Estávamos abraçadas, eu recostada na cama e ela com a cabeça em meus ombros, tínhamos acabado de fazer amor.

- Ana, posso te fazer uma pergunta? – Disse delicadamente

- Claro amor.

- Depois que voltamos nunca mais você perguntou sobre a Jaqueline. Por quê?

- Clara, estou esperando o seu momento. Sei que quando quiser vai falar comigo sobre isso.

- Bom então acho que o momento chegou. Em primeiro lugar quero que saiba que nunca tive nada com ela. Já nos conhecemos há muito tempo e trabalhamos juntas. Não vou negar que Jaque quis ser mais do que uma amiga, porém sempre fui muito direta sobre isso, seria apenas amizade e só. Espero que acredite em mim.

- É claro que acredito. Por que você mentiria se não estávamos juntas? Eu tive outras. Você também deve ter tido. Ela seria apenas mais uma.

- Eu a confrontei sobre o que aconteceu no dia em que você telefonou pra falar comigo e ela negou tudo, disse que com certeza você havia entendido errado.

- Que filha da puta!

- Calma Analu, eu sei que ela esta mentindo. Assim como sei também que te ligou antes da viagem. Nesse caso não negou, disse que queria me proteger de você, por tudo o que havia me feito passar. Nós até discutimos, pois falei que ela não tinha o direito de cuidar da minha vida.

- Era ciúmes. Se esta apaixonada...

- Agora eu preciso te contar uma coisa que sei vai te deixar chateada.

- O que?

- Nós dividimos o aluguel.

- Como assim? Jaqueline mora com você?

- Ana, como te falei nos conhecemos há tempos, e ela não tem família por aqui todos estão morando nos Estados Unidos. Quando viemos para o Brasil perguntou se não poderíamos dividir o aluguel.

- E você aceitou assim, de boa? Mesmo sabendo que ela era a fim de você?

- Sim. Fiquei com dó. E depois nunca tentou ultrapassar os limites. Pelo menos até agora. O que fez não tem desculpas. Eu pedi pra que arrumasse um lugar o mais rápido possível.

- Não gosto de saber que ela ainda está na sua casa.

- Eu tenho dormido todos os dias aqui com você, não tenho? Ela prometeu que assim que voltarmos de viagem vai procurar um lugar.

- Espera aí Clara esta querendo me dizendo que Jaqueline vai nessa viagem com você?

- Ana, nós trabalhamos juntas esqueceu?

- Mas isso significa que sempre que for viajar ela estará contigo? Não há uma maneira de procurar outra pessoa pra ser sua auxiliar?

- Posso até tentar amor, mas não vejo necessidade. Depois da nossa conversa acho que não haverá mais problemas. Eu já deixei claro que nós voltamos a namorar, e que jamais em hipótese alguma eu ficaria com ela, pois o que sinto é apenas amizade.

- E você realmente acha que ela vai aceitar isso assim tranquilamente?

-Não sei, mas espero que sim. Porém se isso te incomodar muito, na volta eu converso com Jaque sobre a possibilidade de uma mudança.

- Não sou uma pessoa chata, mas nesse caso eu realmente me sentiria melhor. Depois do que fez, mesmo sabendo que poderia ser desmascarada e, além disso, ter tentado mentir sobre o fato, o que me mostra que não tem caráter, não há como se ter certeza de nada.

- Tá bom amor. Eu verei o que posso fazer em relação a isso.

- Obrigada. – Disse piscando

-Tem jeito melhor de me agradecer você não acha?

Nem precisei responder, pois é claro que eu achava, e agradeci da melhor forma que eu sabia. O voo dela sairia às dezessete horas de Guarulhos. Não seria um voo comercial, já que a empresa dispunha de um jato particular, o que era bom, pois assim a viagem duraria cerca de quatro horas e cinquenta minutos. Eu queria levá-la até o aeroporto, mas ela não deixou alegando que seria necessário eu largar meus compromissos. Ela sairia cedo do meu apartamento pra poder pegar suas coisas e deixar tudo pronto para a viagem, disse que a levaria em casa então, mas ela retrucou dizendo que eu malharia muito à noite e precisaria descansar para ir trabalhar. Ela estava certa novamente, fizemos amor sem parar e de muitas maneiras, como se desse modo conseguíssemos aplacar a falta que sentiríamos durante os cinco dias em que não nos veríamos. Mas tenho que admitir que ela indo ou não viajar, nós teríamos nos acabado do mesmo jeito, esses dias tínhamos trans*do como dois animais no cio, uma fome que não passava, uma vontade louca, como se quisemos matar o desejo que nos consumiu durante todo o tempo em que estivemos separadas. O despertador tocou às  seis horas da manhã, Clara se levantou, tomou um banho, se arrumou depois me beijou e prometeu que ligaria assim que chegasse à Ushuaia. Ao acordar duas horas depois ainda sentia seu cheiro pelo quarto, seu toque em meu corpo e seu gosto em minha boca. Levantei, tomei banho, fiz café, acendi meu primeiro cigarro do dia, alimentei Boris o meu mal humorado preferido, me vesti e fui embora. Tive uma reunião fora que me tomou quase a manhã toda, depois do almoço fui para o fórum e só voltei para o escritório quase no final do expediente. Um dia rotineiro como todos os outros era o que eu pensava, enquanto voltava para o trabalho, mas estava enganada, aquele seria um dia muito diferente dos demais, e nada agradável.

