Capítulo 26
-- O SE... SENHOR NÃO SABE O QUE PRESENCIEI AGORA. – gritou com os olhos arregalados. Melissa estava perdendo a paciência e Eliezer achou melhor interferir. – ELAS ESTAVAM SE BEIJANDO NA BO... BOCA... O SENHOR SABE O QUE É ISSO? ESSA DESAVERGONHADA COLOCOU NOSSA MENINA NO MAU CAMINHO...
-- Esse “bafão” todo por isso? – Júnior desdenhou se aproximando amparando-se a parede. – Isso eu vejo toda hora. – olhou a velha mulher que estava vermelha – Até decorei. – coçou a cabeça - Eu só vim aqui, assim, “capanga mermo” pensando que elas “tavam” dando uma “tapa na tapioca”, tão ligado? Isso eu nunca tive sorte de ver e sou doido pra ver, deve de dar um...
-- Júnior! – foi à vez de Isadora intervir. – O negócio já é complicado, e você ainda joga mais lenha?
-- Lenha? Onde?
-- Chega! Não vou mais permitir que ninguém nos trate mal, e muito menos a Isadora. – Melissa interrompeu com autoridade.
-- Mercedes, elas são namoradas. – Eliezer tentou falar com mais calma, porém, mantendo-se firme em sua decisão de proteger e apoiar as meninas. – Saiam todos, preciso conversar sozinho com ela. – apontou à senhora.
-- Vem baby. – Melissa puxou Isadora para si, em uma postura protetora, sem deixar de encarar Mercedes com uma expressão mortífera. A velha então concluiu que se um olhar matasse, ela estaria morta. – Pode gritar comigo, mas com ela as coisas mudam de figura, não admito que ninguém faça qualquer coisa para Isadora. Eu sou capaz de destruir a pessoa que ousar a fazer isso, e com minhas próprias mãos. – estava firme em sua postura protetora.
-- Tudo bem minha filha, deu seu recado, agora deixe este velho abrir a mente desta mulher. – Eliezer observou todos saírem, e o carinho como a neta era tratada. Lembrou-se de sua Cristina, e sabia que a defenderia de qualquer maneira se na época soubesse a verdade. – “Meus Deus, isso será apenas o começo do que essas duas crianças terão de enfrentar para viver esse amor”. – pensou com pesar, pretendia retirar toda dor de cima delas. – Agora somos nós Mercedes.
-- Eli...
-- Agora você vai me ouvir. – interrompeu a mulher – Com que propriedade se acha no direito de julgar e condenar essas meninas?
-- Isso é... – fez uma careta – nojento... Repugnante... Um pecado!
-- E não é pecado tentar seduzir um homem casado como você fez inúmeras vezes comigo, quando minha esposa ainda era viva? – passou a mão pelo rosto – Não é nojento, repugnante ou pecado ser notícia da cidade por ter praticado atos obscenos com um pai de família, como sua filha fez e você a defendeu como “santa”? – fez aspas com os dedos ao pronunciar santa. – E fazer fofoca? Isso não é uma maledicência? Ah, não deve ser pecado usar criança para vender drogas como seu filho faz. – passou, novamente, a mão pelo rosto na expectativa de encontrar mais paciência. - Não julgue minha cara senhora, seu telhado é de cristal, e muito mais delicado do que o da minha neta.
-- Eliezer, aceita isso com tanta naturalidade assim? Só pode ser para provocar seu genro.
-- Não tenho genro, nunca tive. – olhou em direção a porta, não pretendia que Isadora o ouvisse falar sobre seu pai, daquela forma. - Existe um homem que fez apenas uma... – respirou fundo e soltou, buscando mais calma. - ÚNICA coisa boa na vida – olhou em direção a porta e apontou. – Aquela garota linda com um coração imenso, que seria capaz de lhe perdoar agora mesmo, pelas coisas duras que você pronunciou.
-- Sempre achei que trabalhar feito homem era errado, mas aquela lá veio me confirmar. – disse baixinho, tentando argumentar em uma causa perdida.
-- Não ouviu nada do que falei? – lamentou – O que posso fazer para lhe abrir os olhos, fazê-la enxergar? – apoiou-se sobre o espaldar da cadeira da mesa da cozinha - Engraçado, até ontem falava dela como uma menina rica que era simples e adorável, agora a condena. – balançou a cabeça – Incoerência não se encaixa ao meu padrão de vida, porque pessoas assim são volúveis, e isso também é repugnante: viver pulando o muro para o lado que lhe favorece.
-- Eliezer, elas são mulheres... – tentou, novamente, argumentar se aproximando do homem que lhe olhava com pesar.
