Capítulo 4. Acerto de contas
"-- Alice, o que você pensa que está fazendo?! -- Emily estava furiosa e gritava com a menina."
-- Por favor, depois eu te explico, só um beijo. -- Alice tentou beijá-la novamente, mas foi rejeitada.
-- Não tem essa de depois eu te explico. Você só pode estar maluca. Primeiro aquele desafio do beijo com Anne, e agora você quer me beijar? Está achando que é só chegar e puf, me agarrar desse jeito? -- Emily estava claramente frustrada e irritada com a situação, ela não podia acreditar que aquela menina, dois anos mais velha, e que era a responsável pela confusão de sentimentos que agora Emily sentia por Anne, estava agarrando-a em meio àfesta junina do colégio.
Alice já havia causado problemas de mais para Emily. O desafio do beijo feito háduas semanas tinha cessado as chances que Emily tinha com o rapaz com quem tinha um rolo desde o início do segundo ano, Kevin. Na manhã da primeira segunda feira após a festa onde Emily e Anne se beijaram o assunto já corria pelos corredores do colégio, foi só questão de tempo até cair nos ouvidos do rapaz, que ficou indignado. Todos da escola pareciam saber que ele havia sido traído por Emily, e o pior, com uma garota. Kevin realmente gostava da jovem, ele havia prometido esperar pelo momento em que Emily estivesse pronta, e o fez por mais de um ano. Os dois eram ótimos amigos, amigos que se beijavam, e apenas isso bastava para a jovem. Emily nunca havia pensado nas necessidades sexuais do namorado, para ela o fato de ter dito não na primeira tentativa que ele teve de dormir com ela funcionaria como o tratado de Tordesilhas, eles resolveriam seus problemas corporais - territoriais a partir dali. Boca pode. Vagina não. E assim seria. Além desse problema, Alice já havia acabado com outros rolos de Emily, mesmo indiretamente. As duas sempre tiveram uma rivalidade quanto às opiniões e isso era totalmente visível em quase todos os debates em sala de aula, e também na conversa entre amigos. As duas sempre terminavam com uma briga, eram como cão e gato. Daí o fato de Emily ficar tão irritada com a atitude da menina.
-- Emily. -- Os olhos pidões de Alice desconcertam a jovem.
-- Não me venha com esse olhar. Você nunca me fez um favor, porque eu devo lhe fazer um sem nem mesmo saber o motivo? -- Emily tentava não ceder à vontade da garota.
-- Eu desafio você. -- Alice se enrolou ao falar as pressas, ela sabia que a “rival” não suportava ser desafiada. Emily tinha um problema sério com desafios, ela não sabia como dizer não nessas horas.
Alice envolveu as mãos no cabelo da jovem e a deu um beijo sedento. Ela sabia que Emily não apresentaria resistência após um desafio e ela se aproveitou disso. Os lábios se entrelaçaram sem harmonia e o gosto de álcool da boca de Alice deixava a jovem desconfortável, passou pela cabeça de Emily abandonar aquele beijo instantaneamente, mas ela sabia se o fizesse seria provocada. Embora rivais, Alice inexplicavelmente sabia inúmeras coisas sobre Emily e tirava vantagem disso em todas as brigas.
-- Emily Harley e Alice Butckovisky, por essa eu não esperava! -- Leônidas disse em um tom imponente. -- As duas na sala da diretoria em cinco minutos! -- A expressão de Leônidas, o coordenador do colégio, era séria. Sua ordem foi seguida a risca, as jovens estavam sem palavras, incrédulas que tinham sido flagradas.
O coordenador se aproximava da sala junto com a diretora, Elizabete, quando ouviram gritos vindos de dentro.
-- É tudo culpa sua! De novo para variar! -- Emily gritava com tanta intensidade que seu rosto ficava vermelho à medida que cada palavra saia de sua boca, seu pescoço ficava marcado pelos traços do grito. Sua voz era um pouco rouca e falhava quando aumentava muito o tom, mas isso não a impediu. -- Se eu for expulsa do colégio eu juro que acabo com você! -- Emily andava em direção a Alice quando ouviu o som da maçaneta e em um único movimento recuou.