No momento em que cheguei percebi pelo rosto de Fatima que havia alguma coisa errada.

- Doutora Ana, me desculpe, eu juro que não queria deixá-la entrar, mas ela me empurrou e disse que a senhora a conhecia muito bem, e foi entrando, não sabia o que fazer, eu ia chamar os seguranças, mas pensei que a senhora poderia não gostar, ai pensei...

- Fatima, para. Respira. Agora começa de novo, mas desta vez com coerência, por favor, por que eu não entendi nada do que me falou. Vamos lá, com calma, o que aconteceu.

- A mulher que esta na sua sala.

- Que mulher?

- Então doutora, eu não sei.

- Como não sabe?

- É o que estou tentando dizer doutora. Ela perguntou para a recepcionista onde era o seu escritório. Então subiu e veio me procurar.

- Até ai tudo bem.

- Aí ela olhou para mim e falou “aquela deve ser a sala da Ana Lucia, certo?” apontando para sua porta. E eu respondi que sim, mas não imaginei o que ela ia fazer em seguida.

- E como ela foi parar na minha sala? – Estava tentando manter a calma.

- Quando eu disse sim, ela foi passando por mim , me empurrando e entrou, eu tentei tirá-la de lá, mas ela não quis sair, falou que a senhora a conhecia muito bem, pra eu ficar tranquila. Quando perguntei o nome dela, pois queria ligar pra senhora e informar que ela estava aqui, não quis responder disse que iria fazer uma surpresa.

Aquilo me tirou do sério. Brincadeira! Cada uma que me aparecia. Quem seria a louca? Fui para minha sala já pronta para brigar, mas quando abri a porta e entrei congelei. Ela não estava mentindo, eu conhecia muito bem aqueles olhos verdes puxados nos cantos, como olhos de gata, uma gata muito traiçoeira por sinal. Ela continuava linda, não parecia ter mais de quarenta de jeito nenhum, a pele morena, os cabelos negros longos, a boca insinuante, e o corpo mignon com curvas voluptuosas, com certeza ainda continuava a virar muitas cabeças ao passar. Mas afinal o que ela estava fazendo ali? E como tinha encontrado o endereço do escritório? Fechei a porta com um estrondo e a encarei com fúria.

- O que você quer aqui Alicia? Não tem vergonha na sua cara não? Já não cansou de ser humilhada, xingada e chutada? Aliás, como descobriu o endereço do meu escritório?

- Oi Ana. Sentiu saudades?

- Você é uma .... Quer saber é melhor você não tentar a sorte comigo. Agora responda o que perguntei!

- Nossa! Não me lembro de você ser tão grossa. Poderia pelo menos ter me cumprimentado educadamente.

Contei até dez, respirei fundo.

- Eu estou sendo educada até demais pra uma pessoa como você. Fala logo como me achou e o que diabos você pretende, antes que eu chame os seguranças pra que te coloquem pra fora.

- Ao contrario de você estava com saudades. Queria ver como estava e não me arrependi de ter vindo, apesar de estar me tratando assim.

Fingi que nem ouvi o comentário.

- Como conseguiu me achar?

- Por que isso é tão importante?

- Tem razão não tem importância nenhuma. Por isso fora daqui agora!

- Por que esta tão nervosa? Que mal eu te fiz?

- Você é muito cínica não é mesmo? Você acha pouco o que fez pra me separar de Clara? Todo o sofrimento que nos causou? E as mentiras que contou pra ela depois?

- Eu não separei ninguém, só roubei um beijo. E depois não contei mentira nenhuma, não sei do que esta falando.