-- Não veja as coisas assim, o amor não tem sex*, idade ou cor. – ergueu-se novamente e apontou a porta – Aquelas duas se amam de verdade, e este sentimento é lindo, ele irradiou esta casa assim que chegaram, e você mesma, inúmeras vezes, declarou que o ar ficava mais leve e o dia mais bonito quando as duas vêm aqui, e sabe por quê? Porque elas emanam amor, energia boa.
-- Elas namoram desde aquela época? – perguntou boquiaberta e com receio da resposta.
-- Mercedes – voltou a olhar com pesar - não sou obrigado a fazê-la aceitar esta relação, como também não sou obrigado a conviver com ignorância e preconceito em minha própria casa.
-- Não acredito que vai me colocar para fora por causa de “uma sapatão”? Ela colocou nossa menina no caminho errado. – estava pálida e admirada.
-- CALE-SE OU PERDEREI MINHA PACIÊNCIA! – falou mais alto e baixou a cabeça, respirou fundo, na tentativa de se recompor, afinal ele era um cavalheiro. – Acredito que você fez isso no momento que insultou minhas netas, dentro da minha casa.
-- Sirvo você há quarenta anos, sempre com a esperança que um dia reconhecesse meu amor e me desse uma chance...
-- Isso só veio a confirmar o motivo pelo qual não lhe dei uma chance: nunca suportei preconceito e falso moralismo. – olhou firma a mulher -. Agora a decisão é sua. – apontou para a porta em direção a sala – Se quiser ficar, terá de ir lá dentro e pedir desculpa as duas, e respeitá-las como elas sempre a respeitou. – apontou em direção à porta da rua - Ou pode ir embora e esquecer esta família.
-- Pois eu vou embora, sei que você voltará atrás. – olhou bem dentro dos olhos verdes que lembravam os de Isadora – Sabe muito bem que elas serão julgadas e condenadas por outros, e você não estará presente ou não terá poder para resolver como agora.
-- Elas têm uma à outra. Tenho esperança que as pessoas mudem e evoluam. – expressou um sorriso irônico – Acredito que ninguém tenha coragem de fazer alguma coisa contra elas, assim, abertamente como você fez agora, e enfrentar a mão de Melissa, você não imagina a força que aquela garota tem.
A velha saiu bufando aos quatro ventos. Melissa e Isadora ouviram os gritos, e depois a batida de porta. Isadora nunca tinha visto seu avô tão alterado, e ficou surpresa.
-- Melissa e Isadora venham as duas aqui. – pediu com autoridade. As duas se olharam, e Melissa abraçou a loirinha, confortando-a.
-- Eu sempre estarei aqui, e sempre teremos o nosso amor. – Isadora retribuiu o abraço e seguiram até a cozinha.
-- Sim vovô. – falou baixinho, aproximando-se com os braços cruzados, cabisbaixa e os olhos cheios de lágrimas. Atrás vinha Melissa, com uma expressão séria, permanecia com o olhar mortífero e cabeça erguida.
-- Mercedes foi embora.
-- Mas vovô... – foi interrompida pelo homem.
-- Levante esta cabeça. – ergueu o queixo da loirinha - Nunca admiti qualquer tipo de preconceito, e não será agora, com as minhas netas que permitirei. – abriu os braços para receber as duas – Enquanto eu viver e tiver força, ninguém fará nada com vocês. – beijou as duas – Mas quero preveni-las, isso é apenas um aperitivo do que a vida lhes reserva. – olhou de uma para outra e concluiu – Isadora, a reação do seu pai vai ser bem pior, e do seu avô... – olhou Melissa e suspirou – a do seu avô devastadora, minha querida. – abraçou mais forte as duas – Agora vamos fazer alguma coisa para comer porque hoje quero assistir televisão, finalmente, com uma imagem nítida e sem fantasmas.
-- Aqui tem “gosto”? Será o Sam? – Júnior interrompeu após ouvir o final da conversa.
-- Sam? – perguntou baixinho, olhando para as duas netas.
-- Pelo que conheço esse bocó, deve ser o “sam...duiche” – Melissa respondeu e levou um beliscão da namorada – Vô, pergunta para sua “netinha”, ela é a tradutora oficial do ser humano em questão. – recebeu um olhar de repreensão de Isadora.
-- Júnior, o nome certo é “ghost” e Sam faz parte de uma história fictícia – a loirinha tentou explicar com carinho.
-- Isso não é usado em sex*? Quando a pessoa diz que tem fictício com alguma coisa?
-- Júnior! – gritaram as duas juntas, despertando gargalhas no velho Eliezer que segurou o rapaz, levando-o até a sala para lhe explicar a diferença entre fictício e fetiche.
