Capítulo 6
Seis
A noite de sexta, que tinha começado excelente, terminou com as duas chateadas, ela por conta de ter levado fora e eu por ter sido o motivo dela ter ficado chateada. Voltei para casa recordando o semblante dela, que estava toda radiante, mas depois, devido a minha indelicadeza, ela acabou por ficar toda chateada. Pensei em mandar mensagem me desculpando, mas nem tive coragem e ela também não mandou nada. Nina, nem quis saber de mim, quando eu cheguei ela estava dormindo, acordou com o barulho da porta, me olhou e voltou a dormir. Fui para cozinha e tomei uma taça de vinho pensando naquela noite. Quando terminei, fui para o quarto, tomei um bom banho, deitei e demorei a dormir; já que a culpa e a consciência pesada, começaram a me atordoar. Tive até pesadelo, tratava-se de um sonho confuso, como se a Yara tivesse desaparecido da minha vida.
No sábado e no domingo, nenhuma mensagem dela. Meu final de semana foi chato, fiquei pensando naquela linda jovem e lamentando minha falta de coragem. Fui tão tola, merecia que ela me ignorasse. Na segunda novamente nada dela e no final do dia infelizmente, a Bia tinha um aviso triste para me dar.
- Doutora, sua paciente que vem toda terça no último horário ligou e cancelou a consulta, vai ter um compromisso.
- A Yara?
- Vou conferir o nome aqui, só um momento (falou checando em seus papeis).
Eu fiquei arrasada. Será que ela iria interromper o tratamento?
- Isso mesmo, o nome dela é Yara e avisou hoje à tarde.
- Ok Bia, até amanhã (falei desanimada e fui embora triste).
Enquanto eu caminhava pensei se deveria ligar para ela ou se mandaria alguma mensagem, contudo me faltava força. Quando cheguei, Nina fez festa, mas nem ela conseguiu-me motivar. A terça foi muito chata, eu nem veria a Yara no final do dia e senti um vazio, por não a encontra no horário que ela geralmente chegava. Mais um dia que fui para casa desanimada. A semana passou e eu não tive nenhuma notícia daquela que me encantava. Combinei de viajar para a casa dos meus pais no final de semana. Fui na sexta e retornei no domingo.
Quando a nova semana começou, fiquei com receio de que ela voltasse a desmarcar a consulta, porém, desta vez ela nem ligou e fiquei com a esperança de que ela aparecesse. Para a minha sorte ela apareceu, contudo, estava diferente e muito séria.
- Boa tarde! (Falei sorrindo e feliz em vê-la).
- Boa tarde! (Balbuciou).
- Tudo bem?
- Sim e você?
- Também. Deixa me ver como está o seu braço, sente-se na maca, por favor (pedi).
Ela foi sem muita vontade e um pouco cabisbaixa. Aquilo me entristeceu, fui até ela e examinei.
- Tem melhorado bastante.
Ela consentiu chacoalhando a cabeça em concordância.
- Você nem veio semana passada (puxei conversa).
- É, tive um compromisso (falou olhando para o chão).
- Você sumiu (disse já me arrependendo).
Ela fingiu que não ouviu. Eu me concentrei no meu trabalho e terminei o procedimento.
- O creme, tem ajudado com as espinhas?
- Sim (monossilábica e objetiva).
- Yara, nunca tive a intenção de te chatear, se o fiz peço desculpas. Não interrompa o seu tratamento, já que a evolução tem sido satisfatória. Se você preferir, posso te indicar outro dermatologista (eu disse com o coração partido).
- Se você não quiser mais me atender, aceitarei sua indicação (ela disse decepcionada).
- Eu quero muito que você conclua o tratamento. Eu só acho, que talvez tenhamos misturado às coisas e criado expectativas. Temos que ter bom senso.
- Doutora, já entendi. Peço desculpas se fui indelicada e insistente. Fique tranquila, nada além do profissional, podemos continuar com o tratamento?
- Claro! (Comecei a ficar incomodada com o tom frio e firme que ela utilizou).
- Encerramos por hoje? (Ela perguntou, olhando nos meus olhos, pela primeira vez naquele dia, eu vi tristeza naqueles lindos e sinceros olhos claros).
Eu fiquei desnorteada, ela estava muito mais chateada do que eu tinha imaginado e tudo por minha culpa.
- Yara, me desculpe, eu não quis te chatear, eu juro!
Ela não falou nada, só ficou me olhando.
