida de teus filhos e faze deles teus amigos. Um pai deve se impor pela autoridade moral, nunca pela violência. Sê um patriota verdadeiro e não te esqueças de que a força somente deve ser empregada ao serviço da Justiça. O povo desarmado merece teu respeito, não importa de que origem seja. -- olhava nos olhos do outro -- Nos momentos de loucura coletiva deves ser prudente, não atentando contra a vida de ninguém. Um homem não pode ser covarde e nem fanfarrão. A honra é para ele um imperativo e nunca deve ser mal compreendida.
(Nota da autora: palavras inspiradas em um trecho da carta do Desembargador Bento Moreira Lima, endereçada a seu filho, então cadete, Rui Moreira Lima)
--Entendo, baba. -- balançou a cabeça
--Dayem, dayem salimean! (Sempre, sempre você estará em boas mãos!) -- exclamou emocionado
--Eu queria lhe dizer tantas coisas, baba... -- uma lágrima sentida rolou-lhe pelo rosto
--Nada que um abraço não possa traduzir. -- abriu os braços e acolheu ao filho como a um menino”
“Nunca se viu baba daquele jeito...” -- a menina pensava -- "Parecia até que também tinha um coração...” -- estava surpresa -- "A falta de giddu Raja deixa todo o clã perdido...”
Sem conseguir aquietar sua alma, Zinara decidiu que iria visitar o avô. Sabia como entrar e sair do acampamento sem que percebessem e acreditava que se insistisse mais em seus argumentos, o ancião poderia mudar de idéia. Sua família dormia e ela saiu da tenda sem dificuldades. A luz prateada que iluminava o caminho parecia colaborar com seu plano ingênuo.
“Ainda bem que é noite de Cynthia cheia!” -- pensava enquanto seguia apressadamente
Após algum tempo, já conseguia avistar o esconderijo do avô. Não sabia porque, mas sentia algo diferente no ar.
“Junuud? (Soldados?)” -- questionava-se intrigada
Ao se aproximar da gruta, chamou pelo homem que veio imediatamente ao seu encontro.
--Zinara!! Eu já lhe proibi de fugir para me ver, por que não obedece? -- ralhou de cara feia -- Você volta para o acampamento agora mesmo! -- pegou a neta pelo braço -- AHHa!
--Leve Zinara de volta e fique no acampamento com usritina (nossa família), giddu? -- pediu com olhos súplices -- Vamos para Al Maghrib? Tacaalii? (Vem?) Não abandona... -- controlava-se para não chorar -- Não abandona...
O homem sentiu imensa pena da menina e entrou com ela em seu esconderijo. Ajoelhou-se diante da neta e respondeu olhando em seus olhos: -- Laou atawa’ik moumkin tikrahni... (Acredite, se eu concordasse com você, você poderia terminar me odiando...)
--Laa! (Não!) -- protestou -- Abadan! (Nunca!) -- segurou as mãos dele -- Zinara vê em seus olhos que giddu quer ficar com usritina! -- argumentava
--Argouk iba’aid mahma a’youni tragouk... (Por favor, fique longe, por mais que meus olhos implorem para você ficar...) -- derramou uma lágrima sentida
--Laa... -- derramou uma lágrima também
--Oh, habibi... -- acariciou o rosto dela -- eu não deveria dizer isso, porque o coração de um homem deve se dividir igualmente entre seus decendentes, mas... -- sorriu -- Você e Zahirah sempre foram minhas preferidas... As delícias de minha vida. -- suspirou e levantou-se -- Eu tinha esquecido de uma coisa. -- caminhou até seus poucos pertences -- Então foi bom que você tivesse fugido hoje para me ver, pois talvez não houvesse mais tempo. -- pegou uma carta e voltou para perto da menina -- Esta carta me foi mandada por bintii (minha filha) Najla -- estendeu para a neta que a recebeu -- e chegou em minhas mãos antes da guerra começar. -- pausou brevemente -- O endereço dela, o lugar em ela mora, está escrito no mesmo alfabeit que a Gália usa. -- olhava para a morena -- Se em Al Maghrib houver serviço de correio, como creio que haja, escreva para ela.
--Que é correio? -- perguntou intrigada quando um barulho chamou sua atenção -- Giddu, vamos embora! -- ficou tensa -- Junuud (soldados) estão aqui!
--Eu sabia que al ghaduuww (o inimigo) viria no meu rastro! Os idiotas até que demoraram a me encontrar! -- pegou sua arma -- Você foge por ali! -- indicou um buraco escavado na rocha -- É pequena e sei que consegue passar! -- ficou de guarda na entrada da gruta
--Zinara não quer ir! -- protestou
--Corra, Zinara! -- ordenou enérgico -- Você me prometeu que quando eu lhe mandasse correr, você correria! -- lembrava
Mais barulhos do lado de fora.
--Corra!!! -- gritou e começou a atirar -- Corra, Zinaraaaaaaa!!!!!!
A garota olhou para o avô pela última vez e se abaixou para passar pelo buraco. Rastejou por um túnel apertado de uns 10m de comprimento e saiu de lá com os joelhos e cotovelos ralados.
Corria sem olhar para trás, ouvindo os barulhos dos tiros e gritos indecifráveis. A voz de Raja repercutia em sua mente gritando “corra, Zinara!” e ela chorava, mal enxergando o caminho diante de si.
Sentia dor, muita dor, e se questionava se havia sido atingida por algum projétil. Fosse como fosse, sabia que uma parte de si havia morrido naquele dia, junto com Raja.
“Zinara corria com pressa, Kitaabii, tirando forças de não se sabe onde. Sentia o gosto salgado das lágrimas e uma dor que tomava a alma por inteiro. O som dos tiros, as vozes, os estrondos causavam uma confusão tremenda na mente e as pedras machucavam as solas dos pés como se fossem facas. Uma parte de Zinara queria escapar com vida, outra desejava que tudo se acabasse ali.
Por que? Diga, Kitaabii, por que? Zinara não entende porque pessoas matam pessoas...
Muita coisa se mistura na lembrança de Zinara. Muito se perdeu... De repente, não corria mais, não sentia nada... O que terá acontecido, Kitaabii? La afham... ( Não entende...)”
--AHAHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! -- no plano astral, a professora convulsionava em agonia -- AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!!!!!!!! -- gritava
--Gente, o que é isso? -- Jamila se assustou com o barulho dos monitores cardíacos -- O coração dela acelerou! Nossa, o que tá acontecendo? -- levantou-se da cadeira -- Socorro, socorro!! -- começou a gritar -- Enfermeira, socorro!!
--O que houve, senhora? -- a plantonista veio correndo
--O coração dela acelerou demais, faz alguma coisa, por favor! -- pediu aflita e chorosa
--Eu vou chamar os médicos, mas a senhora vai ter que sair! -- pegou o rádio
--Oh, baba! -- Najla ajoelhou-se no chão e encostou a testa no solo -- Perdoe-me, baba! Perdoe-me... -- chorava -- Eu não queria que fosse assim... eu não queria...
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!! -- a astrônoma continuava em agonia
Bombas explodem.
--AHAHAHAHAHAH!!!!!!!!!!!! -- e ela gritava
Tiros, berros, choro, tensão no ar.
--Eu não quero mais ver, gidda!! -- pedia em desespero -- Eu não quero!! -- chorava
Selima irradiava uma torrente de fluídos, a partir de seus chacras frontal e coronário, para acalmar sua neta cuja mente encontrava-se em completo desalinho.
***
--Mas isso é um absurdo! -- Leda reclamava no Hortifrutti -- O quilo do tomate custando dez reales e noventa e cinco? Ah, mas é muita pouca vergonha! -- gesticulava
--Mas não adianta reclamar... -- uma mulher respondeu desanimada -- Os preços sobem e sobem mesmo...
--A gente tem que protestar, minha filha! -- falava alto -- É somente com mobilização popular que a coisa muda! -- continuava gesticulando -- Eu fui pras ruas na época da ditadura! Eu sei fazer enxame!
--Calma, senhora! -- um funcionário do mercadinho se aproximou constrangido -- Foram as chuvas na região serrana que fizeram isso!
--Chuva nada, meu filho, isso é pouca vergonha da grossa! -- respondeu revoltada -- Simbora povo! Vamos protestar! -- convocava o pessoal
--Clarice? -- Cátia chamou ao se aproximar
--Você aqui? -- ficou surpresa -- Não sabia que freqüentava esse hortifrutti. -- pegou um frasco de shampoo -- Você nem mora nesse bairro... -- olhava para a outra
--Eu tô sempre buscando boas ofertas e melhores preços. -- respondeu sorridente -- Foi uma feliz coincidência!
A professora sentia um inesperado mal estar e atribuía isso ao constrangimento de terem se encontrado ali de repente. -- Ah, tá... -- respirou fundo -- Escuta, Cátia... -- passou a mão nos cabelos -- sobre meu comportamento na sua casa de veraneio, eu... Nossa, eu tô morrendo de vergonha e...
--Não se desculpe, por favor! -- interrompeu a outra gentilmente -- Eu sei que quando quero uma mulher sou um tanto insistente... -- aproximou-se mais -- Vamos passar uma borracha nesse assunto! -- sorriu sedutora -- Podemos reprogramar um outro final de semana em Costa Azul e deixar a coisa fluir de um modo... bem diferente...
--Então não ficou zangada e nem achando que sou doida? -- perguntou receosa ao se afastar -- "Ela vem pra cima de mim de um jeito!” -- pensou envergonhada
--Não... -- seu olhar se alternava entre os olhos e lábios da paleoceanógrafa -- Você só consegue me deixar mais interessada...
--Vamos botar a boca no trombone, minha gente! -- Leda incitava as pessoas -- Ou o preço do tomate cai ou vai ter quebra pau aqui dentro! -- estava de pé em cima de um banquinho -- Chega de sacanagem com o consumidor!
--É isso aí!! -- o povo apoiava
--Mamãe?! -- Clarice exclamou apavorada -- Ai, meu Deus! -- correu até ela
--Dona Leda? -- Cátia questionou-se surpreendida -- Gente, que velhinha é essa? -- seguiu a outra
--Gente, por favor! -- o gerente buscava acalmar as pessoas -- Não dá pra vender o tomate barato se o preço que chega pra nós já é alto!