- Olha, eu não quero te xingar, então é melhor nem falar sobre isso. De certa forma fui culpada porque eu deixei você me beijar, mas eu só quero que desapareça. Principalmente agora que nos reconciliamos. Por este motivo vou te pedir mais uma vez, vá embora por bem, antes que eu perca a razão.

- Se reconciliaram? Você acredita mesmo nisso?

- O que você quer dizer? Que tipo de veneno esta tentando colocar pra fora agora?

- Você continua linda e inocente por isso ela continua te usando.

- Qual é a intriga que você quer causar agora Alicia? Porque se pretende me roubar outro beijo, esquece. Você nunca mais se aproximará de mim. Aliás, pensando bem, é até bom que tenha vindo aqui, assim você me explica que porr* de fotos são essas que você mandou para a Clara.

- Que fotos? – Perguntou dessa vez bem séria

- Para com esse joguinho sórdido, você sabe muito bem que fotos são.

- Tudo bem Ana, você pode até ter ficado brava comigo por conta do beijo, pode não acreditar que sempre fui apaixonada por você e tudo mais, porém eu não sei nada sobre foto nenhuma.

- Não minta para mim Alicia. Eu não acredito em você. Você é uma cobra traiçoeira.

- Eu – não – estou – mentindo. Eu juro. Não sou santa, eu sei, mas nesse caso não sei que fotos são essas.

 - A é? E nem mandou uma carta dizendo que eu estava com você? Esta tentando me enganar que não forjou fotos de nós duas trans*ndo?

- Me diga como eu faria isso? Por acaso você foi pra cama comigo? Não que eu não quisesse, afinal sempre amei você, mas todas as vezes que fui atrás me dispensou. Como faria pra tirar essas fotos?

- Não sei me explica você, que é a mau caráter por aqui.

- Você quer mesmo saber a verdade? Por que eu não acredito que queira.

- O que você quer dizer com isso?

- Que você colocou uma venda nos olhos e não enxerga quem é a Clara de verdade.

- Não se atreva a falar da Clara. Eu não vou admitir.

- É exatamente isso que eu estou dizendo. Pra você ela é uma santa. Inatingível.

- Até agora, eu estava te aturando com educação, mas se você continuar a insinuar alguma coisa sobre ela, te coloco para fora com as minhas próprias mãos! – Rosnei cheia de raiva.

Ela se levantou de um só pulo do sofá.

- Ah é assim? Tá bom. Estou cansada de ser humilhada. Estou cansada de ficar declarando o meu amor por alguém tão cega e bitolada. Pois eu vou te provar que estou falando a verdade. Eu vou desmascarar a sua santinha do pau oco. Ai você vai ver com quem esta lidando e vai me pedir perdão de joelhos. E vai perceber que devia era ter ficado comigo, que sempre te quis de verdade.

- Fora! Some e não me procura nunca mais!

- Eu estou saindo.

- Eu não quero nem saber se esta viva, me esquece entendeu?

- Quanto a isso irá mudar de ideia rapidinho, e não serei eu a vir atrás de você, e sim você que virá me procurar. – Começou a chorar

- Jamais! Isso não acontecerá nem em seus sonhos mais loucos. Eu quero distancia de você.

- Veremos! Você esta me fazendo chorar agora, mas suas lágrimas também vão rolar. – Disse olhando em meus olhos

E saiu sem dizer mais nenhuma palavra. Ela era uma naja querendo me encher com seu veneno maldito. A raiva era tanta que estava tremendo. Não gosto de violência, principalmente física, mas a minha vontade foi de quebrar sua cara, ainda mais quando tentou denegrir a imagem de Clara. Fechava e abria as mãos quase em convulsão, a inveja que ela tinha da prima era muito grande. Só queria saber por que já que ela sempre fora tão linda quanto a prima, tivera uma boa vida, e era tão amada quanto Clara no meio familiar. Nunca acreditei no amor que dizia sentir por mim, o que ela queria era me usar como brinquedinho sexual, só isso. Mas devo admitir que a filha da puta tinha me desestabilizado.

Liguei para Clarisse e pedi que viesse ao escritório porque precisava falar sobre o que tinha acontecido com alguém. E só ela poderia me ajudar. Quando chegou ainda me encontrou enfurecida.

- Ana se acalme. Você vai ter um infarto.

- Não consigo Sisse, é mais forte que eu. Ta me corroendo por dentro, como se eu tivesse bebido ácido.

- Você não pode ficar assim, daqui a pouco a sua gastrite ataca, ai além de nervosa vai ficar se contorcendo de dor.