- Aquela sexta começou tão linda, tudo estava maravilhoso e eu não queria que tivesse terminado daquela forma.
Novamente ela permaneceu em silêncio.
- Por favor, diga algo!
- Doutora, terminamos por hoje?
Eu suspirei e respondi:
- A consulta, sim terminou, mas eu preciso falar contigo. Conversa comigo?
- Não. Estou cansada e já vou indo (falou se levantando).
Levantei também e me aproximei dela.
- Por favor, vamos conversar (pedi pegando em suas mãos).
Ela não respondeu nada e dos seus olhos começaram a escorrer lágrimas. Eu a abracei e ficamos alguns minutos naquele abraço aconchegante, aos poucos ela se acalmou.
- Não chore! Eu estou me sentido tão mal te vendo assim.
- Eu preciso ir embora (falou se afastando).
- E eu preciso conversar contigo.
- Outro dia (ela disse secando o rosto).
- Tudo bem, quando você quiser. Ficarei esperando, é só você me dizer o dia.
- Ok!
- Quer uma água?
- Não. Até mais!
Eu voltei a pegar na mão dela e depositei um beijo que a fez sorrir discretamente. Em seguida ela saiu da minha sala. Eu fui embora pensando nela e me sentindo a pior pessoa do mundo por ter feito a chorar. Naquela noite tive insônia. Na quarta-feira, me joguei no trabalho e na quinta também, visando ocupar a mente e tentando para de pensar nela. Durante as noites, meu travesseiro foi um ótimo companheiro, me agarrei nele com todas as minhas forças e chorei; devido a insegurança que eu sentia e eu queria mesmo abraçar a Yara. Minha vontade de estar com ela só aumentava.
Consegui esperar por ela até sexta, mas como ela não tinha me mandado nenhuma mensagem, optei por procura-la, é aquela história: quem errou, que precisa correr atrás e por isso, no começo da noite, liguei para ela.
- Alô!
- Oi, fiquei esperando você me dizer qual dia poderíamos conversar e por isso resolvi te ligar (expliquei).
- Eu posso amanhã à tarde (ela respondeu rapidamente).
Nós combinamos horário e local. Conversamos pouco, pois ela logo disse que precisava desligar e tudo que eu mais queria era reencontra-la.
No sábado à tarde nos encontramos em um quiosque na praia e eu nem sabia por onde começar. Após os cumprimentos pedimos dois sucos e começamos a conversar.
- Yara, quero me desculpar por ter te chateado. Eu falhei ao deixar que tudo evoluísse tão rápido (comecei a dizer sem nem mesmo saber o que falar).
- Florência, você me chamou para conversar, para dizer que nossa aproximação foi um erro? (Perguntou entristecida).
- Não é isso. É que misturamos as coisas, você é minha paciente, tem toda a ética profissional.
- Se é este o problema, me indique outro dermatologista. Sinceramente não quero continuar o tratamento com nenhum outro profissional, pois gosto de realizar contigo. Mas se for este o empecilho para a nossa aproximação, eu deixo de ser sua paciente.
- Acho que esta nem é a questão principal. Yara, eu sou dez anos mais velha que você.
- Sério que você se abala com isso? Nossa diferença de idade te assusta?
- Sim, para as duas perguntas (afirmei revelando a minha insegurança).
- Deixa disso, é algo sem importância (falou naturalmente).
- Aposto que várias mulheres da sua idade ou até mais novas, demonstram interesse em você (ponderei receosa).
- E eu estou interessada em você. Além disso, não ligo para isso de idade (afirmou).
- Mas Yara, não é certo (lamentei).
Ela me observou atentamente, balançou a cabeça em negativa, totalmente inconformada e seus olhos se encheram de lágrimas.
- Por favor, não chore. Eu fiquei me sentindo a pior pessoa do mundo quando te vi chorando.
- Eu não vou chorar (falou respirando fundo, tomando todo o seu suco e pedindo outro em seguida).
- Tenho receio de nos magoarmos e de não dar certo (assumi).
- Se não tentarmos, não vamos saber se vai dar certo (salientou me olhando atentamente).
Me perdi no olhar dela e nem soube o que dizer. Será que eu teria coragem de tentar?
- Florência, inicialmente eu pensei que fosse somente uma atração e que logo passaria. Mas a cada novo encontro, o que eu sinto só aumenta. Parei de te procurar, porque não quero te pressionar e muito menos te sufocar. Contigo é diferente de tudo que já passei e confesso que estou apaixonada por você. Eu não paro de pensar em ti e morro de vontade de te beijar.