--O problema é que vocês querem lucrar muito nas nossas costas, mas a gente não aceita isso não! -- Leda respondeu desafiadora -- Vambora, meu povo, vamos barbarizar!!!
--É!!! -- muitos apoiaram
--Peraí, pessoal! Vamos fazer assim: -- o gerente negociava -- eu faço o quilo por nove e cinqüenta!
--Tá caro!! -- Leda discordou
--Tá caro!! -- as pessoas apoiaram
Clarice conseguiu se aproximar da idosa. -- Mamãe, a senhora tem o que na cabeça? -- ralhou -- Desce desse banquinho! -- pediu preocupada -- Não tá vendo que pode cair?
--Cala a boca, menina, não tá vendo que chefio um movimento? O que vai cair é o preço desse tomate! -- voltou a olhar para as pessoas --Tá caro, tá caro, tá caro!!! -- cantava batendo palmas
--Tá caro, tá caro, tá caro!!! -- o povo cantava também
--Oito e cinqüenta! -- o gerente continuava negociando
--Tá caro, tá caro, tá caro!!! -- e tome do povo cantar
--Gente, vamos quebrar tudo! -- Leda incitava
--Vamos!!! -- alguns apoiaram
--Essa velhinha é doida! -- Cátia falou para si mesma achando graça
--Olha aqui, pessoal! -- o gerente levantou os braços -- Cinco reales o quilo pra acabar! -- propôs
As pessoas aceitaram e foram escolher seus tomates.
--Pronto, mamãe, agora me dá a mão e desce daí! -- Clarice insistiu
--Povo frouxo! -- desceu com dificuldade -- Eu tava planejando chegar a uma oferta de um real, mas eles se conformaram com cinco! -- reclamou
--Incitando os outros a fazer quebra pau, mamãe? Que coisa feia! -- continuava ralhando
--Coisa feia é trocar fralda de neném em mesa de restaurante! -- retrucou -- Com gente sem vergonha, minha filha, só uma boa pancaria resolve! Aprende comigo!
--A senhora tem personalidade e força! -- a geofísica se aproximou bajulando -- Conseguiu reverter a situação! -- sorriu -- Fiquei boba!
--Humpf! -- fez um bico -- Falando em gente sem vergonha... -- resmungou
--Eu vim fazer umas comprinhas por aqui e encontrei com sua filha sem querer... -- justificava-se -- Fiquei ainda mais surpresa de ver a senhora chefiando um movimento popular! Agora já vou até comprar tomate, coisa que nem tava nos meus planos! -- olhou para Clarice -- Não vai escolher também, não?
--Ela vai! -- Leda respondeu enfática -- Mas vai você na frente que eu tenho que ter um particular aqui com essa menina! -- Cátia obedeceu sem graça -- Clarice, abre o olho com essa mulher! -- aconselhou -- Essa tarada agora já deu até pra te seguir nos ambientes que você frequenta! Isso é coisa de psicopata!
--Que é isso, mamãe? -- achou graça -- Foi uma coincidência! Eu nunca disse a ela que a gente fazia compras aqui!
--Você não disse, mas ela andou investigando! -- olhou desconfiada na direção da geofísica -- Eu li todos os livros de Agata Histhie e essa tal de Cátia tem o perfil de tarada e psicopata típica! -- fez cara feia
--E desde quando a senhora entende de psicopatas? -- riu
--Ela tem o pato borracha! -- lembrava -- E aposto que carrega um punhal dentro da bolsa!
--Punhal... -- continuava rindo
--Brinca com coisa séria pra você ver! -- ralhou -- Agora vai lá e escolhe um quilo de tomate! -- ordenou -- E não se atreva a convidar aquela tal pra almoçar lá em casa!
--Dona Leda, a senhora é uma parada! -- Clarice foi para perto do balcão dos tomates
***
--Raed. -- Najla abordava o irmão -- Será que podíamos ter um dedinho de prosa?
--O qui ti incomoda, muié? Pareci inté qui andô chorandu! -- comentou desconfiado -- Uai? -- olhou para o diário nas mãos dela -- O qui ocê faz cum o yoom kitaab di Zahirah? -- ficou surpreso -- Zinara nunca qui si disgrudô dele!
--Ela me emprestou pra que eu encontrasse algumas respostas. -- sentou-se à mesa de frente para ele -- Falta pouco pra terminar de ler.
--Eu nunca li e nem quero! -- rebateu de pronto -- Num tenho pricisão di mi alembrá di nada!
--Há trechos aqui, -- colocou as mãos sobre o livro -- onde eu tive a nítida impressão de que você se arriscou pra cuidar de Zinara. -- olhava para ele -- Conheço você, Raed. Sei que tem coragem!
--Teve umas veiz qui... -- abaixou a cabeça -- é obrigação di um pai lutá pelos fio, num é?
--Ela não sabe disso.
--E muda o que? -- olhou para a irmã -- Zinara num gosta di mim, ela mi odeia... -- comentou magoado -- Já ouví ela mi dizê isso... Oiando nus meu zóio!
--Ela não te odeia, Raed! -- segurou as mãos dele -- Você sabe que errou muito com bintak (sua filha)... Ela apenas reagiu a sua atitude infeliz, mas isso pode mudar...
--Pra certas coisa num tem solução, não, muié! -- levantou-se rapidamente e foi até a janela -- Zinara e eu... -- balançou a cabeça negativamente -- num tem mais remédio...
--Se ela te odiasse, -- levantou-se e foi até ele -- não teria te doado um rim. -- abraçou-o pelos ombros -- Zinara tem um bom coração, exatamente como o pai dela. -- virou-o de frente para si -- Não acha que já era hora de deixá-la conhecer o pai que tem? -- sorriu – "Cuida de teus filhos e faze deles teus amigos.” -- repetiu as palavras de Raja
O homem teve um impacto ao ouvir aquilo. Lembrou-se do próprio pai. -- Eu num sô abuuina (nosso pai)... Eu num sôbe criá meus fio... Não os qui nascero im Cedro! -- seus olhos marejaram -- Eu num sôbe criá Zinara, Youssef e Khaled... Num sôbe... -- começou a chorar
--Você tá vivo, meu irmão! -- emocionou-se -- E Zinara também! Vocês podem recomeçar... -- segurou o rosto dele -- Será que não gostaria disso?
Raed não respondeu e secou os olhos. -- Tem qui fazê uns sirviço agora. -- afastou-se dela -- Dispois nóis cunversa... -- saiu da cozinha
--Eu sei que você vai pensar nisso, Raed... -- falou para si mesma -- Você vai... -- balançou a cabeça pensativa -- Ainda precisa mudar seus pontos de vista em uma série de coisas...
***
Jamila buscava informações sobre o estado de sua ex namorada mas não encontrava quem lhe desse atenção ou respostas seguras. Revoltada com o que se passava, invadiu a sala dos médicos.
--Mas o que é isso aqui? -- um deles perguntou indignado
--Sinto muito, mas eu gostaria de falar com o médico que socorreu Zinara Raed hoje! -- pediu altiva -- Exijo que o Código de Ética Médica seja integralmente cumprido!
--Mas o que significa isso? -- uma médica perguntou de cara feia
--Eu sou o médico que socorreu essa paciente. -- o homem ouviu a conversa e se aproximou -- O que a faz acreditar que o Código não tá sendo cumprido? -- perguntou desafiador
--O que aconteceu com Zinara? Como está? Por que não posso entrar pra vê-la? -- olhava para o homem -- Não encontro quem me dê um mínimo de esclarecimentos! -- reclamou -- ISSO é não cumprir com o Código de Ética Médica, pois o dever de informar do médico simplesmente não está acontecendo! -- argumentou
Ficou desconfiado com Jamila. -- A paciente se estabilizou mas a senhora ainda não pode entrar pra vê-la. -- explicava superficialmente -- É necessário mais alguma observação e tratamento específico. -- aproximou-se mais -- E a senhora queira se retirar, por gentileza. -- pediu
Não se importou com o pedido. -- Que tratamento específico? -- insistiu
--Dependerá da evolução da paciente, senhora. -- respondeu de má vontade -- Agora, por favor...
--Vocês não sabem o que aconteceu, não é? -- perguntou diretamente -- Eu quero entender o está acontecendo e o que vocês pretendem fazer com ela! -- afirmou enfaticamente -- Não sairei daqui enquanto não souber. E se pensa em chamar a segurança pra mim, pode fazer isso! -- desafiou -- Sou advogada e sei muito bem como agir em circunstâncias assim!
O médico mudou um pouco de postura. Os outros saíram da sala. -- A paciente tem um histórico de complicações cardíacas e...
--Zinara nunca teve complicações cardíacas! -- interrompeu-o sem rispidez -- Não sei de onde veio esta informação mas ela não procede.
O médico deu uma risada rápida e voltou a falar: -- Senhora, se me deixar falar posso lhe responder como deseja. -- foi irônico
--Doutor... -- olhou para o bolso do jaleco dele -- William, -- voltou a olhar para o médico -- ambos sabemos que o senhor está me respondendo sem se importar em buscar as informações corretas sobre Zinara. -- afirmou convicta -- O senhor tem vários outros pacientes e não pode ter os dados de todos eles de cor. Onde está o prontuário dela? Será que podemos discutir com base em evidências concretas e informações confiáveis? Sei que o senhor tem competência de sobra pra me esclarecer quanto ao que tá acontecendo com Zinara e ao que pretendem fazer com ela. -- falava com propriedade
--Eu não posso lhe mostrar o prontuário dela! -- argumentou
--O artigo 70 do Código de Ética Médica garante o acesso irrestrito do paciente a seu prontuário. -- rebateu -- É considerado antiético por parte do médico negar ao paciente acesso a algo que é seu! -- cruzou os braços -- Uma vez que ela não pode exercer sua autonomia nesse momento, e eu sou a representante legal, tenho direito de ver esse prontuário sim! -- o homem ficou sem resposta -- E, complementando, o artigo 59 do referido Código estabelece que, antes de decidir livremente sobre qualquer prática médica, o médico deve informar de maneira adequada, simples e acessível o que será realizado, os riscos aos quais o paciente será exposto, quais os resultados que vêm sendo obtidos em outros pacientes com respeito à mesma doença, dentre outras informações. A menos é claro, que seja uma emergência, mas o senhor já me disse que ela estabilizou, não foi? -- esperava uma nova atitude
--É... -- passou a mão na cabeça -- vamos consultar o prontuário e eu lhe esclareço sobre tudo que puder. -- estava sem graça
(Nota da autora: http://jus.com.br/artigos/12858/a-relacao-medico-paciente-e-o-dever-de-informar )
***
Clarice e Leda estavam na fila do caixa do hortifrutti.
