Capítulo 7. Inesperado
-- Allison? -- A voz de Alice soou baixa, como se estivesse falando consigo mesmo.
Allison deu um passo à frente, ela observava Alice tanto quanto era observada. O frio na barriga se tornou uma sensação compartilhada entre elas, ambas nervosas e ansiosas por estar conhecendo uma a outra. Eduardo permaneceu calado, não precisava de apresentações verbais naquele momento.
-- Eu pensei em como seria te conhecer. Mas não achei que me sentiria assim. Você se parece tanto comigo. -- Allison tomou a iniciativa, seu português não era tão ruim, uma vez que o pai pagava aulas de português para a filha desde os cinco anos.
Alice não sabia o que dizer. O fato de conhecer uma irmã que nunca havia visto mexia com suas emoções. Ela desviou o olhar por poucos segundos e viu Emily gesticular com as mãos e com um sutil movimento da cabeça e dos lábios “--Vai...”.
-- Na verdade, você se parece comigo. Eu sou mais velha. -- Alice brincou fazendo com que sua meia irmã sorrisse.
-- Quantos anos você tem?
-- Vinte e cinco. Você deve ter uns..,Vinte e três? -- Alice supôs, e logo estranhou a risada que a meia irmã deu.
-- Eu pareço tão velha assim? -- Até a risada de Allison era perfeita. Essa mulher não podia ser real, não na concepção de Emily que apenas observava a conversa.
-- Ela tem apenas dezoito. -- Eduardo adentrou na conversa.
-- Dezoito? -- Alice estava perplexa, não podia imaginar ter uma irmã tão “nova”. -- Então você deve ter acabado o ensino médio agora.
-- Ensino médio? O que é isso? -- Allison parecia confusa.
-- É o que vocês chamam de High School, aqui é chamado de ensino médio. -- Explicou Alice.
-- Eu terminei há pouco tempo.
-- Meninas desculpa interromper, mas eu preciso ir. Eu só vim deixar sua irmã aqui. Sua mãe está me esperando para o jantar. Amanhã eu passo para levá-las a algum lugar. Vamos mostrar a cidade para a Allison... O que você acha? -- Eduardo se aproximou dando um beijo na testa de cada filha. Alice apenas concordou com a cabeça.
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-- Só temos um problema. -- Alice levantou do sofá após terminarem de ver um filme. – Eu só tenho duas camas. A minha e a de visitas. Ou seja... -- Alice olhou para a amiga que logo entendeu o recado.
-- Pode deixar, eu durmo no sofá. -- Emily pegou as taças de vinho vazias em cima da mesa de canto e levou até a cozinha. -- Vou ter um cobertor pelo menos?
-- Então... -- Alice fez uma careta, ela não tinha mais de dois cobertores.
-- Um travesseiro que seja? -- Alice riu e negou com a cabeça.
-- Você pode ficar com o meu. -- Allison que apenas observava quando finalmente se pronunciou. -- Eu não uso mesmo.
-- Até parece que vou te deixar sem travesseiro. -- Alice observou o jeito como Emily olhava e falava com a sua meia irmã e estreitou os olhos para a amiga, ela não podia acreditar que Emily estava se jogando em cima da irmã.
-- Eu realmente não uso. -- Allison estava decidida a dá-lo para Emily. Ela odiava dormir com travesseiros.
Quando a jovem percebeu o olhar que Alice lançava sobre ela suas ações mudaram completamente, ela aceitou e sem dar muitas voltas agradeceu à Allison.
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Já era madrugada quando Allison se levantou para ir à cozinha, dando de cara com Emily que se encontrava encostada na pia, com um copo de água em mãos. Emily assustou-se ao ver que a jovem só usava a regata branca e uma calçinha, pensou em cobrir os olhos, mas não tomou tal atitude.
-- OH MY GOD! -- Allison quase gritou ao ver o vulto de Emily, a luz estava apagada e ela não imaginava que a garota podia estar acordada.
O corpo de Emily saltou ao ouvir o desespero da jovem, ela não esperava tal reação.
-- Desculpa, eu não... -- Emily tentava se desculpar, mas não sabia o fazia por vê-la naqueles trajes ou por tê-la assustado.
-- Achei que estivesse dormindo! Você me assustou.-- Allison interrompeu, mas continuou seu percurso até a geladeira. Era óbvio que ela não estava envergonhada por estar só de regata e calçinha.
Emily pensou em se desculpar de novo, mas não queria agir como uma criança, desculpando-se de cinco e cinco segundos.
-- Perdeu o sono também? -- Emily pegou um copo no armário e o entregou a Allison que já estava com a jarra de água em mãos.