Eu ouvi cada palavra, fiquei perplexa com toda aquela confissão sincera e emocionada que ela acabará de fazer.
- Nossa! Yara, eu não esperava ouvir tudo isso e estou muito confusa. Não estou sabendo lidar conosco. Assumo que também não paro de pensar em você e que senti sua falta quando você sumiu. Eu preciso pensar muito, raciocinar melhor e compreender esta nova situação.
- Promete que vai pensar com carinho? (Ela pediu pegando em minhas mãos).
- Eu prometo (garanti e beijei a sua mão).
- É a segunda vez que você faz isso e este gesto me dá esperanças (salientou).
Eu repeti minha ação, beijando sua outra mão e ela sorriu. Aquele belo sorriso me encantou muito.
- Vamos continuar o tratamento? (Ela perguntou olhando para o seu próprio braço).
- Sim, os resultados têm sido satisfatórios (assenti).
- Quer andar pela praia? (Convidou novamente).
- Quero. Você passou protetor solar?
- Passei sim.
Paguei a conta, ela insistiu que pagaria, mas falei que era a minha vez, já que eu tinha convidado. Caminhamos um pouco em silêncio, apenas admirando o mar.
- Sabia, que você está sendo preconceituosa? (Yara falou enquanto olhava para o céu).
- O quê? (Perguntei meio abobada).
- Você está deixando o preconceito falar mais alto.
- Yara, eu não sou preconceituosa. Eu sou lésbica e assumida. Já fui até casada.
- Não este tipo de preconceito.
- Seja clara!
- No início você não queria a nossa aproximação porque sou sua paciente. Além disso, o que mais te incomoda é a nossa diferença de idade. Isso também é preconceito!
- Meu Deus, eu não tinha pensado desta forma (falei envergonhada).
Voltamos a ficar em silêncio e meus pensamentos fervilhavam. Ela tinha razão eu estava sendo extremamente preconceituosa.
- Yara, você está certa e irei refletir sobre tudo isso.
- Vamos ch*par sorvetes? (Falou apontando para uma sorveteria).
Tomamos sorvetes juntas e logo a noite chegou.
- Onde você deixou seu carro?
- Em casa, vim a pé, é pertinho.
- Então eu te darei uma carona.
- Não carece, são poucas quadras daqui (expliquei).
- Você não quer que eu saiba onde você mora? (Perguntou me analisando).
- Não é nada disso.
Ela acabou me dando carona e de fato chegamos rapidamente; infelizmente, pois eu estava adorando a companhia dela.
- Por favor, não suma (pedi).
- Pode deixar e até terça (ela falou sorrindo).
- Sim, até terça! Boa noite!
Desta vez ela que beijou a minha mão e aquele gesto me tocou intimamente. Também depositei um beijo na mão dela, nos despedimos e deixei o carro. No meu apartamento fiz uma festa com a Nina, eu me sentia mais leve depois da nossa conversa. Liguei para a minha mãe e contei tudo detalhadamente. Ela me ouviu com atenção e sentenciou:
- Filha, você já está totalmente envolvida e fugir nunca é a solução para nada. Essa moça está certa, você foi preconceituosa, mas não é só isso. A grande questão é o seu medo de acabar machucada outra vez, mas pare para pensar, você me contou que ela também já passou por isso e ainda viu uma cena terrível de traição. Eu te entendo, sua vida mudou repentinamente e foi traumatizante, mas meu bem, você não pode ficar se prendendo ao passado, precisa viver e ser feliz!
- Obrigada Mãe.
- Disponha meu bem e se permita!
Eu fiquei refletindo e elas tinham total razão. Antes de dormir mandei mensagem para Yara.
Boa noite! Durma bem e bom descanso. Beijos!
Em seguida, para a minha felicidade, ela respondeu:
Obrigada e idem. Espero sonhar contigo. Boa noite! Beijo.
Fim do capítulo
Olá! Agradeço por cada leitura, comentaristas obrigada por toda companhia e feedback.
Aproveito este capítulo para fazer uma divulgação. Participei de um concurso e o meu conto foi escolhido para compor uma antologia intitulada: "Isso também é preconceito", mais detalhes no link: http://causoseprosas.com.br/livraria/isso-tambem-e-preconceito
Que tenhamos um doce e belo final de semana!
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Vanderly
Em: 01/09/2022
Boa tarde May, banho tomado e quando eu ia saí chuva novamente, aí o jeito foi voltar pro ti. Digo o conto. Risos.