--Clarice, por favor! -- Cátia aproximava-se com sua cestinha -- Querida!
--Mas essa mulher é uma peste, Ave Maria! -- Leda resmungou -- Sai, psico! -- fez cara feia
--Mamãe! -- a filha ralhou discretamente
--Querida, me deixa passar nossas compras todas juntas? -- pediu sorridente ao parar do lado delas -- É pra caixa ter troco pra mim. -- mostrou uma nota de cem reales -- Comprei só essas coisinhas aqui e esqueci o cartão em casa! Dá pra acreditar? -- olhava para as duas
--Não mesmo! -- Leda resmungou
--Tudo bem. -- concordou -- Eu ia pagar em dinheiro também, então... -- entregou duas notas de vinte reales a outra -- Nossa conta vai dar praticamente isso. -- sorriu
--Eu tô de carro aí! -- ofereceu -- Posso dar uma carona...
--Humpf! -- a idosa fez um bico
--É muito perto de casa, Cátia. Não precisa se incomodar. -- agradeceu
--Seria um prazer... -- respondeu meio sem graça
As duas professoras ainda conversaram um pouco na fila até o momento em que colocaram as compras sobre o balcão do caixa.
--Senhora, teria setenta e cinco centavos? -- a atendente pediu
--Eu não tenho! -- Clarice respondeu abrindo a carteirinha
--Nem eu! -- Leda também falou
--Eu tenho, não se preocupem! -- Cátia abriu a bolsa -- Só te peço um pouquinho de paciência! -- piscou para a moça do caixa -- É que tem de tudo aqui! -- começou a esvaziar a bolsa
--Nossa, quanta coisa! -- a paleoceanógrafa achou graça
--Quer ver como daqui a pouco ela vai sacar o pato de borracha? Isso se não aparecer o punhal! -- a idosa cochichou para a filha, que achou graça -- Eu vou é esperar lá fora! -- saiu impaciente
Segundos antes de encontrar as moedas, a geofísica saca da bolsa um curioso objeto e o coloca sobre o balcão.
“Meu Deus!” -- Clarice arregalou os olhos -- Criatura, o que você faz com um punhal na bolsa? -- perguntou apavorada
--Que punhal, mulher? -- riu ao segurar o objeto mais uma vez -- Isso é pra arrancar grampos de folhas! -- esclareceu
“E pra que tinha que comprar justo nesse formato?” -- pensou desconfiada -- Olha, Cátia, eu tenho que me arrumar pra ir pro centro espírita e... -- começou a ensacar suas compras com pressa -- tenho que ir!
--Que pressa é essa, menina, que foi que te deu? -- não entendia
--Nada! -- segurou suas bolsas plásticas -- Tchau! -- saiu quase correndo
--Mas que diabo que essa mulher vive fugindo de mim! -- resmungou chateada -- Até no mercadinho?
***
--Já se sente melhor, habibi? -- Selima perguntou atenciosa
--Acho que sim. -- levantou-se com dificuldade -- Mas eu não queria mais ver... -- olhava para a avó
--Você precisa, habibi. -- Selima acariciava a cabeça dela -- Você precisa... -- olhou para a neta com carinho -- Eu vou ajudá-la a se recompor, mas você deve ser forte. O remédio para nos curar pode ser amargo em algumas ocasiões... -- sorriu -- Al bab al-a’ali! (Entre pela porta da frente!) -- a anciã insistiu para que tivesse coragem -- Ala hasb wedad albik... (Tudo depende do seu coração...)
--Quando que você vai melhorar, hein, hayati? -- Jamila perguntava para a ex namorada inconsciente -- Quando que vai sair daqui desse CTI? -- acariciava o rosto dela -- Volta pra mim? -- olhava-a com carinho -- Prometo que serei sua mulher do jeito como você sempre quis... -- beijou-lhe a testa -- Volta? MiHtajlik ya wujoodi... (Eu preciso de você aqui...) -- sussurrou no ouvido dela
--Ela mexe com você, não é? -- Selima perguntou ao notar a perda de concentração da neta
--Desculpe, gidda... -- abaixou a cabeça envergonhada
--Não se envergonhe! -- respondeu delicadamente -- Amor não é coisa para se envergonhar. -- tocou o rosto dela -- Mas você precisa se concentrar. Temos um trabalho sério a fazer! -- advertiu
--Aywah! (Sim!) -- concordou e fechou os olhos novamente
Mais uma vez o espaço-tempo foi transcendido na mente da astrônoma.
Zahirah e Zinara arrumavam os carpetes dentro da tenda para se deitarem.
--Amanhã é o dia da viagem, habibi... -- olhou carinhosamente para a menina -- Seremos levadas para o porto e pegaremos a embarcação para Al Maghrib. -- explicava -- Você verá al-baHr (o mar)... -- tentava mudar o ânimo da menina -- E nunca mais ouvirá bombas explodirem!
--Bombas explodem dentro de Zinara... -- respondeu com tristeza -- Infijaaraat... infijaraat... (explosões, explosões...) -- terminou de ajeitar os carpetes
--Oh, minha linda! -- fez a menina se sentar e ajoelhou-se de frente para ela -- Todos sofremos pelo que aconteceu, eu sei, mas giddu não gostaria de ver você assim! -- segurou o rosto dela com carinho -- Yatamanna, minha esperança, você tem sido a luz que me manteve firme por todos estes anos, habibi! Min fadlik (Por favor), não se apague! -- pediu emocionada -- Não se apague!
--Zinara sofre... -- derramou uma lágrima
--Eu sei... -- abraçou-a com força -- Mas não deixe o sofrimento matar sua alma, habibi... -- beijou a cabeça da garota -- Behebbik ia, Zinara! (Eu te amo, Zinara!) -- olhava nos olhos dela
--Behebbik ia, Zahirah! -- abraçou-a novamente -- Não abandona Zinara, ar-rabiic (primavera) ! -- pediu súplice -- Não abandona! Não vai embora! Prometa!
--Aseebik? Laa! (Deixar você? Não!) Eu nunca vou te abandonar! -- respondeu com verdade -- Mas não sou eu quem determina minha hora de ir. -- olhou para a menina -- Ninguém pode determinar isso, apenas Allah! -- explicou -- Se eu lhe prometer que nunca partirei, akhasmik (eu a decepcionarei)...
--Pede a Ele! Diz para Ele que você não quer deixar Zinara! -- falou com toda inocência de criança -- Diz!
--Eu peço, habibi... -- respondeu com pena -- Mas somente Ele sabe o tempo de cada pessoa. -- pausou brevemente e sorriu -- Não vamos pensar em coisas tristes. Amanhã é nossa viagem, trabalhamos muito, então devemos descansar. -- tentava mudar o foco da conversa -- Você sempre dorme muito pouco e desde que giddu se foi não mais fechou os olhos para repousar. -- acariciava o rosto dela -- Está tarde, vamos tentar dormir? -- pediu -- Dou meu colo para você deitar. -- ofereceu
--Zinara não tem sono... -- levantou-se e acendeu a vela sobre a pedra de cheiro -- Não tem sono...
--Mas vamos apenas nos deitar? -- insistiu -- Nesse caso, se o sono vier... -- deitou-se ajeitando as cobertas -- Tacaalii? (Vem?) -- chamou e tossiu
A garota voltou para junto da ruiva e aceitou o acolhimento oferecido pela pessoa que mais amava em sua vida. Zahirah ajeitou a criança em seu colo e pôs uma das mãos sobre a cabeça dela, pedindo a Deus que lhe desse forças para suportar tudo que ainda deveria acontecer.
“Aba (Meu Pai), por favor, humildemente Lhe imploro: ajuda Yatamanna, que é apenas uma criança.” -- orava mentalmente -- "Giddu já se foi e sei que estou em meus últimos dias...” -- controlava-se para não chorar -- "Temo que seja tristeza demais para um coração tão jovem, mas confio em Ti, oh, Aba, e imploro Tua piedade para essa menina que ainda não conheceu a paz...” -- suspirou -- "Salva Yatamanna, eu imploro!” -- abraçou a morena com mais força -- "Não permita que ela desista de viver! Não permita que ela esqueça de Ti!”
Zinara adormeceu rapidamente e dormiu a noite toda nos braços de sua amada prima.
***
--Aayaayaayaayaayaayaayaayaay!
O cantarolar matinal do sacerdote do acampamento anunciava a alvorada. Zinara abriu os olhos sonolenta e despertou para o frio que sentia.
--Zahirah? -- chamou pela outra que não respondeu -- Zahirah? -- olhou para a ruiva que parecia dormir em paz -- Acorda... -- pôs a mão no rosto dela e sentiu a pele gelada -- Zahirah? -- seu coração acelerou -- Doktuur!!! -- gritou -- Doktuur! -- levantou-se e correu para fora da tenda -- Doktuur!!! -- estava desesperada -- AHAHAHAHAH!!!!
--Que se passe-t-il? (O que está acontecendo?) -- algumas pessoas vinham para junto da menina
--Zinara? -- Amina levantou-se apressada -- Raed! -- chamou pelo marido -- Será que Zahirah...? -- seus olhos marejaram
--Oh, laa, Aba! (Oh, não, Meu Pai!) -- levantou-se com o coração acelerado -- Que não tenha sido! -- correu para fora da tenda
--Ya aini? (Meus olhos?) -- Youssef despertou preocupado
--Zinara!!! -- Khaled se levantou de um pulo e correu para fora também -- Zinara!!
