Enquanto comiam a pizza sentadas no sofá, Bruna já estava irritada com Lívia, pois todo filme que escolhia, a morena colocava algum defeito.  

 

- Qual o problema com "Um amor para recordar"? - perguntou a ruiva irritada.  

 

- O problema é que nós já assistimos milhares de vezes, pra que você quer assistir e chorar de novo? Coloque um de comédia! - Lívia estava achando graça da irritação dela, mas segurava-se para não rir.  

 

- Os três últimos que escolhi eram filmes de comédia, Lívia.  

 

- Mas não eram bons! - viu a ruiva revirar os olhos - Que tal um de terror?  

 

- Você sentiu medo só de ler a sinopse de "Annabelle". - Dessa vez Lívia não conseguiu evitar e riu da cara emburrada que a outra fez - Ok, eu desisto! Levarei essas coisas para a cozinha, escolha você o filme.  

 

Dito isso, a ruiva jogou o controle remoto no colo de Lívia e começou a recolher o que restou da pizza. Após limpar tudo, Bruna foi até o quarto e buscou um cobertor para as duas. Sentaram-se no sofá próximas uma a outra, Lívia estava feliz por ver a ruiva baixando um pouco a guarda, não fugindo da proximidade entre elas. A morena estava prestes a dar play no filme, quando Bruna reclamou.  

 

- Frozen? É sério? - a ruiva ainda estava irritada.  

 

- Let it go, let it go. Can't hold it back anymoreee - Lívia cantou fazendo graça e tentando tirar um sorriso de Bruna.  

 

- Meu deus - a ruiva finalmente deu um sorriso, relaxando um pouco - você é um pé no saco! - falou empurrando Lívia.  

 

Bruna estava prestando atenção no filme, mesmo já tendo o visto, mas Lívia parecia mais interessada em observá-la. Bruna sentiu a mão da morena repousar em sua perna e virou-se para ela.  

 

- Você escolheu o filme e não está prestando atenção! - Bruna resmungou. 

 

- Você é linda!  

 

Lívia reparou um pequeno sorriso em resposta ao elogio e sentiu seu coração acelerar. Era o que ela precisava para finalmente fazer o que tanto queria desde que sentaram naquele sofá. Virou-se para ela e mão que estava na coxa de Bruna passou para sua cintura, a puxando para mais perto e colando os corpos. Lívia aproximou-se e levou seu rosto para o pescoço da ruiva, que apenas aproveitava as sensações que sentia naquele momento. A morena perdeu-se no perfume que a outra emanava, roçava o nariz com leveza, sentindo-a se arrepiando. Passou a beijar com calma a região, fazendo um caminho até chegar aos lábios da ruiva. E então, as bocas novamente se encontraram, as línguas se encontraram e a explosão de sentimentos acertou outra vez as duas.  

 

O beijo que começou calmo foi evoluindo à medida que os corpos pediam por mais proximidade, as mãos de Bruna seguravam firme os cabelos de Lívia, enquanto ela passava a mão pelo corpo da ruiva, arranhando-a de leve. Lívia surpreendeu-se quando sentiu Bruna se mexendo e passando a sentar em seu colo, o calor que emanava de seus corpos estava deixando as duas mulheres ofegantes. Lívia não demorou a colocar as mãos dentro da blusa que a ruiva estava usando, passou a arranhar suas costas e apertar sua cintura com propriedade. Perdeu a linha quando sentiu as mãos de Bruna subindo aos seus seios e apertando com vontade. Separou as bocas apenas para retirar a blusa que ela usava, mas tal ato pareceu tirar a ruiva do transe em que se encontravam e ela não permitiu que Lívia voltasse a beijar sua boca.  

 

- O que foi? - perguntou preocupada em ter feito algo de errado.  

 

- Acho melhor parar por aqui. - ainda ofegante, Bruna falou.  

 

- Parar? - Lívia não estava entendendo.  

 

- Você sabe o que eu penso, Lívia.

 

- Não, eu sei que você quer, tanto quanto eu. Pare de fugir!

 

- Não nego que quero... - Bruna confessou - mas ainda não me sinto bem para fazer isso.

 

- Ainda? - Lívia sorriu cheia de esperança - Ainda é um bom sinal!   