Bom, não tenho nada contra as diferenças de idade, mas é um caso a se pensar com carinho no quê quer para não magoar a outra pessoa. Já fiquei com uma garota com mais da metade da minha idade e no final ela me trocou por um homem. Também tentei levar algo adiante com uma mulher da minha faixa etária que estava num casamento em crise e no fim ela fez as pazes com a esposa, e eu fiquei cá achando que eu tenho o dedo podre pra o lado afetivo; porém nada disso me deixa insegura. Eu direta igualmente a Yara, mas quando não quero dou fora com a Flôr. Risos.
Tomara que elas se entendam.
Abraço!
Vanderly
Resposta do autor:
Olha a chuva me ajudando rs
Eu também nunca tive problema com idade, sobre traição uns anos atrás já sofri igual as personagens, a namorada da época me traumatizou em vários aspectos, tudo estava um caos e para piorar quis enfeitar minha cabeça com chifres, prefiro tanto meus cachos hahaha é luta né mas, faz parte, é a vida.
flawer
Em: 06/08/2017
Parabéns May!!! Pela estória que está envolvente e pelo concurso que ganhou! Não me espanto já que é uma autora escritora talentosa! Me alegro com sua conquista! (apaludindo de pé aqui) Rssss
Agora dá licença que tou botando leitura em dias! kkkkkkkkkkk
Fuiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii
Resposta do autor:
Muito obrigada, adorei "uma autora escritora talentosa", agradeço muito. Isso coloque a leitura em dia e não nos abandone. Eu, Flor e Yara, gostamos dos comentários rs
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Bia08
Em: 29/07/2017
Que a Flor ouça e faça uso do Conselho de sua mãe e se permita ser feliz.
A Yara é muito objetiva e uma fofa.
Bjs Flor
Resposta do autor:
Olá! Feliz domingo e que tenhamos uma bela semana!
Flora é uma mãe encantadora e uma excelente conselheira. Flor toda perdida né rs
Team Yara? Ela é muito fofa e objetiva mesmo. Uma adorável! Beijos Flor e até o 7.
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Mille
Em: 29/07/2017
Olá amiga May
Flor é insegura e ver a diferença de idade como se fosse uma coisa ruim e a Yara já demonstrou ser muito diferente da ex mulher dela. Se dar uma chance de recomeçar e assim ser feliz, aí fica as duas sonhando com beijos, amor vamos deixar acontecer.
Bjus e até o próximo capítulo, vou espiar aí seu trabalho. Um ótimo final de semana. Abraçooo
Resposta do autor:
Olá! Querida amiga Mille,
Insegurança é o sobrenome dela rs estou adorando este enredo; infelizmente para algumas pessoas a idade é um tabu e nunca me prendi a isso. Pelo contrário quando surge o assunto faixa etária, sou a primeira a citar que são só números, Yara é uma das minhas rs
Pode espiar a vontade, muito obrigada pela habitual companhia. Feliz semana!
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NovaAqui
Em: 29/07/2017
Já comprei o livro e agora é esperar chegar
Abraços!
Resposta do autor:
Obrigada! Agradeço em nome de toda a equipe que participa desta antologia. Também estou aguardando ansiosa pelo meu exemplar, as organizadoras da obra informaram que a gráfica vai começar a realizar as impressões em 5/8 e na sequência iniciam os envios. Depois que você receber e ler, me conte a sua opinião. Muito obrigada! Beijos e abraços, May.
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NovaAqui
Em: 29/07/2017
Parabéns, May! Amor, diversidade e progresso – May Poetisa
Muito feliz por você
Já vou separar a grana para comprar a versão impressa.
Muitos parabéns pela conquista!
Sobre o capítulo:
Flor está sendo muito preconceituosa mesmo. Tenho uma diferença ade idade para minha esposa e isso não atrapalha em nada.... só mesmo na hora de engravidar kkkk. Não quisemos correr riscos e ela foi quem levou nosso AMOR em seu ventre.
Adorei o capítulo enorme. Uma vez por semana e pequenininho? É maldade com nosso coração...kkkk leitora abusada...kkkk
Bom final de semana e mais uma vez PARABÉNS
Abraços fraternos procê!
Resposta do autor:
Olá! Boa tarde! Agradeço muito por ter a sua companhia, por contar com o seu feedback a cada novo capítulo e também pela parabenização. Obrigada! Outro abraço fraterno para ti.
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