--Leva eu, maama! -- Youssef pediu -- Quero ficar perto de Ya aini! -- sentia medo -- Leva eu! -- levantou-se
--O que está acontecendo? -- Leila e os filhos apareceram na entrada da tenda -- O que houve?
--Doktuur!!! -- Zinara gritava -- Remaner ma Zahirah! (Traga minha Zahirah de volta!) -- pedia chorando -- Remaner ma Zahirah! Remaner!!!
“Era como se Zinara tivesse ficado cega, Kitaabii. Cega como Youssef... Não podia ver e nem ouvir. Zinara gritava e chorava e sabia que Zahirah não estava mais lá. Allah me traiu, Kitaabii. Ele tirou de mim meus maiores tesouros...”
--Ar-rabiic!!!!!!! -- gritava como louca -- Não se vá, ar-rabiic!!!! Mihtagalik!!! (Eu preciso de você!!)! -- chorava copiosamente -- Ar-rabiic!!!! Ya hidhn rouhi... (O colo em que minha alma repousa...) -- caiu de joelhos no chão -- Ar-rabiic!!!!
--Zinara! Zinara! -- pessoas a abordavam, mas a garota não percebia nada mais
--Ar-rabiic!!!!!!! -- deitou-se no chão -- Ar-rabiic!!!!!!! -- olhou para o céu -- Ederf ghchamni o laHni, Zinara ma bSa li amal… (Estas pessoas são minha alegria e se tirá-las de mim, Zinara não terá qualquer esperança...)
--AHAHAHAHAHAH!!!!!! -- novamente Zinara se desequilibrava no plano astral
--Mas que merd*, ela tá descompensando de novo! -- Jamila se desesperou -- Socorro!! -- gritou -- Socorro!!! -- correu em busca de ajuda
--Concentre-se, Zinara! -- Selima insistia -- Isso está no passado!
--Ai, mamãe, eu tô sentindo uma coisa tão ruim! -- Clarice olhava para a idosa -- Uma angústia, uma coisa ruim no peito... -- fez uma cara feia -- Desde que estávamos no hortifrutti essa sensação me incomoda!
--Claro! Você sentia que aquela psicopata com doutorado no exterior ia aparecer e deu no que deu! Ficou aí toda bichada!
--Que bichada, mamãe? -- acabou achando graça -- Não tem nada a ver com Cátia! -- passou a mão nos cabelos -- Desconfio que alguma coisa tá acontecendo com Zinara!
--Ih, meu Deus, será que já mataram a coitada? -- perguntou intrigada -- Porque hoje em dia não é a doença que mata a pessoa, né, minha filha? São os hospitais! -- afirmou enfática -- Daqui uns dias os vírus e bactérias tão passando no INSS pra se aposentar, porque não vão ter mais o que fazer!
--Eu vou pra Capital e vai ser hoje! -- decidiu -- Vou me arrumar e ir pro aeroporto agora mesmo! -- caminhou resoluta para seu quarto
--Que é isso, menina, você embirutou de vez? -- Leda seguia a filha -- Você vai hoje, um dia de sábado, viajar pra outra cidade pra visitar uma mulher que não é nada sua? E se não te deixarem entrar?
--Ah, eu dou meu jeito! -- abriu o guarda roupas -- Mas sem notícias não vou ficar!
--E o seu trabalho, minha filha? -- continuava argumentando
--Volto amanhã ou na segunda pela manhã. Mas isso não é um problema sem solução. -- separou a roupa -- Não se preocupe comigo! -- procurava seus sapatos -- Quanto a senhora, ligo pra Cecília vir passar a noite aqui.
--Deixe sua irmã fora disso porque posso ficar sozinha. Além dos mais temos bons vizinhos, não sou eu o problema!
--Mamãe! -- ficou de frente para Leda -- Por favor, eu PRECISO fazer isso! -- olhava nos olhos dela
--Passional como o pai... -- balançou a cabeça e suspirou -- Vá, minha filha... -- cedeu -- Seu coração já não tá aqui, ele viajou primeiro pra Capital...
--Eu sabia que a senhora ia entender, minha fofinha! -- beijou a cabeça da idosa
--Deixe de chamego e cuide da vida, viu? -- deu um tapa no braço da outra, que lhe sorriu
***
O barco seguia lentamente se afastando da costa e Zinara se despedia de Cedro com o olhar mais triste que um dia já tivera. Sentia-se como quem deixa para trás os tesouros mais preciosos de uma vida.
--Ar-rabiic... -- sussurrava -- Ar-rabiic...
Sentia-se extremamente solitária e desamparada. Sabia que seu pai não a amava e achava que sua mãe não tinha interesse em passar muito tempo consigo. Leila já tinha seus próprios filhos e certamente não desejava uma menina. Youssef e Khaled eram seus irmãos e amigos, mas igualmente crianças. No entanto, tinham a vantagem de ter os pais mais presentes para eles. Quem Zinara tinha para lhe cuidar? Ela se perguntava. Sem Raja e Zahirah, a morena via-se desprovida de quaisquer bases e amparo emocional.
De repente percebeu que uma música estava tocando e a voz do cantor parecia ecoar dentro de sua mente.
“Y avait plus de soleil sur la ville…”
(Não há mais nascer do sol na cidade...)
Uma lágrima sofrida escorria de seus olhos avermelhados.
“Et le vent nous glaçait le dos…”
(E um vento frio congela suas costas...)
Pensava em seus parentes mortos e na pequena quantidade de pessoas a que viu sua família reduzida.
“Et tout le monde avait compris…”
(E todo mundo entendeu…)
O balanço da embarcação a desequilibrava um pouco. A viagem era desconfortável e as condições de higiene quase nenhumas, porém, em toda sua vida havia sido assim.
“Qu’c’était la fin des haricots...”
(Que é o limite...)
O vento expulsava fios de seus cabelos para fora do lenço. Detestava usá-lo; parecia-lhe outra espécie de prisão.
“On s’enfermait comme des débiles, chacun chez soi c’est plus facile…”
(As pessoas estão em casa como inválidas, todo mundo em casa, era mais fácil...)
Olhou para céu mentalmente pedindo por respostas.
“Pour soigner son manque de chaud…”
(Morrer sem calor…)
--Por que, Aba? -- sussurrava -- Por que?
“Yalil Yalil nar el kalam,
Yalil Yalil nessi el iyam,
Yalil Yalil tar el zaman,
Yalil Yalil bei el insan...”
(Oh, noite, oh, noite, o fogo das palavras,
Oh, noite, oh, noite, eu esqueci os dias,
Oh, noite, oh, noite, o tempo voou,
Oh, noite, oh, noite, com outras pessoas...)
Novamente olhou para o horizonte e o porto de Cedro lhe parecia uma miniatura.
“On n’avait pás l’esprit tranquille…”
(Ninguém tem paz de espírito…)
Olhou para os outros que viajavam naquela embarcação precária e pôde contar inúmeras famílias.
“Les clochards crevaient dans la nuit…”
(Os desabrigados morrem na noite…)
Youssef e Khaled dormiam encolhidos sobre sacos de farelo. Amina, Raed e Leila estavam sentados lado a lado. Hassan e Jamal aninhavam-se no colo da mãe como podiam.
“Si vos chiens l’hiver veulent sortir, c’est pás vraiment pour vous faire chier...”
(Se os seus cachorros gostam de sair no inverno, não é realmente para serem mandados embora...)
“Isso é vida?” -- questionava-se -- "Por que não morri também? Por que Aba?”
“Mais pour vous montrer dans leus style, votre manque d’humanité...”
(Mas para mostrar a você do jeito deles, sua própria falta de humanidade...)
"Por que tantos se foram e eu continuo aqui?"
“Yalil Yalil nar el kalam...”
(Oh, noite, oh, noite, o fogo das palavras...)
“Será que em Al Maghrib será diferente?” -- não conseguia acreditar
“Yalil Yalil nessi el iyam...”
(Oh, noite, oh, noite, eu esqueci os dias...)
“Leve-me embora com você, ar-rabiic...” -- derramou outra lágrima
“Yalil Yalil tar el zaman...”
(Oh, noite, oh, noite, o tempo voou...)
“Sem primavera, não existem flores...” -- passou a mão sobre os olhos
“Yalil Yalil bei el insan...”
(Oh, noite, oh, noite, com outras pessoas...)
Mickey 3d – Yalil [a]
“No meu coração, tudo se fez deserto…” -- deu um suspiro profundo e fechou os olhos -- "Ya Sheen theek izziwaya, ar-rabiic, men gheer talghet jibeenik?” (O que será de mim, primavera, sem o presente de seu rosto?)
***
Clarice acabava de chegar na Capital. Domingo despontava em suas primeiras horas.
“Acho que fiquei louca!” -- pensava ao sair do saguão de desembarque -- "Encarei uma viagem em cima da hora, que ficou cara, tô desesperada pra ver uma pessoa que não é nada minha e eu só conheço via internet...” -- balançava a cabeça -- "Enquanto isso morro de medo de Cátia, que é uma pessoa que eu conheço ao vivo e à cores, e fugir dela já virou um vício na minha vida... Essas atitudes são coisa de gente louca...” -- concluía
Jamila andava pelos corredores do hospital totalmente insone. Estava nervosa e preocupada com a ex namorada. Em um dado momento, avistou a imagem da Divina Mãe.
--Ai, olha quem tá lá! -- olhou para a santa -- Zinara é devota dEla... -- afirmou pensativa -- Mas eu não acredito em nada disso, nem sou chegada a reza! -- discutia consigo mesma -- Só que eu também não confio em médico... -- cruzou os braços -- É uma droga, viu?
“Chego no hotel, durmo rapidinho, ligo pro doutor Rodrigo e visito Zinara na primeira hora!” -- Clarice planejava mentalmente -- "Ai, gente, como será esse encontro, hein?” -- coçou a cabeça -- "Mas não vai ter encontro, né, a mulher tá inconsciente!” -- lembrou-se do detalhe -- "Será que eu vou conseguir dormir?”