-- Para falar a verdade, não consegui nem dormir ainda. -- Allison tomou um gole da água e recostou ao lado de Emily.
-- Seria abusivo se uma quase estranha te perguntasse o motivo? -- Emily se negou em pensamento após perceber a forma boba como havia falado. -- Que idiota. -- Pensou.
Um sorriso inseguro se formou no rosto de Allison.
-- Acho que deve ser a diferença de horário. -- Mentiu.
-- Nós podemos jogar no vídeo game da Alice se quiser, ou conversar, não sei. -- Emily ganhou confiança em si mesma ao notar o sorriso que novamente provocou em Allison.
-- E se ela acordar? -- Allison olhou-a, arqueando as sobrancelhas.
-- Ela só acordará se você for uma mal perdedora e começar a reclamar. -- Emily riu, gabando-se de si mesma.
Allison fitou a jovem, incrédula nas palavras de Emily. Mordiscou o lábio inferior e retrucou em seguida.
-- Vou encarar isso como um desafio. -- Allison deu um passo em direção a Emily, ficando muito próxima da mesma, seus olhos se encontram e a jovem sorriu. -- E quem vai perder é você. -- O dedo indicador de Allison tocou o busto de Emily que logo compartilhou do sorriso e do olhar desafiador.
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-- Não acredito! Você me ganhou de novo! -- Allison resmungava enquanto dava leves tapas no braço de Emily. -- Como você faz isso? Pode falar, está trapaceando!
Emily apenas olhou-a e sorriu. Os tapas eram de brincadeira, tão fracos que ela mal podia sentir.
Ficar tão próxima de uma menina como Allison deixava Emily sem palavras, seus gestos se resumiam em sorrisos e olhares entre uma partida de FIFA e outra. Ela observava a forma como Allison carregava o controle de um lado para o outro, como se fosse guiar o jogador com esses movimentos, observava até mesmo a expressão indignada que a adversária fazia involuntariamente quando perdia a bola ou quando levava um gol, ou o sorriso que dava quando conseguia chegar até a área de ataque. Seu sorriso formava pequenas covinhas na bochecha, o que Emily admirava com tanta frequência.
-- Eu não estou trapaceando! Você fica me dando carrinhos e acaba com quase todos os jogadores expulsos, o que posso fazer?!
-- Que exagero, eu não dei nenhum carrinho. -- Reclamou com sarcasmo.
Allison caiu na gargalhada junto com Emily, mas esse momento de felicidade não durou muito. O celular de Emily tocou, estava na mesa de canto ao lado do sofá onde estavam. A jovem o pegou e assim que viu o número que ligava pôs o celular no silencioso, era Anne. Ela Provavelmente queria tentar se explicar novamente, ou quem sabe chorar com a amiga como sempre fazia quando era magoada por alguém, ignorando todas as mágoas que ela mesma causava à Emily.
Ao decidir não atender Emily não se sentiu feliz, mas também não se sentiu mal. Ela estava com uma nova amizade que a fazia bem e não queria correr o risco de se abalar com as palavras de Anne, não agora que estava de volta a cidade, não agora que finalmente não se sentia tão presa a essa paixão. O que antes era o fim de mundo para a jovem, agora não passava de uma coisa comum e “quase” insignificante.
-- Pronta para perder a próxima? -- Allison tentou descontraí-la após notar a forma como Emily estava após ignorar a ligação, pensou que pudesse ser um ex-namorado ou coisa do tipo. Algo que provavelmente ainda estivesse magoando a nova amiga.
-- Para PERDER? -- Emily enfatizou. -- Você deveria sugerir um filme para não ser ainda mais humilhada. -- A jovem sorriu para Allison, deixando-a mais tranquilizada.
-- Poderíamos, por favor? -- Allison riu, tudo que ela queria era não perder mais uma partida.
Allison e Emily escolheram um dos filmes que estava no estande ao lado dos livros, era um suspense. Não demorou muito até que Allison pegasse no sono e recaísse sobre o colo de Emily. A jovem levantou as mãos que estava sobre as pernas para que a amiga pudesse ficar mais confortável, em seguida pôs um dos braços por cima da barriga de Allison, foi um movimento furtivo e suave, ela não queria acordar a menina que finalmente havia pegado no sono. Emily deixou o filme correr, mas daquele momento em diante ela não conseguiu mais prestar atenção. Recostou a cabeça no sofá e pôs a outra mão sobre o rosto, embora ter Allison ali fosse incrível, seu pensamento ousava voltar na ligação de Anne, na lembrança da sua voz e consequentemente no teu rosto. Emily considerava Anne uma ótima amiga, mesmo que houvesse sofrido muito nas mãos daquela amizade antigamente colorida. Antes do beijo elas eram inseparáveis, andavam juntas para todos o lugares, se entendiam até pelo modo como olhavam uma para a outra. -- Como algo podia ter simplesmente se esvaído para o ar? -- Emily não conseguia entender porque havia sido tão difícil para Anne manter essa amizade, ela não se importava em ter só a amizade dela, mas de algum jeito tudo que Emily falava soava como algo relativamente insuportável aos ouvidos de Anne, que insistia em dizer que a amizade tinha mudado, que Emily sentia ciúme de tudo e todos.