Alice precisava admitir que em anos de “pequenas” brigas com Emily nunca havia visto a jovem tão irritada, e vê-la dessa forma a fez paralisar, nem uma palavra foi dita para retrucar. “Será que o beijo foi tão ruim que não vale uma advertência?” -- Alice pensou.
-- Seus pais já estão a caminho. – Leônidas entrou na sala, informando-as. Junto dele estava Elizabete, aparentando estar furiosa por ser incomodada em uma festa da escola.
Somente após ouvir o coordenador é que a ficha de Alice caiu, uma situação como essa não seria resolvida apenas por uma advertência posteriormente assinada pelos pais, mas sim por uma conversa direta com eles. Agora estava obvio, Emily estava realmente irritada, pois provavelmente estaria em maus lençóis, uma vez que esse seria o segundo incidente com uma garota.
Para Emily essa seria a ultima carta do baralho para que sua mãe soubesse da sua opção sexual, coisa que nem ela havia decidido ainda, já que há duas semanas ainda estava apaixonada por Kevin. “--Mas aonde foi parar esse sentimento?” -- Emily refletia sobre isso toda vez que esbarrava com Kevin pelo corredor das salas.
-- Sentem-se, por favor. -- Elizabete ordenou, interrompendo todos os pensamentos das jovens. Ela se sentou na borda da mesa e mostrou-as seus assentos, indicando-os com a mão. Elas logo se sentaram -- O que vocês fizeram foi algo muito sério.
Alice se manifestou,defendendo-se.
-- Qual é! Não foi tão sério assim. Os meninos vivem agarrando as meninas pelos corredores. -- Alice observou Emily, notando as mãos trêmulas e o silêncio mórbido da jovem. Emily estava tão fora de si há alguns segundos, e agora estava ali, calada, como se estivesse com o pensamento longe.
“-- Isso é verdade”-- Pensou Elizabete, quase que instantaneamente.
-- Mas vocês são meninas. -- Alegou o coordenador -- E eles nunca foram flagrados. -- Completou.
Alice pressionou os lábios e o encarou assim que percebeu o preconceito do coordenador. Desviou o olhar e caminhou até as proximidades de Elizabete.
-- Elizabete, você é diretora desse colégio a mais de cinco anos, deve conhecer bem as regras impostas pelo corpo docente. Certo? -- Elizabete confirmou com um balançar de cabeça. -- Bom, meus pais, por serem ótimos advogados, sempre me fizeram ler todas as regras dos lugares aonde eu frequento, então eu também tenho algum conhecimento sobre isso. E eu não me lembro de ter visto uma regra contra beijos, não importa de que tipo -- Enfatizou. -- Em festas onde é permitida a entrada de não estudantes. Estou correta? -- O olhar da jovem era intimidador.
Alice se orgulhava tanto da profissão dos pais, que defendiam os direitos das pessoas, que pretendia seguir os mesmos passos. Com o incentivo frequente dos pais a menina sempre ganhava livros que abordavam o assunto e as conversas na hora do jantar eram sempre focadas em ensinar a filha a argumentar. Para os pais de Alice, esse era o fator principal para se tornar um bom advogado: buscar os pontos certos de relevância e usá-los ao seu favor.
-- Eu sei aonde você quer chegar com isso, Alice. -- Elizabete respondeu a altura. -- E posso te garantir que não vai conseguir muita coisa.
Elizabete estava acostumada com subornos dos pais responsáveis, mas nunca havia se submetido a uma ameaça, principalmente feita por uma aluna.
-- É ai que você se engana. -- Alice sorriu persistente. -- Eu aposto que consigo um processo por danos morais e preconceito. -- Ela caminhou de um lado para o outro. -- E com o apoio dos meus pais, que eu logicamente terei. Você e muitos dos membros dessa escola -- Nesse instante Alice encarou Leônidas, como se o ameaçasse também. --Estarão em maus lençóis. E se tudo ocorrer bem para vocês, talvez vocês ainda possam exercer a profissão. Ou não. -- A jovem falava com convicção, uma vez que sabia que seus pais a apoiariam, pois para eles, Alice já havia assumido a sua opção sexual. E no caso da sua família, essa escolha não era de um todo “nova”, uma vez que duas de suas seis tias eram lésbicas.
