Capítulo 4
Claire e Júlia apenas trocaram olhares. Até aquele momento o que lhes parecia era que Cristina estava com ciúme da amiga, pois ela mesma não tinha encontrado alguém com quem quisesse estar, ao contrário de Luana.
As mulheres, então, sem outros compromissos marcados, decidiram ir para o shopping fazer compras, talvez assistir a um filme, ou sentar em uma das cafeterias e apreciar o movimento. Quem sabe encontrassem alguém interessante por lá. Pelo menos Júlia e Claire pensavam assim. Tina, só pensava em manter a mente ocupada para não entrar em desespero, por ter descoberto que o que sentia por Luana não era apenas amizade.
Como na manhã seguinte tinha esperado até quase dez horas e nada de Luana ligar, Tina insistiu até o telefone ser atendido, entretanto, a voz do outro lado do aparelho revelou que não fora a amiga quem atendera, mas sim a fotógrafa.
Sem se intimidar, de forma seca, pediu que Camille desse o recado à Luana de que estaria esperando o retorno da ligação, que custou a acontecer, deixando-a ainda mais irritada.
– Oi, bom dia. – Luana cumprimentou, ainda com voz de sono.
– Oi. Só acordou agora? Ou não recebeu o meu recado? - Provocou, irritada.
– Liga para Ju e para Claire, vamos nos reunir de tarde. – Cortou a amiga, sem dar margem para o início de uma discussão.
– Que horas você vai estar disponível para as amigas? Porque, pelo visto, agora, temos que agendar.
– Vamos almoçar na casa da mãe de Camille, depois podemos nos encontrar. Lá pelas dezesseis... Pode ser?
– Muito bem, estaremos na sua casa às quatro. Vou ligar pras meninas. Almoçaremos juntas, depois encontraremos você. Falamos mais tarde então. Tchau.- Desligou sem dar chance da outra se despedir.
Sabia que estava perdendo a razão, mas, por mais que tentasse, não conseguia ter controle sobre as próprias emoções. Por isso não poderia ir ao encontro de Luana sem as amigas. Caso ficasse a sós com a mulher, não responderia por si, e provavelmente tentasse uma aproximação física, revelando o que sentia, e fazendo papel ridículo.
O tempo se arrastou até o horário do encontro. Tão ansiosa estava, que forçou Claire e Júlia a chegar ao prédio de Luana antes da hora combinada, fazendo com que tivessem que esperar a amiga para finalmente conversarem.
Depois de cumprimentarem-se como de costume, trocando beijos, Tina saiu disparando:
– Então, pode ir contando... Estamos preocupadas.
– Bom... Sei lá... aconteceu. Estou apaixonada...Camille é fantástica... não sei mais o que dizer. São tantas coisas novas.
– Você, com certeza estava precisando de algo assim. - Comentou Julia, feliz pela amiga.
– É, já estava mais que na hora de você voltar ao mundo dos vivos. -Completou Claire.
– Ela está é ficando louca. Não estimulem. - Cortou Tina, em profunda irritação.
– Que bicho andou te mordendo, Tina? Deixe-a ser feliz.
– É,... que coisa. – Fez careta, Claire, para a rabugice da amiga.
– Vocês não estão vendo que isso é completamente insano? Ela mal conhece a mulher e já a trouxe pra casa, depois dormiu na casa da criatura e, pra completar, em menos de um mês, resolve ir pra França com ela. - Disse, alterada.
– Tina, fique feliz por mim. Estou bem. Sei que parece loucura, mas é uma loucura boa. Estou me sentindo tão... tão feliz, é isso.
– Não confunda sex* com felicidade. - Revidou Tina, fora de si.
– Deus, acho que você é quem está precisando trans*r. Caramba. - Comentou Claire, voltando-se para Tina.
– Vão a m... Nada a ver.
