Capítulo 3
Por volta do meio-dia, Tina tornou a ligar para Luana, e mais uma vez o celular chamou até cair na caixa postal. Insistiu novamente pouco antes das quinze horas, já irritada com a falta de consideração da outra de, sequer, atender ao telefone, depois de terem saído juntas na noite anterior, e tendo a outra deixado-as para correr atrás da fotógrafa.
Pouco antes das dezessete horas, a irritação havia dado lugar à preocupação, pois a amiga, com certeza, teria retornado suas ligações se pudesse, então voltou a ligar para seu celular. Caso continuasse sem atendê-la, entraria em contato com Julia e pediria para que ajudasse a procurá-la.
Desta vez, o celular foi atendido quase que prontamente.
– Oi, Tina.
– Oi. E Então? Conte tudo!
– Você está falando exatamente de quê?
– Não se faça de idiota... Do seu final de noite com a fotógrafa, ora.
– Ah, sim... O nome dela é Camille, Tina.
– Tanto faz o nome, conta logo.
– Bom, depois da galeria fomos jantar.
– E?
– Depois a levei em casa.
– Você dormiu com ela?!
– Não... Na verdade nem dormimos.
– Você transou com ela?!
– Não! Terminamos indo comprar jornais para ler as criticas e indo tomar café.
– Então não trans*ram?
– Não, Tina.
– Você mal conhece essa mulher...
– Por isso mesmo que não fomos pra cama... Mas conversamos muito durante o jantar... e até agora tudo que sei é que é uma pessoa fantástica.
– Se você não estava trans*ndo com ela, por que não atendeu ao telefone quando liguei antes?
– Porque tinha colocado no silencioso ao chegar em casa, pra ver se dormia um pouco.
– Hum... – Disse, desconfiada.
– Acordei agora há pouco. Nem saí da cama ainda.
– Você já almoçou?
– Não. Agora vou comer alguma coisa.
– Quer companhia?
– Não, obrigada... Você também não almoçou ainda?
– Dzz, lógico que já. Só queria saber se queria companhia.
– Agradeço, mas estou meio lenta hoje. Há tempos não dormia já dia claro.
Como Luana não deixou espaço para que se oferecesse para ir até seu apartamento, ou a convidasse para algo, não havia mais o que pudesse fazer.
– Tá, combinamos de nos reunir mais tarde na casa da Ju, se quiser aparecer.
– Hoje não... fica para outra vez. Dê beijos nas meninas por mim.
– Ok, darei. Mais uma pergunta.
– Qual?
– Vocês vão se encontrar de novo?
– Sim, combinamos de jantar na sexta. – Luana não mentiu completamente, apenas escondeu que encontraria Camille em algumas horas para irem ao cinema.
– Bom, até lá nos encontramos e você me conta essa história toda direitinho. – Sentenciou Tina, achando que Luana lhe escondia algo.
– Tá bem, mamãe...
– Sim, já que alguém precisa te dar uns conselhos... terei de ser eu mesma.
– Sim senhora.
– Tá, vou desligar. Tenho outras coisas pra fazer além de cuidar de coroas sem noção.
– Ok, beijos pra você também, querida.
– Arg!... Beijos. – Tinha vontade de sacudir a outra pelos ombros, tão irritada estava. Mas sabia que precisava se controlar, e tirar aquelas ideias malucas da cabeça.
Como já havia combinado com as outras amigas um encontro na casa de Júlia, criou coragem para levantar e colocar algumas coisas em ordem, antes de se preparar para sair.
Evidentemente,o primeiro assunto em pauta na casa da amiga foi o possível envolvimento de Luana com a fotógrafa, mesmo porque Claire fez questão de mostrar em alguns sites as fotos da noite do vernissage, e em muitas delas,Camille fora fotografada ao lado de Luana.
Ver as imagens da amiga ao lado da morena de olhos esverdeados deixou Cristina com mais dor de cabeça ainda, além de afetar sensivelmente seu humor, fazendo com que as amigas achassem graça, sem entender o porquê de tanta implicância, afinal, fora a própria Tina que insistira em arrastar Luana para evento, para tirá-la de casa e talvez conhecer alguém.
A semana seguinte passou voando. Cristina atarefadíssima com a elaboração de dois projetos de viabilidade econômica e reuniões para captação de recursos com gerentes dos bancos financiadores de projetos.
Acordando cedo e chegando em casa muito depois do horário normal de expediente, Tina não pôde se dar ao luxo de visitar Luana, falaram-se apenas por telefone no meio da semana, e apenas por alguns minutos, sem que a escritora tivesse dado qualquer detalhe sobre o relacionamento com a fotógrafa, o que já era indício suficiente para que a amiga percebesse que algo estava acontecendo, não fosse assim, por certo Luana teria tecido algum comentário sobre Camille.
Somente no final de semana pôde investigar a vida da amiga, tendo ligado algumas vezes na noite da sexta, sem ser atendida, e mais uma vez no sábado.
– Pode ir contando tudo. – Atacou, antes mesmo de cumprimentar a amiga.
– O quê?
– Já sei que você saiu com a fotógrafa ontem de novo. – Atirou, imaginando que a recusa em atender ao telefone na noite anterior tivesse se dado porque estava acompanhada.
– Estamos indo pra França, no próximo sábado. – Disparou,Luana, sem pensar.
– O quê? Como assim? O que isso quer dizer? Ela está aí com você?
– Sim. Camille precisa ir a Lion a trabalho. Então, vou com ela. – Anunciou.
– Enlouqueceu?! Vocês mal se conhecem... Claro que pelo visto o sex* deve ter sido fantástico, mas daí para atravessar o Atlântico com ela. – Atirou, furiosa, em completo desespero.