-- Isso é uma ameaça? -- Elizabete estava indignada com a atitude da aluna.
-- Não, Elizabete. Com todo respeito, isso é uma verdade.
Por alguns instantes a diretora se calou perante a jovem, ela reconheceu que os fatos estavam a favor de Alice. E embora se sentisse desafiada pela aluna, ela a admirou pela coragem e jogo de cintura. Aproveitando o silêncio da diretora, Alice finalmente chegou ao seu objetivo.
-- Eu não acho que isso precise ser comunicado aos nossos pais, não é mesmo?
Emily a observou, e pela primeira vez, admirou o poder de persuasão que Alice tinha sobre os fatos. Quando esses não eram usados contra ela, era até bonito de se ver. Emily compreendeu a intenção da rival e se pronunciou:
-- Eu acho que me senti ofendida com essa situação também. -- Emily entrou no jogo de Alice, dando-a apoio.
Os advogados Butckovisky eram muito bem reconhecidos pela AOB em todo o país, e até fora do país. O fato de conhecer a história deles fez Elizabete repensar a atitude, ela sabia que o colégio seria bombardeado de maus adjetivos, e isso lhe custaria a carreira. A diretora recolheu suas palavras, e organizou os pensamentos. Leônidas também se sentiu ameaçado pela aluna, ambos reconheciam o erro.
-- Leônidas vá à secretaria e ligue para os pais. Diga a eles que houve um engano.
O contentamento de Emily foi tão grande que a jovem quase saltou da cadeira. Ela respirou fundo, tentando manter o controle, e se levantou devagar, caminhando em direção à porta. Alice a acompanhou.
-- Alice! -- Elizabete a advertiu. -- Você será uma boa advogada. --Ela sorriu, aceitando a derrota.
A jovem, que estava a meio passo atrás de Emily, não conteve a empolgação com o elogio e segurou a mão da rival, apertando-a levemente, deixando escapar um sorriso de missão cumprida e orgulho próprio, mas esse sorriso logo se esvaiu quando Emily deu de ombros e largou a mão de Alice, olhando-a seriamente, como se ainda quisesse matá-la, afinal, para Emily, a atitude de livrá-las daquela situação não foi mais do que a obrigação de Alice.
-- Isso não muda nada. -- Emily deixou as palavras escaparem enquanto se afastava.
Emily caminhava para fora do colégio, quando ainda na portaria foi abordada por Kevin que a puxou pelo braço, o rapaz parecia estar fora de si e não controlou a força que usava, machucando-a.
-- A Anne apenas não bastava? -- Ele a chacoalhou.
-- Kevin, você está me machucando! -- Emily sentiu o apertar da mão de Kevin, e aquilo doeu bastante.
-- O que você é agora? A sapatão do colégio? -- Kevin estava inconformado com o fato de a ex-namorada estar se agarrando com todas as meninas do colégio.
-- O que? Não.. -- Emily negava tudo.
-- Como não? Eu vi vocês duas! Você e Alice. -- O rapaz apontou-lhe o dedo no rosto. --Por essa eu não esperava. -- Essa frase parecia estar se tornando comum para Emily.
-- Eu posso explicar. -- A jovem ignorou a dor e tentou explicar a situação ao Kevin, que sempre fora um rapaz calmo.
-- Claro! Como você sempre pode explicar tudo. -- Ele se exaltou e gritou com Emily. -- Você é uma hipócrita, mentirosa e pior, é uma sapatão!
Alguns meninos do terceiro ano B que viram a confusão e a forma como Kevin segurava e chacoalhava a garota e correram para separar, segurando-o pelo braço, e um deles, Matheus, um praticante de judô e também melhor amigo de Kevin, deu-lhe um mata leão, apenas com o objetivo de imobilizá-lo. Nesse momento, Emily já se encontrava em prantos. Ela estava assustada com a situação e se sentia culpada por ter causado tanta magoa ao rapaz. Ela era a causadora de toda essa confusão.