 

A ruiva saiu de cima do colo de Lívia rindo e voltou ao sofá, pelo menos não foi para longe, o que já deixou a morena um pouco aliviada, tudo que não queria era afastar Bruna dela. Lívia surpreendeu-se quando a ruiva deitou em seu colo sem aviso prévio, mas não reclamou, pelo contrário, passou a fazer um cafuné leve em seus cabelos. Pouco tempo depois notou que ela pegou no sono, tentou acordá-la pois acabaria tendo dores no pescoço se ficasse naquela posição. A ruiva apenas resmungava coisas desconexas, estava em um sono profundo. Lívia deu um jeito de sair do sofá, colocando um travesseiro embaixo da cabeça de Bruna e a cobriu, não queria que ela dormisse no sofá mas percebeu que não iria conseguir acordá-la. Para não deixa-la sozinha, se acomodou no outro sofá e acabou dormindo por ali mesmo.

 

Bruna acordou, olhando em volta para saber onde estava. Notou que estava no apartamento de Lívia, acabou dormindo ali. Levantou-se a procura de seu celular, o encontrou e viu que já passava das 6 horas da manhã, precisava ir para casa ou se atrasaria para sua aula. Aproximou-se da morena que dormia completamente calma em outro sofá, perdeu alguns minutos apenas a observando, gravando em sua mente cada traço e detalhe do rosto que achava tão lindo. Antes que perdesse a hora apenas velando o sono de Lívia, depositou um beijo em sua cabeça e saiu do apartamento. Diferente dos dias em que acordava cedo completamente mal-humorada, naquele dia Bruna sentia-se leve e feliz, guardaria aquela noite para sempre apenas por ter tido a presença de Lívia.

 

Lívia acordou quando já estava quase na hora do almoço, sentia um pouco de dor nas costas por ter dormido no sofá mas não tinha motivos para reclamar, qualquer esforço como esse seria pouco, estava feliz pela aproximação da noite anterior, sentia que aos poucos Bruna estava se entregando ao que sentia por ela. Resolveu mandar uma mensagem para sua ruiva.

 

"Bom dia, fugitiva! Faz tempo que saiu daqui? Poderia ter me acordado"

 

Bruna estava saindo de sua aula quando ouviu o toque do celular, sorriu assim que viu o nome de Lívia no visor, nem precisava ler o conteúdo da mensagem para se sentir feliz.

 

"Bom dia! Sim, acordei assim que o dia raiou. Você estava dormindo feito um anjo, não quis incomodar. Irei ao orfanato hoje, me acompanha?"

 

Quando a resposta chegou, foi a vez de Lívia sorrir feliz, não poderia receber convite melhor naquele dia. Passaria mais tempo ao lado de Bruna e ainda veria seu mais novo melhor amigo, Afonso. Aquele menino era tão especial, nunca havia conhecido criança tão encantadora. E a semelhança que notou entre ele e Bruna era surreal, pensou tanto nesse assunto que chegou a ter dores de cabeça, mas não chegou a nenhuma conclusão, afinal, porque o menino seria tão parecido com Bruna?

 

Enquanto isso, na casa dos pais de Bruna, sua mãe conversava com Marco Antônio sobre o pequeno Afonso. O marido ainda estava receoso quanto às desconfianças da esposa, parecia irreal demais que um menino com o nome de seu neto estivesse num orfanato e fosse tão semelhante à Bruna, simplesmente não fazia o menor sentido, uma vez que seu neto estava morto. Imaginava que era apenas o instinto materno de sua mulher falando mais alto por ver a felicidade que a criança estava proporcionando a filha, até porque a própria Bruna não havia reparado tal semelhança.

 

- Marco, você verá com seus próprios olhos, ele é tão parecido com Bruna, apenas não é ruivo como ela - falou tentando convencer o marido - pensando bem, ele se parece bastante com o Ricardo, tem os cabelos castanhos como ele.

 

- Não crie expectativas em cima dessa criança, Cristina, isso ainda me parece muita loucura! - falou sendo sincero com a esposa.

 

- Apenas o conheça, é o que te peço. Tenho certeza que após isso você irá entender o que digo!

 

- Eu o conhecerei com todo prazer, Cris, independente dessa história louca de sua cabeça, sei o quanto esse menino tem feito nossa filha feliz.

