Conjuração por Angribbons
Minhas lindas, desculpem a demora, como forma de desculpas tá ai um capítulo grandinho <3
Capítulo 5
A sinhá saiu logo após me dá alguns cuidados, que admito que precisava, mas isso não fará com que eu a veja como um anjo. Ela continua sendo igual a todos os outros. O senhor ordenou que eu fosse solta na madrugada e deixou a ameaça de que seria castigada mais severamente se houvesse uma próxima vez.
Entrei na senzala e meu pedaço colchão, era uma espécie de palhas trançadas apenas para que não deitássemos diretamente no chão, já havia sido ocupado e me restava agora sentar num canto. Porém, apenas sentar pra quem passou horas no sol e em pé já seria reconfortante.
Os dias seguiam, no que agora eu considerava normal: dormíamos pouco, comíamos menos ainda e trabalhávamos muito. Marieta ainda me infernizava, mas Blanka, que virou uma amiga inseparável, me continha.
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Já era tarde da noite, o sono não me vinha e era costumeiro as minhas caminhadas pela casa. Ao passar pela cozinha ouvi barulhos lá fora, vozes animadas e instintivamente fui olhar o que era.Vinha da senzala, havia fogueira e os negros pulavam ou dançavam de forma festiva. Não era a primeira vez que ocorria aquilo e não era do agrado de meu pai, mas como muitos negros adoeciam e até morriam deprimidos ele não proibia, desde que isso não interferisse no trabalho do dia seguinte. É melhor dá uma folga do que ter um gasto com escravo morto.
- pai Zezé, acorde — pai Zezé era um negro já velho, me viu crescer, e por está velho muitas vezes acabava por cochilar na varada da casa
- Oi minha flha — falou enquanto despertava do sono
- Me leve até lá — ele olhou em direção a senzala e logo entendeu o que eu queria
- Mabel, você é dona disso tudo, pode ir a onde quiser
- pai Zezé — suspirei — sou a dona disso tudo, incluindo eles. Eu.. só quero vê-los. E se eu chegar sozinha, irão parar. O senhor sabe. E todos lá o respeitam, por isso devia me levar. Vai, vamos . — falei enquanto tirava de suas mãos a vassoura que ele cochilou segurando e puxando-o pela mão.
Íamos caminhando em direção a senzala, uns pulavam, outros dançavam de forma que, sem a música, poderia ser vista com uma luta. A princípio não me viram ou eu fui ofuscada pelo gingado dos que dançavam. Era impossível Shiara passar despercebida no meio daquilo tudo, a música cantada naquela idioma estranho dançava com ela. Os cabelos cacheados soltos, os olhos fechados, o vestido seguia o seu ritmo , e o sorriso...Era a primeira vez que a via rir...era impensável não notar Shiara. Junto dela dançava outro negro, seria seu parceiro além da dança?
As vozes foram caladas uma a uma, até perceber que eu era a culpada pelo silêncio. Todos me olhavam, uns de forma surpresa e outros de forma amedrontada
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- Sabe que dia é hoje? — me perguntava uma Blanka sorridente
- Blanka, desde que cheguei aqui eu só sei quando é dia e noite
- Pois deveria saber! Que tipo de africana é? Pra uma princesa você é bem sem costumes — era difícil deixar a tristeza tomar de conta quando se tinha uma Blanka consigo
- Ó Orunmilá* que tudo sabe, conte-me o que de tão extraordinário tem o dia de hoje
- Shiara! Hoje é dia de Olorum* dançaremos ao anoitecer
Após conversar com Blanka, fui caminhar pelos arredores do moinho, eu precisava descobrir uma forma de sair do engenho e chegar até o porto. Ouvi gemidos e
, movida pela curiosidade, segui o som, me surpreendi ao ver o Senhor Augusto apertado os seios de uma das escravas por atrás, encurralando-a na parede, enquanto tentava tirar sua roupa. " Me solte senhor ", era possível ouvir o pedido gemido e choroso e quando eu não mais aguentei presenciar aquilo e numa súbita coragem tentei intervir. Teria feito isso se não tivesse sentindo um braço musculoso ao redor do meu corpo enquanto o outro tapava minha boca, o desespero se apoderou de mim o e numa tentativa falha de me soltar, ouço próximo ao meu ouvido
- cê tá maluca? Eu não vou te fazer mal, mas se você não ficar quieta o senhor vai — vendo a minha imobilidade, Guesel, era esse o nome do escravo que eu saberia mais tarde, me suspendeu do chão ainda com a mão em minha boca e me levou pra entrada do moinho.. Apesar de saber que era comum nunca havia presenciado e a sensação de impotência era algo que eu não havia aprendido a lidar
- ei ei, volta aqui. Shiara, volta aqui — ao me soltar de seus braços, tentei retornar, mas, outra vez, ele me segurou
- voce,voce não está vendo aquilo? Vai deixar acontecer? Você pode impedir! — bate em seu peito desnudo
- e o que eu vou fazer? Bater no dono do engenho pra ser açooitado até a morte?