-- Soltem ele, por favor! -- A voz de Emily falhava em meio ao choro. Seu rosto estava avermelhado e umedecido pelas lágrimas que insistiam em descer frequentemente. -- Por favor! -- Sua voz quase não saiu.
-- Me solta cara! -- Kevin sacudia-se. -- Eu estou calmo!
-- Olha bem o que você está fazendo cara. É a Emily! -- Matheus advertiu o amigo.
Assim que foi solto, ele deu um passo em direção à garota e novamente os meninos do terceiro ano seguraram-no.
-- Emily, porque você fez isso? -- Kevin perdeu as forças, desabando no colo dos amigos, lágrimas desceram dos seus olhos. -- Nós éramos um casal feliz!
-- Emily,sai daqui, por favor! -- Matheus pediu educadamente.
-- Não. Me deixa falar com ele. -- A jovem se doía ao ver o ex-namorado daquele jeito.
-- Emily! -- Matheus chamou-a atenção. -- Não é o melhor momento.
A jovem consentiu com a cabeça, e mesmo querendo confortar o rapaz, ela se retirou.
Na manhã seguinte, Emily foi acordada pela mãe que lhe trazia o café na cama.
-- Bom dia filhota! -- Katrien se sentou na borda da cama e Emily resmungou.
-- Foi só um mal entendido do colégio mãe. -- Emily se defendia antes mesmo do questionamento da mãe.
-- E essa com certeza é a prova viva de que não foi. Mas essa é uma conversa para mais tarde. Levante-se, tome o café e se vista, tem visita para você.
-- A essa hora da manhã? -- Emily esfregou os olhos e se sentou na cama. -- Quem é?
-- Já passam das dez, Emily. -- Katrien deu um tapinha na perna da filha. -- Vamos Emily, não tenho muito tempo para ficar fazendo sala. Hoje eu tenho um almoço com um novo cliente e preciso passar no escritório para fazer algumas anotações finais aos documentos. -- Katrien colocou a bandeja de café sobre a mesa de canto e foi até a porta de vidro que dava acesso a varanda, abrindo a cortina. A luz do sol invadiu completamente o quarto, nesse momento, Emily se jogou na cama e retornou a cobrir-se, cobrindo também os olhos.
-- Mãaaaaaae!
-- Querida, vamos, a Alice não pode esperar para sempre. -- Katrien tentava apressar a filha a todo custo. Emily se assustou ao ouvir o nome da rival. -- Aliás, quero explicações sobre como vocês se tornaram amigas. Gostei disso. -- Katrien sorriu, apoiando o “tratado” de paz que a filha fizera.
Embora Emily estranhasse uma visita feita por Alice, ela não podia explicar a situação ocorrida na noite anterior para a mãe, não agora, não sem tempo o suficiente para explicar. Ela sabia que Alice lhe causaria mais dor de cabeça, mas não esperava que fosse tão logo, e para piorar, na casa de Emily, onde todos os seus familiares poderiam ouvir.
-- O papai e o Robbert podem fazer companhia a ela enquanto eu me arrumo? -- Emily murmurava por debaixo do cobertor. Ela já sabia da resposta, mas precisava ter certeza.
Katrien puxou-lhe o cobertor.
-- Seu pai levou seu irmão ao campeonato de futebol essa manhã. Emily, vamos... -- Insistia a mãe.
-- É mesmo! Eu tinha esquecido, eles só voltam no domingo... -- A jovem se sentiu aliviada ao ouvir a confirmação da mãe, agora ela sabia que não correria nenhum risco de alguém ouvir a conversa, e provável briga. -- Mãe, diga a Alice para subir e pode ir resolver suas coisas do escritório. Não quero te atrasar.
-- Tem certeza? -- Katrien a olhou, confusa. -- Você odeia que entrem no seu quarto. -- Emily se espreguiçou.
-- Tenho mãe. Agora vai logo antes que eu me arrependa. -- Emily sorriu ao brincar com a mãe.
-- Filha, mamãe te ama! -- Katrien ficou eufórica e correu para dar-lhe um beijo na testa, saindo às pressas logo em seguida.