– Justamente por causa disso. Queremos nos conhecer melhor... Mas acho que podemos conversar sobre isso outra hora. – Tentou encurtar o assunto.
– Não. Você enlouqueceu mesmo! Vocês usaram drogas? Está onde?
– Também achamos que pode ser loucura, mas vamos nos arriscar a descobrir. – Riu imaginando a cara da amiga.
– Luana. Ela está na sua casa agora? Estou entendendo direito? Ela dormiu na sua casa, e vocês vão pra França? Não, agora tenho certeza... Você está louca ou drogada.
- Tina, não seja alarmista. Estou bem. Tem sempre uma primeira vez pra tudo... Inclusive Camille está aqui ao meu lado, pedindo que lhe agradeça por ter me levado à galeria aquela noite.
Os gritos de Tina foram ouvidos até por Camille, que caiu na risada, acompanhada por Luana.
– Você tá bêbada? Essa mulher deu alguma coisa para você cheirar ou beber... Você não é a Luana que conheço. Estou indo aí. E trate de abrir a porta, do contrário a coloco abaixo. Vou ligar para as meninas para que me encontrem aí. – Perdeu completamente o juízo, impondo a presença.
– Tina! Menos, bem menos. Não faça alarde. Estou bem. Por sinal estou muito bem. E não venha sem ser convidada, vamos sair daqui a pouco. Quando puder ligo, e conversaremos mais. – Cortou, já incomodada com a intromissão de Tina.
– Lu, você está me deixando assustada... Chego aí o mais rápido possível. Não saia daí.
– Oi, Tina? É Camille, desculpa... Só para tranquilizá-la. Entendo sua reação, se fosse minha amiga com certeza imagino que faria o mesmo.
– Oi. Olha, não sei quem você é, o que realmente quer, mas vou logo avisando, amo Luana como a uma irmã e não vou permitir que ninguém brinque com os sentimentos dela. Portanto não pense que pode fazer o que quiser e que ficará por isso mesmo. – Ameaçou, esperando que a outra entendesse o recado, e se intimidasse.
– Tina, não tenho a mínima intenção de brincar com Luana. Estamos nos conhecendo. As coisas estão acontecendo rápido demais... Também estamos assustadas com isso, mas não queremos fugir. Preciso ir a Lion a trabalho. Não tenho como desmarcar. Devo permanecer uns quarenta dias. Só que nos encontramos, e agora precisamos de um tempo juntas, então pedi a Lu que viajasse comigo.
– Peça a Luana que me ligue assim que puder. Então conversaremos pessoalmente. Ju e Claire vão querer ouvir isso também.
– Tudo bem. Acho fantástico que ela tenha amigas como vocês. Queria ter a mesma sorte. – Tentou ser simpática.
– Bom, acho que gostaria de me despedir de Luana antes de desligar. – Respondeu de forma grosseira, sem dar margem à outra para que tentasse uma aproximação.
– Claro, vou passar para ela.
– Oi... que ótimo vocês terem se conhecido dessa forma, e já discutido sobre a minha vida particular como se eu não fosse a principal interessada e responsável por ela. – Finalmente esbravejou Luana ao voltar a falar.
– Vou matar você. Quem mandou passar o telefone para ela?! Vou aguardar que esteja sozinha e me ligue para que nos encontremos para que possa trazê-la de volta à realidade. Vou esperar até amanhã. – Desligou furiosa.
Segundos depois, ligou para Claire e para Julia, para contar o que acabara de ouvir. Para aumento da irritação, as amigas acharam ótimo que Luana estivesse disposta a viajar com a mulher, pois era sinal de que estava apaixonada pela fotógrafa, ou pelo menos que se permitira viver uma aventura.
Sem o apoio das amigas, Tina entendeu que o melhor era tentar se distrair, e nada melhor que se jogar no trabalho para não pensar mais em nada. Terminou indo para o escritório e se dedicou à elaboração dos processos durante boa parte do dia. Apenas dando uma pausa por volta do meio dia para comer algo pedido por telefone.
No meio da tarde resolveu que já era hora de voltar para casa, mas acabou desviando do caminho e, apanhando Julia e Claire,para que fizessem uma visita surpresa à Luana, mas ao chegarem ao prédio, foram informadas pelo porteiro que a escritora não estava. Tina,decidida a não se dar por vencida, ligou novamente para a mulher para descobrir onde tinha se socado.
– Onde você está, que não está em casa?
– Não acredito que você foi em casa sem me ligar antes...
– Desde quando precisei ligar antes de visitá-la?
– Desde que te disse que não estava sozinha.
– Tá, não chateia, onde você está? Eu e as meninas estamos em frente ao seu prédio.
– Estou na casa da Camille, e não tenho hora pra voltar pra casa.
– Ai meu Deus, esqueci que lésbicas namoram, vão pra cama, e já resolvem morar juntas, depois do segundo encontro. Disse, sarcástica, bem sabendo que a amiga não tinha esse perfil, ao contrário, seus relacionamentos normalmente fracassavam pela postura inversa.
– Da próxima vez que resolverem aparecer, liguem antes, para que não percam a viagem. – Respondeu, secamente, começando a ficar incomodada com a invasão.
– Muito bem... depois não reclame que ninguém se preocupa com você.
– Nunca reclamei. Boa noite, Tina. Amanhã ligo pra você. Prometo. Beijos.
– Tá. Qualquer coisa ligue. – Respondeu, amuada.
– Pode deixar, está tudo bem. Boa noite.
– Tchau.
- Prometeu de ligar amanhã. – Informou às amigas, que assistiam à cena da amiga ao telefone.
Fim do capítulo
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