No dia seguinte, Marco Antônio saiu de casa decidido a descobrir o máximo de coisas possíveis a respeito de Afonso. Para isso, separou tudo que achou importante e saiu de casa rumo ao orfanato. Precisava falar com alguém de lá que conhecesse a história do garoto, alguém que o fosse ajudar em suas descobertas. Assim que chegou, pediu para falar com Tiago, sua esposa havia lhe dito que ele parecia ser um rapaz de confiança e que tinha muito apego por Afonso.

- Bom dia, Sr. Marco Antônio, como vai o senhor? - O homem foi reconhecido de imediato, uma vez que já havia sido governador do estado.

- Bom dia, Tiago, estou bem e você?

- Estou bem e feliz com sua visita ao nosso orfanato. A que devemos tal honra?

- Não estou aqui como político, Tiago, venho para tratar de um assunto pessoal. - Marco Antônio estava ansioso demais para fazer cerimônias - Podemos ir até uma sala mais reservada?

Tiago o levou até o escritório do orfanato e lhe indicou uma cadeira. Não sabia qual seria o assunto pessoal que o homem teria para tratar com ele, mas pelo seu semblante dava para perceber o quão aflito o senhor estava.

- Pronto, agora o senhor pode me falar do que se trata!

- Minha filha esteve aqui ontem e levou um de seus meninos para passear, ela se chama Bruna, você a conhece?

- Sim, eu a conheço, mas não sabia que era sua filha. Realmente, ela esteve aqui ontem e levou o Afonso para um passeio.

- Pois bem, é sobre o Afonso que quero conversar. Mas antes de dizer qualquer coisa, quero que veja esta fotografia! - o mais velho entregou a Tiago uma foto de Ricardo, seu filho mais velho, quando tinha aproximadamente a mesma idade de Afonso.

Tiago observou a foto por alguns instantes sem conseguir chegar a qualquer conclusão. Várias coisas passavam por sua cabeça enquanto reparava na semelhança daquela criança da fotografia com o menino que morava no orfanato, chegou a ficar feliz ao imaginar que o senhor sentado a sua frente teria encontrado a família do menino, mas nunca passou pela sua cabeça quem era essa família.

- Você vê a semelhança, certo? - Tiago apenas assentiu - Eu estou tão confuso quanto você desde que conheci o Afonso ontem a tarde!

- Quem é essa criança na foto? - perguntou Tiago tentando elaborar uma situação cabível para explicar aquilo.

- Ricardo, meu filho mais velho. Tenho aqui algumas fotografias da Bruna também, eles são muito parecidos!

A cada foto que via, mais confusas ficavam as ideias de Tiago. Que loucura era aquela? Pegou-se pensando em como não tinha notado antes a semelhança entre Bruna e Afonso, pois olhando aquelas fotos parecia algo gritante.

- Eu admito a semelhança, mas ainda não entendo onde o senhor quer chegar com isso. Preciso que me explique do que desconfia!

- Antes, veja mais uma coisa. - então ele entregou a certidão de óbito de Afonso, enquanto o homem lia o documento, continuou a falar - Eu também não estou entendendo muito coisa, Tiago, por isso estou aqui, preciso que me ajude. Há alguns dias minha esposa me falou que Bruna estava visitando um orfanato com certa frequência e estava muito apegada a um garoto, até então não vi qualquer problema. Mas minha esposa insistiu que eu conhecesse o garoto, uma vez que ele parecia uma cópia fiel de nossos filhos. Devo lhe confessar, a principio achei que fosse loucura de sua cabeça. E então, ontem quando o conheci, nem sei como te dizer, me faltaram palavras, tive que me segurar para não chorar e assustar o menino.

- Essa criança que morreu, era filho da Bruna, certo? - Marco Antônio afirmou - E o senhor acredita que possa ser o mesmo Afonso que está lá fora jogando bola com outras crianças? - mais uma vez Marco disse que sim - Estou confuso, como seria possível serem a mesma criança se esse documento comprova que o filho de Bruna está morto?

- É exatamente por isso que preciso da sua ajuda, Tiago! Você estava aqui quando o Afonso veio para cá? - Tiago confirmou - Preciso saber tudo sobre quando ele chegou, se as datas conferem, quem o trouxe para cá, todas as informações possíveis a respeito desse menino. Na época da morte de meu neto, minha família estava muito abalada, quem resolveu tudo foi o sogro de Bruna, ainda preciso investigar o que foi feito por ele, mas gostaria de poder contar com sua ajuda e discrição, sei que, assim como eu e minha família, você quer o bem do Afonso.

- Ainda estou muito confuso com tudo isso, é difícil entender o que pode ter acontecido, mas farei o possível para descobrir as informações e ajudar no que puder. Meu objetivo aqui é dar um lar para essas crianças e poder devolver uma delas para sua verdadeira família sabendo que ele será cuidado e amado vai ser uma enorme alegria para mim. O senhor pode contar comigo, e desde já, lhe agradeço pela confiança!