--Ai, mas eu não preciso acreditar, né? -- Jamila continuava em seu drama -- Se hayati acredita já vale de alguma coisa... -- aproximou-se receosa -- É... com licença. -- falava com a imagem -- Eu não conheço bem o protocolo mas acredito que Vossa Excelência interceda diretamente junto ao Supremo Tribunal Celestial, então... -- ajeitou-se toda e fechou os olhos com as mãos postas -- Meu nome é Jamila Queiroz Haddad e venho por meio desta pedir para que Vossa Excelência se digne a conceder a melhora de minha cliente Zinara Raed, que é devota da senhora, Meretíssima, e que se encontra em condições periclitantes neste hospital. Minha cliente é uma mulher honesta, maravilhosa, sincera, de bom coração que eu só soube dar valor depois que perdi. -- começou a chorar -- Ai, Meretíssima, por favor, se Vossa Excelência conceder a ela uma melhora não significa que estejamos criando jurisprudência para todo e qualquer caso similar... -- abriu os olhos novamente -- Por favor, eu não estaria recorrendo ao Supremo se isso não fosse necessário... -- não sabia o que dizer -- Nestes termos peço deferimento! -- benzeu-se desajeitada
***
“Yoom Kitaabii,
Zinara se despede de você porque ar-rabiic terminou. Não quer mais escrever, perdoe, não quer mais... Walah ya lli ts2alni... la taleb lmoHal… (E se você me pedir o contrário... não deseje coisas impossíveis...)
Kissti wadHa fi jbini … (Essa história está escrita na minha testa...) Zinara é um kitaab (livro) por si só.
Adeus, Kitaabii…
Zinara mujahida tatlub an tarta' al-i'tiqad (bi Allah)... (Zinara está pronta para deixar de acreditar (em Deus))...”
Najla encerrava sua leitura com lágrimas nos olhos.
--Chorandu, muié? -- Amina perguntou desconfiada -- O qui ti deu? -- cruzou os braços preocupada -- Acordô mais cedu qui todo mundo módi chorá sozinha?
--Não é isso... -- secou os olhos com as mãos -- É que terminei a leitura mais difícil da minha vida. -- levantou-se da cadeira -- Mas já é hora de começarmos a labuta nossa de cada dia, né? -- deu um sorriso triste
--É o Yoom Kitaab, né? -- olhou para o livro -- Mi espanta Zinara tê dexadu ele cuntigu. Ela tem um ciúmi desse Kitaab... -- foi até a geladeira
--Eu precisava saber de tudo que vocês passaram em Cedro... Precisava saber de baba... -- abriu a dispensa e foi pegando a louça -- Ela entendeu isso.
--Mas num quero sabê di prosa sobri essis assuntu, pur favô! -- pediu -- Eu num tenhu purque mi alembrá, muitu menos Raed. -- acendeu o fogo para ferver o leite
--Fique tranqüila, não vou fazer vocês reviverem nada daquilo. -- terminou de arrumar a mesa e olhou para a cunhada -- Só queria saber de uma única coisa, se é que você me responderia... -- Amina olhou para ela -- Quando foi que Zinara voltou a acreditar em Deus com a força que acredita hoje? -- estava curiosa -- Sabe o que aconteceu pra mexer com ela dessa forma? Ela terminou esse diário totalmente deprimida e descrente! -- pôs a mão sobre o livro
--Sei. -- balançou a cabeça -- Foi quandu ocê respundeu a carta dela dizendu qui ia tirá nóis de Al Maghrib módi trazê pra cá. -- voltou ao trabalho
O coração de Najla acelerou de alegria e ela se sentiu feliz pela única boa ação que considera ter realizado no passado.
***
--Ela tava sob controle mas alguma coisa aconteceu, -- olhou para Clarice -- e sinceramente ainda não sabemos o que foi, -- voltou a olhar para frente -- que o quadro se alterou e ficou ainda mais delicado. -- Rodrigo explicava -- A doutora Zinara não está nada bem agora! -- caminhavam pelo corredor
--Meu Deus! -- exclamou preocupada
--É aqui. -- o médico indicou ao parar -- Aguarde só uns minutos pra que eu possa lhe autorizar a entrada. -- pediu e entrou no CTI
“Deus, por favor, não deixe que ela morra!” -- orava mentalmente -- "Não assim, não agora, eu Lhe imploro!”
Enquanto isso, Jamila estava do lado de fora atendendo um telefonema de um colega de trabalho.
--Pode entrar! -- Rodrigo voltou para chamá-la
Clarice entrou receosa e sentiu o coração acelerar. Estava nervosa da mesma forma que se tivesse marcado um encontro com Zinara.
--Aqui está ela. -- o médico apresentou a paciente -- Agora com licença que tenho de ir. -- despediu-se
--Ah... -- estava emocionada por conhecer a astrônoma -- Muito obrigado! -- agradeceu olhando para ela. Rodrigo se retirou -- Então... -- aproximou-se da outra -- você é assim? -- sorriu com carinho -- Parece bem mais jovem do que realmente é... tem cara de menina levada... -- acariciou a cabeça dela -- Cabelo bonito... -- segurou uma de suas mãos -- Vamos orar, doutora Zinara! -- fechou os olhos
--Clarice! -- a morena sentiu as vibrações da paleoceanógrafa no plano astral
--Esta moça tem o coração puro e busca de verdade elevar a própria alma. -- Selima falou para a neta -- Vamos aproveitar que uma pessoa assim ora por você neste momento e concentremos nossas mentes nos fatos que você reviveu para observá-los sob um outro ponto de vista. -- olhava nos olhos dela -- Para finalmente superar estes traumas e todos os rancores advindos deles, você precisa entender que seus amados não encontraram um fim, mas um novo começo. -- impôs as mãos sobre a cabeça de Zinara -- Você precisa aprender a ver com os olhos do espírito...
E novamente o espaço-tempo se modificou diante da morena.
Raja atirava contra os inimigos e tentava distraí-los ao máximo para que não percebessem que Zinara fugia. Ele chorava por saber que não sairia dali vivo e sentia-se muito triste por não poder livrar seu país daquela guerra estúpida. Pensou no povo de Cedro e teve pena.
Tiros, tiros, muitos tiros.
Pensou nos filhos, noras e netos e sentiu muita dor. Por toda vida lutou para que o destino de seus decendentes fosse mais feliz. Não desejava ter enterrado quase todos eles.
Bombas explodem.
Pensou na esposa e a dor da saudade cravou uma faca em seu coração. Desejaria muito poder revê-la algum dia.
Gritos de ódio ecoam por todas as partes.
Seu corpo caiu pesadamente no chão e o solo seco e duro tornou o impacto ainda mais violento. Sentiu um gosto de sangue amargo em seus lábios.
Qalbu ash-Sharq lil-Abad... Cedro... (Coração do Oriente, para todo sempre... Cedro...) -- balbuciou uma frase do hino nacional
De repente um estranho silêncio tomou conta do ambiente e Raja viu que tudo havia ficado branco e luminoso.
--Entrego minha alma a Ti, Allah! -- murmurou -- Faça deste velho cansado o que melhor Lhe aprouver... -- não conseguia se levantar
--As-Salamu Alaikum, Raja, ya habibi... (Que a paz esteja convosco, Raja, meu querido...) -- ouviu uma voz conhecida lhe saudar -- Vim para cuidar de você, zogii (meu marido)!
O homem sorriu entusiasmadamente com seus olhos marejados. -- Alaikum as-Salaam, hayati! (E a paz também convosco, minha vida!) -- virou o pescoço com dificuldade e olhou na direção da voz -- Haram tihjur Dineenik... (É proibido deixar aquele que te ama...) -- brincou
--Nunca o deixei, amor da minha vida. -- aproximou-se dele e o envolveu com seus fluídos edificantes -- Abadan! (Nunca!) -- acolheu o homem amado em seu colo e o levou para os espaços
--Então foi assim? -- chorava emocionada -- A morte de giddu foi belo um reencontro de apaixonados? -- olhava para a avó -- Então ele estava bem? Não ficou sofrendo?
--Por que não pergunta a ele? -- Selima respondeu sorrindo
--Zinara! -- a voz do homem ecoou atrás de si
--Giddu?! -- virou-se rapidamente e viu o avô, que lhe abriu os braços
A morena correu até ele e o abraçou com a alma tomada de felicidade.
--Ela parece tão em paz, tão serena... -- Clarice dizia para si mesma -- Zinara... -- abaixou-se e beijou-lhe a testa
--Como assim, eu não posso entrar? -- Jamila perguntou à enfermeira de cara feia -- O que vocês fizeram com ela dessa vez?
--Ela recebe uma visita neste momento e a senhora só pode entrar depois que a pessoa sair! -- esclareceu
--Visita?! -- ficou surpresa -- De quem??
--Ah, eu não conheço a pessoa. -- respondeu de má vontade -- Com licença. -- afastou-se
--Gente, quem será que taí? -- não suspeitava -- Será Cláudia? Mas ela não disse que nem tão cedo podia sair de Cidade Restinga? -- falava consigo mesma
--É melhor eu sair pra outra pessoa poder entrar. -- Clarice decidiu -- Não sei quem é, vai que é gente da família? -- fez um último carinho na professora -- Você tem mais visita, tenho que dar a vez! -- sorriu -- Tchau, minha querida! -- beijou a testa dela novamente
--Eu admiro sua força de caráter e o que você conquistou brilhantemente até agora! -- Raja dizia com a neta nos braços -- Reconheço a força que teve em permanecer lutando apesar de tudo, mas é preciso que você supere certas coisas, habibi. Para o seu próprio bem! -- beijou a cabeça dela -- O que fez por Najla e Aisha foi muito bonito e extremamente importante, mas sabe que falta mais...
--É preciso que você limpe seu coração. -- Selima complementou -- Lembra que isso já lhe foi dito? Lissa faker? (Você lembra?)
Ao sair do CTI, Clarice deu de cara com Jamila.
--Era você quem visitava Zinara? -- a advogada perguntou desconfiada
--Sim. -- estendeu a mão -- Sou Clarice, colega dela no trabalho sobre...
--Mudanças climáticas! -- a jovem completou a frase -- Clarice Lima Verrier, -- olhou-a de cima a baixo com desdém -- paleoceanógrafa da Universidade Federal de São Sebastião. -- fez cara feia -- Sei quem você é não é de hoje!