Emily nem mesmo se preocupou em tirar o pijama, pegou a tigela de cereal em cima da bandeja e adicionou o leite do copo, mas não teve o tempo necessário para terminar de comer. Alice se apressou tanto para ir ao quarto da jovem que acabou se esquecendo de bater na porta. Emily se assustou com o único e alto solavanco que fez a porta ao ser aberta até o limite e quase derramou cereal em si mesma.
-- Não sabe bater não? -- Emily pôs a tigela de volta na bandeja, mas permaneceu sentada na cama. Ela estava com uma calça de moletom cinza claro e uma blusa de manga três quartos,branca com a tonalidade das mangas em azul marinho. O cabelo ruivo estava bagunçado de tanto rolar na cama e seu rosto ainda com marcas do travesseiro.
-- É assim que me recebe? -- Alice observou a menina e admirou sua beleza. Como ela podia ser bonita até desse jeito? Ela não se conformava. -- Você sabe que eu poderia te zoar por esse cabelo e esse rosto amassado, não sabe? -- Alice a observava tão continuamente que nem teve tempo para notar os detalhes do quarto de Emily. Uma das paredes era em tom roxo, com algumas figuras abstratas em branco gelo. Na parede de frente para a cama ficava os instrumentos musicais de Emily, um teclado, um violão no apoio de chão, um violino ao lado de um caderno de tablaturas e a guitarra em um apoio de parede. Ao lado da cama, na mesa de canto, além da bandeja do café da manhã, havia um abajur no estilo japonês e alguns livros de matemática. Ao lado do guarda-roupa tom marrom madeira havia um pequeno estande de livros, o estande estava em superlotação. A parede na qual a cama ficava encostada era coberta por pôsteres de bandas e também por colagens, Emily adorava fazer colagens. Mas o melhor detalhe do quarto de Emily era uma porta duplex feita de vidro, que pegava do chão a alguns centímetros do teto, dando passagem para uma pequena varanda, onde Emily costumava ir todas as manhãs. A cortina que cobria a luz do sol era a salvação de Emily nas manhãs muito ensolaradas e repletas de preguiça.
-- E você sabe que eu poderia te jogar pela janela, não sabe? -- Emily retrucou e Alice sorriu.
-- Eu posso? -- Alice apontou para o puf próximo da cama e Emily compreendendo a jovem, apenas consentiu com a cabeça.
Um silêncio constrangedor se instalou assim que Alice sentou. Ela não sabia por onde começar, e Emily não sabia nem sequer o motivo da visita. Estavam as duas ali, paradas. Ninguém se pronunciou, e os olhos azuis e castanhos se encontraram algumas vezes nesse tempo. Emily respirou fundo, arqueando as sobrancelhas, como quem espera por uma explicação.
-- Também não é fácil para mim, okay? -- Alice respondeu à atitude da rival.
Emily inicialmente não respondeu nada, mas ao notar o aumento do tom de voz de Alice, ela retrucou de forma ofensiva.
-- O que não é fácil pra você sua louca? -- Gesticulou.
-- Emily, qual é o seu problema? Eu só vim... -- A jovem a interrompeu.
-- Meu problema é você. Sempre foi você. No campeonato de vôlei da quinta série eu fui expulsa do jogo por sua culpa. No aniversário de quinze anos da Anne eu não pude ir porque levei uma advertência do colégio na semana anterior e fiquei de castigo. E adivinha por quê? Você. -- Emily foi grosseira. -- Eu não me apresentei no show de talentos na sétima série porque VOCÊ -- Enfatizou. -- Me trancou no banheiro do colégio. Na oitava série eu quase morri por causa de um ataque asmático por causa de uma briga iniciada por você! E você lembra do segundo ano quando eu fui suspensa por três dias quando você caiu no corredor e disse que eu havia te empurrado? -- Emily encarava-a, era notável o estresse dela. -- E agora eu posso desistir de vez do Kevin, porque você me agarrou na escola. Mas o pior de tudo foi me fazer beijar a Anne. -- Emily se lembrou do beijo e se não estivesse tão brava, provavelmente teria gostado da lembrança. -- E agora eu nem mesmo sei se gosto de homens! -- Emily despejou todas as mágoas de uma só vez e acabou dizendo coisas que nem deveria, surpreendendo Alice.