 

 

Bruna teria apenas uma aula naquela tarde, então saiu cedo da faculdade e logo ligou para Lívia dizendo que passaria para busca-la. Não demorou mais que trinta minutos para chegar ao seu condomínio, logo avistou a morena que já a esperava. Partiram rumo ao orfanato conversando sobre diversas coisas, não falaram sobre os beijos trocados na noite anterior, não porque estavam evitando o assunto, mas porque não havia o que ser dito, fizeram o que sentiram vontade de fazer. Lívia sentiu-se bem ao notar que Bruna já havia superado a fase de negar o que estava sentindo. Quando estacionou em frente ao orfanato, Bruna fez uma cara de poucos amigos ao lembrar da primeira vez que levou Lívia até ali.

 

- Ei, - chamou atenção da morena - espero que não fique de conversinha com aquela garota.

 

- Ciúmes? - perguntou Lívia, segurando o riso.

 

Bruna não respondeu e foi saindo do carro, só de lembrar e ter que tocar naquele assunto, sentia-se irritada. Lívia saiu do carro e correu para alcançar a ruiva, quando conseguiu segurou sua mão como quem não queria nada demais e assim as duas entraram no orfanato. Logo avistaram Tiago e foram falar com ele, Bruna precisava pedir autorização para levar Afonso para um passeio.

 

- Olá, meninas, como vocês estão? - perguntou cumprimentando as duas.

 

- Olá, Tiago, estamos ótimas e você?

 

- Estou bem! Querem que eu mande chamar o Afonso ou vocês irão lá fora?

 

- Na verdade, estou aqui hoje para lhe fazer um pedido, Tiago. - Bruna ainda estava receosa, não sabia como abordar o homem.

 

- Pode falar, Bruna, se estiver ao meu alcance...

 

- Eu gostaria de levar Afonso para passear fora daqui, quem sabe leva-lo ao parque mais próximo ou para tomar um sorvete. Gostaria muito que fosse possível!

 

- Olha, Bruna, é um pedido delicado... - o homem não queria ser rude, mas aquilo era contra as regras do orfanato - Vocês estão sempre por aqui e posso ver o carinho que nutrem pelo Afonso, mas até o momento o tema adoção não apareceu em nossas conversas. Não é saudável para as crianças criarem vínculos fortes com pessoas que apenas passam aqui para vê-las, eles se apegam com muita facilidade e levar o Afonso para fora daqui seria como dizer a ele que você quer tirá-lo do orfanato, isso poderia bagunçar a cabeça do menino!

 

- Entendo sua posição, Tiago, e não posso negar que meu plano inicial não era adotar uma criança, buscava apenas me distrair e ajuda-las. Mas esse menino encantou-me de uma forma absurda! - respondeu sincera - Não passa pela minha cabeça deixar de vê-lo, mas eu tenho questões que precisam ser resolvidas antes de tomar uma decisão tão importante como a adoção, afinal trata-se de uma criança. Esse menino é muito especial para mim, eu apenas queria proporcionar uma tarde diferente para ele!

 

Após uma longa conversa onde os dois foram muito sinceros um com o outro, Bruna conseguiu convencer Tiago de que o passeio apenas faria bem ao menino. Sem querer esperar mais tempo, ligou para os pais e marcou de encontra-los no parque mais próximo ao orfanato. Afonso ficou feliz ao ver as duas mulheres, mas nada se compara a alegria que o menino sentiu quando lhe foi dito que eles iriam sair juntos para passear, chegou a dar pulinhos de felicidade e correu para abraçar e beijar as duas, agradecendo mesmo antes de saírem de lá.

 

Durante o trajeto até o parque, era possível notar a curiosidade nos olhos do menino, poucas vezes ele havia saído do orfanato, então tudo que via nas ruas parecia encantá-lo. Chegaram ao destino final e Lívia teve que conter a euforia de Afonso ou o garoto sairia correndo encantado com tudo e acabaria se perdendo. De mãos dadas com as mulheres, o menino passeava encantado com tudo que via e com uma alegria contagiante. Os pais de Bruna já estavam à espera deles, quando se aproximaram, Afonso reconheceu Cristina e soltou-se da mão das duas para ir abraçar a mais velha.

