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Sob o sol de naya por Nadine Helgenberger

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Sinopse:

 


 


Vivemos quase num equilíbrio entre perdas e ganhos...há perdas que nos deixam sem chão, descrentes...há quem decida entregar-se, desistir...mas também existem outras opções...convido-vos a viajar comigo num mundo de possibilidades Sob o sol de Naya.


 


 



Leitor: E_D_R Assinado
Data: 06/05/2019 Titulo: Capitulo 34: Capítulo 34

 Hei, NH, percepções sobre o capítulo...

 

Há uma fábula chinesa bastante interessante que narra sobre o tempo demandado por um desenhista para que produzisse um caranguejo perfeito a pedido de um rei. Para fazê-lo, no entanto, o súdito exigiu cinco anos e uma casa com doze empregados. Passado esse tempo todo, ele não havia sequer começado, então, exigiu outros cinco anos. Ao fim do décimo ano, Chuang-Tsê (esse era o nome dele) pegou o pincel e num instante só, apenas com um gesto, desenhou o caranguejo mais perfeito já visto naquele reino.

Parece meio despropositado falar aqui dessa fábula, mas quando comecei a ler o capítulo e me atentei a alguns detalhes sobre o momento ao qual Raquel está vivendo, achei pertinente. Essa história, dizem alguns filósofos, representa os ritmos de vida mais orgânicos em que ainda se era possível o cultivo do tédio e da lentidão nas tarefas mais simples do cotidiano. Ou seja, na ausência dos automatismos e da aceleração aos quais já estamos tão habituados, um dia talvez já tenha sido possível levar um tempo considerável à execução das tarefas. Para além dessa leitura, costumo pensar que o tempo prefigurado na história remete ao tempo do demorar-se nas coisas. Isto é, demorar-se na ação, no raciocínio, na ponderação, no julgamento, no olhar, na palavra e na escuta. Quando fomos expropriados dessa demora (boa demora, por sinal), alguns automatismos passaram a determinar nossos ritmos de vida, sobretudo a maneira como percebemos e atribuímos sentido às percepções. Isso significa que as esperas necessárias da vida foram quase que totalmente sobrepujadas pela imediatez nas formas com que vivemos. Em meio a tudo isso, o minúsculo e frágil corpo humano, nem tão forte e resistente assim como a biologia supõe, não dá conta de suportar aquilo que demanda rupturas saudáveis ou cesuras importantes.  O que o psiquismo não aguenta, portanto, são as exigências de rentabilidade, de melhoria, de adaptação e de rendimento exigidos para cada um.

Nessa loucura de pensamento você me perguntaria: o que isso tem a ver com a Raquel? Há detalhes no início do capítulo que me fizeram refletir sobre os tempos da personagem e as formas com que o corpo responde a eles. Veja, do capítulo anterior até aqui vejo Raquel num ritmo frenético que lhe expropria até mesmo a cesura necessária para se cuidar. E a atenção recai um pouco sobre esse detalhe, pois acredito que embora possa ser apenas uma resposta às acelerações naturais da vida, uma dor de cabeça rotineira ora pode sinalizar os limites e os esgotamentos, ora podem evidenciar a necessidade de um olhar atento àquilo que colocamos nas costas. Aliás, já houve essa menção anteriormente... Raquel parece carregar o mundo nas costas. Mas a minha preocupação é: Qual o peso disso tudo? Quais os preços podem ser pagos por esse exercício? O que vem aí para Raquel que sinalize a carga que isso tudo representa?

Por outro lado, é interessante observar que a cesura desponta quase que exclusivamente nas divagações sobre Damarys. É o coração na boca, é uma mensagem, o pensamento constante ou uma partilha corriqueira que dão à Raquel a possibilidade de calma tão necessária nesse turbilhão todo. Penso que alguns possíveis percalços que apareçam sejam uma oportunidade para constatar com quem se caminha, ou seja, talvez Damarys seja mesmo o ponto de ruptura necessário para isso ou a “calma” que faça Raquel demorar-se no vivido, nas experiências novas, pois a relação delas parece ser tecida justamente no cultivo dessa demora em que não há pressa para as descobertas... talvez ela proporcione, ainda, momentos tão leves e espontâneos quanto às cenas do parque, por que são eles que tornam evidente o quanto há de bom a ser vivido para além da resignação... talvez esse ponto de ruptura, por fim, possa representar um salto qualitativo na relação que ainda está se firmando.... Loucura? Sim, muita, mas a cabeça voou longe com possíveis pistas que você vai deixando pelo caminho e que estão nas entrelinhas... acho que há aqui um mosaico que talvez faça algum sentido lá na frente rssss, ou não né, vai saber....

Sobre Naya e Valentina...

As cenas do capítulo me remeteram a um poema de Maria Teresa Horta, bastante sensual por sinal, que dão o tom da intensidade da intimidade compartilhada:

“Ponho um beijo demorado no topo do teu joelho. Desço-te a perna arrastando a saliva pelo meio. Onde a língua segue o trilho até onde vai o beijo, não há nada que disfarce de ti aquilo que vejo. Em torno um mar tão revolto no cume o cimo do tempo. E os lençóis desalinhados como se fosse de vento. Volto então ao teu joelho entreabrindo-te as pernas... deixando a boca faminta seguir o desejo nelas”. (Maria Teresa Horta- “Joelho”).