- Eu que devo lhe agradecer pela ajuda, Tiago. Só de imaginar que esse menino pode ser meu neto já sinto uma enorme felicidade. E se eu puder devolver esse amor para minha filha, serei o homem mais feliz desse mundo!

Após firmarem o acordo, Tiago fez mais algumas perguntas relacionadas ao casamento de Bruna e o que aconteceu na época da morte do menino. Analisando todas aquelas informações, as desconfianças de Marco Antônio e sua esposa não pareciam algo surreal, mas muita coisa ainda precisava ser esclarecida por ali e Tiago estava disposto a conseguir o máximo de informações possíveis até que chegassem a verdade por trás daquilo tudo.

Naquela manhã, Bruna mal conseguiu prestar atenção na aula, nada tirava de sua cabeça a cena do dia anterior, quando seu pai conheceu Afonso. Entendia a felicidade dos pais por vê-la empolgada com algo depois de tanto tempo, mas a emoção que viu nos olhos do pai foi algo além disso. Sem sequer imaginar onde o pai estaria naquele momento, resolveu deixar para lá. Lembrou-se de Lívia, do quanto a mulher a fazia bem com pequenos gestos, como as brincadeiras com Afonso. No dia anterior, após deixar a moça em casa, voltaram a se falar antes de dormir e Bruna não teve como negar que apenas isso a fez dormir mais tranquila. Resolveu fazer uma surpresa para a morena, saiu da aula e foi em direção ao supermercado. Naquele dia não teria aulas no período da tarde, então estava livre para passar um tempo com Lívia. Comprou tudo que achou necessário para preparar um belo almoço e partiu para a casa dela.

Lívia não estava esperando receber visitas, então estava apenas imersa em suas leituras ainda de pijamas, mesmo que já passasse da hora do almoço. Escutou a campainha tocar e foi atender sem imaginar quem estaria em sua porta.

- Bruna? - perguntou surpresa.

- Espero que essa seja sua cara de feliz por me ver - falou a ruiva rindo da feição confusa de Lívia. - Como imaginei, você não almoçou ainda, né?

Lívia concordou.

- Vim resolver seu problema - Bruna disse, entrando e dando um selinho breve em Lívia, que ficou surpresa com o gesto mas sentiu-se flutuando por alguns segundos.

- Ei? - Lívia segurou a mão da ruiva antes que ela fosse para a cozinha - Estou feliz por você ter vindo, apenas fiquei surpresa. - deu um beijo em sua mão e deixou que ela fosse.

Como Bruna já conhecia o apartamento e tinha liberdade para mexer no que quisesse, deixou-a sozinha na cozinha enquanto tomava um banho. Estava feliz por ver o quanto Bruna estava se aproximando por conta própria, ainda que tivesse seus receios, era um grande passo. Quando voltou para a cozinha, já de banho tomado e arrumada, encontrou ela distraída com as várias coisas que fazia, ficou um tempo apenas a admirando antes de ser notada.

- Oi - Bruna disse sorrindo para ela - já está quase pronto!

Lívia notou que Bruna tomava uma taça de vinho enquanto preparava o almoço.

- Você trouxe vinho? - Bruna confirmou - Não exagere, não pode voltar embriagada para a faculdade.

- Não se preocupe - a ruiva respondeu achando fofa a preocupação - não terei mais aulas hoje, estou livre para você!

Lívia não sabia se já era um indício do efeito do vinho mas não resistiu ao ver a ruiva lhe lançar um sorriso sedutor após dizer aquilo. Aproximou-se dela a abraçando por trás enquanto ela ainda mexia em algumas panelas.

- Então temos o resto do dia para nós? - perguntou sentindo seu perfume enquanto roçava o nariz em sua nuca, fazendo Bruna se arrepiar levemente.

- Isso mesmo! - Bruna virou-se de frente para ela, olhando em seus olhos - Tem algo em mente para a gente fazer?

- Tenho muita coisa em mente, pode ter certeza! - Lívia sorriu sedutora e Bruna logo entendeu o que ela estava insinuando, resolveu entrar no jogo.

- É mesmo? Me conte uma dessas coisas então... - Bruna enlaçou o pescoço de Lívia com seus braços a trazendo mais para perto. - Aliás, prefiro que você me mostre!

Entendendo o que a ruiva queria, Lívia avançou em seus lábios, matando a saudade que já sentia deles. As línguas se encontraram fazendo uma sensação boa percorrer o corpo das duas mulheres. Bruna enlaçou os cabelos de Lívia com força, trazendo mais força ao beijo, queria sentir cada detalhe da boca da morena. O gosto do vinho da boca de Bruna deixava o sabor do beijo ainda mais gostoso e instigante para as duas. Lembrando-se que o fogo atrás dela ainda estava ligado, Bruna se afastou um pouco, recuperando o fôlego.

- Preciso terminar o nosso almoço. - falou rindo da mulher que ainda não desgrudava de seu corpo, as mãos precisas ainda seguravam sua cintura com firmeza.