- eu posso impedi-lo — já entrava em desespero, a culpa me consumia, ela estava aqui por causa de meu pai e agora seria abusada — tudo isso é culpa minha — meus olhos já desciam salgadas lágrimas
- não é, não se culpe. O que você pode fazer é trocar de lugar com ela, ser abusada no lugar dela, e mesmo assim ele nunca vai parar — Guesel me abraçou, me deixou chorar nos seus braços até que voltasse a ser racional outra vez.
- eu me chamo Guesel — antes que eu pudesse me apresentar, ele antecipou-se —Shiara, eu sei. Eu e todo o porto de salvador, não é todo dia que temos a visita de uma princesa
- rs isso me amedronta, carrego o peso da culpa pela estadia da maioria dos que estão aqui
- Eu não sei qual é a dor de ser tirado de onde se vive, eu sou mestiço nascido aqui mesmo, mas não sei se posso culpa-la — contei a ele que a minha participação no tráfico negreiro era uma só: tentar acaba-lo. Guesel me contou que que era filho de escrava com senhor de engenho, mas que isso não queria dizer nada, ele era como todos os outros, apenas uma mercadoria
- a noite você irá fazer preces para Olorum?
- Estamos presos, aonde mais eu poderia ir? — rimos da nossa triste realidade
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Já era noite, os negros mais disposto fizerem uma fogueira e com alguns batuques na madeira começaram a cantar e dançar
- tome, beba — era um líquido de cheiro forte
- Mas o que diabos é isso, Blanka? — ela riu da careta que fiz
- é a cana de molho*, não sei o que acontece, mas deixa a gente numa leveza. Os escravos mais velhos que fazem lá no moinho.
- bom, o que de pior pode acontecer não é?
Desde que cheguei aqui essa deveria ser a melhor noite, melhor nos parâmetros em que nos encontrava. Ver aquela alegria, o sorriso, a dança, era uma maneira de amenizar o banzo* que nos mataria tão rápido quanto o esforço físico. Após ser contagiada pela cultura do meu povo - e pela cana de molho - eu já me sentia leve, até ligeiramente feliz
- Guesel — gritei — venho dançar comigo! — era um negro charmoso e que dançava muito bem com suas mãos em minha cintura. De repente, um silêncio foi se alastrando e antes que eu pudesse entender o motivo, Guesel me disse
- a sinhá está aqui — a busquei com os olhos
Banzo* = é uma palavra sem tradução, mas tem significado semelhante a saudade, muitos escravos morrerem se banzo, pois por estarem longe da família, da cultura, ficavam excessivamente deprimidos.
Molho de cana = isso gera a fermentação e com a ação de microorganismos e outros processos é gerado a cachaça
Orunmilá: Deus da sabedoria, adivinhação e vidência
Olorum* Deus e criador do Universo, também conhecido como O Senhor do Céu
Fim do capítulo
E então, o que estão achando? Beeeijos
Comentar este capítulo:
Rita
Em: 09/08/2016
A sinhá só quer ir vê-los mas é perigoso não? Eles não devem gostar nada dela. Mas eu acho ela boa pessoa. E acho que ela é linda e imagino que a Shiara também é linda :)
Resposta do autor:
bastante perigoso! Mas veja, fazer algum mal para a filha do dono do engenho, é pedir para ser morto no tronco. Por mais sofriada que era a vida dessas pessoas, muitos ainda davam valor por estarem vivos, acreditavam que poderiam voltar para suas casas.
No decorrer da história, irei deixar mais detalhes sobre as duas *-*
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