– O sex* é fabuloso, confesso, mas tem tantas outras coisas boas... Conversamos muito... Adoro o jeito descontraído de Camille, sua autenticidade, e a falta de regras... Estou me dando o direito de curtir isso.
– Ah, meu Deus, estão vendo ela já está falando até em “curtir”... Tô dizendo.
Todas riram, mesmo Tina, de braços cruzados e com ar de que queria pular no pescoço de Luana e estrangulá-la.
– Arg! Detesto vocês. Tem alguma coisa pra beber nessa casa? - Levantou em direção ao armário, onde sabia que a amiga guardava as garrafas de uísque.
– Vai beber a essa hora? - Perguntou Ju, espantada com o comportamento da amiga.
– Óbvio, se sou a única pessoa com algum senso, vou beber pra ver se não enlouqueço, e entro no clima de vocês. - Serviu-se de uma dose generosa de um dos scots.
– Deixem-na pra lá. Agora conte os detalhes. Como é que resolveu de uma hora para outra ir à França?– IndagouClaire.
Enquanto Luana relatava a conversa com Camille, Tina sorvia em goles grandes o uísque cawboy, sendo observada de quando em vez pelas amigas.
Ju e Claire ouviam o relato da amiga e enchiam-na de perguntas, enquanto Tina servia-se outra vez da garrafa, já trazida para a mesa ao lado de sua poltrona.
Depois da terceira dose,Claire chamou a atenção da amiga, sabendo que algo muito sério estava acontecendo.
– Não acha que está bebendo demais? Desse jeito não vai conseguir levantar daí depois.
– Ah, me deixem em paz. Quem precisa de conselhos não sou eu. – Alfinetou, com cara de poucos amigos.
As outras mulheres se entreolharam, mas não disseram nada, voltando a falar do assunto principal, Camille e a viagem de Luana.
As horas voaram, Tina alheia à conversa, remoendo coisas que as outras não imaginavam. Luana, abraçada numa almofada, contando sobre seu novo relacionamento. Claire e Julia acrescentando comentários, visivelmente felizes pelo momento de vida da amiga, que há muito tempo não parecia tão bem.
O interfone avisou a chegada de Camille que, ao entrar trazendo um enorme embrulho, fez questão de enlaçar o pescoço de Luana e puxá-la para um beijo mais que quente, provocando a ira de Cristina e a diversão das outras amigas da namorada.
– Trouxe um presente pra você. Quer dizer... mais ou menos... O trabalho foi seu, apenas emoldurei. - Dito isso entregou o embrulho à mulher.
– Vem, quero apresentá-la às minhas amigas. - Puxou-a pela mão.
Camille, então, atravessou a sala exalando charme, com o sorriso mais doce que conseguiu.
– Tina você já conhece... ou melhor... já falou ao telefone.
– Oi. Como vai? - Fez menção de se abaixar para beijar-lhe o rosto, mas Tina estendeu a mão, que Camille apertou, educadamente.
– Claire e Ju.
As mulheres, então em pé, trocaram beijos e sorriram amistosamente enquanto Luana abria o embrulho que guardava a fotografia que ampliara, agora emoldurada. Camille escolhera justamente a primeira que Luana revelara, na qual estavam muito próximas, quase se beijando, com olhar cúmplice.
– Que linda. Ficou maravilhosa.
– Linda mesmo! - Comentaram as amigas, em uníssono.
– Adorei a moldura. - Agradeceu Luana, beijando-a outra vez suavemente, em felicidade aparente.
– Ah, amor, foi só uma coisinha. O trabalho foi seu.
Naquele exato momento, a música que tocava não podia ser mais devastadora, Cássia Eller cantava “Preciso dizer que te amo”
A música, a troca de palavras de amor e o segundo beijo foram a gota d’água para Tina, que se levantou sumindo na cozinha de Luana. Deixando para trás um clima estranho.