A professora recolheu a mão constragida. -- Jamila? -- arriscou
--Ela mesma! -- sorriu com deboche -- Jamila Haddad, mulher de Zinara!
“Mulher?” -- surpreendeu-se -- "Será que elas voltaram?” -- ficou triste -- Olha, Jamila, foi só uma simples visita, você não precisa se preocupar! -- esclareceu
A jovem riu e jogou os cabelos. -- Me preocupar? -- sorria -- Eu não tenho motivo pra isso! -- olhou-a novamente de cima a baixo -- Né? -- seguiu adiante e entrou no CTI
“Que mulherzinha nojenta!” -- pensou chateada -- "Mas também, eu não tinha nada que ter vindo aqui!” -- olhou na direção do CTI -- "Que Deus te proteja, Zinara! Que os Espíritos Superiores derramem bons fluídos sobre você e logo este CTI seja uma página virada na sua vida!” -- desejou com muita confiança -- Hora de voltar pra casa! -- suspirou e preparou-se para sair quando esbarrou em alguém -- Ui, desculpe! -- pediu envergonhada
--Não, que é isso! -- Cláudia respondeu educadamente -- Tudo bem, eu que vinha com muita sede ao pote! -- sorriu constrangida -- Tô indo ver uma amiga e tô aqui à mil!
--Cláudia, essa é a doutora Clarice, colega de trabalho da doutora Zinara. -- Rodrigo apresentou -- Ela acabou de visitá-la.
--Ah, é um prazer! -- apertou a mão da outra -- Embora eu gostaria de conhecê-la em outras circunstâncias! -- deu um sorriso triste -- Sou amiga e médica de Zinara. -- apresentou-se -- E não vejo a hora de matá-la com minhas próprias mãos quando a safada sair daí! -- brincou
--O prazer é meu! -- sorriu -- Se Deus quiser ela vai sair daí, -- afirmou confiante -- e você vai mudar de idéia quanto a matá-la! -- brincou também -- Bem, eu vou indo e agradeço por tudo! -- olhou para Rodrigo -- Tchau! -- acenou e partiu. Estava triste e se sentindo uma idiota. Queria ficar sozinha
--Tchau! -- os médicos responderam em coro -- Deduzo que Jamila tenha entrado. -- Rodrigo falou
--Eu vou entrar como médica. Não preciso esperar a chata sair! -- piscou para o colega e entrou
--Eu fico tão feliz que tudo esteja bem, giddu! -- olhava embevecida para o avô -- Demorei tantos anos para apagar da minha mente os sons dos tiros e das bombas explodindo... -- estava emocionada -- E aquele último olhar que trocamos... -- derramou uma lágrima -- Doeu tanto...
--Ana a’arfa (eu sei)... para mim doeu igual... -- derramou uma lágrima também -- Mas quando nós finalmente aprendemos a ver o que realmente fica, o que é verdadeiro, -- falava com sentimento -- e o que deve passar, o sofrimento ganha uma outra dimensão! Tudo depende do ponto de vista, habibi! A verdade é um polígono de várias faces! -- segurou o rosto dela -- Eu tinha que ficar aqui e lutar por Cedro de uma outra maneira! -- explicava -- Nos dias de hoje, Selima e eu, além de alguns de nossos filhos, noras e netos, trabalhamos arduamente para que a violência tenha fim e que as potências estrangeiras não mais invadam nossas terras!
--Temos trabalhado muito para impedir que Godwetrust invada Suriyyah! Uma vez que Cedro funciona como um protetorado deste país, nossos esforços também se estendem a ele. -- Selima falou -- Godwetrust planeja uma invasão e aguarda o momento certo para justificar sua necessidade.
--Sempre Godwetrust... -- reclamou de cara feia
--Atuamos inclusive junto ao povo da Saxônia, -- a mulher continuava explicando -- para que pressionem seu Parlamento a se opor à invasão quando ela for proposta. -- pausou brevemente -- Zahirah acredita fortemente que a Saxônia não vá apoiar a idéia.
--Zahirah também trabalha por Cedro e Suriyyah? -- perguntou orgulhosa
Raja sorriu e respondeu : -- Zahirah é a luz de Cedro, habibi!
--Ela não é uma pobre coitada que teve a vida reduzida a pó! -- Selima afirmou com propriedade -- Seu desenlace foi tranqüilo, rápido e muito bonito. -- impôs as mãos sobre a testa da neta -- Talvez você precise ver.
--Talvez sim! -- Raja fez a mesma coisa
A astrônoma sentiu um suave torpor e retornou a cena que já havia revisitado em sua mente. Só que desta vez estava assistindo de fora, como se fosse uma expectadora de sua própria história.
“A garota voltou para junto da ruiva e aceitou o acolhimento oferecido pela pessoa que mais amava em sua vida. Zahirah ajeitou a criança em seu colo e pôs uma das mãos sobre a cabeça dela, pedindo a Deus que lhe desse forças para suportar tudo que ainda deveria acontecer.”
O céu parecia ter aberto uma pequena porta a partir da qual fachos de luz e espíritos iluminados saíam aos montes. Zahirah e Zinara foram envoltas por linhas luminosas que bailavam ao redor de ambas, movimentando-se cada vez mais rápido, até que fragmentaram-se em pequeninos flocos de luz.
Abnegados Servidores do Alto aplicaram passes em Zinara, que rapidamente adormeceu, enquanto que outros espíritos auxiliaram a ruiva a desprender-se de seu corpo cansado.
Desperta na espiritualidade, Zahirah abriu os olhos e se encantou com o mundo de luz e paz que lhe era novamente apresentado. -- Oh, gamil! (Oh, lindo!) -- sorria -- Deus seja louvado! -- agradeceu emocionada
--Bem vinda, Zahirah! As-Salamu Alaikum! (Que a paz esteja convosco!) -- um espírito saudou -- Viemos conduzi-la de volta a sua pátria espiritual! -- sorria -- Tua liberdade recomeça agora!
--Alaikum as-Salaam! (E a paz também convosco!) -- saudou de volta -- Mas e quanto a usritii (minha família)? -- perguntou preocupada -- E quanto a Yatamanna? -- olhou para a menina
--Não tema, não te preocupe, confia em Allah, que é grande, grande! -- respondeu elevando as mãos aos Céus -- O teu tempo nesta terra é que se acabou, mas os teus ainda precisam de mais trabalho. -- sorriu -- Não temas... -- desaparecia lentamente, assim como os outros espíritos -- crê somente!
Música de alaúdes e flautas invadiram seus sentidos e a jovem percebeu a chegada de alguém. Seu coração acelerou.
-- Oh, meu Deus amado... -- levou as mãos aos lábios -- Ya habibit... (Minha querida...)
Farida se aproximava caminhando sobre um carpete de flores. Pétalas de rosa caiam como uma chuva bem vinda.
--A’asaakoum ma nisaytouni... (Eu espero que você não tenha me esquecido...) -- sorria
--Malakni hawak wala akdar habibi, if yoam ansaik! (Seu amor me possui e eu não posso, minha querida, esquece-la um dia sequer!) -- respondeu em lágrimas -- Allah shahidun 'ala hubbi.... (Deus é testemunha do meu amor...)
Abriu os braços esperando por seu grande amor. -- Ana wgalbi raiheenik! (Meu coração e eu somos sua morada!) -- também estava emocionada -- Venha comigo, minha linda! Agora não haverá mais guerra, fome, junuud (soldados) ou qualquer tristeza do mundo entre nós!
--Leva-me contigo, sob Allah, para qualquer lugar! -- abraçou-se com Farida e juntas seguiram para uma vida nova
--Meu Deus, que coisa linda! -- Zinara chorava -- Que coisa linda!
--A beleza de Yatamanna é muito maior! -- ouviu a resposta
--Meu Deus! -- fechou os olhos e sentiu o coração acelerar -- Ai... -- chorava copiosamente
--Yatamanna? -- insistiu com carinho
A astrônoma virou-se para ver a ruiva e se maravilhou com a imagem da mulher, vestida de branco e totalmente iluminada. Seus cabelos caíam-lhe por sobre os ombros em belíssimas mechas avermelhadas. -- Zahirah! -- prostou-se ajoelhada -- Zahirah... minha luz... ar-rabiic -- não conseguia conter a emoção e tudo ficou branco
--Jamila! Jamila!! -- Cláudia aproximava-se ansiosamente -- Você não sabe o que aconteceu! -- estava eufórica
--O que?? -- segurou as mãos da outra -- Fala, o que foi? -- seu coração parecia que ia saltar pela boca
--Eu não sei o que aconteceu, como aconteceu, ninguém sabe! Mas o fato é que Zinara vai sair do CTI daqui a pouco! -- contou a novidade -- Ela ainda não despertou de todo, mas tá totalmente fora de perigo!
--AHAHAH!!! -- gritou de alegria e se abraçou com a médica -- Gente, mas eu nunca vi uma sentença ser expedida assim tão rápido! -- deu pulinhos
--Sentença?! -- não entendeu
--Ah, é assunto nosso! -- olhou para a imagem da Divina Mãe e afastou-se de Cláudia -- Meretíssima, olha, Vossa Excelência é incrível, maravilhosa, poderosa! -- estava emocionada -- Obrigada, viu? Muito obrigada por ter ajudado minha cliente assim tão rápido! -- agradecia -- Vossa Excelência é um exemplo a ser seguido por todos os magistrados! -- bateu palminhas -- Bem na hora, viu? Eu tenho que ir embora e volto pra casa com uma notícia arretada dessas!
--Ih, eu, hein! -- ficou desconfiada com a atitude da atéia -- Eu só vim te procurar pra dizer isso. Vou voltar pra lá pra monitorar minha amiga. -- fez um gesto com a cabeça e foi embora
--Repara, não, Meretíssima! -- desculpou a médica -- Esse povo não entende nada de assuntos jurídicos! -- piscou para a imagem
***
Cláudia estava na enfermaria com a astrônoma e se distraía com palavras cruzadas. Eram as primeiras horas de segunda-feira.