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-- Você não pode estar falando sério... -- Os olhos de Emily marejaram, mas ela abaixou sua cabeça, não podia deixar que a jovem a visse nessas condições. -- Ele vai acabar te magoando.
-- Emily, como pode falar assim? Você o conhece tão bem... -- Emily interrompeu alterando seu tom de voz.
-- E é por isso que eu posso afirmar isso com tanta certeza. -- Ela segurou a mão da amiga em um ato feroz, rápido. -- Acredite em mim, é tudo que eu te peço. -- O coração de Emily doía fisicamente, ela o sentia retrair com tanta força no peito que teve até medo de passar mal. Mas ela sabia que não passaria, esse sentimento era comum, era angustia, chateação, perda. Seus olhos ardiam na medida em que ela prendia o choro, até que seu rosto ficou rubro, tonando-se impossível negar tanta dor.
-- Eu o amo.
Aquelas palavras soaram como laminas cortantes no coração da jovem. Seu corpo fraquejou permitindo que lágrimas escapassem de seus olhos. Emily correu e deixou a casa de Anne em uma velocidade inacreditável, mas sua força não durou muito tempo. Assim que cruzou a primeira esquina Emily encostou em um poste, e decaiu até se ajoelhar no chão, ela não tinha mais forças para lutar contra a dor que sentia, aquelas palavras destruíram-na por dentro, seus braços apoiaram-se no chão e o choro se fortaleceu, fazendo-a soluçar entre uma lágrima e outra.
Emily acordou em estado de aflição, suas mãos suavam e sua pele estava gelada, ela podia jurar que por algumas poucas frações de segundo ela sentiu as pontadas no teu coração novamente. Demorou algum tempo até que Emily se estabiliza-se, e quando o fez percebeu que Allison não estava mais no teu colo. Olhou em volta e não viu ninguém, pegou o celular em seguida e percebeu que ainda era cedo, e embora soubesse que não conseguiria voltar a dormir, apenas se deitou, ocupando todo o espaço do sofá. O perfume de Allison estava por toda a parte.
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Era sábado de manhã, Emily já havia voltado para casa para se despedir da sua mãe que estava de malas prontas para ir à São Paulo, ela tentaria fechar contrato com um novo cliente. Em tempos passados, Emily sairia com os amigos para algum lugar onde pudessem comprar bebidas sem apresentar o documento de identidade e beberiam em algum lugar perto de algum centro onde as pessoas mais velhas se reuniam para beber, mas agora tudo que a jovem queria era aproveitar a própria companhia. A tarde passou depressa e um dos filmes que ela havia assistido, “curtindo a vida adoidado”, a fez pensar no que poderia acontecer naquela noite em que a casa era só dela, uma festa de boas vindas não lhe parecia uma má ideia.
Emily pegou todos os antigos números dos amigos e enviou-lhes uma mensagem convidando todos para a festa de ultima hora. Com a ajuda de Alice, uma média de oitenta pessoas haviam sido convidadas. Cada um ajudaria com vinte reais para colaborar com as bebidas, pois a comida seria bancada por Emily e Alice.
Os preparativos começaram por volta das dezoito horas. Foi até mais rápido do que elas imaginavam, antes das nove da noite tudo estava pronto. Emily havia convidado Anne, e embora ela não tivesse dado certeza de que iria, a esperança prevaleceu. Ela já havia perdoado o furo da amiga, não costumava guardar rancor dessas coisas.
Alice havia levado a meia irmã, que não havia dado muito papo para Emily a festa inteira, e mesmo não fazendo sentido essa atitude, ela não se importou muito. Estava rodeada de amigos que não via a tanto tempo que não conseguia manter a atenção em uma única pessoa.
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Já passavam das duas da manhã e a festa corria tranquilamente, a maioria das pessoas já estavam altamente alcoolizadas e nada de Anne.
Emily foi até o banheiro para lavar as mãos que se encontravam gordurosas por causa da carne do churrasco e lá se deparou com Allison sentada sobre a pia, ela estava olhando fixadamente para a parede branca e rugosa.
-- Você está bem? -- Emily se aproximou, interceptando a visão dela, mas Allison nem sequer piscou.