Precisava sair dali e respirar, antes que não conseguisse conter as lágrimas que, de um momento para o outro, pareciam querer saltar de seus olhos e destruir qualquer sobra de dignidade.
– Tina, o que é que está acontecendo afinal? - Ju encontrara a amiga parada de costas para a cozinha, na saída para área de serviço do apartamento, olhando para o vazio.
– Ai, Ju... - Não conseguiu mais engolir tudo. E sabendo que poderia confiar na amiga, virou-se deixando-a ver seus olhos marejados.
– Ai, não. Tina! Como é que isso foi acontecer? - Já abraçando a amiga, em mudo entendimento.
– Não sei. Não tenho nem ideia. - Desmoronou, encostada ao peito de Ju.
– Ah, minha querida...mas que droga, depois de todo esse tempo, foi descobrir isso agora?
– Eu que o diga. – Lamentou-se chorosa.
– Bom, agora não há o que fazer. Então, ao menos tente se controlar. Tá dando bandeira demais.
– Não consigo. Tô sem chão.
– Eu sei, mas é preciso. Antes de tudo você é amiga da Lu.
– M... porque fui descobrir isso tão tarde?!
– ... A vida é assim, minha querida. Não tem explicação.
– É como se eu estivesse numa montanha russa, em queda livre. - Desabafou, chorando.
– Tá dando pra ver.
– Eu odeio essa Camille.
– Ela não tem nada a ver com isso, Tina. Não tem culpa. Na verdade ninguém tem.
– Tá. Já sei. A culpa é toda minha. Sou uma idiota.
– Não, essas coisas acontecem. Só não desconte nela. Sei que dói, mas Lu está feliz, então você vai ter que aprender a lidar com isso.
– Não sei se vou conseguir. Por sorte ela vai viajar, assim não vou precisar vê-las juntas.
– É, até que vai ser bom que elas não estejam por perto até que consiga resolver isso.
– Não quero perdê-la, Ju.
– Não vai, mas vai ter que entender que não vai tê-la como gostaria. De nós, você sempre foi a mais próxima a ela. Ela a ama, mas como amiga.
– Eu sei, m... Só que não consigo mais vê-la só assim.
– O tempo vai ajudar. E vamos estar com você, Claire e eu.
Ficaram abraças mais um pouco, então Ju recomendou:
– Agora vamos limpar esse rosto, pegar um balde de gelo para levar pra sala, e você vai fingir que está tudo bem. Ficamos mais um pouco, depois a levo pra casa. Passo a noite na sua casa se quiser.
– Tá. Vou tentar. Mas se não conseguir, vou embora.
– Ok. Saímos juntas, na hora que você quiser.
Na sala, a conversa corria solta entre as três mulheres quando Tina e Ju retornaram com o gelo, sendo discretamente observadas pelas outras mulheres.
– Então, Camille, bebe alguma coisa conosco?- Perguntou Ju, tentado ser simpática com a namorada da amiga, mas dando suporte emocional para Tina.
– Vou seguir no uísque. – Atravessou-se Tina.
– Tá ótimo pra mim. - Acrescentou Camille.
Todas concordaram.
Durante a conversa que se seguiu, algumas vezes os olhares de Tina e Camille e de Tina e Luana se encontraram. Claire já suspeitando, e Ju já sabedora do constrangimento, imediatamente chamavam a atenção como se tentando evitar uma catástrofe.
Se pudesse, Tina teria atravessado a sala e pego a fotógrafa pelo pescoço. Depois sacudiria Luana, na esperança de tirá-la do transe. Mas a dor que sentia era quase paralisante, principalmente quando percebia no olhar da mulher, que conhecia tão bem, o brilho que nunca antes tinha visto.
Cada vez que se chamavam de forma carinhosa, por querida, ou amor, era como se enfiassem uma adaga em seu peito. Por sorte, depois de um tempo, Camille tinha deixado de fazer questão de esfregar em sua cara que estavam em pleno affair.
Fim do capítulo
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