--Maior estrutura conhecida do universo... -- falava consigo mesma -- Ave Maria que tem um bocado de letra e eu nem desconfio! -- reclamou
--Grande Muralha Sloan. -- ouviu a resposta
--Hum, deixa eu ver... -- contou as letras -- É isso mesmo, Zinara! -- começou a escrever e parou arregalando os olhos -- Zinara??? -- deu um salto da poltrona e olhou para a outra
--Eu não imaginei que essa revista tivesse tão atualizada a ponto de considerar o Huge-LQG, -- explicava -- que é um grupo de 73 quasares medindo 4 bilhões de anos-luz de diâmetro. Afinal de contas isso foi descoberto agora pouco, em janeiro. -- pausou brevemente -- Estamos em que mês? -- não sabia
--Estamos em mês de você tomar vergonha na cara, sua bicha safada! -- ralhou de cara feia -- Deixou todo mundo doida! -- aproximou-se do leito -- Sabia que eu ia ligar pra tua mãe hoje? Tava com medo de você morrer!
--Ah, Claudinha, não briga... -- fez beicinho
--Escolha como pretende bater as botas: -- enumerou nos dedos -- enforcada, danada ou derrengada?
--Dá abraço? -- pediu fazendo cara e voz de criança
--Zinara Raed, eu te odeio! -- emocionou-se e abraçou a amiga com cuidado
--E eu te amo! -- sorriu fechando os olhos
***
Clarice apareceu na sala de Cátia ao final do dia.
--Gente, que surpresa! -- levantou-se empolgada -- Você aqui? -- sorriu
--Eu não tenho muito a dizer. -- fechou a porta -- Apenas te peço uma coisa. -- aproximava-se devagar
--O que? -- acompanhava-a com o olhar
Parou diante da outra e falou olhando nos olhos: -- Me faça esquecer! -- puxou-a para um beijo
--Gente! -- Cátia interrompeu o beijo e olhou abestalhada para Clarice -- É você mesma? -- perguntou incrédula -- Não vai sair daqui correndo pra algum lugar? -- estava em choque
--Não fujo mais! -- afirmou convicta -- Só quero que me faça esquecer! -- pediu novamente
--Eita, que eu vou te deixar é com amnésia! -- puxou a morena para junto de si e beijou-a com raça
***
--E agora, Zinara? -- Cláudia perguntava observando a outra se arrumar -- Eu ainda tô confusa com tudo isso! O que você vai fazer, afinal? Resolveu pôr a cabeça no lugar e se tratar?
--Vou continuar de onde parei. -- respondeu convicta -- Mas volto pra Cidade Restinga porque tenho que trabalhar pra um evento que acontece em abril!
--Humpf! -- fez um bico -- Claro que eu não devia esperar uma resposta diferente disso, né? -- cruzou os braços revoltada -- Da próxima vez que você se danar por aí eu não vou mudar minha agenda toda e deixar minha filha doente aos cuidados de meu marido só pra vir te ver não, viu? -- reclamou
--Oh, minha amiga! -- olhou para ela com carinho -- Vou passar o resto da minha vida te agradecendo, mas não se zangue comigo! -- beijou a testa dela -- Pelo menos você ficou aqui por menos de 48 horas! -- piscou para ela e voltou a se arrumar
--Rodrigo foi um santo na tua vida e a gente ralou muito pra fazer teu plano de saúde cobrir os gastos nesse hospital! -- continuava falando -- Prepare-se pra facada porque teve coisa que ficou à parte!
--Ele é outro com quem tenho uma dívida impagável! -- respondeu agradecida -- Vai dar tudo certo, Cláudia, confie em mim!
--Ah, vai! Você vai morrer iluminada após cruzar o Caminho de Seu Tiago! -- ironizou
--Meu caminho é outro, amiga! -- sorriu -- Muito mais longo...
Deu um suspiro profundo. -- Eu queria tanto colocar juízo nessa sua cabeça e fazer alguma coisa mudar aí dentro! -- desejou
--Pode acreditar que muita coisa mudou, doktuur! -- balançou a cabeça pensativa -- Muita coisa mesmo!
Capítulo 15 – Onde É Que Eu Havia Parado?
--Fiquei muito feliz com essa novidade, camma! -- Zinara dizia para Najla -- Saber que agora ya sayyida vai morar aqui com maama e baba deixa meu coração em paz! -- sorria
--E o meu também! -- olhava emocionada para a sobrinha -- Sabe a quem devo tamanha felicidade, não sabe? -- sorriu
--Somente a Deus! -- respondeu de pronto -- Não a mim!
--A você, que foi o anjo que Ele usou pra mudar minha vida! Minha e de bintii (minha filha)! -- segurou as mãos dela -- E quanto a você, Amina e Raed? Quando irão aparar as arestas? -- perguntou -- Sabe que falta isso!
--Preciso ir agora, camma. Não posso esperar que baba volte da casa de Ahmed. -- justificou-se -- Ele é o preferido, e quando precisa de baba pra resolver seus problemas... -- revirou os olhos -- A coisa leva tempo!
--Mas Amina tá aqui! -- argumentou -- Você podia conversar com ela!
--Eu sei, mas... -- abaixou a cabeça -- isso é ridículo da minha parte, só que ainda preciso de um tempo...
--Não é ridículo! Você é humana, habibi, é isso! -- beijou a testa dela -- Obrigada por tudo! Inclusive por ter me deixado ler o yoom kitaab. Foi difícil mas me fez muito bem!
--Há uma coisa que tenho de lhe dizer. -- olhou para a outra -- Eu não lembro com exatidão de todas as coisas que vi e senti quando estava no coma, porém não poderia me esquecer de um pedido de giddu. -- percebeu a emoção da tia -- Na verdade, um recado dele pra ya sayyida (senhora).
Najla não conseguia dizer palavra.
--Ele disse que ya sayyida sempre foi e sempre será uma rosa e que al ward gamil (as rosas são lindas)! -- segurou o rosto dela -- Disse que nunca a julgou e que por isso não haveria o que perdoar. Pediu para que o perdão brote em seu coração para zogik (seu marido) e para si mesma.
Concordou balançando a cabeça e chorando.
--Fique com Deus, camma! -- beijou o rosto da tia e a abraçou com força
--Rahimaka Allah, habibi! (Deus te abençoe, querida!) -- fechou os olhos
***
--Ô meu Deus, mas como é que eu vou dar conta de tanta coisa com esse pinguinho de dinheiro? -- Werneck reclamava examinando alguns documentos no computador -- E agora que eu esqueci onde guardei o telefone da secretária da agência de fomento? Tem coisas que tem que ser por telefone, não tem jeito!
--Se esqueceu do número, pergunta pro presidente de Godwetrust. -- Zinara apareceu na porta -- Eles têm tudo gravado, mesmo... -- brincou -- Vai que te ajuda?
--Você voltou!! -- levantou-se animado -- E mais cedo que eu pensava! -- agarrou-a em um abraço de urso -- Eu sabia que você não ia resistir!
--Calma, homem, não me mata! -- tentava se desvencilhar dele -- Eu não voltei! -- achou graça -- Apenas passei aqui pra dar uma olhada em vocês e conversar com meus alunos! -- sorriu
--Ah, Zinara, pára com isso de licença! -- reclamou olhando para ela -- Esse negócio de ser chefe de departamento em período de corte de verba não é mole, não!
--Sei como é, pode ter certeza! -- sentou-se -- Mas ainda preciso de um tempo. Aliás, vou cair de cabeça no estudo de minha teoria sobre o alinhamento do eixo planetário! -- comentava -- E me preparar pra briga feia que a gente vai encarar no congresso mundial! -- riu
--E não podia fazer tudo isso trabalhando como sempre fez? -- voltou para se sentar -- O dinheiro vai acabar, filha, e recuperar o tempo perdido não vai ser mole! -- advertiu -- Você tá deixando lacunas não preenchidas e muito cabra daqui vai querer preencher na base da pernada!
--Eu sei. -- concordou -- Mas tenho coisas mais importantes pra cuidar por agora!
--Sabe que eu acho que você tá é um tanto perdida nessa sua idéia de licença e o escambal?
--Talvez... -- balançou a cabeça pensativa -- mas te garanto que muita coisa já mudou e eu me sinto bem mais leve... -- bateu uma palma -- Vambora, sujeito, vou te dar uma assistência em nome da nossa amizade! Diz aí o que é que te aflige!
--Olha só o novo formulário da agência de fomento que a gente tem que preencher! -- virou a tela do computador para ela -- Espia!
A astrônoma gastou uns segundos calada e perguntou: -- Que tipo de gente inventa uma titica dessas, hein? Será que alguém é pago pra transformar o que já é ruim num trem ainda pior?
--Isso não é de Deus, não... -- Werneck respondeu -- Será que se quando o Papa chegar no país eu levar meu computador pra ele benzer, vai ajudar de alguma forma?
***
Zinara chegava tarde em casa após um dia de muito trabalho. Ao acender a luz surpreendeu-se com o que viu. -- Jamila? -- arregalou os olhos -- Como conseguiu entrar aqui?
A mulher se levantou e balançou um chaveiro. -- Respondo a sua pergunta, hayati? -- aproximava-se sensualmente
--Eeeu pensei que... -- gaguejou -- você não tivesse mais as chaves! -- afastava-se
--Laa! (Não!) -- sorriu jogando as chaves na poltrona -- Eu tenho as chaves dessa casa e do seu coração! -- percebeu que a morena estava tensa -- Bitichkii min eh? (Qual é o problema?) -- continuava se aproximando
--Nós estatamos separadas! -- encostou-se na parede -- Você não podia estar aqui me esperando de roupa íntima e salto alto! -- engoliu em seco
--Eu pensei em te receber nua! -- colou seu corpo no da professora -- Mas achei que você gostaria de me despir... -- sorria cheia de malícia -- Sei o quanto adora fazer isso! -- deslizou um dedo pelo rosto da outra -- Eshtaqto elaiki katheeran... (Senti tanto a sua falta...) -- sussurrou a ponto de beijá-la
--Aasif! (Sinto muito!) -- Zinara afastou-se com um movimento de ninja -- Mas nós não nos reconciliamos e eu não esqueci do que aconteceu! -- tentava se recompor -- Comigo não funciona assim e você sabe! -- estava nervosa
--Eu sei é de três coisinhas: -- encostou-se na parede e começou a tirar o sutiã -- behebbik ia hayati! (Amo você, minha vida!) -- olhava nos olhos da outra -- Quero ser sua zoga (esposa)! -- jogou a peça no chão e movimentou-se para tirar a calcinha -- E quero você aqui: -- arremessou a roupa no colo da morena -- dentro de mim!