- Você faz isso depois. - Lívia respondeu enquanto distribuía beijos em todo o pescoço de Bruna, não queria perder um segundo sequer ao lado dela, sabia que aquele clima não duraria para sempre.

- Espere, vai acabar queimando tudo! - Bruna a afastou um pouco e voltou-se para o fogão, voltando sua atenção ao que fazia antes. - Prepare a mesa para nós, já está quase pronto.

Vendo que Bruna estava novamente concentrada em terminar o almoço, Lívia a obedeceu. Colocou a mesa para as duas e serviu-se de um pouco de vinho. Não demorou muito para o almoço realmente ficar pronto. As duas sentaram à mesa e comeram enquanto conversavam animadas sobre coisas diversas. Mal notaram o quanto estavam bebendo, apenas se deram conta quando perceberam a garrafa de vinho vazia. Para a alegria das duas, Lívia tinha outra garrafa de vinho em casa. Lavaram toda a louça juntas, enquanto brincavam uma com a outra e partiram para a sala.

Bruna já estava sentindo-se um pouco alterada, alegre demais e Lívia apenas ria da cara dela, gostando de vê-la mais desinibida.

- Vamos dançar? - perguntou Bruna animada - Coloque uma música!

A ruiva estava tão alegre que Lívia não ousou recusar seu pedido, era lindo ver Bruna daquela forma, apesar de ser efeito da bebida ingerida. Ligou o som em uma rádio qualquer e sentou-se no sofá observando-a dançar uma música animada que tocava.

Bruna estava se sentindo feliz e livre. Fazia um tempo que havia perdido o costume de beber, então qualquer pequena quantidade a deixava alterada. Apesar disso, sentia-se bem naquele momento, enquanto dançava animadamente sendo observada por Lívia.

- Ei, venha dançar também - Bruna pediu tentando puxar a morena pela mão.

- Não, estou gostando de observar você! - notou que a música havia acabado e agora tocava algo mais lento, quase sensual - dança para mim!

Bruna percebeu que não era um pedido, era uma ordem. Começou a mover-se lentamente no ritmo da música enquanto aproximava-se de Lívia. Os olhos da morena não saíram de seus movimentos, reparando em cada gesto, cada mexida sensual de seu corpo atraía a atenção dela. Chegou até o sofá vendo a respiração de Lívia começar a falhar à medida que a aproximação entre elas aumentava. Apoiou uma mão em cada lado de sua cabeça e passou a beijar seu pescoço lentamente, sentindo o corpo da morena estremecer ao seu toque.

Não aguentando mais, Lívia puxou Bruna para sentar em seu colo e a beijou com toda vontade que tinha. As mãos apertavam a cintura da ruiva, que correspondia à altura, passeando a mão por todo seu corpo, sentindo seu arrepio em cada toque. O beijo era intenso, as línguas tinham pressa, o gosto do vinho deixava as duas ainda mais excitadas. Lívia separou as bocas para ir encontrar o pescoço da ruiva, distribuía beijos e mordidas por toda a extensão, tinha tanto anseio por aquilo que talvez estivesse deixando marcas, mas não se importava, apenas queria curtir e aproveitar aquele momento. Bruna segurava firme em seu cabelo, dando puxões vez ou outra enquanto sentia os toques deliciosos da morena.

O celular de Bruna tocou, tirando as duas do devaneio em que se encontravam. Tentaram continuar o que faziam e ignorar a ligação mas a pessoa insistiu, na terceira vez que tocou, Bruna se levantou tentando se recompor rapidamente e foi em busca do celular.

- Alô? - atendeu rápido, sem ler o nome no visor.

- Bruna, onde você está? - escutou a voz de Eduardo do outro lado da linha, estremeceu, na mesma hora a culpa lhe invadiu.

- Estou na casa de uma amiga, Edu! - Respondeu com medo que ele não acreditasse.

- Cheguei de viagem esperando encontrá-la...

- Achei que chegaria só no final da semana, deveria ter me avisado que voltaria antes.

- Consegui resolver tudo antes do previsto. Enfim, estou à sua espera!  

Bruna desligou a ligação sentindo como se tivessem colocado uma tonelada em suas costas. Seu marido estava em casa e a esperava, enquanto ela estava se divertindo e ficando com outra pessoa. Por mais que estivesse feliz com o rumo que sua vida estava tomando, não conseguia evitar sentir-se mal por estar enganando Eduardo.

- O que houve? - Lívia se aproximou notando que Bruna parecia um pouco confusa.

- Preciso ir para casa! - a morena tentou pegar em sua mão, mas Bruna rapidamente afastou-se.

- Bruna, está tudo bem?

- Não posso deixar meu marido me esperando, depois conversamos!

E então, Bruna pegou sua bolsa e saiu, sem dar chance de resposta. Enquanto a ruiva corria para casa, confusa e culpada por suas ações, Lívia deixou uma lágrima escapar ao pensar em tudo que estava se passando. Estava apaixonada por uma mulher casada, e para piorar, casada com um de seus clientes. 

Fim do capítulo