-- Vô, cuidado para não ter “azaleia”, vai ter que tomar “aspiro tinta”. – Melissa gritou, e Isadora jogou o avental sobre ela. – Falei alguma coisa?
-- Descasca essas cenouras... – apontou para o balcão – Temos que terminar essa comida. Eliezer olhou de uma para outra e fez um sinal com a cabeça, e continuou apoiando o rapaz até a sala.
Fim do capítulo
Boa semana meninas! Posteis nas duas, beijos
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lay colombo
Em: 19/06/2017
Decepcionante ver como as pessoas podem ser ignorantes, e o pior é saber q na vida isso tbm acontece, as vezes até pior.
Resposta do autor:
Bem aquela história: querem que todos vivam de acordo com o que eles colocaram como padrão, tradicional. Ridículo! Infelizmente isso é cada vez mais atual. Beijos e boa semana
EriOli
Em: 19/06/2017
É uma pena que em nossa realidade nem sempre existam pessoas FODÁSTICAS como o Vô Eliezer, afinal todas vamos ter que passar por isso, cedo ou tarde, é dificil vencer o preconceito!
Boa noite Rafa, arrazando como sempre não é!
Bjs, boa semana, não esqueça de nós...kkkkkk
Há braços
Resposta do autor:
Olha EriOli, realmente é uma pena, mas sou otimista: se existem ocasiões assim, são para nos fortalecer. Acredito que depois de tudo o que estas duas passarem, o amor será bem mais fortalecido, e como acontece isso diariamente, o que não fortalecer entre elas, fortalece individualmente. Sorte que temos sempre um vô Eliezer em nossas vidas, seja na família, ou fora dela. Beijos . Não esqueço, pode deixar!
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Milales
Em: 18/06/2017
Tô amando reler as histórias 'tá ligada'. O Júnior tem um idioma tão fodastico, que não está a minha altura kkkk. O que é "azaleia" não peguei pelo contesto. Foi mal aí!
Resposta do autor:
Oi Milales, azaleia é o mesmo que cefaleia (dor de cabeça). Aspiro tinta o mesmo que aspirina. Ele é fodastico! KKKKK. Beijos e boa semana.
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Suzi
Em: 18/06/2017
É tem gente que não aprende nada com o que a vida mostra, a hipocrisia fala mais alto e como se diz o pior cego é aquele que não quer ver. Mercedes vai trilhar o caminho que escolheu.
Jr pra variar enfiando o pé.
Resposta do autor:
Exatamente! Não aprende nem com as dificuldades da vida. Aqui vivemos uma hipocrisia, se fala em estado laico, mas não vejo isso, pelo contrario. O Brasil anda complicado, em tudo, não só na hipocrisia. Beijos
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Mille
Em: 18/06/2017
Olá Rafa
A primeira pessoa a destratar o namoro das meninas? e vi Eliezer colocando a Mercedes no lugar dela.
Vovô vai se divertir um pouco com o Júnior enquanto as meninas fazem o jantar.
Bjs e até o próximo
Resposta do autor:
Eu acho que a Débora, de certa forma, também ironizou as duas. Sim, colocou, mas será o suficiente? Mas ele vai se divertir muiiiiitoooo com Júnior. Beijos
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Alexia
Em: 18/06/2017
Olá! Rafa, boa noite!
"Tá ligada" capítulo "fodestico" muito bom ter o apoio de alguém ainda mais do vo Eliezer que é um ser humano incrível feliz com o capítulo de hoje! Bj! Até o próximo! :-)
Resposta do autor:
Oi Alexia, agora não entendi porque o comentário anterior saiu tão grandão?!
Eu não lembro dos meus dois vôs, mas da minha avó materna, ela era um amor, e me apoiava em tudo. Muito bom ter uma pessoa acima dos nossos pais que nos apoiam em tudo, incondicionalmente.
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ik felix
Em: 18/06/2017
Cara o vô Eliezer é o máximo!!! E essa Mercedes é o retrato de boa parte da sociedade onde só sabem reparar e jugar a vida dos outros e esquece da sua. Abraço.
Resposta do autor:
Essa Mercedes representa todos àqueles que querem aparentar, quem não é. Quer ser puritana, a dona da razão e da verdade. A boa mulher, mas que cobiça a esposa da outra. A mãe que fala mal dos filhos dos outros, porque não prestam, mas sua filha ganha a vida como profissional do sexo e cobiça o marido de outra, o filho rouba o dinheiro da igreja, e usa amigos como mula no transporte de drogas... Mas o problema é o casal do mesmo sexo que se ama. Vai ser por aí o que elas enfrentarão.
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