Zinara sentia seu corpo queimando de desejo. “Ô, meu Pai, me defenda...” -- pensou agoniada
(Notas da autora: Minha singela e carinhosa homenagem a meu avô e a todos os homens valorosos que lutaram por estas guerras mundo afora sem perder sua humanidade. Eles não criaram estes conflitos, mas tiveram de se envolver neles em virtude das circunstâncias. Querido vovô, desejo que seu reencontro tenha sido muito rico e especial. Gostaria que nosso tempo juntos pudesse ter sido maior, mas Deus sabe o momento de cada pessoa. Saiba que viverá sempre em minhas lembranças!
Vovó, minha querida sábia e conselheira do Além: meu amor não pode ser expresso por palavras, mas sabe que meu coração lhe diz o que não consigo verbalizar. Amo-te imensamente e sinto muitas saudades... Luz de meu caminho...
A todas as Zahirahs que tiveram sua vida e juventude interrompidas pela guerra, atesto aqui meu mais profundo respeito. Vocês não são as verdadeiras vítimas de tudo isso, porque os agressores é que são os mais infelizes. Vocês representam a esperança dos que sobrevivem e as luzes que iluminarão as mentes do novo amanhecer da humanidade.)
QUE O MUNDO DIGA NÃO À INVASÃO DA SÍRIA!!!!!!!!! QUE CESSEM AS ATROCIDADES!!! QUEREMOS PAZ!!! PRECISAMOS DE PAZ!!
Fim do capítulo
Música do Capítulo:
[a] Yalil. Intérprete: Mickey 3D. Compositor: sem informações. In: Tu Vas Pas Mourir de Rire. Intérprete: Mickey 3D. Virgin, 2003. 1 CD, faixa 4 (3min32)
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Samirao
Em: 23/03/2023
Olha eu com força total! Huahuahua
Solitudine
Em: 26/03/2023
Autora da história
Estou vendo!
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Femines666
Em: 15/03/2023
Estou apaixonada por Zinara e pelo sofrido povo de Cedro. O diário acaba comigo!
História lindíssima!
Troféu de miss empoderada pra dona Leda!
Resposta do autor:
Obrigada querida!
Fico feliz com esse retorno tão positivo!
Beijos,
Sol
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Seyyed
Em: 17/09/2022
Já vi que Magali está para Zinara como Priscila esteve pra mim só jogando contra. Zi passa mal quando sofre coitada. Essas lembranças de Cedro me matam, eu choro. A morte da Zahi, puta merda! É lindo, triste, tocante. Jamila fica só cercando, mas agora né? Depois de fazer um monte de merda. Clarice não tinha que ter acreditado nela aí vai cair nos braços da cafa.
A reza da Jamila é pior que a minha hehe
DEVORANDO!!!+++!!!
Resposta do autor:
kkkk Adorei a comparação Magali x Priscila!
Como não sofrer com as lembranças de Cedro? A guerra é o fim de toda humanidade em uma sociedade sob conflito.
Clarice é muito insegura, Jamila, ao contrário, é muito segura de si sob vários aspectos. Em uma hora destas ela leva a melhor. Vamos ver o que acontecerá com Clarice, Cátia, Zinara e Jamila.
Continue devorando! rs
Beijos,
Sol
PS:Cada um reza como se sente melhor rs
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Zaha
Em: 21/01/2018
Bom dia, tarde, noite!!
Tô aqui cheia de emoções, meu estômago que o diga.... foi muito forte essas lembranças de Zinara, não apenas no diário, mas também quando esteve em coma. Lindo e doloroso TB...vejo tudo de forma igual e ao mesmo tempo diferente do q li da primeira vez. Mas teve partes que não li ou minha memória está falhando, pq sei que pulava muito, mas lembro da parte do coma...mas tenho uma sensação estranha...
O final foi tão significativo, não imagina quanto, n sabe como chorei e você n imaginaria o motivo, sem falar que entendi certas coisas, lacunas que agora foram preenchidas...
Posso afirmar que começo q entender mais algumas questoes importantes., n minhas, mas q sao importantes para mim e acho q posso entender pq essa estória tem força no coração de muitos e de uma pessoa que conheço, em especial...
Te digo, tudo fluie divino, essa nova leitura corre de modo natural, leio sem olhar cada minuto, quando termina o capítulo. Deixar algo claro, não pq era chato, mas, vc é conhecedora de minha doença e somada ao TDAH, n ajudava muito, Deus sabe como me esforcei... Engraçado que nossas percepções mudam de acordo com nosso estado anímico...eu estou mais que bem!!
Como disse antes, não quero me prolongar muito e por isso n vou comentar como "solía hacerlo antes". Tenés mucho laburo, de todos los tipos a que se dedicar para poder responder mís msjs! Já pensou se fizesse aquelas explicações que costumava fazer...n pode!! Rs.
prepara que o capítulo " final" vou descer com tudo.. kkkk
Beijos, Sadikii!!!
Resposta do autor:
Belíssimo comentário!!
Espero que você continue mais que bem sempre!!!
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Gabi2020
Em: 07/05/2020
Olá Sol tudo bem?
"-- Eu não sei o que é pior: os conselhos que ela te dá ou você parar pra levar a sério!"... Perfeito! Kkkkkk... Clarice leva muito em consideração no que as pessoas podem pensar dela.
Jamila tem seus defeitos... Mas a bicha é porreta mesmo!
O diário de Zahirah é um triste e emocionante relato da guerra, impossível não se emocionar. Leio e releio e custo acreditar que essa é a realidade em muitos lugares.. Triste.
Kkkkkkkk... Dona Leda é figuraça! Chefe do movimento... Kkkkkkk...
A relação de Raed com Zinara era bem difícil, mas um resgate que ela precisa fazer para se curar.
Muito triste a morte de Zahirah... Ela se libertou de todo sofrimento e Zinara... Tadinha!
Que maneira de Clarice conhecer a Zinara e aí vem a Jamila e fecha com chave de ouro! Tá louco hein?
" Minha singela e carinhosa homenagem a meu avô e a todos os homens valorosos que lutaram por estas guerras mundo afora sem perder sua humanidade. Eles não criaram estes conflitos, mas tiveram de se envolver neles em virtude das circunstâncias. Querido vovô, desejo que seu reencontro tenha sido muito rico e especial. Gostaria que nosso tempo juntos pudesse ter sido maior, mas Deus sabe o momento de cada pessoa. Saiba que viverá sempre em minhas lembranças!
Vovó, minha querida sábia e conselheira do Além: meu amor não pode ser expresso por palavras, mas sabe que meu coração lhe diz o que não consigo verbalizar. Admiro-a imensamente e sinto muitas saudades... Luz de meu caminho...
A todas as Zahirahs que tiveram sua vida e juventude interrompidas pela guerra, atesto aqui meu mais profundo respeito. Vocês não são as verdadeiras vítimas de tudo isso, porque os agressores é que são os mais infelizes. Vocês representam a esperança dos que sobrevivem e as luzes que iluminarão as mentes do novo amanhecer da humanidade.)"
Coisa mais linda Sol, parabéns!
Beijos
Ps. Coração ficou apertadinho com esse capítulo!
Resposta do autor:
Gabinha!!!
Clarice ouve muito a mãe, no que está certa, mas não sabe administrar certas coisas.
Jamila precisava de um choque de realidade em sua vida amorosa. E isso ela teve.
O diário de Zahirah é de uma realidade ainda vivida em vários lugares por este mundo. Quando ela se foi, estava se libertando, mas Zinara precisou de tempo para entender. O que é natural. Quem nunca sentiu o peso de uma ausência? E há ausências extremamente presentes em nossas vidas, não é?
"Que maneira de Clarice conhecer a Zinara e aí vem a Jamila e fecha com chave de ouro! Tá louco hein?" Jamila estava na "disputa". Ela não faria por menos.
"Coisa mais linda Sol, parabéns" Obrigada, querida!
"Coração ficou apertadinho com esse capítulo!" O meu também!
Beijos,
Sol
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Sem cadastro
Em: 21/01/2018
Bom dia, tarde, noite!!
Tô aqui cheia de emoções, meu estômago que o diga.... foi muito forte essas lembranças de Zinara, não apenas no diário, mas também quando esteve em coma. Lindo e doloroso TB...vejo tudo de forma igual e ao mesmo tempo diferente do q li da primeira vez. Mas teve partes que não li ou minha memória está falhando, pq sei que pulava muito, mas lembro da parte do coma...mas tenho uma sensação estranha...
O final foi tão significativo, não imagina quanto, n sabe como chorei e você n imaginaria o motivo, sem falar que entendi certas coisas, lacunas que agora foram preenchidas...
Posso afirmar que começo q entender mais algumas questoes importantes., n minhas, mas q sao importantes para mim e acho q posso entender pq essa estória tem força no coração de muitos e de uma pessoa que conheço, em especial...
Te digo, tudo fluie divino, essa nova leitura corre de modo natural, leio sem olhar cada minuto, quando termina o capítulo. Deixar algo claro, não pq era chato, mas, vc é conhecedora de minha doença e somada ao TDAH, n ajudava muito, Deus sabe como me esforcei... Engraçado que nossas percepções mudam de acordo com nosso estado anímico...eu estou mais que bem!!
Como disse antes, não quero me prolongar muito e por isso n vou comentar como "solía hacerlo antes". Tenés mucho laburo, de todos los tipos a que se dedicar para poder responder mís msjs! Já pensou se fizesse aquelas explicações que costumava fazer...n pode!! Rs.
prepara que o capítulo " final" vou descer com tudo.. kkkk
Beijos, Sadikii!!!
Resposta do autor:
Belíssimo comentário!!
Espero que você continue mais que bem sempre!!!
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Solitudine Em: 14/06/2024 Autora da história
Obrigada querida!
Beijos,
Sol