Menciono esse poema aqui não apenas pelo intertexto em relação à intimidade compartilhada, mas também porque trata-se de uma forma de elaboração que ousou externalizar aquilo que até então era quase que um tabu no universo feminino: o prazer sexual da mulher. Dos versos repletos de sensualidade até a abordagem explícita do ato sexual, Maria Teresa Horta constituiu um grito necessário à liberação do prazer feminino reivindicando a liberdade para aquilo que ainda era reprimido. Para além de todas as questões sociais que poderiam ser suscitadas aqui, há muita sensualidade nas linhas que demonstram, com extrema acuidade, as sensações que o prazer representa para a mulher. Chama atenção obviamente o protagonismo feminino, o extravasamento da vontade de sentir e ter prazer da maneira que quiser, o foco sobre a mulher no ato sexual e, de certo modo, a busca do gozo; mas, sobretudo, a narração do ato que até então não era tão comum para a Poesia. 

E por que estou dizendo tudo isso? A cena em que Naya chega à casa e espera por Valentina é tão sensual que me remeteu às formas de poetização do prazer feminino em que as palavras se tornam tão necessárias à liberação que Valentina, por exemplo, está conquistando capítulo a capítulo. Nessa cena, Naya, aos pés de Valentina, (e é nessa posição que Vinah sente o prazer invadi-la e dominá-la completamente) prefigura a doação total ao outro em que o prazer do outro já é, em si mesmo, o próprio prazer. É no olhar extremamente erótico, misturado ao movimento dos lábios e da língua, por exemplo, que o abrir-se ao sentir e ao prazer são mais expressivos. Veja, é como se o olhar buscasse a confirmação do prazer sem limites sentido pelo outro. E Naya colhe todos os louros nessa liberação...

Ao mesmo tempo, há momentos em que as palavras tornam-se dispensáveis e é a imaginação que conduz os desfechos. No poema, por exemplo, não há qualquer menção sobre o desfecho da cena erótica, mas se imagina que muito provavelmente tenha conduzido à partilha do prazer e ao êxtase final. Na cena de Naya e Valentina o mesmo acontece: a forma com que essa cena se conduziu foi tão sensual que, em dado momento, pareceu dispensar certas palavras, pois é a intensidade e a explosão que ditam os tons do desfecho... Veja, isso tudo não é pouco...

 

Sobre Ailine... tenho a sensação de que essa personagem, com sua possível astúcia, pode representar alguns paradoxos para Naya. Há muitos elementos que indicam o encantamento, a suavidade e o magnetismo que, no entanto, coadunam também com a inconstância, com a irresponsabilidade emocional e com os jogos de sedução em que o outro talvez constitua apenas um meio para a alimentação do ego sedutor. Obviamente Naya não é nem um pouco ingênua e nem uma princesa boba que cai na magia da bruxa travestida de princesa; mas, a concluir pelas percepções um tanto pessimistas de Íris em capítulos anteriores, Ailine pode ser a prefiguração do feitiço e do encantamento, mas também uma tempestade que devasta. E isso fica evidente na própria percepção de Naya quando conclui que julgava conhecer uma pessoa que nada tinha a ver com aquilo que via à sua frente.

Mas o paradoxo realmente expressivo que me fez refletir sobre a importância dessa personagem foi ela ativar em Naya lembranças e emoções tão boas quanto importantes: a vida feliz na Austrália e o modo como Leonard criava, comparado à sua voz sedutora. Em reminiscências posteriores, por exemplo, ela continua a despertar em Naya saudades de coisas que ela nem se lembrava mais ou que não se permitia mais ter...  Acho essas passagens muito sugestivas e não sei até que ponto até perigosas, já que essa capacidade de ativar memórias possa, em algum momento, trazer complicações à Nayami... sei lá, fiquei patinando nisso e não consegui chegar à conclusão alguma... mas o modo como isso afetará esses núcleos certamente pode ser muito instigante...

Por fim, sobre as cenas finais... acredito que algumas tempestades podem ser formar a partir daqui. Acho que Naya tem bastante sensibilidade para inúmeras questões e algumas menções ao pensamento constante em Lola, alguns sonhos confusos e o medo de quebrar a cara e o coração aparecendo de modo mais constante dialogam com o mesmo medo repentino de Valentina em perder Naya, a viagem um pouco mais longa que vem por aí e a aparição dessa personagem ao final que, penso eu, talvez tenha a ver com algumas pontas ainda soltas na vida pessoal de Valentina, isto é, alguns ciclos que ainda não foram concretamente finalizados e resolvidos e podem constituir um problema diante desse alguém que, ao flagrá-las, passou a ter uma informação valiosa em mãos... muito, muito instigante o que pode vir por aí. Posso pedir para que venha logo? rsssss.

Enfim, chega desse jornal!

Boa semana e muita inspiração para o próximo!

Bjos, mtos.