Em poucos segundos Emily viu na jovem o que antes ela costumava fazer inconscientemente quando se sentia triste e logo a cutucou.
-- Acorda! Olhando desse jeito a parede vai até ganhar vida. -- Emily riu.
Allison finalmente deu um sinal de vida ao chacoalhar a cabeça, percebendo a presença da menina.
-- Desculpa eu... -- Allison respirou fundo e prosseguiu. -- Eu estou um pouco tonta. -- Ela desceu da pia.
Emily enfiou as mãos na água gelada e antes que pudesse secá-las Allison decaiu, esbarrando em Emily que quase caiu junto, mas por não estar de fato bêbada ela conseguiu segurar a jovem.
-- Opa. -- Sua voz soou baixa. -- Acho que você precisa ir para um lugar mais calmo.
O braço de Emily cercou a jovem, enquanto na outra mão estava o seu copo de vodka. Ela a levou, servindo como apoio, até o seu quarto, onde deixou-a na cama. Allison parecia ter dormido no instante em que deitou na cama, fazendo com que Emily acelerasse seu processo de retorno a festa. Ela estava se afastando da cama quando a voz de Allison soou quase sem som:
-- Stay, please. (fica, por favor.)-- Allison esbarrou a mão na perna de Emily na tentativa de puxá-la pela alça da calça, mas seus braços estavam moles e desorientados.
Emily se sentou ao lado dela pondo as mãos flexionadas ao redor de Allison na cama.
-- Você não deveria beber tanto. -- Emily aconselhou. -- Amanhã nem se lembrará das coisas que fez hoje, das pessoas que conheceu.. -- Emily olhava-a atentamente, estava preocupada com o estado dela.
Emily passou a mão pelo rosto de Allison, retirando uma mexa de cabelo que caia sobre o teu rosto. A meninnaentreabriu os olhos e pondo uma das mãos na nuca de Emily puxou-a para mais perto, seus rostos quase se colaram. Em sussurros Allison afirmou:
-- Disso eu sei que não vou esquecer. -- Os lábios de Allison tocaram os de Emily, e embora o gosto de vodka na sua boca estivesse muito forte, suas línguas entrelaçaram-se com harmonia.
Era perfeitamente aceitável que o excesso de álcool no sistema de ambas deixasse-as bem mais ousadas que o normal, mas as mãos de Allison tocavam Emily de forma sucinta e carinhosa. Allison percorreu todo o corpo de Emily com as mãos, ela buscou tocá-la na bunda, mas tudo que suas mãos alcançaram foram a cintura da menina. Emily reduziu a distancia entre elas ao dobrar os braços, encostando-os sobre a cama. Seus corpos colaram. Emily beijou o rosto de Allison até que chegasse ao alcance do seu pescoço, parando por alguns segundos quando sentiu as unhas de Allison passarem por suas costas, fazendo-a arrepiar.
No silêncio que dominava o quarto, somente os sons dos lábios colidindo com o pescoço de Allison e sua respiração que ficava ofegante a cada beijo eram ouvidos. Até o instante em que o som da maçaneta se abrindo eclodiu nos ouvidos de Emily, tão alto que parecia muito mais um portão rangendo. Foi só a porta se abrir que todos os outros sons do mundo voltaram junto com a ultima pessoa que Emily imaginaria ver naquela noite. Ela rapidamente se afastou de Allison, direcionando seu olhar aflito à porta.
-- Sinto que interrompemos alguma coisa. -- Alice olhou para a amiga com os olhos espantados. Sua cara fechou ao ver que a garota com quem Emily se encontrava aos beijos era a sua meia irmã.
-- Eu estava só cuidado da Allison, ela bebeu de mais. -- Emily cuspiu as palavras de tão rápida que foi ao tentar se explicar.
-- E cuidou muito bem. -- A voz de Anne, que estava ao lado de Alice soou neutra, mas seus olhos demonstravam um pouco de ciúme, ou até mesmo raiva, era complicado para Emily deduzir o que se passava no rosto da amiga, ela não conseguia decifrar o que não reconhecia mais.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Marcinha
Em: 22/10/2015
Agora pode parar de se esconder e voltar???
Hahaha...
Com saudades da História já... :(
Resposta do autor:
Olá Marcinha, minhas sinceras desculpas pela demora.
Estarei disponibilizando os capitulos assim que possível, espero que possa continuar acompanhando. Um grande beijo!
Sem cadastro
Em: 10/09/2015
EU AMO ESTA HISTÓRIA CARA
Resposta do autor:
É um prazer enorme saber disso Silva, em breve estarei disponibilizando novos capitulos, espero que possa acompanhar.
Um grande beijo.
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