- Não se preocupe que isso não vai acontecer, porque já aconteceu. Já tomei o remédio.

- Vem cá amore, senta aqui que vou te fazer uma massagem. Enquanto isso me conta tudo direitinho.

Sentei no chão, encostada no sofá e ela foi massageando meus ombros enquanto eu contava o que tinha acontecido.

- Agora me diz se ela não é infernal? Aliás, acho que é mais que isso, se ela aparecesse no inferno o Diabo mandava devolver com medo da concorrência.

- Ela é má com certeza. Mas Ana posso te fazer uma pergunta, você promete que não fica brava comigo?

- Depois dessa massagem que você me fez pode perguntar o que quiser menos que eu descreva minhas noites de sex*. – Brinquei já mais relaxada

- Não se esqueça que não preciso perguntar isso,  por que já tive a experiência e sei que é bem interessante entre outras coisas. – Respondeu zombando

- Ei, isso não se fala assim, sabia? Eu fico sem graça, era só uma brincadeira.

- Ai adoro ver você bravinha, fica tão bonitinha.

- Para com isso. Faça logo a pergunta antes que eu mude de ideia.

- Quando ela falou sobre as fotos, como ela parecia? Quero dizer, ela parecia sincera ao dizer que não sabia nada sobre o assunto?

- Aquilo é uma cascavel Sisse, sempre pronta para dar o bote. É uma atriz. Precisava vê-la chorando!

- Eu sei Ana, mas só queria saber se ela pareceu assim, espantada sabe?

- Clarice o que você esta matutando nessa cabecinha doida? – Fiquei intrigada.

- É complicado. Eu tenho medo de dizer e você ficar chateada comigo, mas lá vai eu não tenho nada contra a Clara, ao contrario ela parece ser legal e tudo mais, só que essa historia das fotos... Ficou martelando na minha cabeça.

- Como assim?

- Olha, eu te conheço muito bem e sei que não gosta de ficar comentando sobre os seus casos sexuais, mas sei que não mentiria para mim então eu acredito em você.

- Desenrola Clarisse.

- Você disse que não transou com a Alicia certo?

- Certo.

- E naquela época não tinha celular que tirasse fotos.

- Hum hum.

- Então como é que a Alicia teria mandado fotos de vocês na cama para a Clara? É que ninguém, a não ser turista japonês, ou fotógrafo profissional, anda com uma câmera a tira colo, pensando a vou trans*r com fulana e tirar fotos e etc. Principalmente porque a chance de ir para a cama com você era praticamente inexistente, segundo você me disse.

- Não iria pra cama com ela de jeito nenhum. Nem a deixava chegar perto de mim. Mas afinal aonde você quer chegar?

- Não é que eu queira chegar a algum lugar, mas que é estranho é. Primeiro por conta da máquina, depois por conta da não trans*.

- Não sei como, mas com certeza ela deu um jeito de fazer isso. Ela é uma serpente asquerosa, sabe iludir. Só que não vai conseguir manchar a imagem da Clara.

- Você está certa. Foram só umas coisas que andem imaginando. Mas deixa pra lá. Com certeza foi alguma tramoia.

- Com certeza. – Respondi

 Mas a agora era a minha cabeça que estava pensando no que Sisse tinha dito. Quando estávamos na chácara Clara falou que me mostraria as fotos, depois disse que não as tinha encontrado e procuraria mais tarde, porém não tinha tocado no assunto novamente, e eu no meu fogo absurdo, tinha me esquecido de cobrar. Agora havia acontecido aquilo e eu não tinha nem como esfregar na cara de Alicia a montagem, por que só podia ser isso, afinal nunca tinha sequer tocado em Alicia depois daquele beijo idiota.

Eu tinha que esquecer o que Alicia tinha tentando implantar em minha mente, com certeza eram intrigas. Mesmo porque não havia um motivo para Clara inventar essas fotos. Quando voltasse de viagem eu pediria pra procurar e me mostrar, então tudo se resolveria. Assim que ela me ligasse eu contaria que Alicia tinha ido ao escritório e tudo o que dissera a seu respeito. Estava na hora de Clara acertar suas contas com aquela mentirosa. Pensando nisso resolvi ligar pra saber como estava o voo e o celular chamou até entrar na caixa postal, deixei um recado e pedi que me retornasse assim que chegasse. Já estava morrendo de saudades e queria muito ouvir sua voz, ainda mais depois da visita importuna que eu tivera.

Fim do capítulo