Essa havia sido a primeira vez em todos esses anos de discórdia que Emily havia desabafado, ela finalmente havia tirado o nó que sentia na garganta em todas as discussões nas quais segurava as palavras e mágoas, e isso fez com que Alice se sentisse arrependida pela terceira vez. Mas o arrependimento não a fez mais volátil, e nem mesmo mais sensível e menos orgulhosa.
-- Minha culpa? Você fala como se não tivesse feito coisas horríveis comigo também! Lembra quando me humilhou na frente da sala inteira quando eu errei uma conta matemática? E quando você... -- Alice não conseguiu se recordar de nenhuma outra briga causada por Emily, ela não sabia onde estava todo o seu dom em argumentar positivamente ao seu favor. -- A questão é que você não é uma santa!
-- E quando você é... é... -- Emily imitou a rival, provocando-a. -- Até você sabe que é a malvada da história.
Talvez Emily estivesse certa, mas quem é que está certo quando o assunto é uma briga?
Alice se deu conta de que ambas se encontravam no meio de uma discussão novamente, como sempre faziam assim que se dirigiam uma à outra e esse não era o objetivo da visita. Foi difícil para ela superar todo o orgulho que tinha, mas na noite anterior, quando viu Emily tão irritada e ao mesmo tempo aflita, um sentimento diferente foi percebido por Alice. Ela gostava de fazer Emily se sentir assim, mas naquela noite, algo parecia ter passado do limite, e seu coração apertou. Embora isso fosse novo para Alice, ela se sentiu horrível ao causar tanta aflição a Emily e defende-la foi algo quase que instantâneo.
-- Emily! -- Alice a interrompeu em alto e bom som.
Ambas se calaram. A troca de olhares foi inevitável. Alice nunca havia se dirigido a Emily essa forma.
-- Eu sinto muito. Por todas essas coisas. Sinto muito por nós. -- Alice aproximou-se de Emily e agachou na borda da cama. -- Nós não precisamos ser assim, inimigas.
-- E o que mais nós seriamos Alice? -- Emily observou a aproximação da jovem. -- Nós somos boas em ser rivais. -- Emily deu um sorriso breve e Alice retribuiu, entendendo a jovem.
-- Eu não sei por você, mas eu estou cansada de tantas brigas Emily.
-- Mas é você que... -- Alice a interrompeu.
-- Calma, me deixa terminar. -- Ela foi educada. -- Olha, eu preciso admitir que eu adoro te irritar, eu adoro provocar isso em você, mas gosto porque tenho a sua atenção. -- Alice admitiu. -- Eu confesso que no dia em que você teve aquele ataque asmático eu quase fiz o que finalmente estou fazendo hoje. -- Mesmo com medo da rejeição da rival, Alice tocou a mão de Emily. -- Ontem eu saí daquela festa sentindo algo diferente, eu acho que fiquei preocupada com você. Dá para acreditar? -- Alice parecia surpresa por ter se sentido assim, mas agora ela entendia o motivo. Emily pressionou os lábios, sorrindo. Ela ficou contente em ouvir isso, sentiu sinceridade em Alice. Não soltou a mão da rival, pelo contrário, dessa vez foi Emily quem deu um leve aperto na mão de Alice. -- Eu soube hoje de manhã o que ocorreu entre você e o Kevin, e foi nesse momento em que eu tive certeza de que precisava me desculpar com você. Não só por ontem, por todos os dias.-- Aliceolhava atentamente para a jovem, seus olhares se encontraram e ela admitiu novamente. -- Eu não quero que ninguém brigue com você, ninguém além de mim. Só que... -- Ela pausou e pensou. -- Só que eu também não quero mais brigar com você. -- Alice se embolava com as palavras, nunca havia se desculpado com alguém além dos pais. -- Você entende o que eu quero dizer? -- Emily e Alice se olhavam, era a primeira vez em que conseguiam sair de uma discussão de forma tão simples. Emily estava surpresa com o pedido de desculpas, ela não sabia se esse era mais um dos jogos de Alice, ou se realmente as coisas voltariam para o eixo.
Fim do capítulo
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