 

- Tia, você também veio passear comigo? - perguntou o menino feliz, já lhe dando um abraço.

- Claro, meu amor, eu estava morrendo de saudades!

 

O menino estava feliz por vê-la ali também, saiu a puxando pela mão e levando para conhecer o parque. Enquanto isso, Marco Antônio observava a cena e o garoto, estava paralisado, sua cabeça estava confusa com o que via. Para sua surpresa, sua esposa não estava tendo ideias surreais, pelo contrário, tudo que lhe disse fazia todo o sentido.

 

- Papai, viu um fantasma? - Bruna perguntou estranhando a cara pálida do pai.

 

- Oi, meu amor, me desculpe, acabei ficando distraído! - respondeu o homem abraçando a filha. - Você deve ser a Lívia, não é? - Lívia assentiu - minha mulher já é sua fã! Muito prazer, me chamo Marco Antônio!

 

- O prazer é meu! A dona Cristina é um amor de pessoa!

 

- Ei, vocês dois venham aqui! - Bruna chamou os dois que ainda estavam caminhando entre as árvores próximas. - Tem outra pessoa aqui querendo te conhecer, Afonso.

 

O menino se aproximou de Marco Antônio o observando enquanto o mais velho se abaixava, ficando na altura da criança.

 

- Afonso, esse é o meu pai, seu nome é Marco Antônio, ele também quer conhecer você! - Bruna apresentou, antes que o menino estranhasse.

 

- Oi, Afonso, tudo bem? - Marco Antônio quase não podia acreditar no que estava vendo, era realmente surreal.

 

- Oi, que bom que o senhor veio também, assim tem mais gente para brincar comigo! - o menino falou feliz, mas notou que o homem parecia chorar um pouco, acabou ficando com medo de ter dito algo de errado e olhou para as mulheres em volta procurando uma resposta.

 

- Desculpe, querido, é que estou muito feliz de finalmente te conhecer! - respondeu Marco antes que o menino se assustasse.

 

- Não liga não, Afonso, depois de velho ele ficou mais chorão! - Cristina falou fazendo o menino sorrir e voltar a relaxar.

 

- Isso aqui é para você! - ele entregou a bola que até então estava "escondendo" atrás de suas costas.

 

- Jura? Olha, tia Lívia, agora eu tenho uma bola só minha! - o menino foi até ela para mostrar a bola, estava encantado com o presente. - Nós podemos jogar aqui?

 

- Claro, rapaz, mas se prepare para perder outra vez! - falou a morena zombando do menino.

 

- Ei, tio - voltou a atenção para Marco - Obrigada!

 

- Não precisa agradecer, campeão! E aí, vamos jogar? Quero ver se você é bom, mas acho que não, já soube que perdeu para a Lívia!

 

- Eu não tive culpa, tio, ela é muito boa, você vai ver! - o menino fez com que todos rissem de sua inocência ao falar - vem, tia, vamos logo!

 

E então, os dois correram para a grama e começaram a brincar. Bruna apenas observava tudo, quando estava próxima de Afonso, perdia a fala, apenas queria aproveitar ao máximo o tempo que tinha para admirá-lo. Vendo que o marido ainda estava em estado de choque, Cristina se aproximou dele.

 

- Agora você concorda comigo, não é?

 

- Eu ainda não sei como, mas tudo que me disse faz total sentido! - respondeu abismado.

 

- Eu lhe avisei, Marco!

 

- Não se preocupe, eu não desistirei até entender toda essa situação!

 

Após o susto inicial, Marco sentiu-se melhor e foi brincar com o garoto, mas ainda carregava a certeza que tiraria aquela história a limpo, nem que para isso precisasse usar sua influência política para descobrir tudo.

 

O dia estava lindo, a cena que se passava no parque ainda mais. No final, todos acabaram brincando com o menino, até Bruna e sua mãe aceitaram jogar bola, mesmo não tendo a menor habilidade para aquilo. Despedir-se de Afonso na volta ao orfanato foi a parte mais difícil do dia, tanto para Bruna e Lívia quanto para o menino, estava nítido em seus olhos que ele queria passar mais tempo com ela. Com isso na cabeça, Bruna foi para casa, imaginando como seria se pudesse realmente cuidar do menino sem precisar devolvê-lo ao orfanato depois. 

Fim do capítulo